terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10946: Do Ninho D'Águia até África (44): O Canjura andava farto de guerra (Tony Borié)

1. Quadragésimo quarto episódio da série "Do Ninho de D'Águia até África", de autoria do nosso camarada Tony Borié (ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66), iniciada no Poste P10177, chegado até nós em mensagem do dia 12 de Janeiro de 2013:


DO NINHO D'ÁGUIA ATÉ ÁFRICA (44)




O Canjura não era o Canjura Turé, esse era milícia e ajudava os militares, servindo de guia tradutor, era só o Canjura e andava farto de guerra, mesmo farto.

O Canjura era um africano já com uma certa idade, que andava por ali, ajudava nas obras do aquartelamento, por lá comia e andava vestido com a roupa que lhe dava o Cifra e outros militares. Fazia recados, quando era preciso limpar alguma zona, ou qualquer trabalho que não envolvesse muita força física, o Canjura era chamado. O Cifra acredita que todos os aquartelamentos no interior tinham o seu “Canjura”. Quando não ia dormir à sua morança, que estava em muito mau estado, pois não era sua mas de alguém que “foi no mato” e a abandonou, tendo o Canjura tomado posse dela, dormia debaixo de alguma viatura militar que estivesse a jeito no aquartelamento em obras.

Sabia o nome de quase todos os militares do Agrupamento a que o Cifra pertencia, pois foram dos primeiros a ocuparem o novo aquartelamento, fazia a saudação, colocando-se em sentido antes de falar, não importava que fosse soldado ou coronel, aquilo já era um vício, podia ver o Cifra dez vezes por dia, que fazia sempre a saudação, embora o Cifra lhe dissesse por um milhão de vezes para parar com aquilo, pois todos gostavam dele sem saudação, mas ele não ouvia. Perguntavam-lhe a idade e não sabia, onde nasceu e não sabia, se tinha família e não sabia, mas via-se a aflição no seu rosto, demonstrando sempre algum desespero com receio que o mandassem embora do aquartelamento, talvez já o tivessem mandado embora de outros locais. Andava farto de guerra e de fugir, isso era o que dizia ao Cifra, dizendo também que queria morrer em “chão balanta”, nem que fosse com um tiro ou numa explosão de uma granada de morteiro, mas queria ficar em “chão balanta”. Muitas vezes, quando lhe davam um cigarro, ria-se e aceitava, também aceitava cerveja e café. Na altura da refeição, lá estava à espera, às vezes com outros africanos, ele próprio controlando e não deixando ninguém avançar sem o Arroz com Pão, que era o cabo do rancho, dar ordem.


O Canjura era popular no aquartelamento, todos sabiam o seu nome e lhe davam roupa, botas, cigarros. Quando alguém não queria qualquer coisa, dizia-se: -
Dá ao Canjura!.

Às vezes andava melhor vestido que muitos militares. Um dia, nunca se soube quem mas desconfiava-se que tivesse sido alguém do comando do Batalhão de Artilharia “Águias Negras”, que estava estacionado no aquartelamento, nas instalações recuperadas do que tinha sido um antigo convento de padres de uma ordem religiosa francesa, o vestiu a rigor, com umas divisas de major, brilhantes, novas a luzir nos seus ombros. Era uma cópia, imitando o tal major “Petinga”, que era o oficial de operações especiais do Agrupamento, a que o Cifra pertencia, o tal que tinha dado uma enorme bofetada num prisioneiro, com as mãos amarradas, que caiu no chão desamparado, só porque este lhe disse que queria ser tratado como prisioneiro de guerra, e fizeram, talvez a troco de qualquer promessa de cigarros ou outra coisa qualquer, o bom do Canjura ir ao gabinete do tal major “Petinga”, bater à porta e apresentar-se, em sentido, com uma perfeita saudação.

Calculem a fúria do major ao abrir a porta do seu gabinete e deparar com o bom do Canjura, vestido tal e qual, parecendo mesmo uma cópia do major “Petinga”!
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 12 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10927: Do Ninho D'Águia até África (43): Lodo e tarrafo (Tony Borié)

Guiné 63/74 - P10945: Manuel Serôdio, ex-fur mil CCAÇ 1787 (Empada, Buba, Bissau, Quinhamel, 1967/68) (Parte VIII): Subsetor de Empada: atividade operacional em agosto / setembro / outubro de 1968


Tomar > RI 15 A> 1967 >  Elementos do primeiro pelotão da Companhia 1787





Guiné > Região de > Empada > 1968  >  O Manuiel Serôdio, no regresso de uma operaçãio



1. Continuação da série do Manuel Serôdio (, camarada que vive em Rennes, Bretanha, França), sobre a história da sua companhia, a CCAÇ 1787 (*)


Agosto de 1968 (continuação)

Operação "Nativo"

Situação:

A zona de Ponta Brandão e a estrada Empada-Gubia não é percorrida pelas nossas tropas desde Maio último. Dado o desaparecimento do destacamento de Gubia, é natural que o inimigo tente estender de novo a sua atividade às regiões antes controladas pelas nossas tropas, com o fim de retomar o controle da referida zona, que é bastante rica em terrenos cultiváveis.

Missão:

Patrulhar ofensivamente a área de Ponta Brandão e Binhal, montando uma rede de emboscadas neste local.

Forças executantes:  2 grupos de combate da Companhia 1787 + 2 grupos de combate da Companhia de Milícias n° 6

Sem contato nem vestígios.

Operação "Negrola"

Situação:

A região de Saucunda e Batambali Balanta costumava ser com muita frequência percorrida e patrulhada por grupos inimigos vindos de Aidará. Apesar dos revezes que o inimigo tem sofrido ultimamente frente às nossas tropas nesta região, é natural que continue a utilizar esta zona, como zona de passagem, e área de patrulhamento.

Missão:

Bater a área referida e montar nela uma rede de emboscadas, de modo a aprisionar ou aniquilar qualquer elemento inimigo que se revelasse durante a operação.

Forças executantes: 2 grupos de combate da Companhia 1787 + 2 grupos de combate da Companhia de Milícias n° 6

Ouvidos vários tiros de espingarda e pistola metralhadora no acampamento inimigo de Aidará, deparou-se um grupo inimigo de de 8 elemetos a cerca de 2000 metros. Não foi feito fogo por estarem fora do alcance das nossas armas.


Setembro de 1968

Atividades operacionais: (i) Patrulhamentos e picagem diários às estradas para o cais e Ualada, e à pista de aterragem; (ii) Montada a proteção aos barcos e aviões que demandaram Empada; (iii) Montada segurança aos trabalhadores da bolanha; (iv) Patrulhamentos conjugados com emboscadas (9)

Operação "Naperon"

Situação:

A região de Caur de Cima, Beja e Manpatá não é muito atingida pela atividade inimiga. Para isso contribui grande número de vezes, que as nossas tropas têm atingido ultimamente a citada zona, a última das quais em 12 de Agosto passado, durante a operação "Quarentão". Contudo, é natural que o inimigo tente por vezes patrulhar e percorrer esta mesma região, tanto mais que a zona mais a sul, ( cruzamento de Batambali) é caraterizada por uma forte atividade inimiga.

Missão:

Bater a área jà referida, e montar uma rede de emboscadas, de modo a aniquilar ou aprisionar qualquer elemento inimigo que se revelasse, quer durante a batida, quer durante as emboscadas.

Forças executantes: 2 grupos de combate da Companhia 1787 + 2 grupos de combate da Companhia de Milícias n° 6

Sem contato nem vestígios recentes

Operação "Nórdica"

Situação:

Estão desde hà muito, referenciados acampamentos inimigos em Aidará Balanta e Aidará Beafada. O inimigo realiza, embora últimamente com pouca frequência devido à constante ação das nossas tropas, patrulhamentos para Faracunda Balanta, Faracunda Beafada e Missirã Beafada. Os elementos civis da zona controlada pelo inimigo, cultivam atualmente o arroz na bolanha de Aidará.

Missão:

(i) Patrulhar ofensivamente a área de Faracunda Beafada e Faracunda Balanta, e montar uma rede de emboscadas; (ii) Aprisionar ou aniquilar os elementos inimigos que se revelassem durante a operação.

Forças executantes: 2 grupos de combate da Companhia 1787 + 2 grupos de combate da Companhia de Milícias n° 6

Sem contato.

Operação "Negociata"

Situação:

O cruzamento de Batambali é um ponto importante, dele irradiando as estradas para Buba, Catió e Empada. As nossas tropas, se bem que tivessem atingido as zonas próximas por duas vezes, em 19 de Julho e 28 de Agosto, desde 20 de Junho que não patrulham a área propriamente dita do cruzamento.

Esta mesma zona é frequentada por grupos inimigos, que vindos de Aidará, se dirigem a Gambine-Antuane, e vice-versa.

Missão:

Patrulhar ofensivamente toda a área da estrada Empada-Buba, até ao cruzamento de Batambali, e montar neste último local uma rede de emboscadas, aprisionar ou aniquilar os elementos inimigos que se revelassem durante a operação.

Forças executantes: 2 grupos de combate da Companhia 1787 + 2 grupos de combate da Companhia de Milícias n° 6

O inimigo não se revelou.

Operação "Noventa"

Situação:

A região do subsetor denominada península da Pobreza, é totalmente controlada pelo inimigo. Foram jà referenciados vários acampamentos inimigos em toda a península. A área da mata de Cantora e o cruzamento das estradas de Pobreza e Caur de Baixo Balanta,, é constantemente percorrida por grupos inimigos vindos de Satecuta e Ianguê, se dirigem ao entroncamento das estradas de Gubia-Darsalame com a da Pobreza.

Missão:

Patrulhar ofensivamente toda a área da mata, e o cruzamento das estradas da Pobreza e Caur de Baixo Balanta, e montar uma rede de emboscadas, aniquilando ou aprisionado qualquer elemento inimigo que se revelasse no decorrer da operação.

Forças executantes: 2 grupos de combate da Companhia 1787 + 2 grupos de combate da Companhia de Milícias n° 6

Foi montada uma armadilha no itenerário que vem de Satecuta, no qual é muito provável a aproximação do inimigo.


Outubro de 1968

Actividades operacionais: (i) Patrulhamentos e picagem diários às estradas para o cais e Ualada, e à pista de aterragem; (ii) Montada segurança aos barcos e aviões que demandaram Empada; (iii) Montada segurança aos trabalhadores da bolanha; (iv) Patrulhamentos conjugados com emboscadas (5).

Patrulhamento com emboscadas a Caur de Baixo Balanta

Situação:

A região de Caur de Baixo Balanta é percorrida com alguma frequência por grupos inimigos vindos dos lados de Ianguê, Satecuta e Cachobar. Últimamente o inimigo não a percorre com a frequência habitual devido à contínua ação de patrulhamento efetuados pelas nossas tropas, no entanto existem na área trilhos de utilização mais ou menos recentes.

Missão:

(i) Patrulhar ofensivamente a área de Caur de Baixo Balanta, e montar uma rede de emboscadas.; (ii) Aniquilar ou aprisionar os elementos inimigos que se revelassem durante a operação.

Forças executantes: 2 grupos de combate da Companhia 1787 + 2 grupos de combate da Companhia de Milícias n° 6

Sem contato

Patrulhamento a Ponta Brandão


Situação:

A área compreendida entre Empada e Gubia, era controlada pelas nossas tropas. Com a evacuação daquele destacamento, é natual que o inimigo procure estender a sua ação para nascente, no sentido de Empada a partir de Cubisseco.

Missão:

Patrulhar a área anteriormente referida até Ponta Brandão, conjugando o patrulhamento com a montagem de emboscadas, por forma a aniquilar os elementos inimigos que se revelassem.

Forças executantes: 2 grupos de combate da Companhia 1787 + 2 grupos de combate da Companhia de Milícias n° 6

Sem contato

(Continua)
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Nota do editor;

Último poste da série > 24 de dezembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10858: Manuel Serôdio, ex-fur mil CCAÇ 1787 (Empada, Buba, Bissau, Quinhamel, 1967/68) (Parte VII): Subsetor de Empada: atividade operacional em julho e agosto de 1968

Guiné 63/74 - P10944: Agenda cultural (248): Abertura ao público do Arquivo Amílcar Cabral e realização do seminário "Amílcar Cabral: um projeto interrompido", Lisboa, Fundação Mário Soares, 2ª feira, dia 21


1. A Fundação Mário Soares, com sede na Rua de São Bento, 160, Lisboa, vai realizar um seminário sobre Amílcar Cabral, em 21 de janeiro de 2013, 2ª feira, das 11h00 às 19h15. Esta iniciativa é aberta ao público, não há inscrições prévias. O auditório da Fundação tem capacidade para 100 pessoas. A organização deste evento é conjunta, contando com a parceria do Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa (IHC/UNL) e a colaboaração da Fundação Amílcar Cabral, com sede na cidade da Pria, Cabo Verde.

A partir do 20 do corrente, a Fundação vai permitir o acesso ao público do Arquivo Amílcar Cabral,  na Internet, ao fim de vários de trabalho de recuperação e tratamento do espólio (documental) do fundador e líder do PAIGC, sob a direcção (segura, persistente e competente) do dr. Alfredo Caldeira.  Até agora tem estado disponível apenas uma pequena amostra desse espólio.

É de recordar aqui que,  "ao longo da sua existência, a Fundação Mário Soares tem recebido um amplo reconhecimento público pela actividade desenvolvida, em especial pela contribuição dada na promoção de uma cultura cívica e democrática e pelo papel desempenhado na preservação, digitalização e divulgação de numerosos acervos documentais e fotográficos relevantes para a investigação e conhecimento da memória histórica comum dos países da Lusofonia".
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Nota do editor:

Último poste da série > 12 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10929: Agenda cultural (247): Termina a 27 deste mês a exposição Álbum de Memórias: Índia Portuguesa. 1954-62, Lisboa, Padrão dos Descobrimentos

Guiné 63/74 - P10943: Estórias cabralianas (76): Não sei se por distracção ou por preguiça, mas esqueci-me de morrer... (Jorge Cabral)

1. Mais um "estória do nosso alfero". Desta vez "triste", diz ele. Alfero Cabral, lembram-se dele ? Não, não é o Cabral que foi assassinado em 20 de janeiro de 1973, mas um tal Jorge Cabra, que um dia foi "régulo" de Fá Mandinga e de Missirá, ínfimas aldeias de um pequeno país lusófono chamado Guiné-Bissau. 

[Foto à esquerda: Jorge Cabral e Eduardo Magalhães Ribeiro, dois camaradas patriotas, Lisboa, Monumento Nacional aos Combatentes do Ultramar, Forte de Bom Sucesso, 10 de Junho de 2011]


2. Estórias cabralianas > Mais uma incursão no futuro - Ano 2042
por Jorge Cabral

Não sei se foi por distracção ou por preguiça, mas esqueci-me de morrer. Claro que  tenho pago escrupulosamente o Imposto de Sobrevivência, mas agora resolvi aceder  ao apelo governamental “ todos os velhos devem comparecer na Central de Abate,o  que constitui um dever patriótico”.

Comuniquei a decisão à família, que ficou muito  contente, principalmente a minha bisneta Carol, que foi logo requerer mais um filho  nos Serviços de Programação Genética. Um rapagão que nasça já crescido para não dar  trabalho… 

Porém antes do dia da apresentação é preciso fazer o espólio e transmitir as memórias  que serão arquivadas. Todos os meus dez mil livros serão incinerados..e quanto às  memórias, ligar-me-ão a uma máquina que reproduzirá um resumo. Já consultei  algumas de Camaradas da Guiné. A máquina não me parece muito fiável ou se calhar  são as memórias…

Mas é obrigatório. Estive três horas ligado e depois o operador deu-me a conhecer o  resultado. Lá aparece um idílico Missirá, rodeado de cerejeiras ,junto a um riacho  onde se pescam trutas e até consegui ouvir o Branquinho ao piano.
 - Confere ? - perguntou o funcionário.
- Correcto!- respondi.

É já amanhã o dia. Sei que vou encontrar Camaradas. Patriotas….pois então!

J. Cabral [, foto à direita, em cima, Fá Mandinga, 1969]

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Nota do editor:

Últimos cinco  postes da série:


(...) Há mais de sessenta anos que conheço esta Leitaria. Fica na Avenida do Brasil e quando eu era miúdo havia lá uma vaca. Uma vaca em plena Lisboa…Quando conto,pensam que é estória, mas não é, a Senhora Margarida, vendia o leite produzido à vista do cliente. (...)

1 de outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10463: Estórias cabralianas (74): Danado para as cúpulas... (Jorge Cabral)

(...) – Branquinho, eu era danado para as cúpulas ? – perguntei-lhe um dia destes, porque habitualmente me socorro da sua memória. Ainda há meses, logo depois do almoço da CCS do Bart 2917, em Guimarães, no qual contaram tantas estórias do meu Missirá, tive de procurar confirmação junto dele. Praticamente eram todas invenções, pois também têm direito…

A esta questão, o Branquinho nem soube responder.
–Cúpulas ? Quais cúpulas? (...)

29 de agosto de 2012 > Guiné 63/74 - P10307: Estórias cabralianas (73): O Conde de Bobadela (Jorge Cabral)

(...) Estou no Tribunal de Mafra à espera de um Julgamento, quando uma mulher me interpela:
- É o Senhor Conde, não é?

Hesito, mas para evitar mais conversa, respondo:
-Sou sim. Como vai a senhora?
-Ai, que já não se lembra da Aurora! Eu trabalhava em casa do Senhor D.Ilídio. O Senhor Conde ia lá muito, quando estava na tropa. (...)

9 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9873: Estórias cabralianas (72): Ressonar... à fula (Jorge Cabral)

(...) Além de ressonar, sempre falei a dormir. Um dia em Missirá propus-me descobrir, de que falava, o que dizia. Ora, havia lá um velho gravador de fita, máquina pertencente a não sei quem, enfim nossa, pois viviamos numa espécie de “economia comum”. Resolvi pois gravar uma das minhas noites. (...)

24 de abril de 2012 > Guiné 63/74 - P9796: Estórias cabralianas (71): Fixações etnomamárias: evocando o meu avoengo Carloto Cabral que, no séc. XVIII, crismou Quebo como a Aldeia das Mamas Formosas (Jorge Cabral)

(...) Há uns tempos recebi uma simpática mensagem de uma leitora das “estórias cabralianas”. Gabava-me o humor mas alertava-me, algumas indiciavam uma certa “fixação mamária”. Nada de grave, que não pudesse ser tratado no seu divã, de psicanalista, presumo. (...)

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10942: Blogpoesia (317): Toadas de Inverno (J.L. Mendes Gomes)

1. Em mensagem do dia 11 de Janeiro de 2013, o nosso camarada J.L. Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil e Catió, 1964/66), enviou-nos este poema para publicação em companhia de boa música:


Toadas de Inverno

Toadas de Inverno 
Num Outono cadente. 
Trovoadas acesas 
Nas eiras de pão.

Está tudo trocado. 
Chovem grãos de cevada 
Nas searas de trigo 
Escorre óleo de rícino, 
Em vez de azeite.

Nem o centeio voraz 
É capaz de crescer. 
Pendem mirradas 
As uvas sem suco.

Ardem gargantas 
Com gretas de fome. 
Nem as tetas das vacas 
Segregam as natas de leite. 

Os carros de bois 
Voltam tão tristes para casa 
Com os fueiros acesos, 
Sem nada em cima.

Apagaram-se as luzes da estrada

Campeiam fantasmas 
Pelas veredas da aldeia. 

Só falta tocar a rebate 
E chamar os bombeiros 
Que apaguem depressa 
Esta fogueira de fome, 
Enquanto a água não seca. 


Ouvindo concerto nº 1 para piano de Tschaikowsky Zehlendorf, 7 de janeiro de 2013
9h34m
Joaquim Luís M. Mendes Gomes
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 11 de Janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10923: Blogpoesia (316): Apat(r)ia... (J.L. Mendes Gomes)

Guiné 63/74 - P10941: Fantasmas ...e realidades do fundo do baú (Vasco Pires) (3): A morte, em 24/1/1971, do cap inf op esp Fernando Assunção Silva, 1º comandante da CCAÇ 2796, e meu amigo

1. Mensagem do Vasco Pires, que vive no Brasil, e que foi comandante do 23º Pel Art (Gadamael, 1970/72) [, foto atual, à esquerda]

Assunto: Fantasmas do fundo do baú

Caríssimos Luis Graça/Carlos Vinhal,
Cordiais saudações.

Esta semana, lendo um extrato do diário de uma autora americana, pensei que um blog de ex-combatentes possa ser um lugar adequado para também exorcizar fantasmas.

Quando cheguei em Gadamael, lá pelos meados de 1970, encontrei uma Companhia [, a CART 2478,], em fim de comissão, comandada pelo então Capitão de Artilharia Rodrigues Videira, experiente Oficial, já com várias comissões de serviço. Era generoso, e me ajudou muito com a sua experiência.

Dizia ele que a sorte do ser humano é a memória ser seletiva, e ir atenuando as experiências negativas, logo os eventos positivos sobressaem. Sábias palavras, contudo alguns fantasmas ficam lá no mais recôndito do "baú".

Quarenta anos após, é a momento ideal para relembrar os feitos de guerra e alegrias desse tempo de juventude.
- E os fantasmas? - pergunto eu.

A Companhia de Artilharia foi logo rendida por uma Companhia de Infantaria [, a CCAÇ 2796,] comandada pelo saudoso Capitão de Infantaria Fernando Assunção Silva, intrépido e carismático Oficial. Foram tempos agitados esses, talvez o PAIGC quisesse eliminar Guileje, aniquilando primeiro Gadamael.

O Capitão Assunção Silva comandou sempre magistralmente a reação a todas as flagelações, e ordenava patrulhas regulares, algumas delas comandadas por ele pessoalmente. Pois é, e numa delas aconteceu, um simples disparo de um franco-atirador atingiu-o mortalmente no peito.

Consternação, para mim, além de Comandante, amigo morto.

O remédio que usei, foi o "velho Scotch", errei na dose e virou veneno. Lembrou que ensaiei um discurso provavelmente desconexo, "apaguei", e uma mão generosa me retirou da câmara mortuária.

Naquela noite, os leais e eficientes Furriéis de Artilharia Oliveira e Krus assumiram o comando efetivo do 23° Pel art.

Se eu encontrasse hoje o Capitão Rodrigues Videira, reconheceria que ele estava certo, realmente a memória é seletiva, porém, as excepções à regra, às vezes pesam. (**)

Forte abraço

Vasco Pires [, foto acima, à direita, em São Domingos, no final da comissão, em 1972]
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Notas do editor:

(*) Fernando Assunção Silva, natural de Oliveira de Azeméis, cap inf op esp., comandante da CCAÇ 2796 (Gadamael e Quinhamel, 1970/72), morreu em combate em 24/1/1971. Está sepultado no cemitério de Atouguia, Guimarães (Fonte: Portal Ultramar Terraweb > Mortos do Ultramar > Concelho de Oliveira de Azeméis).

A CCAÇ 2796, independente, foi mobilizada pelo RI 2, partiu para to TO da Guiné em 31/10/1970 e regressou a 5/10/1972. Esteve em Bissau, Gadamael e Quinhamel. Comandantes:  Cap inf  Fernando Assunção Silva e Cap Art  António Carlos Morais da Silva (, este último, instrutor da 1ª CCmds Africanos, em Fá, adjunto do COP 6, em Mansabá, e comandante da CCAÇ 2796, em Gadamael).

Como escreveu o Morais da Silva no nosso blogue, “avancei no fim de Janeiro de 1971 para o comando da CCaç 2796, em Gadamael, quando da morte em combate do seu comandante, meu camarada de curso e amigo Capitão de Infantaria Assunção Silva. Fiquei, a meu pedido, no comando desta companhia até ao final da comissão em Outubro de 72” . (Vd. poste P6690).

Outras referências à CCAÇ 2796 e ao seu primeiro comandante:

(i) 22 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9936: Memórias da CCAÇ 798 (Manuel Vaz) (9): Uma perspectiva a partir de Gadamael Porto - 65/67 - VII Parte - Evolução da situação militar - Anexo IV

(...) "A  29DEZ70 a [,CART 2478,] era rendida pela CCAÇ 2796 que, nos primeiros tempos em Gadamael, foi severamente atacada pelo PAIGC, tendo sofrido várias baixas, entre os quais, o próprio Comandante da Companhia. O esforço operacional não a impediu de se dedicar à população, construindo 80 casas no Setor Norte do Aldeamento, uma Escola e um Posto Sanitário, na zona de ligação entre os dois setores do Ordenamento, para além de um Heliporto, Casernas e uma nova Reorganização do Terreno. A 1ª foto aérea dá uma ideia do Aquartelamento e das zonas limítrofes, no tempo desta Companhia".  (...)

(ii) 21 de fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7817: Os nossos médicos (23): Resposta de Morais da Silva (ex-Cap Art, CCAÇ 2796, Gadamael e Quinhamel, 1971/72) a Amaral Bernardo, ex-Alf Mil Med (CCS/ BCAÇ 2930, Catió, 1970/72)

(...) "A CCaç 2796 foi fustigada de forma brutal nos seus primeiros passos em Gadamael numa primeira tentativa do PAIGC de, indirectamente, eliminar a posição de Guileje (o que veio a conseguir em 1973 por via directa). Sofreu baixas, incluindo o comandante da companhia (24Jan71) e nos finais de Janeiro de 1971 era uma subunidade extenuada psicologicamente. Com muito trabalho de todos, reagiu, recuperou, deixou obra feita (reordenamento, escola, posto sanitário, casernas, organização do terreno) e garantiu a posse de Gadamael, a segurança da população, o apoio logístico a Guileje e a liberdade de movimentos no seu sector. Em suma "Cumpriu a Missão". Não desmereceu do seu primeiro e valoroso comandante de companhia – Capitão Assunção Silva, dos seus restantes camaradas mortos e feridos em combate e da confiança da população que apoiou de múltiplas formas e com quem manteve relações de respeito e amizade." (...)

(iii) 24 de junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6638: Lista alfabética dos 24 capitães que morreram em campanha no CTIG, dos quais 10 em combate, todos comandantes de companhias operacionais (9 Cap QP, 1 Cap Mil) (Carlos Cordeiro)

(...)
- FERNANDO ASSUNÇÃO SILVA : Cap Inf / Cmdt CCaç 2796 / Combate / 24 de Janeiro de 1971 (vd. poste P3451, de 13/11/2008). (...)

(iv)  Ficha de unidade: elementos recolhidos pelo  José Martins (vd. poste P3451, de 13/11/2008)

Companhia de Caçadores n.º 2796

Unidade Mobilizadora: Regimento de Infantaria n.º 2 – Abrantes

Comandantes: Cap Inf Fernando Assunção Silva e Cap Art Carlos Morais da Silva

Divisa: Gaviões

Partida: Embarque em 31 de Outubro de 1970 – Desembarque em 10 de Novembro de 1970

Regresso: Embarque em 5 de Outubro de 1972

Síntese da Actividade Operacional:

(i) Após uma curta permanência em Bissau, seguiu em 27 de Novembro de 1970, para Gadamael e assumiu a responsabilidade do respectivo subsector em 1 de Dezembro de 1970, em substituição da CArt 2478, ficando integrada no dispositivo e manobra do BArt 2865 e depois do BCaç 2930.

Em 1 de Fevereiro de 1972 foi rendida pela CCaç 3518, tendo seguido para Quinhamel, por fracções, em 24 de Janeiro de 1972 e 2 de Fevereiro de 1972. Em 22 de Fevereiro de 1972, rendendo a CCaç 2724, assumiu a responsabilidade do subsector de Quinhamel com destacamentos em Ponte Vicente da Mata, Ome e Ondame, colaborando na segurança e protecção das instalações e das populações e ainda nos trabalhos dos reordenamentos de Blom e Quiuta, na dependência do COMBIS.

Em 5 de Setembro de 1972, foi rendida no subsector de Quinhámel pela CCaç 3326, recolhendo seguidamente a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

(História da Unidade (Caixa n.º 87 – 2.ª Div/4.ª Secção, do AHM)

O José Martins diz que o cap inf op esp Fernando Assunção Silva, faleceu por ferimentos em combate em Tamabofa (sic). Não encontro este topónimo na carta de Cacoca (que inclui Gadamael). Não seria
Talaiá (, a nordeste de Gadamael Porto) ? Ou Iambambuli (?), a sudeste, junto à limnha de fronteira ?...

Guiné 63/74 - P10940: (Ex)citações (207): Festejando a entrada do nosso seiscentésimo grã-tabanqueiro, Abílio Magro, natural de Fronteira, um dos seus 6 filhos que a família Magro ofereceu à ditosa Pátria amada para servir em África (Angola, Moçambique e Guiné) ...

1. Dois comentários do 600.º (e bem humorado) membro da nossa Tabanca Grande, o último "pira, Abílio Magro (*), ao poste P10935 (*)

Camarada Carlos Vinhal,

Agradeço o teu post de apresentação e aproveito para informar que o título de sexycentésimo não me soa nada mal.

Aproveito também para lembrar aos grã-tabanqueiros que é norma, mesmo no mais "mixuruca" dos supermercados, a atribuição de uma lembrança àqueles que atingem números assim redondinhos (também aceito cheques).

Entretanto,  quero corrigir a distribuição do pessoal da Companhia Magro que saíu errada na O.S., talvez por minha culpa na formatação do texto enviado.

Então era assim em 1972:

Disponibilidade - Rogério Magro
Moçambique - Dálio Magro
Angola - Carlos Magro
Guiné - Fernando Magro + Álvaro Magro
Caldas da Rainha - Abílio Magro

Feitas as devidas correcções, com o meu pedido de esculpas, passemos ao trabalho.

Quanto à assessoria informática, eu sou apenas um "curioso" que anda metido nisto dos bytes há bué de tempo, como autodidacta, não me sentindo, no entanto, nenhum expert na matéria. Faço umas coisitas, é verdade, e é o meu principal hobby, mas não sei se estarei à altura de assumir tamanha responsabilidade. Estou, isso sim e com todo o gosto, inteiramente disponível para dar a ajuda que me for possível, se para tanto tiver engenho e arte. E acreditem que o digo com toda a sinceridade porque eu "gosto mesmo disto, carago!". Isto é: informática na óptica do programador. Mas fica desde já o aviso: sou completamente amador!.

Quanto a fotos é que a coisa, para já, está fraca, por um lado porque a minha impressora deixou de "sacanear" e através de telemóvel a "coisa" não funciona lá muito bem e, além disso, os meus irmãos, cá como lá, estão dispersos - Viseu, Lisboa, etc. 

O meu irmão Fernando, o mano velho, escreveu em tempos um livro "Memórias da Guiné" (***) do qual possuo um exemplar e penso enviar-vos alguns excertos mais tarde, porque hoje "bai dar o Puorto, carago!"

Um grande abraço.
Abílio Magro


PS - Em tempo:

Felizmente regressamos todos sãos e salvos, uns mais cacimbados que outros, e cá continuamos todos, agora troikados e também uns mais que outros. A nossa mãe faleceu em Dezembro de 1971, enquanto o 5.º filho navegava com destino à Guiné. O nosso pai é que viu todos partir e, felizmente, também os viu regressar. A dada altura já todos nós o tratávamos por Comandante.

AM

2. Comentário de L.G. (**):

Abílio, ainda não tive ocasião de saudar a tua entrada, jovial, bem humorada, nesta "caserna virtual" onde, como sabes, pelas regras em vigor, se pode falar de tudo menos de "política, religião e futebol"... 

Isto quer dizer, que eu não vou comentar as (muito menos revelar as minhas) emoções do jogo de futebol de ontem, entre Benfica e Porto, que - dizem - dividiu mais uma vez o país ao meio... Eu, como sou mouro, de ADN,  mas morcão de coração, só posso estar, nesses dias, em Vila de Rei, que é o centro geodésico de Portugal...  

Quanto ao resto, és bem vindo e aparecido. Deixa-me tirar o quico à tua ditosa e amada família que tantos filhos machos deu à Pátria, esforçada na guerra, ingrata na paz.  Para já, vocês, os Magro, passam a figurar no Livro de Recordes da Tabanca Grande. Seis combatentes em África é obra. Temos também aqui um outro alentejano, o José Luís Vacas de Carvalho, que esteve comigo em Bambadinca, e que teve vários irmãos militares, mas julgo que menos que vocês. Os Vacas de Carvalho são uma família numerosa e conhecida de Montemor-o-Novo.

Bom, espero que tragas os manos da Guiné, o Fernando e o Álvaro, até ao nosso blogue. Vamos fazer 9 anos de existência e até ao dia 23 de abril de 2013 temos uma campanha em curso para "recrutar" mais 25 "periquitos"... Conto com a tua militância bloguística. As alvíssaras virão depois.
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Notas do editor:

(*) vd. poste de 13 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10935: Tabanca Grande (381): Abílio Magro, ex-Fur Mil Amanuense do CSJD/QG/CTIG (1973/74), 600.º tabanqueiro desta tertúlia

(**) Último poste da série > 14 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10937: (Ex)citações (206): Festejando a chegada do "pira" José Sousa Pinto, meu contemporâneo em Teixeira Pinto, 1972 (Mário Bravo)

(***) Fernando Valente (Magro) é também blogador,  autor do blogue *Portugal e o passado", donde retirámos os seguintes elementos de identificação:

(i) Nasceu a 10/05/1936 em Arouca;
(ii) É Engenheiro Técnico de Construções Civis;
(iii) Prestou serviço na ex-colónia da Guiné como Capitão Miliciano de Artilharia, entre 1970 e 1972;
(iv) É membro da Associação Portuguesa de Escritores;
(v) Autor das seguintes obras: - Menina do Meu Pensar - A Canção Arábica - Memórias da Guiné - Um Olhar Abrangente - As Aventuras de Robin dos Bosques

Da Docweb, retirámos mais os seguintes elementos bibliográficos:

Memórias da Guiné / Fernando Magro. - Lisboa : Polvo, 2005. - 84 p. ; 20 cm

  

Guiné 63/74 - P10939: Memória dos lugares (205): Olossato, anos 60, no princípio era assim (1) (José Augusto Ribeiro)

1. Em mensagem do dia 1 de Janeiro de 2013, o nosso camarada José Augusto Ribeiro (ex-Fur Mil da CART 566, Cabo Verde (Ilha do Sal,  out 63/  jul 64) e Guiné (Olossato), jul 1964/out 65), enviou-nos algumas das suas fotos que documentam o nascimento do quartel onde passaria uma boa parte do tempo da sua comissão de serviço:


MEMÓRIA DOS LUGARES 

OLOSSATO - O princípio


Foto 94 > > Olossato > Entrada do quartel

Foto 95 > Olossato > Hastear de Bandeira

Foto 98 > Olossato > Obras na pista de aterragem

Foto 100 > Olossato > Um DO na pista do Olossato

Foto 105 > Olossato > Casa dos Sargentos

Foto 106 > Olossato > Construção de abrigos

Foto 107 > Olossato > Construção de abrigos

Foto 108 > Olossato > Construção de abrigos

Foto 109 > Olossato > Construção de abrigos

Foto 113 > Olossato > Construção de abrigos

Foto 114 > Olossato > Construção de Abrigos

Foto 115 > Olossato > APSICO - Convívio com a população

Foto 116 > Olossato > APSICO - Convívio com a população



2. Recorde-se o trajeto do José Agusto Ribeiro por terras de África:

(i) Pertenceu a CArt 566, como Furriel miliciano atirador de artilharia, e esteve no Olossato cerca de 10 meses (dez 64/ out 65);
(ii) Nasceu em 1939, na Lousã;
(iii) Partiu em 8 de Outubro de 1963, no T/T "Ana Mafalda", com destino a Cabo Verde, Ilha do Sal, mas com passagem por Bissau;
(iv) Dez meses depois, a CART 566 embarca. no velho navio de guerra "Lima", a 25 de Julho de 1964, com destino à região do Óio (Biossorã);
(v) Conhece pela primeira vez a G3, em Bissau, e treina na carreira de tiro, antes de cir de férias a Portugal;
(vi) Em dezembro, a companhia vai para o Olossato;
(vii) Saída do Olossato no inicio de Outubro de 1965 e ida, de novo, para Bissorã;
(viii) Embarque a 7 de Outubro de 1965 erm Bissau com destino a Lisboa, no navio "Niassa", com a 3 de Novembro.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 10 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10919: Memória dos lugares (204): Os meninos do Xime, do tempo da CART 3494 (1972/73) (José Carlos Mussá Biai)

Guiné 63/74 - P10938: Notas de leitura (449): Palavras de um Defunto... Antes de o Ser, por Mário Tito, o nosso camarada Mário Serra de Oliveira (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 24 de Outubro de 2012: 

Queridos amigos,
O Mário Tito cumpriu a promessa, temos aqui uma passeata de quase toda a sua vida, é um gosto vê-lo divertido, desassossegado, nunca se queda numa linha principal, rapidamente bifurca em múltiplas considerações e só a custo tira conclusões. Dentro dessa bonomia, somos induzidos a vê-lo à frente de restaurantes antes e depois da independência. Trouxe Momo Turé do Grande Hotel para O Pelicano. Para quem já se esqueceu, Momo Turé foi invocado como o conspirador-mor em Conacri, um dos fautores do assassinato de Amílcar Cabral.
Lendo o Mário Tito, não é difícil perceber que foram acusações estapafúrdias, Momo não tinha estofo para dirigir aquela conspiração de guineenses. Ele promete mais revelações sobre aqueles tempos de Bissau. Vamos ver se essas revelações serão mesmo surpreendentes.

Um abraço do
Mário


Memórias do patrão de Momo Turé

Beja Santos

“Palavras de um defunto… antes de o ser!”, por Mário Tito, Chiado Editora, 2012, é uma extensa digressão da memória de um camponês que prestou serviço na Base Aérea 12 (Bissalanca, Guiné) durante o serviço militar, aqui ficou como encarregado de restaurante, proprietário, trabalhador na Embaixada dos EUA em Bissau e depois imigrante nos EUA. É um discurso fluido mesmo que propositadamente saia da linha principal e proceda a circunlóquios, parte do simples e arrasta as frases em novelo, confrontando o leitor com vários assuntos e rematando conclusões cujos dados nem sempre estão consignados nas premissas. Usa as exclamativas com generosidade, pouco preocupado com o fio da meada, somos atraídos até Alcaide, nas faldas da Gardunha, convocados para descrições de uma pobreza brutal, há mesmo fotografias com meninos de pé descalço, há fotografias de reuniões familiares, há muitos irmãos, está prestes a assentar praça mas a memória salta, indisciplinada, para recordações daquela Guiné-Bissau de grandes carências, logo a seguir à independência, trabalhava a mulher como cozinheira-governanta na residência do embaixador norte-americano e ele fazia o que podia para manter um restaurante de pé, não resistiam a andar sempre com uma garrafinha de azeite e pacotes de açúcar, o hábito faz o monge e podia-se chegar a um local onde havia peixe mas podia faltar azeite ou até um dente de alho.

Pois bem, este Mário Tito que viveu 14 anos e meio na Guiné, que trabalhou no Grande Hotel, que esteve como encarregado em O Pelicano, que teve A Tabanca e o Ninho de Santa Luzia a seu cargo, iniciou o seu périplo no RI 7, bateu à porta dos paraquedistas, que foi enviado para a BA 3, acabou na messe de Bissalanca. As suas lembranças voltam ao terrunho, ele não esconde o muito orgulho pelas origens e fala do esforço da sua mãe para que não faltasse o essencial, o pão de trigo, dois ou três pratos de sopa feita com feijão-frade e couve lombarda acompanhada por uma virada de pão de centeio e explica-nos que era uma ementa estudada para a sobrevivência, aquele pãozinho ia amolecendo dentro da sopa, uma pasta dentro do líquido, assim se enganava a fome. O Mário Tito não esconde a sua febre de escrever como se fosse arrastado pelo devaneio em que o discurso mistura vários passados e algum presente, pois que aquela infância gerou imensa solidariedade mas ele jamais esqueceu as atribulações de uma mesa onde tudo faltava mas o que havia era repartido. Um exemplo: “Nós comíamos o fígado cerca das 10 da manhã. À nossa conta éramos nove o ano todo, meus pais e meus irmãos e muitas vezes ainda repartíamos por duas famílias da vizinhança, com 3 filhos, duas raparigas e um filho cada, pelo facto que estas famílias também repartiam connosco quando vendessem qualquer porco ou cabra ou chibo”.

Parece que o Mário Tito não foi muito feliz em Bissalanca. Ele promete dedicar um livro intitulado “Bissaulónia” a toda a sua vivência, anda por Bissalanca como por vinha vindimada, chegámos gora ao restaurante O Pelicano e resolve fazer algumas considerações sobre o que escreve Oleg Ignatiev acerca de Momo ou Mamadu Turé no livro “Três tiros da PIDE”. Momo vivia com estreita ligação com Mário Tito. Um dia, Momo deu uma festa em sua casa e a seguir desapareceu. Mário Tito tinha feito a sua comissão nos anos de 1967 e 1968, arranjou logo trabalho em Bissau, no Grande Hotel. Quando O Pelicano abriu, em 14 de Novembro de 1969, Mário Tito levou consigo alguns elementos do Grande Hotel, entre eles o Momo. Chama mentiroso a Oleg Ignatiev quando este refere três dias depois de Momo sair da prisão do Tarrafal apareceu um novo chefe de sala em O Pelicano. Ora, alega Mário Tito, nessa altura nem O Pelicano sequer existia, Momo foi trabalhar para o Grande Hotel. A verdade é que a seguir ao desaparecimento de Momo vieram os agentes da DGS a O Pelicano, tirar nabos da púcara, tão discretamente como vivia tão discretamente Momo partiu para a clandestinidade. Lembra-se perfeitamente que Momo conversava em O Pelicano com Rafael Barbosa que aqui vinha beber a sua bebida predileta, a Laranjina C. E discorre sobre as razões do assassinato de Amílcar Cabral, ouviu mesmo agentes da DGS em Bissau que garantiam que não interessava às autoridades da Guiné que Cabral desaparecesse, era o único interlocutor com inteligência suficiente para a passagem do testemunho.

As suas lembranças de Bissau incluem um Rafael Barbosa que também frequentava o Ninho de Santa Luzia, este antigo presidente do PAIGC virá ser acusado de colaborador pelo PAIGC e de bombista pela DGS. Sucede que nunca houve provas suficientemente incriminatórias, Barbosa viu a sua sentença de morte comutada em prisão, é talvez a seguir a Amílcar Cabral o maior mistério da luta pela independência. As recordações de Mário Tito oscilam entre a messe de oficiais da Força Aérea, em Bissalanca, decide não regressar a Portugal, arranja um emprego no fraturante Solmar, no ano seguinte casou e trouxe a mulher para a Guiné.

É brejeiro, tem mesmo um arranjo muito próprio do “Piriquito vai para o mato”, alega que todos os arranjos são possíveis muito mais quando o autor é desconhecido. Com é tudo pouco comum neste discurso, agora sim, temo-lo em Bissalanca, há recordações dos passeios na península de Bissau, sai da Guiné e vai correr mundo. É um homem feliz com os amores, sente-se compensado por toda a iniciativa que demonstrou ter na restauração na Guiné, antes e depois da independência. Sente-se consolado por ter uma vida bem vivida, não esquece a aspereza de Alcaide, ter sido marçano em Lisboa, ter feito a Força Aérea onde teve uma comissão cheia de sorte, não conheceu dificuldades, afeiçoou-se à Guiné, serviu à mesa gente que ganhou notoriedade, num lado e no outro, fez o que pôde para trabalhar na Guiné, até ao impossível. E quer voltar a escrever, diz que tem muito a revelar sobre o quotidiano de Bissau depois da independência. Acha que se inventou um Momo Turé chefe de conspiração, acha tudo isso um puro delírio. E avisa-nos solenemente que a Bissaulónia vai deixar muita gente de boca à banda. Cá ficamos à espera.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 11 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10925: Notas de leitura (448): Amílcar Cabral, Unité et Lutte (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P10937: (Ex)citações (206): Festejando a chegada do "pira" José Sousa Pinto, meu contemporâneo em Teixeira Pinto, 1972 (Mário Bravo)


Guiné > Região do Cacheu > Teixeira Pinto (ou Canchungo) > 1972 > O Alf Mil Médico Mário Bravo - o quarto a contar da esquerda, de óculos - no meio de um grupo de oficiais. O Sousa Pinto é o sexto. Por sua vez, o AGA (António Graça de Abreu, Mil do CAOP1, Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74) é o primeiro da esquerda. Três membros da nossa Tabanca Grande numa só foto!...

Foto: © Mário Bravo (2013. Todos os direitos reservados

1. Mensagem de ontem, do nosso grã-tabanqueiro Mário Bravo (, ex-Alf Mil Médico, que passou por Bedanda, neste caso pela  CCAÇ 6, entre Dezembro de 1971 e Março de 1972 e depois por Teixeira Pinto,ficando  o resto da comissão no HM 241, em Bissau)
Bom dia., Luis Graça:

Para ti e todos os camaradas, cá vai um grande abraço, com votos de Bom Domingo. (*)

Ontem, ao matar o vício de ver o nosso blogue, dei com a cara do Sousa Pinto (**), com quem estive, na mesma época em Teixeira Pinto. 

E para realçar e festejar a chegada de mais um tabanqueiro, decidi enviar uma foto em que aparece o "piriquito"  do blogue!...  

Temos que o informar de que às quartas-feiras há sempre um almoço, no Restaurante Milho Rei, em Matosinhos - ponto de encontro da Tabanca Pequena de Matosinhos.

Cumprimenta Mário Bravo

2. Legenda proposta pelo AGA (António Graça de Abreu):

Já agora, o primeiro à esquerda sou eu, um menino ainda, à minha direita, o alf Gamelas, do BCaç 3863, depois, o alf  Cravinho, oficial de Operações do CAOP 1, já falecido (foi médico em S. Pedro do Sul), logo depois está o alf médico Mário Bravo, nosso camarada nas lides do blogue. Depois estão dois alf que não sei identificar, um deles é SGE (Serviço Geral do Exército), do B3863, mais o al  Sousa Pinto, das transmissões do B3863, e na ponta direita é o capitão António Andrade, de camuflado, comandante da 35ª CComandos.

Estávamos todos à espera da chegada do Spínola e do Costa Gomes, para lhes bater a pala e ter a honra de ser cumprimentados.

A fotografia (tirada por quem?) deve ser de 8 de Janeiro de 1973.

Um abraço a todos.

António Graça de Abreu
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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 11 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10926: (Ex)citações (205): Ainda eu, o comandante Alpoim Calvão e a Operação Nebulosa (Jorge Félix, ex-alf mil pil, AL III, Esq 122, BA 12, Bissalanca, 1968/70)


(**) Vd. poste de 7 de janeiro de 2013 >  Guiné 63/74 - P10908: Tabanca Grande (378): José Sousa Pinto, ex-Alf Mil de Transmissões do BCAÇ 3863, Teixeira Pinto, 1971/73


domingo, 13 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10936: Efemérides (115): Nhabijões, 13 de Janeiro de 1971, morte na picada (Luís Rodrigues Moreira)

1. Mensagem do nosso camarada Luís Rodrigues Moreira (ex-Alf Mil Sapador da CCS/BCAÇ 2917 e BENG 447, Bambadinca e Bissau, 1970/72), com data de hoje, 13 de Janeiro de 2013, lembrando este mesmo dia de 1971, quando o Unimog em que seguia fez accionar uma mina anticarro, provocando a morte do seu condutor e ferimentos graves nos restantes ocupantes.


NHABIJÕES, 13 DE JANEIRO DE 1971

RECORDAR, PORQUE ESTAMOS VIVOS

Passam hoje quarenta e dois anos sobre aquele fatídico dia em que, no destacamento dos Nhabijões bem no centro da Guiné-Bissau e cerca das 11,25 horas, faleceu um jovem pai de seu nome Soares, condutor auto da CCAÇ 12, destacado naquele reordenamento juntamente com outros camaradas da mesma companhia e ainda alguns camaradas sapadores da CCS do BART 2917 e eu Alf. Mil. Sapador do mesmo Batalhão que comandava aquela força há pouco menos de um mês, vítima de uma mina anticarro quando nos conduzia, a mim, ao Furriel Fernandes da CCAÇ 12 e ainda a um jovem africano com menos de 10 anos de idade e não me recordo se mais alguém, à sede do Batalhão em Bambadinca onde eu iria almoçar e presumo que o mesmo iria fazer o Fernandes, regressando depois o Soares com o Unimog 411 que lhe estava distribuído e o almoço para os restantes camaradas que aguardavam no destacamento.

Não tenho nenhuma memória dos factos que se sucederam exceto daqueles que me contaram os camaradas que nos socorreram e, saiba-se lá porquê, das últimas palavras que o Soares proferiu: vamos fazer gincana, meu alferes.

E explico a razão das suas palavras. A estrada por onde circulávamos era de terra batida como a maioria das estradas da Guiné naquele tempo. No lado esquerdo da estrada e no sentido em que seguíamos, portanto em contramão para nós, havia um enorme buraco, em diâmetro, não muito fundo mas que todas as viaturas que por ali passavam evitavam até porque a maioria delas passava carregada de bidões de água que iam buscar à Ponte do Rio Udunduma, a alguns quilómetros de distância, e não convinha partir alguma peça da viatura ou perder alguma da água com os solavancos. Ao dizer estas palavras o Soares desviou a viatura do trajeto normal para descer e subir aquele obstáculo.

Foram as suas últimas palavras já que dentro do buraco estava dissimulada uma mina anticarro que rebentou sob o rodado do lado do condutor, deixando o Unimog 411 reduzido a um monte de escombros como se pode ver na foto que foi publicada neste Blogue.


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > 1971 > CCS/BART 2917 (1970/72) > Cemitério de viaturas militares > Em primeiro plano, pode ver-se o estado em que ficou o burrinho, o Unimog 411, depois de accionar uma mina anticarro à saída do reordenamento de Nhabijões, em 13 de Janeiro de 1971, por volta das 11h25. Duas horas depois, era accionada outra mina A/C por uma GMC (parecida com a que está visível ao fundo, na imagem, mas com um maior grau de destruição). (Legenda: Luís Graça)

Foto: © Humberto Reis (2006). Direitos reservados


Eu seguia ao lado do condutor Soares no local onde, na foto, está um dos pneus da viatura e os restantes ocupantes nos bancos da caixa da viatura. A partir desse instante não tenho memória dos factos até ao momento em que, no dia seguinte, fui abordado pelo General Spínola no SO do Hospital Militar 241 em Bissau onde estava internado.

Mas antes de ser evacuado para o hospital e ainda em Bambadinca soube que os camaradas que nos tinham ido socorrer tinham sofrido novo acidente com o rebentamento de uma segunda mina anticarro quase no mesmo local, que fez vários feridos ficando o hoje meu grande amigo Fernando Marques em estado muito grave. Vi-o alguns dias depois numa maca num corredor do hospital e dirigi-me a ele, mas um enfermeiro acabou por me dizer que não estava em estado de me ver ou ouvir sequer e que iria ser evacuado nesse dia para o hospital militar em Lisboa. Não mais soube dele durante décadas até ao momento em que ouvi chamar pelo meu nome em frente à Basílica da Estrela no dia em que os Deficientes Militares organizaram uma manifestação daí até à Assembleia da República para defesa dos seus direitos.


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Destacamento e reordenamento de Nhabijões > Finais de 1970 > O Alf Mil Moreira, sapador, pertencente à CCS / BART 2917, destacado no reordenamento de Nhabijões, aqui fotografado junto a uma velha GMG . Evacuado para o HM 241, em Bissau, por ferimentos graves em 13 de Janeiro de 1971, passaria depois aos serviços auxiliares e terminaria o resto da comisão - os 15 a 16 meses que lhe faltavam! - no BENG (Batalhão de Engenharia) 447. (Legenda: Luís Graça)

Foto: © Luís Moreira (2006). Direitos reservados

Aí estava ele são e salvo e com o seu ar jovial de sempre acompanhado pelo Gabriel Gonçalves que foi quem me reconheceu e chamou. É indescritível a sensação e a alegria que tive naquele momento ao vê-lo ali e ao saber que foi um lutador incansável ao longo de vários anos para recuperar a sua vida normal.

Telefonou-me hoje a recordar esta data que a minha memória teima em olvidar. Obrigado caro Fernando. Hoje infelizmente não deu para almoçarmos juntos mas fica a promessa de no próximo ano o fazermos, talvez juntando ao grupo dois dos sobreviventes destes dois acidentes, o Luís Graça e o Fernandes.


Oeiras > Livraria-Galeria Municipal Verney / Colecção Neves e Sousa > 19 de Janeiro de 2010 > 4.º Encontro do 2.º Ciclo de Colóquios-debates Fim do Império - Olhares Civis > Os dois antigos camaradas da CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71), caídos numa mina anti-carro, em 13 de Janeiro de 1971, à saída do destacamento e reordenamento de Nhabijões, Sector L1 (Bambadinca), zona leste... (Legenda: Luís Graça)

Foto: © JERO (2010). Direitos reservados

Os factos aqui descritos estão muito melhor documentados e retratados pelo autor do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné no poste P5717* de 28 de Janeiro de 2010 em que homenageia o Fernando Marques.

Hoje apenas tive a intenção de os recordar e mais uma vez fortalecer os laços de amizade e camaradagem que me unem a estes camaradas de infortúnio bem como a muitos outros que combateram numa guerra em que não queriam estar e que hoje se revêm em múltiplos encontros que se desenrolam ao longo do ano por este País fora.

Um grande Bem Haja a todos vós por fazerem parte do meu círculo de CAMARIGOS.
Luís Moreira
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 28 DE JANEIRO DE 2010 > Guiné 63/74 - P5717: Blogpoesia (64): À uma e meia da tarde... Em homenagem ao António Marques, que sobreviveu, dois anos depois, à explosão de um vulcão (Luís Graça)

Vd. último poste da série de 25 DE DEZEMBRO DE 2012 > Guiné 63/74 - P10864: Efemérides (114): 22 de dezembro de 1971, partida para o CTIG do BART 3873, no N/M Niassa (António Bonito)

Guiné 63/74 - P10935: Tabanca Grande (381): Abílio Magro, ex-Fur Mil Amanuense do CSJD/QG/CTIG (1973/74), 600.º tabanqueiro desta tertúlia

1. Mensagem do nosso camarada e novo tertuliano Abílio Magro*, ex-Fur Mil Amanuense (CSJD/QG/CTIG, 1973/74), com data de 9 de Janeiro de 2013:

Camarigo Luís Graça:
Desde já um abraço com muito "ronco" pela tua Tabanca Grande.

Tenho seguido com alguma assiduidade os posts publicados na tua /nossa Tabanca, mas só hoje me dei ao "trabalho" de lá publicar um comentário ao tópico "O cruzeiro das nossas vidas", comentário esse que é mais um post, mas que não sei como publicá-lo como tal.
Acontece que possuo algum material que poderá enriquecer um pouco aquela Tabanca, já que pertenço a uma grande família de "combatentes" pois, de 8 irmãos (6 rapazes e 2 raparigas) todos os "machos" foram dar com os "costados" nos vários TO's (Angola, Moçambique e Guiné), chegando a estar 5 irmãos (todos milicianos) ao mesmo tempo, a cumprir serviço militar, dos quais 4 no Ultramar.

Dos 8 irmãos eu sou o mais novo e regressei da Guiné em Setembro de 1974, com a Guiné já independente e com guerrilheiros do PAIGC a fazerem patrulhas em Bissau, em conjunto com a nossa PM.

Desde 1967 houve, portanto, sempre a presença de, pelo menos, um irmão a "combater" em África, até ao fim da guerra. Muito pouca gente acredita, mas é realmente verdade e passo a explicar:

- O primeiro a embarcar foi o meu irmão Rogério que nasceu em 1944 e esteve em Angola entre 1967 e 1969 como Fur. Milº Atirador de Infantaria.
- O segundo foi o Dálio que nasceu em 1946 e esteve em Moçambique entre 1970/1972 como Alf. Milº de Engenharia.

- Também entre 1970/1972 prestou serviço em Angola o meu irmão Carlos, como cabo especialista da FAP (6 anos de serviço) e que se tinha oferecido como voluntário.

- Ainda entre 1970/1972, prestou serviço na Guiné o meu irmão mais velho Fernando, como Cap. Milº de Artilharia que, tendo nascido em 1936, já tinha prestado serviço militar obrigatório antes da guerra se iniciar em África.

- Ainda na Guiné, prestou serviço como 1º Cabo Enfermeiro o meu irmão Álvaro, que nascido em 1950, tinha mais um ano e meio de idade do que eu.

- Finalmente, eu (Abílio) o caçula, inicio o CSM no RI 5, Caldas da Rainha, em Abril de 1972, encontrando-se, nessa altura, a Companhia Magro assim distribuída:

- Rogério Magro - Na disponibilidade
- Dálio Magro - Moçambique
- Carlos Magro - Angola
- Fernando e Álvaro Magro - Guiné
- Abílio Magro - RI 5, Caldas da Rainha

Entretanto, em Março de 1973, lá fui parar à Guiné onde fui recebido pelo meu irmão Álvaro, pois o Fernando, o mais velho, já tinha regressado à Metrópole.

Penso possuir, portanto, algum "material" de interesse para a tua/nossa Tabanca.

Abraço camarigo
Abílio Magro


2. Nova mensagem, de 10 de Janeiro, de Abílio Magro, desta vez para desfazer uma troca de identidades, sem gravidade, que entretanto tinha sido esclarecida:

Camarada Vinhal
Já providenciei para que aquele "caramelo" do romeiro nunca te responda "ninguém", e te responda:
- És um homem grande, chefe de Tabanca e esquece o Magricelas que anda apanhado da caçoleta por causa da Troika e outros cacimbos do género".  Djubi, mi ca cunhe bem blogue de bó. Mi ca miste pôr bó num pusiçom inferior. Mi segue informaçom dos blogue. Os blogue fala pa mandá dos preferença pros mail do Luis. Mi disculpa esfuriel, tá? 

Por falar em humor, a minha passagem pela Guiné teve vários episódios burlescos que pretendo ir relatando na Tabanca Grande, assim os grã-tabanqueiros o permitam.
Não esperem relatos de grandes feitos, que não os houve, pois a minha prestação, enquanto militar, foi aquilo a que normalmente se chama de "ganda baldas!".
Já estou a tratar da digitalização das fotos do guerreiro e do reformado, que enviarei brevemente, conjuntamente com um pequeno texto sobre os meus primeiros dias de "guerra".

Abraço
Abílio Magro


3. Em mensagem do dia 11, o nosso camarada Magro enviou as fotos da praxe, assim como o primeiro texto para a uma série a começar a ser publicada brevemente: 

Camaradas Luís Graça e Carlos Vinhal
Conforme o solicitado, seguem em anexo 2 fotos.
A primeira foi tirada na Guiné e alguns dar-lhe-ão o título de "O Bravo do Pelotão", e outros o de "O Magro como um cão".
À segunda ficar-lhe-à bem o título de "Um reformado com estilo", digo eu.

Envio também um pequeno texto de início de "hostilidades", ficando ao v/inteiro critério dar-lhe o destino que muito bem entenderem.
Caso achem poder haver algum interesse no relato dos episódios que se seguem, que incluem umas mini-férias na praia fluvial de Cacine, superiormente gerida pela CCaç 3520, numa altura em que havia grande arraial e fogo de artifício na aldeia vizinha (Gadamael), terei todo o gosto em efectuar os respectivos relatos, não prometendo grande qualidade literária, mas apenas alguns salpicos pseudo-humorístcos.

Abraços
Abílio Magro


4. Comentário de CV:

Caro camarada Abílio Magro, bem-aparecido na nossa Tabanca Grande.
Começo por te dizer que não conheço caso idêntico ao da tua família, de ter permanentemente um membro (pelo menos) desde 1967 até 1974, na guerra. Imagino que seria uma casa de sobressalto com uns pais permanentemente em sofrimento.

Por que nada referes, supõe-se que, felizmente, regressaram todos sãos e salvos.

No primeiro poste da tua série a sair em breve voltaremos ao assunto com mais pormenor.

Quanto a ti, sabemos teres sido Fur Mil Amanuense e prestado serviço na Chefia do Serviço de Justiça e Disciplina no Quartel General do CTIG. Felizmente que a tua comissão de serviço foi mais curta pelos motivos que todos sabemos. Embora em termos operacionais não tivesses algum problema, só o estar tão longe da família era já castigo bastante.

Prometo em breve começar a publicar a tua série, mas ficas obrigado a alimentá-la de modo a não ficar a saber a pouco. Se houver por aí umas fotos de Bissau, manda também.

Para que os nossos leitores possam confirmar os teus dotes de informático, aconselho uma visita às tuas páginas Abílio Magro - Genealogia em: www.amagro.net e www.genealmagro.blogspot.pt
A propósito, não queres ser nosso consultor técnico?

Para evitar dúvidas, a tua correspondência deverá ser sempre enviada, por uma questão de segurança, para dois destes três endereços: Luís Graça, sempre, e Carlos Vinhal ou Eduardo Magalhães, à escolha.

Caso não tenhas reparado, és o 600.º elemento da tertúlia, agora escolhe seres o seiscentésimo ou o sexcentésimo.

Com este apontamento de profundos conhecimentos de português (ou resultado de busca na net) deixo-te um abraço em nome da tertúlia e dos editores.

Em nome desta gente toda
Carlos Vinhal
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 9 de Janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10915: O cruzeiro das nossas vidas (18): O meu batismo de voo, em 28 de março de 1973, num DC 6 da FAP (Abílio Magro)

Vd. último poste da série de 13 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10934: Tabanca Grande (380): João Nunes, açoriano, grã-tabanqueiro nº 599, ex-fur mil, CCAÇ 4544 (Cafal Balanta e Bolama, 1973/74)

Guiné 63/74 - P10934: Tabanca Grande (380): João Nunes, açoriano, grã-tabanqueiro nº 599, ex-fur mil, CCAÇ 4544 (Cafal Balanta e Bolama, 1973/74)

1. Mensagem,  de ontem, do nosso novo membro da Tabanca Grande, nº 599, João Nunes, que nos escreve de Angra do Heroísmo (*):

Data: 12 de Janeiro de 2013 à59 16:54
Assunto: foto atual

Camarada Luís Graça,  foi com satisfação que vi publicadas as fotos que lhe enviei, sim são todas de Cafal Balanta.

Na altura em que lá estive, já havia as tabancas feitas pela companhia anterior, a primeira a ocupar esse espaço.

Junto envio a foto identificada com alguns nomes de camaradas que me recordo, pois passaram-se 40 anos, não me lembro de todos. Sei que o cão se chamava "Cigano".

Sim,  esta era a minha secção do 3º grupo de combate,  comandado pelo alferes Moura, natural do Porto.

Claro que aceito ser membro da Tabanca Grande. 


Despeço-me com um grande abraço, sempre ao vosso dispor.
João Nunes
Ex-furriel, CCAÇ 4544,
Cafal Balanta, 1973/74.



Guiné > Região de Tombali > Cafal Balanta > CCAÇ 4544 (Cafal Balanta, 1973/74) > Foto do álbum do João Nunes, de Angra do Heroísmo.  Trata-se da  secção do João Nunes,  3º grupo de combate (que era comandado pelo alf mil Moura, natural do Porto). O João foi capaz de identificar, 40 anos depois, a maioria dos seus camaradas de secção.

 Fotos: © João Nunes (2013). Todos os direitos reservados


2. Comentário de L.G.:

João, obrigado pela tua rápida resposta. Ficas apresentado à Tabanca Grande (**), de que passas a ser o membro nº 599. A seguir ao Carlos Prata e ao António Agreira, és o terceiro representante dos bravos da CCAÇ 4544 que hastearam a bandeira verde-rubra em Cafal Balanta. Fico duplamente feliz pela tua entrada na Tabanca Grande, pelo facto de seres um lídimo representante da liberalíssima e bela Angra do Heroísmo e, ao mesmo tempo, irmão do meu antigo aluno e amigo de longa data, o dr. Jorge Nunes, ilustre médico especialista em saúde pública, autoridade de saúde do concelho das Caldas da Rainha.

João, mandam as nossas regras tabancais que nos tratemos por tu. Aqui somos todos iguais e não há mais alguns mais iguais do que outros. A princípio não dá jeito, a gente estranha, mas depois... a coisa - o tu cá, tu lá - entranha-se. Dá cumprimentos ao mano e conta-nos mais coisas do teu tempo de Cafal Balanta e de Bolama. Foram tempos duros, mas todos fizemos o nosso melhor. Espero que tragas mais camaradas açorianos até ao nosso blogue. LG

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 9 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10917: O nosso livro de visitas (156): João Nunes, Angra do Heroísmo, Ilha Terceira, Açores, ex-fur mil, CCAÇ 4544,/73 (Cafal Balanta e Bolama, 1973/74)

(**) Último poste da série > 9 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10914: Tabanca Grande (379): José Augusto Miranda Ribeiro, ex-Fur Mil da CART 566 (Cabo Verde e Guiné, 1963/65)

Guiné 63/74 - P10933: Os melhores 40 meses da minha vida (Veríssimo Ferreira) (22): 23.º episódio: Memórias avulsas (4): "O nosso Furié"

K3 (Saliquinhedim) > Chegada de uma operação. Em primeiro plano, Veríssimo Ferreira
Foto: Veríssimo Ferreira


1. O nosso camarada Veríssimo Ferreira (ex-Fur Mil, CCAÇ 1422 / BCAÇ 1858, Farim, Mansabá, K3, 1965/67), em mensagem do dia 8 de Janeiro de 2013, enviou-nos mais uma história para publicar na sua série "Os melhores 40 meses da minha vida".


OS MELHORES 40 MESES DA MINHA VIDA (23)

GUINÉ 65/67 - MEMÓRIAS AVULSAS (4)

O NÔSSO FURIÉ

Chegara o correio e recebi uma desagradável notícia e, mesmo sem querer, deixei transparecer o estado d'alma com que ficara.
Repararam os 3 elementos felupes que agora faziam parte da minha Secção, em substituição de igual número de metropolitanos hospitalizados.

Um deles, o 44, nome pelo qual insistia ser chamado, vivia em Farim, numa morança colada à cidade, mas passava a maior parte do tempo no aquartelamento.
Guia e militar dos bons, tinha seis mulheres e pela última dera duas vacas leiteiras e 1.500 pesos.

Cinco trabalhavam nas hortazinhas improvisadas, ali junto ao aeroporto com quem confinavam, e a mais nova tomava conta da criançada.
A exígua produção, quer de hortaliças quer de tomates bem como de laranjas verdes, estava previamente vendida aos comerciantes libaneses da terra e com os magros pesos conseguidos adquiriam panos e alguns pequenos roncos para as crianças, 10 até então.

Eu, fora apresentado à família toda e com o tempo senti o que era ser estimado o que retribui como sabia.

Fátima se chamava a mais nova esposa e era moçoila bem formosa. Lavava a roupa do "nôsso furié" (assim me tratavam) e também a da prole, mas a confecção era do pai, estilista, que tinha uma "Singer" com a qual cosinhava lá no K3, nos momentos vagos, chegando até a fazer-me uma camisa por medida e bivaques, no que era especialista.

Ofereceu-me também um fato d'Homem Grande que uso ainda duas ou três vezes por ano para mostrar que quem manda cá na minha Tabanca sou eu, o que não seria necessário pois que sou "macho" e nem seria preciso "marcar" o terreno, digo eu mas ninguém me liga.

Visitava-os mais ou menos de 15 em 15 dias, embora com um olho no burro e outro no cigano, não fosse o diabo tecê-las, levava-lhes algumas medicinas, doces e guloseimas e em troca mimavam-me obrigando a que aceitasse laranjas, galinhas, ovos e nozes da cola.

Como descrito portanto, a relação entre aquela família e cá o rapaz era psico-socialmente do melhor e tal modo de vida foi mais tarde implementado por todas as tropas em presença.

Ainda sobre o facto das 6 mulheres, deixem que vos diga que chegado à Metrópole, tentei seguir por esse caminho mas a religião única nessa altura, não o permitia, apesar de eu ter o dinheiro e as vacas para a troca. Todavia e porque as não queria a trabalhar para mim e chulice já era uma profissão muito na moda e hoje mais ainda, acabei por ter 5 e não 6, para não faltar à verdade, e até o meu confessor não achou mal porque as não explorava e dizia-me sempre:
-Vai em paz, ajuda-as e fá-las felizes.

E eu "fízeas".

Como ia a dizer... ao verem-me arruvecido diz o 44:
- Furriel está triste... Furriel vai lá à Maria... vai qu'ela hoje espera pelo "minino".

Convém acrescentar que a Maria era uma sua cunhada, boa com'ó milho daquele com que fazem as pipocas, criada de servir numa casa importante e de quem se sabia ser uma daquelas mulheres, como se diz? - não se m'alembra nem interessa.... menos sérias pronto.

O nôsso furrié conhecia o caso, já a tentara mas ela havia respondido:
- "Só si foras tinente".

Como vêm eu distraído não andava, antes pelo contrario, (o mesmo não se pode dizer agora, que nestas questões estou meio zarolho) mas levara c'os "feet".

O meu agradecimento foi:
- O quê pá? Ah ganda malandro qu'até me fizeste esquecer, porque estava melancólico...

E lá fui com passaporte assinado e tudo, apanhar o cacilheiro.

Travesssia do Rio Cacheu em frente a Farim
Foto ©: Carlos Silva (2008). Direitos Reservados

(continua)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 6 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10903: Os melhores 40 meses da minha vida (Veríssimo Ferreira) (21): 22.º episódio: Memórias avulsas (3): The Python Sebae

Guiné 63/74 - P10932: Parabéns a você (522): Maria Ivone Reis, ex-Cap Enf.ª Paraquedista

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 9 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10913: Parabéns a você (521): Manuel Vaz, ex-Alf Mil da CCAÇ 798 (Guiné, 1965/67)