sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10923: Blogpoesia (316): Apat(r)ia... (J.L. Mendes Gomes)

1. Em mensagem do dia 7 de Janeiro de 2013, o nosso camarada J.L. Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil e Catió, 1964/66), enviou-nos este poema para publicação:


APAT(R)IA

Ardem-me os olhos
E amarga-me a boca.
O coração me sangra
Dentro do peito.

Acordo atónito,
No terror deste Portugal de Abril,
Atraiçoado e traído.

Está tudo apático!...
Paralíptico, asséptico, seco e amorfo.
Andam à solta  ladrões nos quintais
Ao pé das galinhas!
Não há caçadeiras!
Nem ladram os cães!...

Só para a caça!...
Ó que desgraça!

O abade ressona!
O regedor esgravata!
Os presidentes, sem guelra,
Andam nas feiras…
Enfiando barretes…
Exibem gravatas
E comem pipocas!

Mas que sujeira de gente de trampa...
Medra nestas paradas desertas,
Sem tropas…
Só mangas de alpaca
E sebo nas botas!...

Apanhem, ao menos,
Os fueiros das vacas !
E escavaquem-lhes os ossos das costas,
Se é qu’inda há costas erguidas de gente,
Com vergonha na cara!...

Choro de dor, vergonha e de raiva,
Neste País de tanta honra e glória
Na história!?...

Ouvindo Hélène Grimaud tocando Chopin
Zehlendorf, 7h41m do dia 7 de Janeiro de 2013
Joaquim Luís M. Mendes Gomes




2. Comentário dos editores:

Joaquim: Fizemos uma brincadeira com o título do teu poema: APATIA... Achamos que ficava bem o R, entre parênteses: APAT(R)IA... Vista de Berlim, a pátria está a sofrer de apatia... Todos o sentimos, mesmo às portas da  capital... Espero que os nossos leitores o entendem como um grito de revolta, patriótico, apesar de irónico,  de um antigo combatente,  um grande palmeirim, que deu o melhor de si nas bolanhas e savanas da Guiné...  (LG)

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 7 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10909: Blogpoesia (315): Em louvor da CART 566 (Bissau, Bissorã, Olossato e Bissorã, jul 64/ out 65) (Viçoso Caetano)

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10922: Memórias de Mário Oliveira, Cabo Condutor de Máquinas da Vedeta de Fiscalização Belatrix (1): O Soldado Desconhecido do Ana Mafalda, 1961

1. Mensagem do nosso camarada Mário Ferreira de Oliveira* (1º Cabo Condutor de Máquinas, na situação de reforma, Vedeta de Fiscalização Bellatrix, 1961/63), com data de 8 de Janeiro de 2013:

Luís Graça e Camaradas da Guiné
Um Bom Ano Novo

Quero começar por agradecer a Honra que me foi concedida de ser admitido como membro de pleno direito da Tabanca Grande. Devo contudo fazer uma pequena afinação na minha ficha de inscrição, eu sou cabo C.M. dos Q.P. na situação de Reforma. Cabo CM significa cabo condutor de máquinas, antigamente éramos fogueiros-motoristas, aqueles gajos que enegrecidos pelo pó do carvão ou o corpo manchado por salpicos de óleo só seriam vistos e o seu labor valorizado, se o convés dos Navios de Guerra fosse de vidro. Conduzíamos enormes caldeiras e outras máquinas e “maquinetas” que propulsionavam os navios e alimentavam de energia todos os sistemas de armas. Apesar de sermos a base do poder técnico-militar dos navios, éramos mal amados pelos “Tétézinhos” que,  de reluzente uniforme branco e unha envernizada, zelavam pela disciplina na Armada.

Isto que acabei de escrever não é História, é pré-história, fui há uns meses visitar uma fragata daquelas obsoletas nas Marinhas da NATO que os nossos aliados nos cedem a troco de uns milhões, e vim de lá “maluco”:  o camarada cabo CM, que teve a gentileza de me mostrar as instalações de máquinas, levou-me no final a uma sala com ar condicionado, repleta de monitores, onde através de câmaras de vídeo e comandos à distancia os CM confortavelmente sentados, conduzem todo o sistema de máquinas.

E lembrei-me então daquela noite em Bissau, atracados à muralha, ia o NRP Sal a caminho de Angola, estava eu de “quarto” ao gerador, o chefe de máquinas, espreitando pela escotilha “caçou-me” sentado no vão da porta da casa das máquinas P.P. a menos de um metro do gerador, bastava-me estender o braço para apalpar o tubo de circulação de água, e só não me deu cinco dias de detenção, segundo me afirmou no dia seguinte, depois de me passar uma valente “piçada”, por eu estar na 1ª classe de comportamento, isto é absolutamente inacreditável, eu não abandonei o gerador, estava apenas sentado junto dele. Mas vamos lá então ao meu relato de hoje.


N/M "Ana Mafalda" (1951-1975)

O Soldado Desconhecido do “Ana Mafalda”

Quando o “Botas” mandou apitar à faina e ordenou “largar cabos” e “avante a toda a força” que Angola é nossa, milhares de rapazes foram arrancados das suas aldeias, e depois de uma carecada, aprenderem a fazer direita volver e apresentar armas, foram enfiados em tudo o que navegava e enviados, parte deles sem saberem sequer a localização geográfica, para Angola, Guiné e Moçambique, defender sonho que se verificou irrealizável do Portugal do Minho a Timor.

Entre o que navegava e foi aproveitado para o transporte de homens e todos o tipo de equipamentos e armas, encontrava-se um navio da Sociedade Geral, o “Ana Mafalda”, pomposamente classificado na época de navio de passageiros, podia na realidade transportar 56 passageiros em três classes, 1ª, 2ª e 3ª e nos porões umas valentes toneladas de carga. Nos porões foram montados beliches e, onde anteriormente se estivavam toros de madeira ou carga a granel, passaram a alojar-se, nas piores condições, soldados (vulgo carne para canhão) e o "Ana Mafalda" passou a ter mais uma classe: a 4ª, transformando-se finalmente em navio de passageiros.

Mas perdoem-me a ironia, naquela viagem para a Guiné foi também um navio “turístico” porque para nós,  marujos, navegar sem fazer “quartos” é turismo, é que o navio transportava também cerca de três dezenas de marinheiros que seriam a primeira guarnição do Comando da Defesa Marítima da Guiné e da primeira Esquadrilha de Lanchas, Bellatrix, Canopus, Denebe e LDP 1 e LDP 2.

Saída a barra do Tejo, apresentou-se-nos um mar calmo mas de ondulação larga que fazia baloiçar o "Ana Mafalda" de BB-EB e de proa a popa, curiosamente não estando mau tempo, é do pior que se fabrica para “maçaricos” que pisem pela primeira vez o convés de um navio a navegar.

Contudo, a maior parte dos soldados portou-se galhardamente, havendo mesmo grupos que jogaram à lerpa de Lisboa a Bissau, enquanto houve uns patacos jogou-se, a coisa só amainou quando os mais hábeis limparam literalmente os bolsos dos “saloios”. Recordo-me até de um dos rapazes ter sido apontado como o gajo que ganhou mais dinheiro.

Aí pelo quarto dia de viagem sem factos a registar, a não ser dois marinheiros dos mais antigos terem ido protestar junto do Comandante de Bandeira, pela má qualidade da alimentação, coisa que de imediato se resolveu, passando as praças da Marinha a comerem do rancho dos Sargentos do Exército, estava uma “gajada” composta de marinheiros e soldados a descascar favas (não estou a reinar, estávamos em Abril, mês das favas) em cima dos pranchões que tapavam a boca do porão, quando por nossa surpresa uns quanto soldados transportavam em braços, conforme podiam, um camarada meio desfalecido que depositaram em cima das cascas das favas.
- Ai, Ai - gemia o desgraçado! Ai que não volto a ver a minha rica mãezinha!

Olho para o gajo e disparo:
- Oh pá tem, lá calma que de enjoo ninguém morre!
- Morre, morre - afirmaram os que o tinham trazido do fundo da 4ª classe para o ar puro do convés, o que tinha sido uma boa ideia - ele há quatro dias que tudo o que come ou bebe vomita.

Acontecia que eu, apesar da minha pouca idade, 24 anos, era já um “velho marinheiro” e sabia que o enjoo é como o medo, todos o sentem, o segredo é aprender a dominá-lo. É que eu aos 24 anos já tinha navegado uns milhares de milhas. Além da comissão a Angola no N.R.P. Sal, no Petroleiro Sam Brás (quem é que se lembra dele) tinha feito sete travessias do Atlântico para as Antilhas Holandesas (Aruba e Curaçao) e contava no meu curriculum com duas viagens das Antilhas a Nova Yorque.

Quanto a enjoo tinha feito o meu “tirocínio” nos melhores navios que para esse efeito existiam: os Destroyeres. Nas manobras que em 1957 se fizeram com uma Esquadra da NATO, que foram interrompidas por causa da Gripe Asiática e do mau tempo, eu tinha sentido a bordo do NRP Dão o que o “Soldado Desconhecido” estava a sentir. Na Armada o enjoo não é doença, e um gajo mesmo que vomite as tripas e metade do fígado tem que fazer os “quartos”. Eu já tinha sofrido de enjoo até às lágrimas, quando se tem de recorrer às ultimas reservas do querer, no limite da resistência moral e física, e num esforço inimaginável fazer o que está superiormente determinado.

Decidi então dar a mão àquele “sacana”, começando por dizer aos camaradas que o reclinassem com as costas apoiadas num saco de favas, e ao gajo eu disse:
- Olha para o horizonte lá longe onde o mar se junta com o céu, não olhes para o mar aqui junto da borda, que te faz andar a cabeça à roda!
- Ai, Ai - continuava o rapaz.

Encosto-me a ele e digo-lhe ao ouvido:
- Tu és homem para guardar um segredo?
- Sou, sim,  senhor marinheiro.
- Olha,  eu sou um homem igual a ti, também enjoo (o que era verdade) mas tenho uma erva que trouxe da Índia (o que era mentira) e quando o mar está bravo e me vejo aflito, tomo um chá e fico logo bom, vou-te fazer um chá dessa erva que te faz passar o enjoo, mas tens de ficar de bico calado, porque já tenho pouca erva.

Feito o acordo, fui à cozinha do navio e pedi um púcaro de chá e umas bolachas ao despenseiro, o soldado bebeu o chá em pequenos goles como lhe recomendei e foi mordiscando as bolachas. Fui dizendo ao gajo:
- Olha que isto não vai passar já, vais ficar melhor pouco a pouco, se apetecer vomitar fazes força e não vomitas, porque o chá não deixa. Dormes cá em cima ao ar puro e vais ver que com o fresco da noite ficas melhor, e amanhã vais almoçar ao pé de mim, e depois voltas a beber outro púcaro de chá, calas é o bico!

Tive o meu “protegido” debaixo de olho até chegarmos a Bissau. O “gajo” recuperou bem. Nunca mais o vi. Que Deus o guarde se ainda for vivo.

Largamos de Lisboa a 27-4-1961 (salvo erro).
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 1 DE DEZEMBRO DE 2012 > Guiné 63/74 - P10746: Tabanca Grande (369): Mário Oliveira, ex- 1º Cabo Condutor de Máquinas (na situação de reforma), Vedeta de Fiscalização Belatrix, 1961/63, grã-tabanqueiro nº 589

Guiné 63/74 - P10921: Blogoterapia (220): Tempo que não foi tempo (António Eduardo Ferreira)

1. Em mensagem do dia 6 de Janeiro de 2013, o nosso camarada António Eduardo Ferreira (ex-1.º Cabo Condutor Auto da CART 3493/BART 3873, MansamboFá Mandinga e Bissau, 1972/74) enviou-nos um texto com o título que se segue:


Tempo que não foi tempo

Sem guerra! Teria sido tempo; de esperança, de amar, de rir, chorar, mas pensar sempre mais além… Aquele foi tempo que não foi tempo… porque a guerra não deixou. Foi o camarada, o amigo, que morreu ali ao nosso lado, o outro a quem a mina que ele próprio acionou, ao explodir, deixou marcas para o resto da vida, as físicas e as outras!… Aquela que tendo sido mãe, não foi esposa, a criança soube que teve pai porque outros lhe disseram. Tempo que não foi tempo!...

Também aquele que um dia regressou, mas que não tivera tido tempo para ver o filho nascer, dar os primeiros passos, aprender a dizer mamã, mas também papá. Ao chegar com uma vontade enorme de o beijar, viu o filho fugir com medo, chorando agarrado à mãe. Consequências de um tempo. Que não foi tempo!... 

Aquela mãe, que um dia viu o filho partir para a guerra e não mais o voltou a ver, a quem a dor e a tristeza jamais deixaram só. Também para essa mãe, o tempo, passou a ser outro tempo.

Guerra!... Palavra triste, que um dia prometi a mim mesmo não mais voltar a pronunciar. Mas o tempo por influência dos homens, tantas vezes obriga-nos a dizer o que não queríamos. De guerra! Todos já ouviram falar… dos que a viveram muitos são os que a desejavam esquecer, mas por mais que se esforcem, jamais o conseguirão. A fome que passaram, a sede que os arrasava, a incerteza que era companheira de todos os dias!… Será hoje, que alguma mina me destruirá? Será hoje, que vou cair na emboscada? Quando será o próximo ataque ao aquartelamento? Será que chegarei a ver o meu filho? Quem serão os feridos que a parelha de helicópteros que nos sobrevoa levará?

Como estará a minha família na Metrópole?

De certezas!… Tínhamos apenas a incerteza! Naquele tempo que não foi tempo…

António Eduardo Ferreira
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 11 DE DEZEMBRO DE 2012 > Guiné 63/74 - P10783: Blogoterapia (219): Reflexão sobre a nossa condição militar (António Melo, camarada da diáspora)

Guiné 63/74 - P10920: Núcleo Museológico Memória de Guiledje (20): Vestígios da passagem de "Os Magriços do Guileje", a CCAÇ 2617 (mar 70/ fev 71), na reconstrução da antiga messe... Quem serão o José Sá e o João Castro ? (Pepito)


Foto nº 5



Foto nº 4

Foto nº 3


Foto nº 1



Foto nº 2


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Vestígios da antiga messe, agora em reconstrução, e que são do tempo da CCAÇ 2617 (Guileje, março de 1970/fevereiro de 1971).

Fotos: © Pepito / AD - Acção para o Desenvolvimento (2013). Todos os direitos reservados. [ Fotos editadas por L.G.].


1. Mensagem de ontem, do nosso amigo Pepito, diretor executivo da AD - Acção para o Desenvolvimento:


Olá Luís

Continuamos com o programa de reconstituição da Memória de Guiledje.

Agora, estamos a "reconstruir" de forma muito adaptada a zona da antiga Messe, onde irá ficar o Centro Interpretativo Ambiental e Cultural. [Fotos nº 1 e 2].

Prevê-se a sua inauguração no dia 29 de Março do corrente ano.

Hoje, ao andar a ver os pormenores da obra, dou com estas inscrições no que julgo ter sido o depósito de água da Messe. Não resisto a mandar-te as fotos [nºs 3, 4 e 5] ,  pois poderá dar muito prazer aos que lá deixaram o nome:  40 anos depois ainda lá estão e continuarão a estar.
um abraço
para todos
pepito


2. Comentário de L.G.:

Obrigado, Pepito. Se ainda estiverem vivos e nos lerem, os nossos Magriços da CCAÇ 2617, João Castro e José Sá vão ter um bom pretexto para sorrirem, ao verem os "vestígios arqueológicos" do aquartelamento do seu tempo e as inscrições, no cimento da messe, com os seus nomes... É um hábito muito antigo que nos vem da Alta Idade Média, altura em que os mestres canteiros deixavam a sua "assinatura" (geralmente simbolos geométricos, antropomórficos) nas pedras...

Recordo que a CCAÇ 2617, Os Magriços do Guileje, passaram por Guileje enter Março de 1970 e Fevereiro de 1971... Cada companhia que por aí passava ia fazendo as melhorias que podia (em termos de instalações para o pessoal e sistema de defesa). Tudo indica que o referido depósito da água que abastecia a messe tivesse sido construído pelos Magriços.

A este companhia pertencia o ex allf miil José Carlos Mendes Ferreira, falecido em 2006,  amigo do Humberto Reis, do Tony Levezinho e de mim próprio (furriéis milicianos da CCAÇ 12). Era natural da Amadora ou vivia na Amadora, desde miúdo. Visitou-nos em Bambadinca, a caminho da região do Gabu para onde foi inicialmente o seu batalhão (BCAÇ 2893) e a sua companhia (CCAÇ 2617). Ainda convivi com ele na Amadora, depois do regresso da Guiné. Era casado e tinha dois gémeos.

Se não erro, o José Crisóstomo Lucas é o primeiro  Magriço (e até agora o único) a integrar a nossa Tabanca Grande. Talvez ele nos possa ajudar a localizar os camaradas José Sá e João Castro (que, tudo indica, terão pertencido à CCAÇ 2617).

Pepito, fico sensibilizado pelo carinho e competência com que tu e a tua equipa vão fazendo surgir dos escombros o antigo quartel de Guileje. Um bom ano para a AD e para os seus projetos. LG

Guiné 63/74 - P10919: Memória dos lugares (204): Os meninos do Xime, do tempo da CART 3494 (1972/73) (José Carlos Mussá Biai)



Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > Xime > CART 3494 / BART 3873 (Xime e Mansambo, 1972/74) > Meninos do Posto Escolar Militar nº 14.... Recorde-se que este batalhão esteve no TO da Guiné entre 28 de dezembro de 1971 (chegada a Bissau) e 3 de abril de 1974 (regresso). A CART 3494 esteve no Xime até abril de 1973, tendo sido depois transferida para Mansambo. E nessa altura a velhinha e cansada CCAÇ 12 passou a ser guarnecer o Xime como unidade de quadrícula.

Foto: © Ricardo Teixeira (2013). Todos os direitos reservados. [Foto editada por L.G.]


Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 81968/70) > População do Cuor (Finete ou Missirá) cambando Rio Geba Estreito. Fopto do álbum do fur mil Lopes, o homem dos reabastecimentos da CCS/BCAÇ 2852.

Foto: © José Carlios Lopes  (2013). Todos os direitos reservados. [Foto editada por L.G.]


1. Mensagem do do nosso amigo José Carlos Mussá Biai:

Data: 9 de Janeiro de 2013 16:15

Assunto: Re: [Luís Graça & Camaradas da Guiné] Guiné 63/74 - P10907: Memória dos lugares (203): Xime, o Posto Escolar Militar nº 14 e os seus meninos, entre eles o José Carlos Mussá Biai, hoje engenheiro florestal a viver e a trabalhar em Portugal (Sousa de Castro) (*)



Meu Caro Luís,
Fico sempre muito emocionado quando vejo fotos da terra que me viu nascer e suas gentes.

As fotos do novo "tabanqueiro" Ricardo Teixeira, não foram exeção, pois levaram-me a reviver a minha infância.

Tempos muito difíceis, pois na minha opinião, as gerras nunca foram e jamais serão fáceis. Mas, apesar da guerra e do sofrimento causado, nós as crianças de então, vivíamos felizes.

Relativamente as fotos, infelizmente, não me encontro em nenhuma delas. Mas é com grande felicidade que vejo o meu irmão mais velho, hoje Juiz, na primeira fila, de camisa branca e alguns amigos da idade dele.
Cumprimentos e um abraço,
José C. Mussá Biai
PS: Muito agradeço o telefonema e como sempre a agradável conversa de segunda feira.


2. Comentário de L.G.:

De facto, já tínhamos falado ao telefone, eu e o  Zé Carlo, a trabalhar no  ex-IGP (Instituto Geográfico Português), agora Direção Geral do Território (, mudam os ministros, mudam as tabuletas dos serviços ministeriais).

Ele já tinha visto a foto do  Ricardo Teixeira e confirmado que não estava no grupo (que era de alunos mais velhos do Posto Escolar Militar do Xime).  Em contrapartida, reconhecia  um seu irmão,  que hoje é juiz em Bissau. É o moço, na primeira fila, à esquerda, de camisa branca. O Zé Carlos, nascido em 1963,  tem hoje 49 anos.

Perguntei-lhe por notícias da sua terra... aonde não vai há 12 anos. Quer levar lá as suas duas filhas, para conhecerem a terra do pai (e julgo que da mãe) mas ele espera por melhores dias...Mora em Odivelas. Naturalmente que ele tem desejo de lá voltar,  ao Xime, mas não quer ser apanhado, com a família portuguesa, no meio de mais um golpe de Estado. Como já aconteceu com amigos dele.

Sobre a família do Xime, diz que está bem. O Xime é que já tem pouco a ver com o do nosso tempo. O cais onde muitos de nós desembarcámos, vindos de Bissau em LDG, já há muito que desapareceu. Como desapareceu o cais flutuante montado pelos alemães, depois da independência. É com mágoa que o Zé Carlos vê o seu belo Rio Geba Estreito fechado à navegação. Dantes, no seu tempo de infância,  navegava-se de Bissau até ao Xime, e daqui até Bafatá. Havia um grande movimento de embarcações nomeadamente até ao porto fluvial de Bambadinca. Xime e Bambadinca eram a grande porta de entrada da zona leste.

Hoje a situação é desoladora: há muito que o Rio Geba Estreito está assoreado, por incúria da administração dos portos. A natureza seguiu o seu curso. E os homens nada fizeram para manter aberta a "autoestrada" fluvial do leste...

O Zé Carlos ficou muito feliz pelo meu telefonema. Já me procurou duas vezes, no meu local de trabalho. E eu já estive com ele uns bons minutos, da primeira vez. Da segunda, eu não estava no gabinete.

Como se vê, pelço seu email, ele continua a  acompanhar  o nosso blogue. Com a saudade e  a paixão de um guineense da diáspora,  e também português, de alma e coração. Um grande abraço para ele e família alargada, em Portugal e na Guiné-Bissau.

Guiné 63/74 - P10918: Parabéns a você (522): Bernardino Parreira, ex-Fur Mil da CCAV 3365 e CCAÇ 16 (Guiné, 1971/73)

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 9 de Janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10913: Parabéns a você (521): Manuel Vaz, ex-Alf Mil da CCAÇ 798 (Guiné, 1965/67)

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10917: O nosso livro de visitas (156): João Nunes, Angra do Heroísmo, Ilha Terceira, Açores, ex-fur mil, CCAÇ 4544,/73 (Cafal Balanta e Bolama, 1973/74)




















Guiné > Região de Tombali > Cafal Balanta > CCAÇ 4544 (Cafal Balanta, 1973/74) > Fotos do áçbum do João Nunes, de Angra do Heroísmo. Sem legendas. Recorde-se que a CCAÇ 4544/73 foi mobilizada pelo RI 15, partiu para o TO da Guiné em 23/9/73 e regressou a 8/9/74. Esteve em Cafal Balanta e em Bolama. Teve dois comandantes:  Cap Inf Carlos Alberto Duarte Prata e  Cap Art José Manuel Salgado Martins. Era uma companhia independente. 

Fotos: © João Nunes (2013). Todos os direitos reservados


1. Mensagem do nosso leitor e camarada João Nunes, enviado em 20712/2012,. para o mail profissional do nosso editor L.G.

Assunto: Guiné

Camarada Luís Graça, fala aqui o ex-furriel João Nunes, da Cçac 4544/73, de Cafal Balanta]. a sul de Cadique, vd. carta de Cacine].

À semelhança do ex-furriel de transmissões António Agreira (`), gostaria que publicasse as seguinte fotografias, que anexo, respeitantes a Cafal Balanta.

Informo que estou de saúde e que resido em Angra do Heroísmo. Ilyha Terceira, Região Autónoma dos Açores.

Contacto > Telem 965272710 / E-mail - j.sousanunes@hotmail.com

Um grande abraço para si e as todos os ex-camaradas de Cafal Balanta.
João Nunes


2. Comentário do editor:

Camarada Nunes: Sê bem aparecido!...



Da tua companhia lá fazem parte do nosso blogue o Carlos Prata (vosso antigo comandante) e o António Agreira, fur mil trms. Também o Manuel Santos Antunes nos procurou através da filha, Catarina., mas ainda não nos mandou as fotos da praxe.

Espero que a tua visita(**) seja também um pedido implícito para integrares esta grande família, que é a nossa Tabanca Grande. Manda-nos uma foto, tua, atual, para os teus camaradas te poderem reconhecer quando passarem pela bela terra, Angra do Heroísmo, a última cidade do Velho Mundo e a primeira cidade do Novo Mundo. Ao entrares no nosso blogue, reforças a presença dos camaradas açorianos, muitos deles dispersos pela diáspora.

Tenho gratas recordações da tua ilha e da tua cidade, onde já passei férias há largos anos. Já agora, completa as legendas das tuas fotos. Vê se te lembras quem são estes camaradas que aparecem contigo (em princípio, é malta da tua secção, não ?)...



Outra coisa: as fotos são todas tiradas em Cafal Balanta ? Havia então estruturas edificadas no teu tempo, contrariamente ao que se passava no tempo do Manuel Maia.


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Notas do editor:

(*) Vd. postes do António Agreira:

15 de Agosto de 2011 > Guiné 63/74 - P8672: O Nosso Livro de Visitas (115): António Agreira (ex-Fur Mil Trms, CCAÇ 4544, Cafal Balanta, 1973/74)

(...) Camaradas, tive conhecimento da existência deste blogue pelo Manuel Moreira da CART 1746. Claro que na primeira oportunidade fiz uma visita!

Foi sem dúvida com alguma emoção que revivi alguns momentos passados em Cafal Balanta. Aproveito desde já para enviar um forte abraço ao Coronel Prata e ao Manuel Antunes, assim como a todos os camaradas da CCAÇ 4544.

Fui incorporado no Exército em Outubro de 1972 e fiz o Curso de Sargentos Milicianos. Fui Furriel de Infantaria com a Especialidade de Transmissões. Depois de passar por Caldas da Rainha, Tavira, Coimbra e Lisboa, em Outubro de 1973 juntei-me à CCAÇ 4544 em Tomar, e em Setembro lá abalamos.

Recordo algumas situações mais complicadas durante a estadia em terras de Cafal Balanta, onde rendemos a CCAÇ 3565. Aproveito para enviar aos camarada da 3365 um forte abraço.

No dia em que nos deixaram entregues a nossa sorte partiram-nos logo o bico, e foi forte! Já mais para o fim da guerra não esqueço que a noticia da Revolta dos Capitães chegou à CCAÇ 4544 através dos meus serviços, às primeiras horas do dia 25 de Abril de 1974. (...)

 23 de Agosto de 2011 > Guiné 63/74 - P8699: Tabanca Grande (299): António Agreira, ex-Fur Mil TRMS da CCAÇ 4544/73 (Cafal, 1973/74)

(...) Então o Manuel Maia esteve em Cafal Balanta.... Os dias que passei em Cafal não teriam sido muito diferentes. Para além das rotinas diárias, surgiam as visitas nada desejadas, que causavam sempre grande confusão. O período de maior agitação foi no NATAL de 1973 com a reconstrução da estrada entre Cadique e Jemberem, mas isso fica para depois.

Em Cafine estava uma força de Fuzileiros Especiais. Nós passávamos por lá uma vez por dia porque o nosso porto estava minado e com tal inoperacional. (...)

2 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8726: Os últimos dias da CCAÇ 4544/73 em Cafal Balanta (António Agreira)

(...) Satisfazendo o pedido do Carlos Vinhal, devo dizer-te que foi uma experiência singular, a entrega de Cafal Balanta. Tudo começou num dia igual a tantos outros, em que um grupo de elementos do PAIGC entrou pacificamente em Cafal Balanta.

Passearam à vontade pelo tabancal e também pela zona militar. Não houve incidentes, para além de uma tentativa de visitar o Posto de Rádio, à qual eu me opus, mantendo o acesso interdito à área das Transmissões, pois ainda não tinha recebido ordem para destruir componentes confidenciais. Esta visita estava a ser acompanhada pelo Segundo Comandante da Companhia. (..:)




(...) Este homens que fazem parte destas fotos eram de Transmissões e Enfermeiros, todos os dias faziam patrulhamentos na mata do Cantanhez, com excepção de dois que eram Operadores Cripto.
Sendo patrulhas de rotina eram sempre motivo de conversa nestas reuniões, que como é evidente não ocorriam todos os dias.

Diariamente se fazia a picagem da estrada ao longo da bolanha até Cafine, mesmo que não ocorresse qualquer ida a Cufar ou Catió, cuja deslocação era sempre feita em barcos semi-rígidos pelo rio Combijã, no mínimo duas embarcações.

Voltando às fotos, o local destes convívios era sempre a tabanca das Transmissões, não era uma tabanca diferente das outras, a única coisa que tinha de diferente era o posto de rádio que se situava num abrigo localizado nas traseiras da tabanca, 7 ou 8 metros de profundidade, diga-se de passagem muito seguro.

Era no posto de rádio que se sabiam as noticias do exterior, e até dos familiares. Era o local que nos ligava ao Mundo e onde organizávamos a nossa defesa quando éramos atacados pelo PAIGC. Era também de lá que apoiávamos os camaradas das outras Companhias, pelo menos nos ataques com armas pesadas, em que utilizávamos o sistema de cruzamento de linhas para detectar as coordenadas dos pontos de saídas do fogo. Estas informações eram enviadas via rádio para: Jemberem, Bedanda, Catió e Bissau (BA 12). (...).


Guiné 63/74 - P10916: Postais ilustrados (19): O menino, Augusto, que fumava cigarros "White Horse" (Beja Santos)



1ª Exposição Colonial Portuguesa, Porto, Palácio de Cristal, 16/6/1934 - 30/9/1934.

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 3 de Janeiro de 2013:



Queridos amigos,

Eis o resultado de andar a vasculhar caixas com bilhetes-postais, uma atração irresistível em lojas de ferro-velho ou velharias de toda a espécie.

O Augusto a fumar não é para ficarmos indignados, à luz das mentalidades dos anos 1930. Ajuda a refletir sobre o tratamento de uma criança-objeto, uma imagem irrecusável que até talvez causasse simpatia, naqueles tempos em que havia crianças contorcionistas em trupes de ciganos, crianças trapezistas no circo ou a chicotear cavalos.

A exposição do Porto, em 1934, teve como uma das principais atrações os guinéus. Eduardo Malta, convém não esquecer, sentiu-se fascinado pelo régulo Mamadu Sissé, um dos incondicionais do capitão Teixeira Pinto, desenhou-o com imensa beleza. Fazia-se filas para ver os Bijagós desnudados, era um desregramento autorizado.
Para que conste.

Um abraço do
Mário


O menino da Guiné que fumava cigarros White Horse

por Beja Santos



Há, por ora, um embaraçante enigma que alguém, mais avisado, poderá contribuir para esclarecer. O postal que se exibe mostra o Augusto da Guiné, estamos em crer que ele veio na comitiva guineense que se apresentou na 1ª Exposição Colonial Portuguesa, que se realizou no Porto, em 1934. Na verdade, o Augusto aparece noutras fotografias, até tem honras de aparecer estampado no livro “O Império de Papel”. E a Tabacaria Trindade fez nome publicando imensos bilhetes-postais, basta ir ao Google. Como os tabacos White Horse também existiram, basta ir ao Google.

E vamos agora à exposição em que participou o Augusto. Diga-se desde logo que foi um invento com estadão e alto significado político. Uma coisa foi a Exposição Industrial de 1932, no que é hoje o Pavilhão Carlos Lopes, por lá acamparam uns régulos Fulas e respetivas famílias em pleno Parque Eduardo VII, foram tratados com uma atração de feira, era uma chamada de atenção para aquela terra de onde vinha amendoim, coconote, algumas madeiras exóticas, ceras e curtumes, convinha sensibilizar os investimentos para a orizicultura e outras potencialidades agrícolas, o Império não era só Angola e Moçambique, espaços largos, de se perderem à vista.

Em 1934, o regime consagrado pela Constituição de 1933 queria dar provas de que o Império era muito mais do que o imaginário, era obra de missionação, havia para ali recursos a explorar para o engrandecimento da Nação. O capitão Henrique Galvão recebeu instruções para que a encenação ultrapassasse tudo o que até agora fora mostrando dos diferentes povos no vasto Império. E ele não se poupou a esforços. 

O problema foi a moral pública, a reclamar daquelas bajudas com maminhas ao léu, aqueles Bijagós despudorados com saias de ráfia, praticamente nus, e de olhar tão inocente. Faziam-se excursões, rezam as notícias publicadas nos jornais da época, para ver aqueles povos bárbaros, as crianças atiravam pedradas, a polícia tinha que agir, o ministro das Colónias, Armindo Monteiro, não gostou das críticas, ordenou ao capitão Henrique Galvão que acabasse com os desmandos, quem desrespeitasse os guinéus ia para a choça.

O Augusto devia ser uma criança muito dócil, os pais até devem ter achado graça ver o menino a fumar, reproduzido em bilhete-postal. Não vale a pena fazer comentários, fica o registo de um tratamento primitivo. Em muitos domínios, a História não dorme.
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Nota de CV:

Guiné 63/74 - P10915: O cruzeiro das nossas vidas (18): O meu batismo de voo, em 28 de março de 1973, num DC 6 da FAP (Abílio Magro)

1. Comentário do nosso leitor e camarada Abílio Magro ao poste P10912 (*):

28MAR1973, Aeroporto de Figo Maduro, Abílio Magro, 21 anos, Fur Mil Amanuense...

Embarco num DC6 da FAP com destino ao TO da Guiné, efectuando o meu baptismo de voo, já que se tratava da minha 1ª viagem de avião.

Calhou-me em sorte um lugar à janela, junto à asa direita da aeronave.
Á minha esquerda senta-se um barbudo e espadaúdo Fuzileiro com aspecto de já ter algumas comissões no "papo".

O DC6 arranca e, à medida que a velocidade aumenta, sinto que tudo aquilo treme e fico com a sensação de que, a qualquer momento, vai saltar um qualquer parafuso ou rebite. Já nem sei se quem treme sou eu, ou a aeronave.

Passada, talvez 1 uma hora, olho pela janela e vejo um dos motores da asa direita a verter óleo às golfadas. Calculo que as minhas feições tenham tomado um aspecto de aflição tal, que o Fuzileiro barbudo sentado a meu lado se apressou a sossegar-me:
- Não se preocupe, tem 2 motores em cada asa e aguenta "x" horas com só 1 em cada lado e, se pararem os quatro, aguenta "y" tempo a planar.

Para quem voava pela 1ª vez, aquela informação "sossegou-me completamente (!!!)".
Acabamos por aterrar na ilha do Sal, onde não saímos do Aeroporto e, depois de feita a manutenção, lá seguimos para Bissau, onde chegamos passadas 4 horas, de farda nº2, com blusão e camisola interior de manga comprida.

Quarta-feira, Janeiro 09, 2013 11:53:00 a.m.
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Nota do editor:

(*) Vd. poste de 8 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10912: O cruzeiro das nossas vidas (17): Relembrando as nossas separações e partidas...

Guiné 63/74 - P10914: Tabanca Grande (379): José Augusto Miranda Ribeiro, ex-Fur Mil da CART 566 (Cabo Verde e Guiné, 1963/65)

1. Mensagem do nosso camarada e novo tertuliano José Augusto Miranda Ribeiro, ex-Fur Mil da CART 566, Cabo Verde (Ilha do Sal) e Guiné (Olossato), 1963/65, enviada ao nosso Blogue no dia 1 de Janeiro de 2013:

Amigo e camarada da Guiné, Luís Graça.

Pertenci a CArt 566, como Furriel miliciano e estive no Olossato cerca de 16 meses, em 1964-1965.

Foi a minha companhia que construiu os primeiros abrigos e, utilizando as velhas e destruídas casas dos comerciantes brancos (libaneses?) fez o aquartelamento do Olossato.

Tenho muitas fotografias do Olossato e também de Bissorã, Bissau e do mato que tirei quando nos deslocávamos em combate.

Não sei se há interesse em enviar mais fotografias. Espero uma resposta.

Um abraço deste amigo que deseja colaborar com a "Tabanca Grande".
JRibeiro


2. Mensagem de resposta enviada, no dia 2, ao nosso camarada Ribeiro:

Caro camarada José Ribeiro:

Muito obrigado pelo contacto e pelas fotos. Estamos, pois claro, interessados nas tuas fotos e eventuais textos de memórias para publicação no nosso Blogue.´

À boa maneira da nossa Tabanca Grande, como também é conhecido o Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, vamo-nos tratar por tu, pois aqui não há distinções de ex-posto militar e idade. Muito menos é para aqui chamado, como forma de diferenciação, as nossas habilitações e o que fazemos ou fizemos.

Posto isto, em nome do nosso editor Luís Graça, queria convidar-te a aderires formalmente à Tabanca Grande, a esta enorme família de quase 600 ex-militares e amigos da Guiné-Bissau. Para tal, queria que me mandasses um foto actual e outra do teu tempo de militar, que nos dissesses o teu antigo posto, especialidade, unidade a que pertenceste, quando foste e vieste para e da Guiné, por onde andaste durante a tua comissão, e tudo o que aches que devemos saber de ti para te conhecermos melhor. Podes contar uma pequena história sobre ti ou sobre a tua Companhia para publicarmos na tua apresentação.
Cumprida esta formalidade estamos aptos a publicar as tuas fotos e as tuas histórias.

És do início da guerra, quando a mesma não seria tão violenta, digo eu, mas quando as carências de instalações mais se faziam sentir. O mesmo é verdadeiro para os itinerários, autênticas armadilhas em cada metro percorrido. Se conheceste a estrada de Mansoa para Farim, imagina que no meu tempo (1972) ficou toda alcatroada. Impensável em 1964/65.

Cumprida a formalidade da apresentação vamos então publicar o teu espólio fotográfico que vai fazer delirar a muita malta que passou pelo Oio, em particular pelo Olossato.

Ficamos à espera das tuas notícias.
Até lá recebe um abraço dos editores.

O teu camarada e novo amigo
Carlos Vinhal

3. Mensagem de José Augusto Ribeiro recebida no nosso Blogue em 5 de Janeiro de 2013:

Caro amigo Carlos Vinhal, camarada da Guiné.
Conforme me solicitaste aqui envio os meus dados identificativos:

Nome: José Augusto Miranda Ribeiro
Naturalidade: Lousã
Residência: Condeixa-a-Nova
Data de Nascimento: 8 de Abril de 1939
Posto: Furriel Miliciano na CART 566
Especialidade: Atirador
Unidade mobilizadora: RAP 2 (Vila Nova de Gaia)

Ida e regresso:

Parti de Lisboa (Cais de Alcântara) a 8 de Outubro de 1963, no pequeno navio "Ana Mafalda", tendo passado pela Guiné a fim de descarregar mantimentos e duas companhias, e carregar outras duas companhias que iam regressar a Portugal.

Seguimos para a Ilha do Sal, em Cabo Verde tendo ali ficado de reforço à Guiné.

De surpresa, a minha companhia embarcou, no velho navio de guerra "Lima", a 25 de Julho de 1964 e passámos duas noites e um dia com chuva e com o mar muito agitado, dormíamos desprotegidos no convés.

Por fim lá chegámos à Guiné. Passámos cerca de um mês em Bissau onde conhecemos a G3 e treinámos com ela numa pequena carreira de tiro. Nessa mesma ocasião embarquei de avião da TAP para Portugal onde passei 28 dias de férias.

Quando voltei a Bissau a CART 566 já estava instalada em Bissorã. Desloquei-me para lá numa pequena avioneta militar, que sobrevoou algumas "casa de mato" para observar e fazer o reconhecimento.

Ali permanecemos, fazendo constantes patrulhamentos e acompanhando as colunas de mantimentos que vinham de Bissau e, depois de descarregar os nossos mantimentos, seguiam para o Olossato onde estava instalado um pelotão da nossa companhia a dar apoio a uma unidade de artilharia com 2 obuses.

Foi em Bissorã que, infelizmente tivemos duas vítimas mortais, quando levantávamos abatizes na estrada de Bissorã - Mansoa. Os seus nomes estão gravados, juntamente com o nome de muitos mortos em combate na nossa Unidade RAP 2, em Vila Nova de Gaia.

Em Dezembro, pouco antes do Natal, a CART 566 foi totalmente para o Olossato. Ali construimos um aquartelamento e os primeiros abrigos. Saímos do Olossato no inicio de Outubro de 1965 e fomos para Bissorã.

A 27 de Outubro embarcámos em Bissau com destino a Lisboa, no navio "Niassa", onde chegámos a 3 de Novembro.

Há muitas histórias para contar, mas isso fica para mais tarde. Apenas queria enviar uma fotografia do "Mamadu" que agora é o Jorge e vive no norte do País. O Jorge quando criança foi recolhido pela 566 e transportado às costa de vários militares.O Sargento Preto foi quem mais apoio lhe deu.
Agora o Jorge já tem cabelos brancos.

Estudou, fez o 5º ano do Liceu, foi protegido por um industrial do norte e tem ido aos nossos encontros anuais.

Para ti, Carlos Vinhal, vai um abraço.
JRibeiro

Olossato > Entrada do quartel

Olossato > Hastear da Bandeira

Olossato > Casa dos Sargentos

Jorge, ou o jovem Mamadu, protegido CART 566, há muitos anos radicado em Portugal

O Sargento-Mor Abílio Preto

Fotos: © José Augusto Ribeiro (2013). Direitos reservados


4. Comentário de CV:

Caro camarada José Ribeiro:

Bem-vindo a esta tertúlia de camaradas ex-combatentes da Guiné.

Ficamos a saber algo de ti e da tua Unidade, que curiosamente fez trânsito em Bissau para deixar pessoal, indo depois para Cabo Verde em missão de soberania para, 9 meses depois, voltar à Guiné a fim de cumprir o tempo que restava de comissão.

Não conhecia esta situação, não sei se houve outras semelhantes. Sei sim de um caso de mudança de agulha para a Guiné em pleno alto-mar. O nosso camarada Rogério Cardoso foi um dos protagonistas.

Vamos então proceder à publicação das tuas fotos relativas ao Olossato, esperando também as tuas memórias escritas que hão-de ser muitas. Já agora, não te confines à Guiné, também gostaríamos de saber como foi a vossa vida, longe da guerra, em Cabo Verde.

Sou portador de um abraço de boas-vindas da tertúlia e dos editores para ti, pelo que fica assim entregue.

Alguma dúvida que queiras desfazer, é só contactar um de nós para o efeito.

O teu camarada e novo amigo
Carlos Vinhal
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Nota de CV:

Vd. poste da série de 7 de Janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10908: Tabanca Grande (378): José Sousa Pinto, ex-Alf Mil de Transmissões do BCAÇ 3863, Teixeira Pinto, 1971/73

Guiné 63/74 - P10913: Parabéns a você (521): Manuel Vaz, ex-Alf Mil da CCAÇ 798 (Guiné, 1965/67)

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 6 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10902: Parabéns a você (520): Paulo Santiago, ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 53 (Guiné, 1970/72)

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10912: O cruzeiro das nossas vidas (17): Relembrando as nossas separações e partidas...

1. A propósito da nova série "Cartas de amor e guerra" (*), está na altura de reler alguns dos postes que publicámos numa série já esquecida,  "O Cruzeiro das nossas vidas".... Só este material dava para fazer uma antologia... Recorde-se aqui os 16  postes já publicados, e os seus autores (um dos quais infelizmente já não está entre os grã-tabanqueiros vivos, mas cuja memória perdurará entre nós: Victor Condeço, 1943-2010):

12 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1271: O cruzeiro das nossas vidas (1): O meu Natal de 1971 a bordo do Niassa (Joaquim Mexia Alves)

(...) No chamado bar de Oficiais havia uma banda de música, composta se não me engano por três indivíduos de idade avançada, pelo menos para mim, o que tornava o ambiente ainda mais surreal. A mesa de pingue-pongue na varanda (não sei o termo náutico, tombadilho?), junto ao bar deixou rapidamente de ter clientes porque, julgo eu, devem ter acabado as bolas no Atlântico ao sabor das ondas.

Lembro-me ainda da excitação do pessoal quando se avistaram peixes voadores, porque tirando a experiência dos mais viajados, para a maior parte era algo que apenas pertencia aos livros de Zoologia. (...) O calor, quando entrámos no Golfo da Guiné, era insuportável, e somado ao barulho constante das máquinas do navio e ao cheiro a vomitado que tomava conta dos corredores, tornou o Natal a bordo algo de inesquecível, dando razão àqueles que, preocupados com o nosso bem estar, nos fizeram embarcar naquela data para a Guiné. (...)





19 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1296: O cruzeiro das nossas vidas (2): A Bem da História: a partida do Uíge (Paulo Raposo / Rui Felício, CCAÇ 2405)

(...) Embora muito me custe contrariar o Paulo Raposo, não ficaria de bem com a minha consciência se não rectificasse a observação que ele faz a meu respeito. A História não se compadece com imprecisões! Há que relatar os factos tal como eles se passaram efectivamente, sob pena de os vindouros tirarem conclusões erradas. E a rectificação é a seguinte: Eu não estava a mandar nenhuma mensagem de telemóvel, pela simples razão de que os radares do Uíge interferiam com a captação de rede do meu aparelho. Estava naquele preciso momento, no camarote onde íamos viajar, a perfurar um telex, outro aparelho muito em voga também naquela época. Fica reposta a verdade! A Bem da História!!!! (...)

21 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1300: O cruzeiro das nossas vidas (3): um submarino por baixo do TT Niassa (Pedro Lauret)

(...) Talvez nem todos saibam que 90% do reabastecimento dos três teatros de operações [ - Angola, Guiné e Moçambique - ] nos 13 anos de guerra foram efectuados por via marítima, mas é verdade!

Talvez também nem todos se tenham apercebido que as áreas oceânicas que os nossos transportes de tropas atravessavam eram contíguas a mares territoriais de países hostis, países que, em muitos casos, tinham saído recentemente de situações coloniais. Países que assumiam protagonismo internacional crescente, que se organizavam a partir de Bandung, no movimento dos não-alinhados. Países que assumiam claramente posições agressivas contra a política ultramarina/colonial de Portugal. Países que faziam ouvir as suas vozes nas posições que as Nações Unidas iam assumindo contra a política do governo do nosso país. (...)

 21 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1301: O cruzeiro das nossas vidas (4): Uíge, a viagem nº 127 (Victor Condeço, CCS/BART 1913)

(...) O material digitalizado que junto em anexo, pode ajudar a ilustrar esses mesmos cruzeiros e o Luís usará como lhe aprouver se neles reconhecer algum interesse. Trata-se da ementa do primeiro jantar de regresso da Guiné a bordo do NM Uíge e do programa de distracções para os cinco dias previstos da viagem, que afinal acabaram por ser seis. Os passageiros eram os militares dos BART 1913 e do BART 1914.

São portanto, recordações desse cruzeiro, iniciado a 26 de Abril de 1967, quando na Rocha do Conde Óbidos embarquei no Uíge com destino à Guiné. 
Já tinha quase vinte meses de tropa, já nem contava de ser mobilizado, mas fui, infelizmente todo o pessoal do meu curso foi contemplado com um destes cruzeiros. (...)


11 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1420: O cruzeiro das nossas vidas (5): A viagem do TT Niassa que em Maio de 1969 levou a CCAÇ 2590/CCAÇ 12 (Manuel Lema Santos)

(...) O TT Niassa, em Maio de 1969 e conforme reza a Ordem de Transporte nº 20 do ME, transportou a CCAÇ 2590 e também as Unidades indicadas no seguinte quadro, com o itinerário e horários que mais abaixo se discriminam. (...) Tratou- se de uma dupla viagem Lisboa–Bissau–Lisboa–Funchal–Bissau–Lisboa. teve início a 5 de Maio, em Lisboa, e terminou, novamente em Lisboa, a 13 de Junho de 1969. (...)- Transportou de Lisboa, na totalidade, 52 oficiais, 187 sargentos e 1299 praças além de 1727 toneladas de carga, depois de corrigidos alguns desvios de última hora à previsão acima feita e conforme a seguinte listagem do quadro abaixo. (...)


 
15 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1953: O cruzeiro das nossas vidas (6): Ou a estória de uma garrafa, com o SPM de Mansoa, que viajou até às Bahamas (Germano Santos)

(...) Já não me recordo muito bem, mas nesse dia de Natal ou no dia a seguir, alguns de nós - talvez uns quatro ou cinco - decidimos carpir as nossas mágoas com alguém que estivesse noutras paragens, e do mar nos quisemos servir como meio de comunicação. Vai daí, lançámos ao mar algumas garrafas com as mais variadas mensagens. A minha era tão só um cartão de visita, no qual acrescentei o SPM do Batalhão ou do local para onde íamos (Mansoa).

O tempo foi passando e a guerra também. E surpresa das surpresas. Em finais de Janeiro de 1972 (um ano e pouco após ter deitado ao mar a garrafa), recebo uma carta proveniente dos Estados Unidos da América, mais concretamente de Milwaukee, datada de 19 de Janeiro desse ano e assinada por uma Senhora de nome Lillian Drake, dando-me conta de ter encontrado a garrafa com o meu cartão. (...)



3 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2025: O cruzeiro das nossas vidas (7): Viagem até Bolama com direito a escalas em Leixões, Mindelo e Praia (Henrique Matos)


(...) Penso que, tal como tantos outros que partiam com a “alma a sangrar” mas em navios cheios de militares, tive sorte com a viagem para a Guiné. Em pleno verão, 10 de Agosto de 1966, com mar chão, saiu de Lisboa o “Rita Maria”, navio misto de carga e passageiros, que nesta viagem levava poucos militares sendo a maioria dos passageiros civis, nomeadamente estudantes, com destino a Cabo Verde. Ainda foi a Leixões só para meter carga, depois Mindelo e Praia com paragens curtas e finalmente Bissau. (...)


13 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2044: O cruzeiro das nossas vidas (8): Porto de Lisboa, Cais de Alcântara (Luís Graça)

(...) Foi daqui que todos partimos (...) . Todos ou quase todos (os das ilhas adjacentes, partiam do Funchal ou de Ponta Delgad). Vocês ainda se lembram ? A Administração do Porto de Lisboa comemora 100 anos. No vídeo (promocional) O Porto de Lisboa há uma escassa referência ao passado. Mas não se pode ignorar ou escamotear os anos de brasa da guerra colonial... Há uma odisseia, há quase um milhão de homens a partir e a chegar. E depois de 1974, há mais meio milhão de homens, mulheres e crianças que retorna de África, com os seus parcos haveres. Por ar e por mar. Uma formidável muralha de contentores irá separar Lisboa e o Tejo, irá cortar o contacto visual dos lisboetas com o seu rio... Passei há tempos por lá... Muita coisa mudou... O edifício, arquitectura do Estado Novo, é o mesmo... As infraestruturas portuárias e toda a envolvente é que mudaram... Hoje é um pomposo terminal de cruzeiros de luxo, por onde passam os maiores navios do mundo, como o Queen Mary II... Sentimentos contraditórios assaltam-nos quando voltamos ao passado.(...)



15 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2050: Cruzeiro das nossas vidas (9): Do Funchal para Bissau no Ana Mafalda (Carlos Vinhal)

(...) Entretanto o tempo foi passando, e no dia de saída para a Guiné, 13 de Abril de 1970, já a bordo do navio “Ana Mafalda”, o sargento Rita veio ter comigo e com o Carneiro para nos dizer que não precisávamos de procurar alojamento a bordo, pois iríamos no camarote deles que tinha quatro beliches.

Ficámos contentes, pois ficaríamos mais bem instalados que os restantes camaradas furriéis. Os camarotes dos oficiais e, dos sargentos do quadro, eram no casario superior do navio enquanto que os furriéis iam nos camarotes do casco, junto à linha de água. Já agora, diga-se que os soldados e cabos iam nos porões, instalados de qualquer maneira. Para piorar a situação, o navio já trazia dos Açores uma Companhia açoriana com o mesmo destino que o nosso, a Guiné. (...)



13 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2533: O cruzeiro das nossas vidas (10): Fui e vim no velho e saudoso Niassa (Manuel Traquina)

(...) O Velho Niassa... Foi este o navio que nos transportou à Guiné, e também de regresso a Portugal. Antes tinha sido um cargueiro, farto de cruzar oceanos, tal como o Uije, o Alfredo da Silva e outros. Foi no inicio da guerra colonial adaptado ao transporte de tropas. (...) Além dos enjoos e das noites mal dormidas a bordo, recordamos também que tinha uma agradável sala de jantar, destinada apenas a oficiais e sargentos. Já do alojamento para os soldados o mesmo não se pode dizer, em todos os cantos do porão tinham sido improvisados dormitórios, as condições eram deploráveis. A comida era razoável, no entanto a sopa, embora fosse a mesma todos os dias, no menu tinha todos os dias um nome diferente... O bar onde se bebia whisky, cerveja e se jogava à lerpa, dispunha de um pequeno conjunto musical que à meia tarde tocava sempre os mesmos trechos musicais, enfim o seu repertório não era muito vasto (...).

21 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3338: O cruzeiro das nossas vidas (11): Viagem para a Guiné em época de Carnaval (Jorge Picado)

(...) Uma vez que o embarque era na segunda-feira de Carnaval, dia 9 de Fevereiro de 1970, tive de abalar para Lisboa no dia anterior onde pernoitei. As despedidas ocorreram no almoço desse domingo em minha casa onde reuni toda a Família mais chegada. Afinal, ainda que não manifestássemos, não sabíamos se voltava-mos a rever-nos.

Chegada a hora e depois de todos fazerem das tripas coração como se costuma dizer, para não haver fracos, meti-me no carro dum tio de minha mulher (que por ironia do destino até fazia parte do colégio que elegia então o Presidente da República... por isso vejam lá com que prazer ele levaria o sobrinho que ia defender aquilo em que ele acreditava!!!), juntamente com o meu sogro e os meus 2 rapazes de 6 e 5 anos (já que o de 2 anos ainda era muito novo) e abalámos para Lisboa. (...)


23 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3345: O cruzeiro das nossas vidas (12): Uíge, 5 de Fevereiro de 1969, destino Guiné (António Varela)

(...) No dia 5 de Fevereiro de 1969, depois das despedidas da família e do desfile militar, fui ainda contemplado pelo Movimento Nacional Feminino com um livrinho sobre a Guiné, uma imagem religiosa e um maço de tabaco (Três Vintes). O cais da Rocha de Conde de Óbidos estava apinhado de gente para o último adeus, emocionado.

O navio que me transportou e ao BART 2865 foi o Uíge, fomos colocados oficiais e sargentos nos camarotes e os soldados no porão. Com o navio todo inclinado para o lado do cais, num último adeus sentido, com muitos lenços brancos a acenarem para os filhos, maridos, irmãos, namorados, que se afastavam agora a caminho do mar largo, com destino à Guiné. (...)


15 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3894: O cruzeiro das nossas vidas (13): S.O.S., fogo a bordo do Carvalho Araújo (Luís F. Moreira)

(...) Dia 25 de Novembro de 1970, cerca das 10.00 horas, tudo a postos para embarcar mais uma carga para a Guiné. Todas as cerimónias habituais, ninguém ligou nada. Portaló colocado ao navio e começaram a entrar os militares que pertenciam às Companhias, em seguida aqueles que iam em rendição individual, (era o meu caso), e quando toda a gente pensava que íamos seguir viagem, começaram a chegar carrinhas militares, mas celulares.

Imediatamente surgiu um boato, constava que tinha havido distúrbios a bordo e que os tropas envolvidos já não iam seguir connosco, mas iriam presos. Passado algum tempo tudo se clarificava, as carrinhas começaram a encostar ao navio e a descarregar os presos que transportavam, eram militares que iam de facto para a Guiné de castigo e com a indicação de serem colocados em locais de maior porrada. (...)


10 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5248: O cruzeiro das nossas vidas (14): Queremos o Uíge (António Dias)

(...) A grande maioria de nós viajou para as Áfricas de barco. Durante 2 anos (menos os 2 meses de férias) ouvi os meus camaradas soldados (a sonhar/dormir) - "QUERO O UÍGE"! Em especial nos destacamentos pois era ali que estava mais perto deles naquelas noites tropicais.

Ainda tenho o folheto da "Última Ceia" no Uíge a caminho da Guiné para os que viajaram em 1.ª classe, gostarei de partilhar com aquele pessoal. (...)

24 de janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5703: O cruzeiro das nossas vidas (15): O dia do embarque (José Marques Ferreira)

(...) E lá entrei no barco, qual carga de gado vivo, que se chamava «Sofala». Como era preciso cumprir as ordens de Salazar (porra, sempre este nome a vir à baila, quando falamos da nossa juventude toda ela passada sob o síndrome da guerra colonial), que dizia «rápido e em força». Nem que fosse preciso tratar as pessoas como meros animais, que entravam num cargueiro sem condições para transportar o que quer que fosse, quanto mais pessoas!!! Ele eram porões e mais porões, num cargueiro enorme, “carregado” de milhares de homens uniformizados militarmente, qual quantidade enorme de carne para canhão, ali metidos, tendo ainda, por baixo desses porões, uma quantidade enorme de outros soldados com viaturas, armamento, máquinas e munições… muitas munições. (...)

29 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6274: O cruzeiro das nossas vidas (16): Uma viagem calma no Carvalho Araújo a caminho da Guiné (António Tavares)

(...) Ao meio-dia de 24.04.70 e após o terceiro apito arrastado, o mais longo dos anteriores, zarpou o “paquete” Carvalho de Araújo, adornado a estibordo, com o BCaç 2912 e alguns tropas individuais a bordo, num total de 500/600 militares.

À medida que o barco se aproximava da barra os choros e gritos lancinantes dos familiares, na Gare Marítima de Alcântara, iam sendo inaudíveis. Fomos almoçar, a comida era razoável… nunca tinha comido tanta marmelada e queijo à sobremesa como naqueles dias... ainda era a doçura do mel… o fel viria dias depois! (...)


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Nota do editor:

(*) Vd. poste de 8 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10910: Cartas de amor e guerra (Manuel Joaquim, ex-fur mil, arm pes inf, CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67) (1): A separação e a partida

Guiné 63/74 - P10911: Do Ninho D'Águia até África (42): O Cifra encontra um inimigo (Tony Borié)

1. Quadragésimo segundo episódio da série "Do Ninho de D'Águia até África", de autoria do nosso camarada Tony Borié (ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66), iniciada no Poste P10177.


DO NINHO D'ÁGUIA ATÉ ÁFRICA (42)


O Cifra, quando da sua instrução básica, num quartel da província, e ainda se chamava Tó d’Agar, no seu último dia de instrução já tinha guia de marcha para se deslocar, ao outro dia, para um quartel nos arredores da capital, mas nessa última noite passada nesse quartel, na formatura do recolher, um militar, primeiro cabo, que já fazia de sargento de dia, pois estava à espera de promoção a furriel, tinha umas divisas parecidas com as de furriel miliciano, mas não era miliciano, era um primeiro cabo, que devia ter assistido a um curso, que lhe daria a promoção ao posto imediato, fez de todos os militares presentes no quartel, nessa formatura de recolher, “gato e sapato”, como se costuma dizer.


Mandava pôr em sentido, chamava pelo número e vinha ver se era a pessoa, pedindo a identificação, enfrentava-a com cara de mau, mas ridícula, pois fazia rir a pessoa com quem falava, depois dava uma volta em seu redor, revistava o cabelo, a barba, a farda, os emblemas limpos, as botas engraxadas e depois passava um raspanete agressivo, mesmo sem motivo.
Isto tudo na parada e numa formatura de recolher, portanto à noite, prolongando-a por mais de uma hora, pois fazia os militares ficarem em sentido, às vezes por cinco minutos. Às tantas, alguns mais atrevidos, começaram a mandar “bocas”, como por exemplo, “queres promoção”, “cabrão”, “lateiro”, “toma lá disto”, “filho da p...”, e mais uns tantos nomes que envergonhavam qualquer um. Falavam de uma ponta da formação, e quando ele corria a ver quem era, logo outro chamava da outra ponta, fazendo rir toda a formatura. O homem queria mandar, tinha mesmo sede de mandar, e com os seus excessos, tornou-se ridículo. Talvez tivesse sido treinado para isso.

O tempo passou, e estando o Cifra sentado no patamar de cimento, em frente ao centro cripto, no aquartelamento de Mansoa, a olhar o horizonte, a pensar na sua aldeia em Portugal, esperando que alguma mensagem viesse do centro de transmissões, ouve um barulho. Levanta os olhos e vê chegar umas tantas viaturas com tropas novas. Levanta-se, fecha a porta do centro cripto e vai ver se vinha alguém da sua zona em Portugal, dando de repente de caras com o tal primeiro cabo, que só era mesmo primeiro cabo.

Primeiro, olhou bem, sim era ele, pois usava óculos graduados, depois fez tal e qual como ele lhe fez na parada do tal quartel na província em Portugal, deu uma volta em seu redor, e depois certificando-se que era a mesma pessoa, e vendo as divisas de, só, primeiro cabo, disse-lhe, tirando o cigarro três vintes da boca:
- O que é que passou? Eras comandante.

O homem, não perdendo a compostura, encara o Cifra, e pergunta:
- De que é que o nosso cabo, está a falar?
- Olha, de uma noite miserável que me fizeste passar num quartel da província, em Portugal.

Ele, então baixa um pouco os olhos, e diz:
- Eu sei, não és só tu que me tem dito isso, fui treinado e instruído para isso, e essa noite era uma das provas da minha promoção, não fui muito feliz e castigaram-me, não me promoveram, e tenho sorte em ser primeiro cabo, porque depois disso já fui castigado outra vez, por assuntos que não gosto de lembrar. Agora estou aqui, com estas divisas, e tenho que provar mais alguma coisa. Olha, por favor ajuda-me, onde posso beber água? Isto aqui é difícil? Onde é que vamos dormir?

O Cifra não sabia onde é que iam dormir, mas guiou-o o melhor que pôde, e também lhe disse que não tinha que provar nada, tinha mas era que tentar sobreviver e deu-lhe todo o apoio que era possível durante o tempo em que esteve em Mansoa. Também lhe explicou que às vezes, depois da hora do recolher, os guerrilheiros costumavam dar tiros e atacar o aquartelamento com granadas de morteiro, e que nessa altura estávamos todos unidos para nos proteger, pelo que não havia recolher nenhum. Desejou-lhe a maior sorte do mundo, pois foi para uma zona de combate, como tantos outros.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 5 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10900: Do Ninho D'Águia até África (41): Outra vez, a menina Teresa (Tony Borié)