segunda-feira, 11 de junho de 2007

Guiné 63/74 - P1835: Tabanca Grande (11): Germano Santos, ex-1º Cabo Op Cripto, CCAÇ 3305 / BCAÇ 3832, Mansoa, 1971/73

T/T Carvalho Araújo > 19 de Dezembro de 1970 > CCAÇ 3305 / BCAÇ 3832 > 1º Cabo Operador Cripto Germano Santos, no dia de embarque para a Guiné.


Guiné > Região de Bissau > Cumeré > CCAÇ 3305 / BCAÇ 3832 > Finais de 1970 > 1º Cabo Operador Cripto Germano Santos, junto a um heli, no dia em que o General Spínola visitou o batalhão, antes de este ser colovado em Mansoa.

Fotos: © Germano Santos (2007). Direitos reservados.

Caro Camarada Luís Graça,

Conforme combinado aqui vai um ficheiro com 3 fotos minhas, uma actual e duas relativas à Guiné.

Uma delas foi tirada no embarque a bordo do navio Carvalho Araújo, no dia 19 de Dezembro de 1970. A outra é do Cumeré, nos primeiros dias após a chegada à Guiné, e na sequência da visita do Spínola ao batalhão.

Brevemente contactar-te-ei de novo para contar um ou outro episódio passado na Guiné e ainda para te descrever a minha visita à Guiné em 1998.


Um abraço.
Germano Santos


2. Comentário de L.G.:

Germano: Já te dei há dias as boas vindas. Obrigado pelas fotos. Aguardo as tuas impressões da Guiné, de 1970/73 e, depois, em 1998. Diz-me só uma coisa: tiveste mais de 24 meses de comissão ? Quando regressaste a casa ? Foi em 1972 ou 1973 ? O teu batalhão estava sediado em Mansoa... E a tua companhia ? E, já agora, onde vives actualmente ? Um abraço. Luís

3. Informações complementares do Germano:


Caro Luís: (...) Quanto às perguntas que me fazes, aqui vão as respostas:

Embarcámos em Lisboa, no dia 19 de Dezembro de 1970. Chegámos a Bissau a 29 do mesmo mês e fomos directamente para o Centro de Instrução do Cumeré (a seguir a Nhacra).

Embarcámos em Bissau a 6 de Janeiro de 1973 e chegámos a Lisboa a 12 do mesmo mês. Regressámos no Uíge.

Estivemos, pois, na Guiné, cerca de 24 meses e meio.

O meu Batalhão de Caçadores 3832 esteve sediado durante todo o tempo em Mansoa. A minha Companhia, a CCAÇ 3305, tinha uma parte em Mansoa, outra em Braia e outra em Infandre. Tenho ideia que, nos primeiros tempos, também tivemos elementos em Cutia. [vd. carta de Mambonco].

Sou natural de Moscavide (Concelho de Loures) e moro actualmente na Bobadela, do mesmo Concelho.
_________

Nota de L.G.:

(1) Vd. post de 4 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1814: Tabanca Grande (8): Apresenta-se o Operador Cripto, CCAÇ 3305 / BCAÇ 3832 (Mansoa, 1970/73) , Germano Santos

(...) "Fui Operador Cripto do Batalhão de Caçadores 3832 que operou, sediado em Mansoa, nas regiões de Cutia, Infandre, Braia, Porto Gole, Bissá, Jugudul, Uaque, Bindouro e Rossum.

"Tive oportunidade de regressar à Guiné em 1998, e rever Mansoa e Jugudul. Deu ainda para dar um salto a Bissorã, João Landim, Quinhamel e ao Arquipélago de Bijagós, designadamente a Ilha das Galinhas, antiga rota dos escravos, sem esquecer Bissau" (...).

Guiné 63/74 - P1834: O Capitão de Op Esp Bordalo Xavier, da CCAÇ 12 (Bambadinca, 1971/73) (Joaquim Mexia Alves)


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Destacamento do Mato Cão > Pel Caç Nat 52 > 1973 > O Alf Mil Joaquim Mexia Alves, pousando com um babuíno (macaco-cão) mais o Braima Candé (em primeiro plano), tendo na segunda fila, de pé, o seu impedido, o Mamadu, ladeado pelo Manga Turé. O Pel Caç Nat 52 terá ido para este destacamento em finais de 1972. Antes esteve no destacamento do Rio Udunduma. O Mexia Alves esteve lá até meados de 1973, altura em que foi para Mansoa, para a CCAÇ 15. Foi nesta época que privou com o pessoal da CCAÇ 12 e com o Cap Bordalo Xavier.

1. Mensagem do Joaquim Mexia Alves (1):

Caro Luis Graça

Li com atenção o último post sobre o encontro da CCAÇ 12 (2) e, se tivesse sabido antes(3), tinha lá dado um salto.

A sala de que fala o Vitor Alves, frequentei-a muitas vezes, aliás, para mim era a sala que eu frequentava nas minhas visitas a Bambadinca.

O Cap Bordalo Xavier, meu particularissimo amigo, é e foi na Guiné um homem de extraordinárias relações humanas, para além de um fantástico operacional, que conseguiu uma união notável com todo o pessoal, não só da CCAÇ 12 mas de outras unidades, como o meu 52.

Reside em Lamego, é Major, obviamente na reserva, e é a alma da Associação de Operações Especiais. Infelizmente há muito que não contacto com ele, mas quero fazê-lo brevemente.

Retenho na memória, há uns anos em Monte Real, eu estava ao fim da tarde a jogar ténis no campo à frente do Hotel das Termas e vejo para um carro e dele sair uma pessoa que me pareceu o Cap Bordalo.

Achei que não podia ser, mas roído pela curiosidade pedi desculpa ao meu parceiro e fui perguntar ao porteiro do Hotel quem era a pessoa que tinha chegado. A resposta deu como certa a minha suposição. Não o via desde a Guiné.

Imediatamente pedi ao porteiro que ligasse para o quarto e pedisse ao capitão para vir à rcepção por um motivo qualquer. Quando nos vimos, literalmente num abraço como que lhe peguei ao colo, (o Cap Bordalo Xavier é bem mais baixo do que eu, o que não é de espantar), e ficámos ali não sei quanto tempo abraçados.

O hall do Hotel estava cheio de gente que ficou muito espantada de me ver assim abraçado a um homem de barbas.

Foi dos encontros mais emocionantes da minha vida!!!

As histórias que tenho com ele e com a CCAÇ 12 nesse tempo....


Guiné > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bolama > Bolama > CART 3492 > 1972 > "No jeep. Da frente para trás: Alf Canas, Alf Novais, Alf Lima (Secretaria?), Alf Rodrigues (meu camarada de curso, também que era da CCS e veio depois para o Xitole, por troca com o Alf Gonçalves Dias se não me engano), Alf Martins (CART 3493, Mansambo) e eu" (4).

Foto e legenda: © Joaquim Mexia Alves (2006). Direitos reservados.

Outro assunto. Penso, a não ser que tenha havido dois Alf Mecânicos com o mesmo nome, seguidos em Bambadinca, que o Canas a que se refere o Vitor Alves era do BART 3873 e não do Batalhão que ele refere [, o BART 2917].

Se assim for, nalgumas fotografias que te enviei e publicaste, mormente em Bolama, ele está presente.

Estou a preparar um novo texto mas o tempo falta-me!!!

Abraço forte e amigo do
Joaquim Mexia Alves
_________

Notas de L.G.:

(1) Ex- Alf Mil Op Esp Joaquim Mexia Alves esteve na Guin, entre Dezembro de 1971 e e Dezembro de 1973, tendo pertencido à CART 3492 (Xitole), ao Pel Caç Nat 52 (Mato Cão / Rio Udunduma) e à CCAÇ 15 (Mansoa). Nunca esteve sedeado em Bambadinca, mas sim no Rio Udunduma e no Mato Cão, destacamentos do Sector L1 (Bambadinca). Ia de vez em quando à sede do Batalhão (BART 3873, 1972/74), a que estava adida a CCAÇ 12, do Cap Xavier Bordalo.

(2) Vd. post de 11 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1832: Convívios (15): CCAÇ 12 (Bambadinca, 1971-73), 2 de Junho de 2007, Azeitão: o 34º encontro anual (Victor Alves)

(3) Vd. post de 29 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1791: Convívios (11): 32º encontro da CAÇ 12 (Bambadinca, 1971/73)

(4) Referências à CCAÇ 12 e ao Mexia Alves:

13 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P958: 'Gajos das tropas africanas eram doidos' (Joaquim Mexia Alves, CART 3492, Pel Caç Nat 52 e CCAÇ 15)

(...) "Quando estava no Pel Caç Nat 52, junto a Bambadinca, tinha uma forte ligação à CCAÇ 12, não só operacional mas de amizade com todos eles, especialmente o Capitão Bordalo e os seus Alferes, de que infelizmente neste momento não me lembro do nome de nenhum.

"Para além das operações e outras actividades que íamos fazendo, sobrava-nos tempo para algumas loucuras, resultantes de algum cacimbo e do cansaço provocado pelo stress permanente, e por alguma incompetência, de quem deveria ser competente.

"Entre algumas de que lembro, fomos uma vez à noite, o Capitão Bordalo Xavier, os seus Alferes e eu, armados até aos dentes, de Unimog jantar ao Xime, pela estrada de todos conhecida e que naquela altura só se fazia em coluna protegida, mercê das emboscadas que nela tinham acontecido.

"Quando regressávamos, num alarde a roçar a loucura, talvez também ajudados por uns uísques, parávamos na estrada, no sítio das emboscadas, e voltados para a mata, aliviámos as bexigas.

"Foi um momento hilariante, mas muito intenso, que nos uniu ainda mais na amizade e companheirismo" (...).


17 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P966: O Mexia Alves que eu conheci em Bambadinca (António Duarte, CCAÇ 12, 1973)

(5) Vd. post de 30 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1473: O álbum das glórias (6): A 'dolce vita' de Bolama (Joaquim Mexia Alves, CART 3492)

Guiné 63/74 - P1833: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (49): Cartas de além-mar em África para aquém-mar em Portugal (4)

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > 1969 > Espectacular vista aérea do Geba Estreito entre o Xime e Bafatá > Na época, havia um serviço de cabotagem entre Bissau e Bafatá, embora precisasse de segurança militar próxima, no troço Xime-Bambadinca, e nomeadamente na zona do Mato Cão. Este troço era um pesadelo para as embarcações civis. Durante largos meses, o Pel Caç Nat 52 assegurava o patrulhamento, quase diário, desta zona. Será depois substituído pela CCAÇ 2590/CCAÇ 12, colocada em Bambadinca nos finais de Julho de 1969.

Em carta enviada à noiva, Cristina Allen, o comandante do Pel Caç Nat 52, Mário Beja Santos, escreve: Resisto, mas ando de rastos, não sei como hei-de pôr ordem nesta existência automatizada a ir vigiar barcos junto ao Geba ou estar dentro de água à noite à espera do inimigo que não vem atacar-me junto de Missirá. Desde que nos retiraram mais 10 milícias sem quaisquer contrapartidas fazemos das tripas coração. Chego a ir a Mato de Cão com 18 homens. (LG)

Foto do arquivo de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71)

Foto: © Humberto Reis (2006). Direitos reservados.


49ª Parte da série Operação Macaréu à Vista, da autoria de Beja Santos (ex-alf mil, comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) (1). Texto enviado a 17 de Maio de 2007.

Cartas de um militar de além-mar em África para aquém em Portugal (4)
por Beja Santos (1)

Para Paulo Ribeiro Semedo, no Hospital Militar Principal >

Paulo, querido amigo,

Recebo notícias tuas pela Cristina e pela minha irmã, que te dedicam particular estima. É por elas que soube que a operação aos teus olhos correu bem mas continuas a falar pouco. Em nome de todos os teus amigos de Missirá, peço-te o favor de não adiares por mais tempo os teus deveres de amizade, ao menos escreve ao Domingos e ao Uamsambo, que nunca mais esqueceram o bravo 40.

Por aqui, o quartel está muito bonito, mas temos muitos militares doentes na época das chuvas e com a canseira das idas diárias a Mato de Cão e emboscadas nocturnas. Ussumane Baldé e Gibrilo Embaló, teus camaradas de cubata, querem que te diga que o primeiro abrigo foi deitado abaixo e, se houver flagelação, será mais fácil reagir ao fogo nesta construção mais segura.

Espero poder no próximo mês de Julho mandar-te o gira-discos por um Cabo da CCS de Bambadinca que vai de férias, a minha mãe tratará do conserto para que rapidamente possas matar saudades das tuas mornas e coladeras. Os teus amigos querem que te mande mais um disco do Bom Assim, bem como o teu álbum de discos. A situação militar do nosso sector está a piorar, no Xitole/Saltinho há muitas flagelações, as tabancas de Mansambo estão a ser flageladas, o mesmo se passa entre Xime e Amedalai.

Encontrei há dias em Bambadinca o Zé Pereira que trabalha no Xime, ele manda-te um grande abraço, está roído de saudades de Missirá. O teu amigo, o Furriel Casanova, bem como o Mamadu Camará andam doentes, o primeiro com uma grande tristeza, o segundo anda cheio de paludismo.

Peço-te que não me deixes sem notícias tuas, quem me escreve e fala de ti é o Jolá Indjai, que continua aí, nas doenças infecto-contagiosas. Continuo sem perceber porque é que não somos atacados em Mato de Cão, embora seja muito difícil emboscar-nos pois percorremos sempre caminhos diferentes. Mas há dias, entre Gambaná e Mato de Cão os nossos vizinhos de Madina puseram uma mina anti-carro num pontão, devem-nos ter avistado ao longe, tentaram fazer saltar a mina, mas nada aconteceu.

Dentro de dias vou a Bissau, por causa do julgamento do Ieró Djaló, que adormeceu na operação que fizemos a Madina e em que o Fodé Dahaba ficou muito ferido, quando acordou o prisioneiro tinha fugido. Espero então trazer um gerador para Missirá, e acabarmos então com o tormento de acendermos os petromaxes debaixo de chuva. Aceita um grande abraço deste amigo que só te quer bem e com muito mais saúde.

Para o Carlos Sampaio > Inesquecível amigo,

Os teus livros chegaram e já os devorei. A leitura, tal como a oração, é um refúgio e um bálsamo para a alma. Ando sempre com livros embrulhados em plástico, na tentativa vã de eles resistirem às chuvas ou aos campos alagados dos arrozais. Às vezes, quando estamos a esperar os barcos que passam pelo Geba, não resisto a ler umas páginas seja de autores clássicos seja dos poetas da nossa geração, como o Gastão Cruz ou a Fiama.

Um dos quartéis de que sou responsável, e que ficou praticamente destruído em Março passado, está já de pé, foi um esforço enorme desde o final de Março até ao fim de Maio, sem dias de descanso mas foi muito bonito ver civis e militares aceitar este sacrifício para não ficarmos na época das chuvas em condições ainda mais deploráveis.

Carlos, ajuda-me com o teu conselho já que podes conversar aí com a Cristina, embora eu saiba que estás muito tomado com o preparativo desse batalhão com que vais para Moçambique. A Cristina insiste em vir para Bissau e dar aulas, até eu me poder juntar. Acontece que ninguém fala na minha transferência, antigamente um militar passava cerca de 12 meses em teatro de operações, consta que doravante não vai ser assim, podemos andar a comissão toda em locais de muito risco. Não me sinto no direito de a deixar num estado grande de ansiedade e inclusivamente ficar sozinha até meados do ano que vem.

Como tu irás certamente experimentar, a guerra é por natureza absorvente: com os militares só falas de guerra, tens que estar permanentemente atento se há comida bem feita na messe ou falta arroz à população civil, levar as crianças e os doentes à consulta médica, há que conversar e estar atento aos problemas das autoridades civis, há que cuidar da segurança do quartel, é um estado de espírito dominado pelo serviço aos outros. Não vejo, pois, circunstância de apoiar este projecto da vinda para Bissau. Prometi à Cristina ir a Bafatá tratar dos documentos na conservatória, mas peço do coração que me ajudes a ver melhor todo este quadro, e diz-me com sinceridade se a minha inquietação tem fundamento.

Não ando bem de saúde, tenho a tensão baixa, ando cheio de líquen, micoses, durmo mal, precisava de uns dias de repouso, não chega tomar tónicos ou vitamina C. Os quartéis à minha volta estão a sofrer muito com os ataques dos rebeldes. Estes, descobriram uma nova modalidade de atacar os barcos militares e civis que circulam no Geba, já não os atacam em Mato de Cão, põem-se num extremo acima de uma povoação chamada Xime de onde disparam os seus rockets, semeando o pânico.

A guerra aqui agrava-se muito e confundo-me os ataques que os rebeldes fazem às populações em autodefesa. Hoje não te maço mais, agradeço toda a tua ajuda, é para mim impensável viver sem a tua grande amizade. Deus te ajude na tua comissão que vai começar em breve.


Para Cremilde Tapia, em S. Miguel

Querida Bibi:

Peço-lhe desculpa por andar a escrever tão pouco, o estado de saúde não é dos melhores. Todos os dias penso em si, quando mexo no crucifixo que me ofereceu antes de partir para Lisboa. Já não vale a pena limpá-lo, a prata não resiste a estes 40 graus em que diariamente ando daqui para ali, no mínimo 25 quilómetros. Louvo a este crucifixo que me tem preservado a vida, dando-me ânimo para suportar todas estas contrariedades.

Diz-me na sua carta que me espera ver em Lisboa. Infelizmente, só nos veremos para o ano já que fui punido e tenho pouca esperança em que os meus argumentos sejam considerados e o castigo retirado. A guerra aqui entrou numa nova fase, os rebeldes estão muito activos, atacam constantemente os aquartelamentos e os povoados na outra margem do Geba. Sei praticamente de tudo porque oiço os rebentamentos aqui, a qualquer hora do fim da tarde e até de madrugada. É horrível nada poder fazer, ficamos angustiados com o sofrimento dos outros mas impotentes.

Ainda a noite passada vi as colunas de fumo subirem para o céu, pensámos logo na perda de vidas e na destruição que tais flagelações provocam. Não entendo muito bem como é que depois estes militares, os meus superiores, se indispõem uns contra os outros, castigam-se, desprezam-se, e certamente esquecem que nós estamos a ver e não ficamos lá muito moralizados.

Diz-me também na sua carta que me quer enviar livros e pergunta-me o que eu gostaria de ler. Lembro-lhe que me ofereceu O Senhor, de Romano Guardini que ardeu em Março passado. Teria muito gosto de ter esta grande companhia, se não estiver a abusar do seu dinheiro. Há vários livros da Moraes Editora que também me tentam e que têm a ver com o pensamento pós-conciliar. Estou totalmente aberto à sua generosidade. Hoje e amanhã vou escrever à Maria e ao Marino, na rua de Santa Clara 2, e ao Padre Agostinho. Receba toda a ternura deste seu amigo que só lhe deve generosidade e que lembra sempre o bem que lhe fez aí em S. Miguel.

Para o Ruy Cinatti > Ruy, Dear Father:

Não começo com ciúmes com o Teixeira da Mota só porque ele escreve torrentes de cartas. Ele é assim, não há competições, cada amizade tem o seu lugar. Obrigado pelas suas observações, criticando o excesso de palavreado em que ando autocentrado. Comoveu-me a sua resposta para contrariar a minha enxúdia culta ou pseudo-culta, enviando-me alguns dos seus poemas, de uma secura à chinesa, carregadinhos de força. Por exemplo,

Ao nascer, iguais
Dizem à ... e ao morrer
Devido a quais
os casos angélicos?


De um poema seu:

Donde sei
para onde
não se sabe
sou retirante.

O resto
irá por carta
ou por telefone

Que outros relatem
o meu cansaço
Eu anuncio
o poder da morte
lembrando tudo o que
me prende à vida

Viver a pedir,
receber, porquanto
quem recebe deve.
- estranha condição

Eu nunca pedi.
Devo solidão.


Sinceramente, agradeço-lhe ter posto em tão bela poesia pedaços dos meus sentimentos que vazo nos meus escritos. Li mais um dos livros que me mandou, Sábado à Noite e Domingo de Manhã, por Alan Sillitoe. Sei muito bem que V. gosta muito da literatura britânica mas não o sabia aficcionado pela cultura operária do pós-guerra. Este herói-menino, Arthur Seaton, é bem um paradigma de uma geração que rompe com os valores da solidariedade estreitada pela guerra. Bebe, goza o dia sem consequências para amanhã. Corteja as mulheres dos outros e diverte-se, com a agravante de parecer simpático com os maridos. Por fim, cede ao desgaste de um vida conduzida a extremos e aceita novos vínculos familiares como se tivesse ido buscado, ele que é pescador nos tempos livres. A tradução parece-me primorosa.

Logo que possa vou pegar nos poetas franceses que me mandou. Desculpe ser breve mas ainda não me recompus da minha baixa tensão. Estamos cade vez menos a poder saír para os patrulhamentos ou para as emboscadas, o transporte de comida e materiais é um suplício com as estradas encharcadas e as bolanhas na sua plenitude. Estou cada vez mais descrente de poder ir a Lisboa, este ano. Obrigado por todo o estímulo que me dá, pela oferta da sua bela poesia que eu gostaria um dia de poder imitar. Um grande abraço do gadulha para o Dear Father.


Para a Cristina Allen > Meu adorado amor:


Resisto, mas ando de rastos, não sei como hei-de pôr ordem nesta existência automatizada a ir vigiar barcos junto ao Geba ou estar dentro de água à noite à espera do inimigo que não vem atacar-me junto de Missirá. Desde que nos retiraram mais 10 milícias sem quaisquer contrapartidas fazemos das tripas coração. Chego a ir a Mato de Cão com 18 homens. Não querendo deixar-te mais intranquila, isto parece um convite a uma desgraça se houve uma emboscada bem montada. Há dias senti-me tão indignado que fui falar ao Pimbas, chegando mesmo a pedir-lhe para me tirar daqui. Ele procurou tranquilizar-me dizendo-me que está uma companhia de tropa africana a ser formada em Contuboel e que em breve vou ser aliviado nas idas a Mato de Cão.

Espero que tenhas ido visitar a D. Maria Alzira, ela dá-nos excelente companhia na messe, faz petiscos e introduz uma nota de urbanidade com conversas que nos fazem esquecer o palavrório da guerra. Espero ir em breve a Bafatá tratar da documentação, embora não resista a dizer-te que estou muito indeciso quanto à bondade desta tua vinda como professora em Bissau, ignorando eu o meu futuro em teatro de operações. Vamos pensar bem.

Ando exausto, Cristina. O Casanova não me pode ajudar como me ajudava, está presentemente a descansar uns dias em Bambadinca, anda muito acabrunhado, quem me ajuda mais agora é o Pires, eu vou a Mato de Cão e ele coordena a emboscada ou vice-versa. A minha concentração diminuiu, defendo-me ouvindo música ou com leituras aligeiradas. Li um livro de uma nova geração de escritores britânicos que me impressionou muito, Sábado a Noite e Domingo de Manhã, por Alan Sillitoe. Já vira o filme realizado por Karel Reisz em que o Albert Finney era o protagonista. Grandioso filme mas não menos vigoroso romance sobre o actual operariado inglês.

O que leio é mais distractivo, menos comprometedor. Ando agarrado aos romances de Mickey Spillane e ao seu detective que actua como justiceiro solitário, Mike Hammer. Desta vez, em A Minha Arma Não Perdoa, o Mike procura ajudar uma prostituta desvalida e enfrenta um tenebroso gang de tráfico de carne humana. Spillane escreve primorosamente, não percebo como é que tratam literatura policial como um produto de fancaria quando há investimentos estéticos mesmo com recurso a linguagem tão violenta do género "Finquei-lhe 4 dedos duros na gorja e, com a outra mão, atirei-lhe uma lambada que o deixou marcado na boca por algum tempo". Spillane é um produto típico desta guerra fria e conhece todos os artifícios de exaltar a América e os seus heróis, desbobinando um anticomunismo sem rival. Compro estes livros da Colecção Vamipro numa livraria em Bafatá, é uma boa companhia neste período de imenso cansaço que não sei iludir.

Sei que o Carlos Sampaio te vai contactar e peço-te o favor de conversares com ele sobre a hipótese de vires. A todo o transe quero evitar mais sofrimento, mais ânsias, mais intranquilidade. O nosso correio espelha um devotado amor, entre a guerra e a paz. Lutamos por chegar à paz, não demos mais circunstâncias às guerras dentro da guerra. Obrigado por tudo quanto fazes por mim, quanto fazes por quem ficou tão ferido aqui no Cuor. Beijos, e tantas, tantas saudades!

________

Nota de L.G.:

(1) Vd. último post desta série > 1 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1806: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (48): Junho de 1969: Missirá em estado de sítio

O último post, com cartas do beja Santos, é o post de 13 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1657: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (41): Cartas de além-mar em África para aquém-mar em Portugal (3)

Guiné 63/74 - P1832: Convívios (15): CCAÇ 12 (Bambadinca, 1971-73), 2 de Junho de 2007, Azeitão: o 34º encontro anual (Victor Alves)

Guiné > Zona Leste > Estrada Xime- Bambadinca > 1969 > O Capitão do Quadro Permanente Carlos Brito, da CCAÇ 2590/CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71). 

Foi o primeiro comandante da CCAÇ 12, uma unidade de intervenção, constituída por quadros metropolitanos e por soldados do recrutamento local, que esteve ao serviço do Sector L1 da Zona Leste. Os quadros metropolitanos eram de rendição individual. Carlos Brito é hoje coronel e vive em Braga. Julgo ter sido substituído pelo Cap Mil Humberto Trigo Bordalo Xavier, com formação em Operações Especiais, em Março de 1971. É a ele que se refere, no texto a seguir, o nosso camarada Victor Alves. 

Foto: © Humberto Reis (2006). Direitos reservados. 

  1. Mensagem do Victor Alves, que foi furriel miliciano vagomestre na CCAÇ 12 (Bambadinca, 1971/73), o periquito do Jaime Sanjtos, o primeiro vagomestre da CCAÇ 2590/CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadina, 1969/71). 

O Victor vive em Santarém e aderiu recentemente ao nosso blogue. Amigo Luís, Conforme informámos (1), lá realizámos o nosso habitual encontro, que eu informei ser o 32º, mas vou corrigir para 34º. Tem causado algum espanto, o facto de se ter começado a realizar, tão cedo, os nossos encontros... 

Foram vários os factores que contribuiram para isso. Porém, o grande causador disso terá sido a vinda, para a CCAÇ 12, do Cap Humberto Trigo Bordalo Xavier, oriundo das Operações Especiais, e amigo pessoal de Spínola. 

Ele soube muito bem provocar uma aglutinação e consequentemente uma união entre todos, ao ponto de estabelecer uma messe e bar para todos os militares da companhia oriundos da metrópole, sem distinção de posto... 

 Foi, na minha óptica, eata a principal razão da nossa união. Eu, por exemplo, como vagomestre e sempre que havia uma operação, por exemplo com saída às 4 da manhã, lá estava a dar pequeno almoço, pão quente e café à rapaziada que seguia. Assim como, mal regressassem, por exemplo, às 3 da tarde, tinham sempre a refeição com meio frango ou meio bife com acompanhamento à sua espera... 

Foi isso que o Capitão pediu e foi isso que se fez. É evidente, dentro dos limites da guerra. Com fomos todos em rendição individual, nem sempre nos encontros conseguimos reunir todos, alguns já faleceram, outros emigraram e outros não vão porque... não. 

 Este ano conseguimos trazer mais duas presenças novas o que foi maravilhoso, foram eles o cabo radiotelegrafista Andrade, de Caldas da Raínha, e o cabo cripto Simões, de Lisboa. Isto quer dizer que não nos víamos há 37 anos, portanto foi muito bom. 

 Para além deles vieram também o Canas (Alf Mil Mecânico do Bart 2917), o H. Martins (Alf Mil Pel Nat 54) e o J. L. Vacas de Carvalho (Alf Mil Pel Rec Daimler 2206): estes últimos já são clientes habituais, embora faltem algumas vezes. 

 De qualquer forma é sempre uma grande alegria, vermo-nos e estarmos juntos. Para o próximo ano é no dia 31 de Maio (Sábado) em Lamego e quem vai organizar é o J. Andrade (Fur Mil CCAÇ 12). 

 Um abraço Victor Alves 

  2. Comentário de L.G.: 

 Victor, ainda não nos mandaste as duas 'chapas da praxe', uma fotografia do teu tempo de furriel vagomestre e outra, mais recente... 

Além disso, tens de trazer, contigo, malta da nossa querida CCAÇ 12. Eu pertenço à primeira vaga de quadros metropolitanos (1969/71), tu pertences à segunda (1971/73)... Temos que reconstituir o puzzle. É espantoso como até agora não mantivémos quaisquer contactos... Mas nunca é tarde. Teremos que nos (re)encontrar, algures, um belo dia destes. O ponto de partida pode e deve ser o nosso blogue. 

Parabéns pelo vosso 34º encontro anual. Isso quer dizer que vocês se têm reunido todos os anos, religiosamente, desde o vosso regresso em 1973 !... Gostava conhecer a história da tua/nossa companhia nesse período em que lá estiveste (1971/73). 

O teu ex-comandante, o Cap QEO Bordalo Xiavier, está contactável ? Já lhe falaste no nosso blogue ? Ele deve ter sido um excelente líder, a avaliar pelo que nos dizes. 

 Um abração para ti e demais camaradas periquitos da CCAÇ 12. 

Luís.

 _________ 

 Nota de L.G.: 

domingo, 10 de junho de 2007

Guiné 63/74 - P1831: Macbeth em África ou Namanha Makbunhe no Teatro da Trindade, com os Fidalgos, grupo de teatro de Bissau (Beja Santos)

Lisboa > Teatro Nacional D. Maria II > Uma cena da peça Namanha Makbunhe. A partir da obra-prima Macbeth, de William Shakespeare. Produção Teatro Nacional D. Maria II em colaboração com o Grupo de Teatro Os Fidalgos, da Guiné Bissau (1).


Foto: Teatro Nacional D. Maria II (2007) (com a devida vénia...)


Namanha Makbunhe
por Beja Santos

O superclássico Macbeth de William Shakespeare é uma referência (por vezes um mero pretexto) e um ponto de partida para um espectáculo profundamente africano, criado por um encenador polaco e desempenhado pela Companhia de Teatro Guineense Os Fidalgos, de Bissau. Sobre esta estrutura dramática paira o drama da guerra civil que enlutou a Guiné Bissau, fala da luta pelo poder, disseca a natureza humana, equilibra-se entre o sagrado e o puramente mágico, usando a ética como pólo de atracção.

Macbeth é a doença pelo poder, a cedência à traição, o enredado da intriga política que leva à quebra de alianças, à rendição às forças do Mal. O encenador Andrzej Kowalski pega numa narrativa imortal, recria uma peça com elaborado trabalho filológico onde se entrançam os melhores e mais eloquentes registos de Shakespeare com vernaculismos, usos e costumes da mais poderosa realidade comunicativa guineense (2).

Onde havia Macbeth passa a haver Namanha Makbunhe, um grande guerreiro do Império Mali. Onde há aristocracia inglesa, passa a haver os grandes senhores da guerra como o régulo de Buruntuma. É uma leitura ágil, aquecida pela música instrumental guineense, uma encenação que oferece um ritmo quase mediaval africano, pontuado pelos figurinos, destacado pelos costumes exibidos em cena.

Não é a história de Shakespeare que prevalece, é a verdade intemporal da luta pelo poder, até à destruição. Há duas Lady Macbeth em cena, a pérfida e aquela que exprime o amor verdadeiro. A pérfida leva ao crime, a amante incondicional tudo perdoa no momento da hecatombe.

Para nós, que vivemos no meio do crioulo, da sonoridade dos instrumentos musicais gentílicos, que observámos as sessões intermináveis de partir mantenha, que nos lembramos das luzes da floresta, que vivemos em destacamentos rodeados destas mulheres e homens que se movem com solenidade, que riem com absoluta sinceridade, Namanha Makbunhe é um momento excepcional de reencontro com uma cultura dilacerada numa tragédia que avassala todas as fronteiras entre a vida e a morte.

A ver no Teatro da Trindade, de 31 de Maio até 1 de Julho, de quarta a sábado, às 21:30 e, aos Domingos, às 16:30. Duração: 1:50 e preços acessíveis. Os Fidalgos estão à vossa espera e representam primorosamente.

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Notas de L.G.:

(1) Este grupo de teatro tem um blogue próprio, um "sítio que aborda a cultura na Guiné Bissau", e que se chama justamente Os Fidalgos. Animam também o Centro de Intercâmbio Teatral de Bissau, que é uma parceria com a AD - Acção para o Desenvolvimento (do nosso Pepito) e a Cena Lusófona.

(2) Referências à peça (texto de William Shakespeare; adaptação / encenação de Andrzej Kowalski)

Resumo da peça (Fonte: sítio do Teatro Nacional D. Maria II > Produções > Namanha Makbunhe)

O valente guerreiro Namanha Makbunhe, régulo de Iall, mata, em combate, o traidor Makumba, conseguindo a vitória para o rei Bolum. Ao regressar da batalha com o companheiro Borry encontra na floresta três feiticeiras que o saúdam: a primeira chama-lhe régulo de Iall, a segunda régulo de Cansala e a terceira dirige-se a ele como rei. Makbunhe fica perturbado e é nessa altura que chega Madiu, enviado de Bolum, que o felicita pelo seu novo cargo: Makbunhe acaba de ser distinguido com o título de régulo de Cansala.

Makbunhe fica eufórico: se a primeira profecia das feiticeiras está certa, então a segunda estará também e ele será, um dia, rei. Ao chegar a casa, as suas mulheres – Djatú e Rokya – têm reacções distintas à notícia. A primeira aconselha prudência ao marido, a segunda diz-lhe que não deverá esperar: o rei Bolum vem visitá-lo e deve morrer já.

Makbunhe mata o rei e o filho deste, Djagra, foge, temendo pela própria vida. O guerreiro assume o trono e a sua primeira preocupação é eliminar os rivais, sobretudo Borry, a quem as feiticeiras predisseram que seria pai de reis. Makbunhe envia um assassino matar Borry e o filho Bunka, mas a missão falha: o assassino consegue matar o pai, mas não o filho. Borry aparece ao rei na forma de fantasma e, muito assustado, Makbunhe manda chamar as feiticeiras para que lhe predigam o futuro. Estas dizem-lhe que ele não deverá temer nenhum homem nascido de ventre materno e que só será destituído quando a floresta de Foroba caminhar.

Makbunhe fica tranquilo, mas será sol de pouca dura: um exército liderado por Djagra caminha já na sua direcção, disfarçado com ramos de árvore. E é Madiu, que não nasceu "por via natural", mas foi arrancado da barriga da mãe, morta, que mata Makbunhe num confronto final.


Post de 15 de Maio de 2007 >Os Fidalgos > Os Fidalgos em Foco


Mais uma vez Os Fidalgos (Guiné - Bissau) em Portugal, desta vez a convite, do Teatro Nacional D. Maria II.

O texto Macbeth, de William Shakespeare, serve de base para a estrutura dramática e poética de Namanha Makbunhe, um espectáculo profundamente africano que também integra actores angolanos e moçambicanos.

Envolvido num ambiente de magia e superstição esta tragédia africana narra também a sede do poder e a ambição desmedida dos homens. Inspirado por uma cadeia de acontecimentos vividos em África, a metáfora ultrapassou a adaptação simples para à realidade histórica, cultural e tradicional desse continente para se tornar numa transposição, original.

Se William Shakespeare tivesse nascido em África, a história de Macbeth não seria idêntica. Porque o que é dramático para um europeu pode não o ser para um africano e vice-versa. Namanha Makbunhe recria em termos plásticos e sonoros: climas e atmosferas de uma outra realidade; da luz, da floresta, dos ritmos e dos cheiros africanos.

O rufar quente dos tambores, a dança, o canto dolente, ajudam a esquecer os males de que África padece. É preciso exorcizar as dores; sorrir, brincar, transmitir energia para a vida; sonhar com um mundo melhor para todos, com mestria e através do sorriso contagiante, uma parte de Africa está viva neste espectáculo.

A africanização desta tragédia mostra-nos que, apesar de realidades históricas distintas e locais diferentes, mantem-se o enredo original. Afinal a Mãe-África dos nossos dias, no caminho para a democracia, ainda está longe de ser um acto pacífico entre os povos de uma mesma Nação.

Guiné 63/74 - P1830: Guileje, uma espécie de colónia penal militar até finais de 1969... (Nuno Rubim)

Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1967/68) > Homens e vacas rodeados de arame farpado ... Até finais de 1969, Guileje era considerado um sítio tão mau que funcionava como... uma espécie de colonial penal militar. Foto do nosso saudoso Zé Neto (1929-2007) (1).

Foto: © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados.

1. Mensagem do nosso querido amigo e camarada Nuno Rubim:


Durante anos, após a minha permanência lá (2), ouvi referências sobre o facto de serem enviados para Guileje militares punidos ou indesejados de outras unidades do CTIG [Comando Territorial Independente da Guiné].

Apesar de ter tido uma experiência pessoal que parece ter confirmado este facto, só agora descobri, no AHM [Arquivo Histórico Militar] (3), um documento oficial que esclarece totalmente a questão !

Mensagem Com-Chefe, Guiné, Dezembro 1969.

Retransmitido pelo Batalhão de Artilharia 2865, reponsável pelo Sector S3 (nessa altura em Catió), que englobava o sub-sector de Guileje. (AHM )

Por determinação superior “… Considerada a situação de Guileje, cancelamento de mais transferências por motivos disciplinares para aquela guarnição” !!!
Um abraço

Nuno Rubim

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Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 30 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1801: Capitão José Neto (CART 1613, Guileje, 1967/68), a última batalha

(2) O Nuno Rubim, hoje coronel de artilharia na reforma , esteve em Guileje, à frente de duas unidades, a CCAÇ 726 (Out 1964/Jul 1966) e a CCAÇ 1424 (Jan 1966/Dez 1966).

(3) Vd. post de 7 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1408: Vamos salvaguardar a(s) nossa(s) memória(s), apoiando a Liga dos Amigos do Arquivo Histórico Militar (Luís Graça / Nuno Rubim) .

O presidente da direcção desta Liga é o coronel, na reforma, e conceituado historiador da guerra colonial Aniceto Afonso.

Guiné 63/74 - P1829: Ser solidário: À Gilda e a todas as vítimas de guerras, discriminação, racismo... (Torcato Mendonça)

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Mansambo > CART 2339 (1968/69) > Fotos Falantes II > Putos do campo fortificado de Mansambo...

Foto: © Torcato Mendonça (2007). Direitos reservados.

1. Mensagem do Torcato Mendonça (ex-Alf Mil da CART 2339, Zona Leste, Sector L1, Mansambo , 1968/69) . Vive actualmente no Fundão, o coração dos lusitanos e do Viriato, que merece uma visita, com tempo e vagar, não só pela sua cereja e a sua festa (15 a 17 de Junho próximos) pelo seu património arquitectónico, pelo seu Museu Arqueológico Municipal José Monteiroe pela sua novíssima casa da cultura, a Moagem - Cidade do Engenho e das Artes... De facto, há mais vida, para lá do litoral, do eixo Setúbal-Lisboa-Coimbra-Porto-Braga e das autoestradas que nos levam da periferia ao centro... A A23, por exemplo, que nos leva ao Fundão e à Cova da Beira e às nossas raízes lusitanas... (LG)


Eih, pá, consegues dizer praticamente ou realmente tudo. Esta estória (1) é, para mim, um cântico à tragédia das guerras, ao sofrimento daqueles miúdos que nós conhecemos, às mães e pais a sofreram aquele drama. Há um aperto em mim, se sou piegas problema meu, mas recordo, talvez o que mais fortemente recordo são os meninos e o olhar…um olhar doce, a suplicar ajuda das mães.

Luís, só por este post, só por esta estória valia a pena ter um espaço na Net para ajudar…contribuir para que as pessoas, que tanto sofreram, sejam um dia, mais felizes. Tocou-me e não dá para continuar. Obrigado a ti, aos camaradas que ajudaram a Gilda e que ela, a filha, a família sejam felizes. Que, se assim o desejarem, voltem a reunir-se à sombra das mangueiras e dos poilões… e a Gilda diga que é de Catió, de Cascais, portuguesa ou guineense, as duas naturalidades… E não se esqueça que nós, humanos, temos diferentes cores…religiões…eu sei lá…Felizmente tanta diferença para, ao fim e ao cabo, sermos todos iguais, humanos.

Obrigado por este final de tarde, mesmo sofrido.

Um abraço para ti, para a Gilda (1) e, através dela, para todos os que foram – continuam a ser – vítimas de guerras, de discriminação, de racismo, de tanto sofrimento… o tal Grito de protesto…


Torcato Mendonça
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Nota de L.G.:

(1) Vd. post de 6 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1819: De Catió a Lisboa, de menina a Mulher Grande ou uma história triste com final feliz (Gilda Pinho Brandão / Luís Graça)

Guiné 63/74 - P1828: Armamento do PAIGC (3): O Foguetão 122 mm ou a arma especial Grad (Nuno Rubim)



Lisboa > Museu Militar (1) > O foguetão 122 mm ou a arma especial Grad (na terminologia do PAIGC).

Fotos: Nuno Rubim (2007). Direitos reservados.

Texto do Coronel Art, reformado, Nuno Rubim, o nosso (deste blogue) grande especialista em armamento, tanto das NT como do PAIGC. É, reconhecidamente hoje, o maior especialista português em história da artilharia (2). Foi, além disso, um dos capitães de Abril, injustiçado em 25 de Novembro de 1975.

Last but note the least, é um dos oficiais da sua arma, a Artilharia, mais condecorados: é detentor de condecorações como a Cruz de Guerra, Medalha de Serviços Distintos com Palma, Medalha de Mérito Militar e outras. Todas essas medalhas tiveram por base louvores do escalão de Comante de Agrupamento para cima (a Cruz de Guerra e a Medalha de Serviços Distintos com Palma acabaram em Ministros do Exército e Defesa Nacional).

O Nuno Rubim esteve na Guiné (por duas vezes). A sua presença, neste blogue, muito nos honra. Com ele, ao nosso lado, corremos sempre o risco de, quando abrimos a boca, de dizer asneira. Foi o que aconteceu comigo ao escrever que o foguetão 122 mm podia atingir os 20 km de alcance (3)... (LG).

Caro Luís:

Para complementar as informações sobre o Foguete de 122 mm (1), utilizado pelo PAIGC, aqui vão mais alguns dados:

(i) O Sistema era conhecido pelo PAIGC como Arma Especial - Grad;

(ii) Era uma arma de artilharia, de bater zona e não de tiro de precisão;

(iii) O alcance máximo era de 11.700 m para 40º de elevação. Segundo um relatório do PAIGC a distância maior a que se efectuou tiro, teria sido contra Bolama, em 4 de Novembro de 1969, a 9.800 m.

(iv) Como se poderá ver nas imagens acima, o foguete dispunha de um perno (assinalado a vermelho ) que, percorrendo o entalhe em espiral existente no tubo, imprimia uma rotação de baixa velocidade afim de estabilizar a vôo. As alhetas só se abriam depois do foguete sair do tubo.

Enviei para o blogue, há algum tempo, a fotografia do Tubo que se encontra no Museu Mil Lisboa, que julgo ser o capturado em Cufar, em Janeiero de 1973.

Um abraço

Nuno Rubim

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Notas de L.G.:

(1) O Museu Militar fica no Largo do Museu da Artilharia, 1100 - 468 Lisboa, junta à Estação de Caminhos de Ferro de Santa Apolónia, em Lisboa. Telefone > 21 884 25 69.Fax > 21 884 25 69
E-mail> mmilitar@um.geira.pt

Funcionamento > Das 10h00 ÀS 17h00. Encerra 2ª e Feriados.

Autocarros > 9, 12, 25, 28, 35, 39, 46, 104, 105, 107.

Tutela > Ministério da Defesa Nacional.

Em 1926 a denominação do Museu [que era de Artilharia] é alterada para Museu Militar. O edifício do Museu encontra-se classificado como Imóvel de Interesse Público, desde 1963. O organismo responsável por este museu é o Ministério da Defesa Naciojnal.

A mostra das colecções museológicas desenvolve-se ao longo de 33 espaços expositivos. O visitante pode verificar que a natureza das colecções não passa unicamente pelas peças bélicas, mas também pelo património artístico patente na pintura, azulejaria e escultura, pela mão de grandes artistas dos séculos XVIII, XIX e XX.

Através do seu espólio o Museu Militar aborda as grandes temáticas da história de Portugal. A missão do Museu encontra-se patente na sua divisa (em latim): MAIORVM NATV ARMA PROPONIMVS (“Expomos as Armas dos Antepassados”). ~

O Museu contempla, desde 1998, de um espaço nas Caves para a realização de exposições temporárias e de outros eventos culturais. No percurso do itinerário interior o visitante poderá dispor no Pátio dos Canhões de uma Loja e de uma Cafetaria. Caracteriza-se por ser um museu que vive de uma exposição permanente. Há várias exposições temporárias anuais.

A primeira (e única) vez que lá fui, há uns meses atrás, estavam ainda (há quanto tempo ?) em remodelação as Salas sobre a Guerra Colonial 1961 – 1975 (sic).

Salas de maior visibilidade:

Sala Vasco da Gama

Sala das Guerras Peninsulares

Sala da Grande Guerra

Sala de Camões

Sala Mouzinho de Albuquerque (LG)

(2) Vd. post de 18 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1189: O tertuliano Nuno Rubim, especialista em história militar

(3) Vd. post de 7 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1821: Armamento do PAIGG (2): Mísseis terra-terra Katyusha ou foguetões 122 mm (A. Santos)

Vd. posts anteriores desta série (ou relacionados com armamento do PAIGC):

17 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1764: Armamento do PAIGC (1): Metralhadoras pesadas Degtyarev, antiaéreas (Nuno Rubim)

13 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1756: Exposição de armamento apreendido ao PAIGC, aquando da visita de Américo Tomás (Bissau, 1968) (Victor Condeço)

18 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1672: Guileje: a artilharia do PAIGC (Nuno Rubim)

27 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1628: Projecto Guiledje: fotografias de armamento e equipamento, das NT e do PAIGC, precisam-se (Nuno Rubim)

sábado, 9 de junho de 2007

Guiné 63/74 - P1827: Convívios (14): 38ª Companhia de Comandos, Pínzio, Vilar Formoso, 9 de Junho de 2007 (A. Mendes)

1. Mensagem do A. Mendes, ex- 1º Cabo Comando da 38ª CCmds (Guiné, 1972/74)

Luís, se me permites, gostaria aqui de divulgar mais um encontro anual da minha Companhia.


12º Encontro da 38ª Companhia de Comandos (Guiné, 72-74)

Local: Pínzio (Vilar Formoso)
Data/hora: 9 de Junho de 2007 pelas 10:30h

Aqui fica o convite a quem quiser estar presente, principalmente a quem morar na zona e tenha estado na Guiné. Apareça que eu tenho todo o gosto em recebê-lo.

Concentração junto à Igreja.

Amilcar Mendes

Ex-1ºcabo, 38ª CCmds (Guiné, 1972/74)

2. Comentário de L.G.:

Amílcar, desejo-te um bom dia, com ida (a Pínzio) e regresso (a Lisboa), sem percalços. Que seja mais um excelente encontro dos valorosos comandos da 38ª.

A propósito, vi ontem na televisão um reportagem sobre o lançamento de um DVD com a história dos comandos em Portugal. Entre outros, vi o Folques, já aqui falado diversas vezes. Quando tiveres um tempinho livre, peço-te para nos falares desse DVD cujo conteúdo eu ainda não conheço.

Um abraço para ti e os teus camaradas. Luís

Guiné 63/74 - P1826: Estórias do Zé Teixeira (17): Eh fermero di caradjo, pára lá, a mim amigo di bó, amigo memo! (José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enf)


1. Mais uma estória do Zé Teixeira, ex-1º Cabo Auxiliar Enfermeiro da CCAÇ 2381 (1968/70) - os Maiorais

Caríssimos.
Aí vai mais uma das minhas estórias. Amanhã [hoje, 9 de Junho] vou ter o prazer de abraçar o Idálio Reis. A CCAÇ 2317 de Gandembel faz o seu Convívio aqui no Porto e eu lá estarei. Fraternal abraço com votos de bom fim de semana.


Uma mão na gaita, outra na catana

por Zé Teixeira

A sorte bafejou-me durante uns meses, ao ser destacado para acompanhar o Grupo de Combate que se fixou em Mampatá Forreá. Tabanca pequena de gente simples, de maioria Fula e Mandinga, que nos recebeu de braços abertos e durante cerca de seis meses me permitiu passar o que hoje considero umas pequenas férias em pleno meio da guerra, rodeado por Aldeia Formosa, Gandembel, Guileje, Gadamael , Mejo, etc. Locais onde havia festa da brava em contínuo, que nós escutávamos em silêncio e expectativa , enquanto eu apenas fui visitado umas cinco ou seis vezes, pese embora tenham sido momentos muito difíceis, que superámos sem grandes percalços, a não ser um belo dia, em plena hora de almoço, em que tentaram apanhar-nos à mão e chegaram a entrar dentro da barreira de arame, tendo queimado onze moranças.

Bajudas bonitas e afáveis. Até à data ainda não encontrei na minha vida mulher mais bonita que a Fátma Baldé, a minha lavandera, a Djubae ou a Dada, filha do régulo Aliu Baldé, hoje casada com o Régulo de Sinchã Sambel (Saltinho) onde tive o prazer de a encontrar e abraçar em 2005. Sempre bonita.

Assumi a minha missão de enfermeiro, montando diariamente a enfermaria estrela, nome que lhe dei, pois não passava de uma pequena mesa e um banco debaixo de uma árvore onde colocava as mesinhas: adesivos; compressas; ligaduras, etc. Os medicamentos tinha de os guardar, pois faziam milagres de tirar dores di bariga, dores di cabeça , ramassa (diarreia), kurpo kente (Febre) ou turse (tosse), etc., etc.

Todos os dias lá apareciam, sobretudo bajudas e mulheres à caça do comprimido para… hoje era barriga, amanhã era cabeça, outras vezes pediam para levar e tomar na morança, ou seja era para outra pessoa. Havia também as pequenas feridas, as feridas crónicas (chagas) por falta de tratamento em devido tempo, os entorses etc. Combater o paludismo nos militares brancos, no grupo de combate de milícias ou na população era a minha grande preocupação e os resultados foram satisfatórios, pois durante seis meses ninguém morreu com esta doença, bem pelo contrário safei duas crianças, de morte certa, como já referenciei no diário.

A par desta missão cabia-me, durante a noite, passar uma hora, a visitar os sentinelas de serviço, nos respectivos postos, em parceria com os furriéis e o Alferes, com o objectivo de os ajudar a passar o tempo e garantir a atenção necessária ao meio envolvente de onde o IN poderia estar à espreita. Estava cerca de dez minutos em cada posto em conversa com o colega de serviço e lá partia para o posto seguinte. Por precaução e segurança da pele, fazia os percursos cruzados de modo a nunca caminhar perto da barreira de arame farpado.

Uma noite, daquelas em que estava tão escuro que não se vê um palmo à frente do nariz (como se diz na minha terra), atravessava a Tabanca, com uma G3 emprestada, (não tinha arma atribuída por opção própria e quando saía para o exterior em serviço, apenas levava a bolsa de enfermeiro) em direcção oposta ao posto de sentinela de onde tinha partido, com todo o cuidado para não esbarrar com uma árvore, que sabia existir naquele lugar, quando esbarro com algo que se mexe. Só tive tempo de gritar – tem calma é Fermero Tixera ki passa, e, logo ouço uma voz Tu tem sorte fermero, djobe ! (repara).
Era nem mais nem menos um dos milícias, meu amigo, que tinha saído da sua morança para deitar a árvore abaixo ou seja urinar e por segurança trazia uma catana, isto é, estava com uma mão na gaita e outra na catana, para o que desse e viesse. A catana estava bem no alto pronta a cair sobre a minha cabeça.

Com fair play retorqui:
- Sorte na tem bó, djobe, nha G3 stá tiro a tiro (falso).
- Ehhh fermero di caradjo ! pára lá ! a mim amigo di bó. Amigo memo.

Seguiu-se um afável parte mantanhas. Ele, possivelmente foi empernar com uma das duas lindas mulheres que tinha, na esteira onde algumas vezes nos deitamos a três, ele, eu e uma das mulheres, para conversarmos sobre a Lisboa (Portugal continental), até a noite se perder pela madrugada.

Eu segui o meu caminho para o posto do colega que estava de sentinela, uns metros à frente e que não dera por nada.

Zé Teixeira
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Nota de L.G.

Vd. post de 15 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1760: Estórias do Zé Teixeira (15): Tarde de Domingo com sorte

sexta-feira, 8 de junho de 2007

Guiné 63/74 - P1825: Mário de Oliveira, na Feira do Livro de Lisboa, dia 9 de Junho de 2007


Guiné > Mansoa > BCAÇ 1912 (1967/68) > O capelão, Mário de Oliveira, alferes miliciano, entre soldados. Viria a receber ordem de expulsão da Guiné em 8 de Março de 1968.

Foto: © Padre Mário da Lixa (2003) (com a devida vénia...)


Texto do nosso camarada Mário de Oliveira, que foi alferes miliciano capelão no BCAÇ 1912(Mansoa, 1967/68). O Mário de Oliveira - que virá a ser conhecido mais tarde como o Padre Mário da Lixa - recebeu ordem de expulsão da Guiné em 8 de Março de 1968, ao fim de 4 meses de comissão. Para quem o quiser conhecer pessoalmente, ele estará amanhã na Feira do Livro de Lisboa, a autografar o seu último livro. Aqui fica uma mensagem que nos mandou há dias e que só hoje, infelizmente, foi possível pôr no blogue:

Companheiras / Companheiros

O meu abraço e a minha paz.

Venho comunicar-vos que no dia 7 deste mês de Junho, a partir das 16 horas, estarei na Feira do Livro do Porto. E no dia 9 deste mesmo mês de Junho, a partir das 16 horas estarei na Feira do Livro de Lisboa.

Numa e noutra Feira, começo por apresentar, no espaço reservado para esse tipo de eventos, o meu novo livro SALMOS VERSÃO SÉCULO XXI, editado pela Campo das Letras. E depois prosseguirei no Stand da Editora Campo das Letras a acolher as leitoras, os leitores que quiserem proporcionar-me essa alegria e essa festa.

E a quem o desejar, também autografarei os meus livros que estarão lá venda a preços mais reduzidos. A apresentação do livro no Porto será feita pelo meu amigo Padre Anselmo Borges, professor de Filosofia na Universidade de Coimbra e conta também com a presença do actor Júlio Cardoso, da Companhia de Teatro Seiva Trupe, que dirá alguns dos 50 salmos do livro. Espero lá por si. Apareça e leve consigo outras amigas, outros amigos também.


Vosso companheiro e irmão
Mário, presbítero da Igreja do Porto

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Nota de L.G.:

(1) Vd. posts de:

28 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1002: Um novo recruta, Aires Ferreira (BCAÇ 1912, CCAÇ 1686, Mansoa, 1967/69)

27 de Junho de 2005 > Guiné 60/71 - LXXXV: Antologia (5): Capelão Militar em Mansoa (Padre Mário da Lixa)

14 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCL: Capelão militar por quatro meses em Mansoa (Padre Mário da Lixa)

17 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLXV: Foi em plena guerra colonial que nasci de novo (Padre Mário de Oliveira )

Guiné 63/74 - P1824: O Aeroporto de Jumbembem e os ecologistas 'avant la lettre' (Artur Conceição)

Texto do Artur Conceição, ex-soldado de transmissões da CART 730 (1965/67), actualmente residente na Damaia, Amadora. Esteve em Bissorã, Farim e Jumbembem, ou seja, na actual Região do Oio.




O Aeroporto de Jumbembem
por Artur Conceição

Em 1965/66 o correio na Guiné era lançado a partir de uma avioneta na maioria dos acampamentos espalhados no território. Jumbembem não fugia à regra, e lá para quinta ou sexta-feira vinha a avioneta que largava um ou dois sacos, conforme o volume de correspondência.

Este era sempre um momento de grande alegria mas também de alguma ansiedade, se nos lembrarmos de que os telegramas a dar a notícia da morte de um familiar eram também entregues pela mesma via.

Aconteceu que numa dessas largadas de sacos um deles ficou em cima de uma árvore gigante que se encontrava junto da entrada do aquartelamento. Claro que não ficou lá por muito tempo, dado que apareceram logo exímios trepadores para retirar o saco daquele local.

É a partir deste acontecimento que surge a ideia da construção de uma pista onde fosse possível aterrar uma avioneta de pequeno porte, como era o caso. Poupava-se muito esforço mas por outro lado perdia-se a ida semanal a Farim, para levar o correio a expedir, o que também não agradava a todos.

A localização do novo aeroporto não envolvia qualquer polémica, pelo que, após rigoroso estudo de impacto ambiental, ficou decidido que seria construído a noroeste do aquartelamento no sentido de Farincó.

Foram reunidos os meios materiais, que se reduziam a algumas pás, picaretas e alguns machados e serras, ou seja o material que era utilizado na construção de abrigos, incluindo o corte de algumas palmeiras.

Arrancou-se com todo o entusiasmo, mas as árvores no local eram na sua maioria de grande porte, o que exigia um grande esforço para as arrancar, e a construção da pista lá ia andando um pouco aos soluços, tanto mais que a comissão já ia a mais de meio e o pessoal tinha perdido o entusiasmo inicial. As obras estavam quase paradas...

É nesta fase que surge o episódio do “cabrito escondido com o rabo de fora”.
Nessa altura na Guiné ainda havia manga de vacas só que não eram leiteiras, como certamente se lembram, pelo que o comandante da companhia resolveu comprar uma cabra para dar leite para o pequeno almoço na messe de oficiais. A cabra vinha acompanhada de dois cabritos menores que a chibinha tinha também de alimentar. Alguém muito atento e entendido na criação de cabritos, e amigo dos animais, achou que para a pobre bicha, era um esforço demasiado, alimentar dois cabritos e cinco oficiais...

Então resolveu aliviá-la de um deles. Detectado que foi o desaparecimento do animal foram iniciadas as buscas para o localizar, tendo sido encontrado após algumas horas de busca dentro de um caixote, daqueles onde eram guardadas as botas e outros apetrechos, isto porque o raptor tinha deixado o animal com o rabo de fora.

O raptor e seus cúmplices foram penitenciados a arrancar vinte árvores na pista em construção. Saíam de manhã, vinham almoçar ao meio dia e voltavam da parte da tarde sempre acompanhados de uns baralhos de cartas e alguns alimentos e bebidas.

Para além de gostarem de cabrito, também eram amigos do ambiente, pelo que volvidos quinze dias as árvores continuavam de pé. Para que a penitência não fosse alterada ou agravada foi-lhes dado um prazo e as árvores lá tombaram. Foram as últimas !!...

Depois de tanto esforço nunca tivemos o prazer de ver uma aeronave mesmo pequena a aterrar no Aeroporto de Jumbembem.

Depois da companhia 730, devem ter passado por Jumbembem mais umas cinco ou seis. Tanto quanto sei nenhuma delas concluiu a obra, mas que a 730 começou isso é verdade !!!!.....

Artur Conceição

Guiné 63/74 - P1823: Camaradas que já nos deixaram (2): O Picão, da CCS do BCAÇ 2930 (Catió, 1970/72), que morreu há dias na miséria (Amaral Bernardo)

Lourinhã > Praia Vale de Pombas (1) > 2005 > "Um homem e a a sua cruz"... O Picão faleceu no hospital de Leiria no dia 28 de Maio último, de madrugada, tendo o funeral sido em S. Martinho do Porto no dia 29 às 16 horas. Gravemenete ferido num ataque a Catió, com foguetões 122 mm, no 14 de Abril de 1970, nunca mais pôde trabalhar. Não tinha Segurança Social, pelo que o funeral foi às custas da sua pobre família e dos seus amigos... Mais um estória triste e revoltante.

Foto: © Luís Graça (2005). Direitos reservados.


1. Mensagem do Amaral Bernardo, ex-Alf Mil Médico da CCS / BCAÇ 2930(Catió, 197o/72) (2):

Luís,

Sábado passado, dia 2, o BCAÇ 2930, a que pertenço, realizou mais um encontro anual. O Rocha Pais, que foi enfermeiro do batalhão, pediu-me ajuda com o documento que te mando.

Podemos fazer alguma coisa? O camarada recém falecido ficou gravemente ferido numa brutal ataque com foguetões 122 a Catió em 14 de Abril de 19971. Ficou cheio de estilhaços... e parece que morreu com uma complicação pulmonar, provocada por um deles. Morreu na miséria (foi preciso arranjar dinheiro para o funeral) e deixa a viúva com a quantia que o documento refere. Haverá um processo oficial, perdido algures em qualquer repartição das Forças Armadas, a pedir o apoio a que ele tinha direito.

Se não se conseguir nada a nível oficial, tentarei sensibilizar uma TV qualquer.´É triste, mas terá que ser assim... embora não faça o meu género.

Abraço

Amaral Bernardo.

P.S. - Podes dar a publicidade que entenderes


2. Mensagem enviada pelo Luís Martins Silva , com data de 31 de Maio de 2007, para o Rocha Pais:


Pais:

Lamento ter de informar que não podemos comparecer ao Encontro. A minha sogra ficou internada no hospital de Beja, em observações, pelo que não sabemos o desfecho do assunto. Se puderes ainda avisar que são menos 2, melhor, se tivermos que pagar diz alguma coisa.

Mandou-me hoje uma mensagem a Dª Susete, viúva do Picão. Pede para darmos um abraço a cada um dos nossos companheiros, pois o Picão dizia sempre que gostava de abraçar cada um.

Sei que vais estar só, de nós os três que tivemos no funeral, mas se tiveres hipóteses, fala no assunto e se vires que há condições pede o apoio dos nossos companheiros.

Por mim a única coisa que posso fazer é escrever a seguinte mensagem que depois, se vires que há hipoteses, podes ler para os nossos camaradas.

Amigos ecompanheiros.

Por motivos relacionados com a doença súbita de um familiar, não me é possível estar este ano, presente no nosso convívio. No entanto, não quero deixar de vos saudar a todos e às vossas famílias, desejando que , apesar das contrariedades da vida, consigamos sobreviver mais alguns anos para nos continuarmos a encontrar.

Um dos que nunca esteve connosco nos Encontros, mas que nós lembrávamos bem, era o José Júlio Abreu Picão.

Nunca mais vai estar connosco, apenas em pensamento. Faleceu no hospital de Leiria no dia 28, de madrugada, tendo o funeral sido em S. Martinho do Porto no dia 29 às 16 horas. Estivemos eu, o Pais e o Lisboa. No momento do corpo descer à terra, com a autorização da família e por concordância do Pais e do Lisboa, teci algumas considerações sobre o nosso amigo que nos deixou. Realcei o facto de o Picão ter esperado 37 anos por uma pensão, dado que, tendo sido ferido como sabeis, no 14 de Abril de 1970, nunca mais pôde trabalhar . Não tinha segurança social, pelo que o funeral foi às custas da família (esposa) e dos amigos. Trata-se, como pudémos comprovar, duma familia bastante pobre e carenciada (viviam com a reforma da actual viuva, de 230 euros mensais), ele, a esposa e uma neta que criou desde o nascimento e agora com 13 anos.

Por isso, daqui faço um apelo à nossa generosidade para com aquela senhora, que está a passar por maus momentos, não só espirituais, como materiais. Se assim o entenderem, podem entregar os vossos donativos ao Pais, que lhos fará chegar. Se entenderem fazê-lo directamente, o Pais tem consigo a morada da viúva.

Pedia-me hoje por mensagem, a viúva, que no nosso Encontro eu desse um abraço a cada um de vós, em nome do Picão, pois em vida manifestou esse desejo. Faço-o através desta mensagem. Que Deus nos dê coragem para aguentarmos com mais este embate e outros mais que virão a caminho.

Tal como disse no funeral do Picão, repito-o agora:
ADEUS AMIGO, ATÉ SEMPRE.

Luís Martins Silva
ex-furriel miliciano mecânico auto.


Pais:

li igualmente as mensagens que reencaminhas-te do alferes Santos. Se ele estiver no Encontro dá-lhe um abraço bem forte.

E tu, que és um homem de coragem, ve se consegues sair desse imbróglio.

Recebe um abraço para ti e Rosalina do

Luís e Elsa

3. Comentário do editor do blogue:

Estou fora de Lisboa, com dificuldades de ligação à Net (Eu ladrão me confesso: isto de contar com o ovo no cú da galinha, que é como quem diz, com o sinal da rede sem fios... do vizinho!)...

O Amaral Bernardo telefonou-me há dias a contar este triste caso, acima descrito. Só agora consigo pô-lo no blogue. Não podemos ficar indiferentes a situações como estas que, mais uma vez, nos chocam, envergonham e entristecem.

O nosso blogue abre o seu espaço às sugestões e comentários de todos os camaradas, em geral, e dos camaradas do BCAÇ 2930, em particular. Como demonstrar a nossa solidariedade para com o Picão e a sua família ?

Antes de mais, trata-se de dar um murro na burocracia, no cinismo e na indiferença. Há tempos comentámos aqui um caso semelhante, o de um camarada que morrreu, como um cão, na sua barraca, na Nazaré (3). L.G.

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Nota de L.G.:

(1) Vd. Luía Graça > Blogue Fora-Nada... E Vão Dois > Post de 9 de Novembro de 2005 Blogantologia(s) II - (15): O amor em Agosto

(...) Nem vale.
Nem pombas.
Nem praia.
Na Praia do Vale de Pombas,
À maré cheia, à praia-mar,
Há apenas um fio de água doce
Que mantém os cordões umbilicais
Do infinitamente pequeno da vida
Ligados ao infinitamente grande
Dos corpos celestiais.

Vale de Pombas:
Aqui caiu uma chuva de meteoritos.
Um dia hei-de lá levar-te.
(...)

(2) Vd. post de 2 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1489: Tertúlia: Formalizo o meu pedido de entrada (Amaral Bernardo, ex-Alf Mil Médico, Catió, BCAÇ 2930)

(3) Vd. post de 3 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1398: Poema de Natal: Só agora, camarada, te mataram (Jorge Cabral)

quinta-feira, 7 de junho de 2007

Guiné 63/74 - P1822: Estórias do Gabu (5): Nunca chames indígena a ninguém (Tino Neves)

Região Autónoma da Madeira > Ribeira Brava > Sítio da Encumeada (a 1000 m de altitude > Maio de 2007... Está por conhecer a pesada factura humana e social da guerra colonial que a Madeira e os madeirenses também pagaram...

Foto: © Luís Graça (2007). Direitos reservados


1. Texto do Tino Neves , ex-1º Cabo Escriturário, CCS/BCAÇ 2893, Nova Lamego (Gabu), 1969/71.

Vou contar uma pequena estória, que me veio à memória recentemente (1).

A estória passou-se comigo e um soldado da Ilha da Madeira. Digo já que não tenho nada contra os Madeirenses, apesar de ainda nunca ter ido à Madeira. Tenho, de resto tenções de lá ir um destes dias, pois tenho lá camaradas da minha companhia.

Um determinado dia no ano de 1971, já no Aquartelamento novo de Nova Lamego (Gabu), chegou uma coluna de víveres, de um aquartelamento da zona, já não me recordo de onde). Estando eu na Sala do Soldado (cantina), a comer uma sandes de chouriço e a beber um cerveja, chega um soldado dessa coluna, muito falador. Se não fosse a pronúncia, diria que seria do Algarve (já que os algarvios têm fama de faladores).

Como sou descendente de algarvios, e apesar de ter nascido na Cova da Piedade (Almada), fui baptizado no Algarve (Luz de Tavira). Fiquei por isso curioso em saber de onde ele seria, pois nesse tempo não sabia distinguir um madeirense de um açoriano. Na minha companhia tinha dois camaradas da Madeira, e não falavam assim, daí eu resolver interpelá-lo com a seguinte pergunta:
- Donde é que tu és indígena?

E tive como resposta rápida:
- Vou-te matar! - e nisto sacou de um grande punhal (daqueles à Rambo, com serrilha) e deitou-me uns olhos, que eu fiquei sem pinga de sangue, a olhar para o facalhão.

Se não fossem os camaradas presentes a segurarem-no, ele, julgo eu, que o fazia, mas depois de ser desarmado, eu caí em mim e percebi a razão da sua reacção. Ele deve ter pensado que eu estava a insultá-lo, a chamar-lhe… indígena. Ele deve ter percebido a pergunta deste modo:
- Donde é que tu és, indígena ? – Procurei, por isso, pôr água na fervura, reformulando a pergunta:
- Eu sou indígena de Lisboa, Almada… E tu?

Aí ele acalmou e compreendeu o que queria dizer:
-Ahhhh, eu sou da Madeira!

Depois pediu-me desculpa pela sua reacção, porque não compreendera bem o que eu queria dizer. Eu respondi-lhe que quem tinha de pedir desculpa era eu, porque eu tinha o mau hábito de usar o termo Indígena em vez de Natural. E logo a seguir pedi ao barman mais duas cervejas, que pagava eu.

Moral da estória: nunca deves perguntar a ninguém donde é que é… indígena, principalmente, a quem estiver armado até aos dentes, com facalhão à Rambo e G3 a tiracolo.

Um abraço

Tino Neves

Almada

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Nota de L.G.

(1) Vd. post anterior > 20 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1769: Estórias do Gabu (4): O Capitão Comando João Bacar Jaló pondo em sentido um major de operações (Tino Neves)

Guiné 63/74 - P1821: Armamento do PAIGG (2): Mísseis terra-terra Katyusha ou foguetões 122 mm (A. Santos)



Guiné > Zona Leste > Sector L3 > Nova Lamego > 1973 (?) > Foguetão 122 mm, completo, apreendido ao PAIGC.

Foto: © António Santos (2007). Direitos reservados.

1. Mensagem do nosso camarada A. Santos, ex-Sold Trms, Pel Mort 4574/72, Zona Leste, Sector L3, Nova Lamego,1972/74.

Luís: Aqui estão as duas imagens do mesmo míssil que, segundo o Rubin (1), parece ser único (2).

A. Santos

2. Comentário de L.G.: Não sou especialista em armamento. Julgo, no entanto, tratar-se do míssil terra-terra Katyusha, mais conhecida entre as NT como foguetão 122 mm. De origem soviética, teria um alcance de 20 Km.

Fontes a consultar:

Wikipédia > Lista de equipamento militar utilizado na guerra do Ultramar

Guerra na Guiné - Os Leões Negros > CCAÇ 13 > Bolama > Katyusha > 3/11/69
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Nota de L.G.:

(1) Vd. posts recentes sobre este tópico (armamento do PAIGG):

27 de Março de 2007 > Gúiné 63/74 - P1628: Projecto Guiledje: fotografias de armamento e equipamento, das NT e do PAIGC, precisam-se (Nuno Rubim)

12 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1753: Diorama de Guileje, 1965/67 (Muno Rubim)

13 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1756: Exposição de armamento apreendido ao PAIGC, aquando da visita de Américo Tomás (Bissau, 1968) (Victor Condeço)

17 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1764: Armamento do PAIGC (Nuno Rubim)

18 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1766: Guileje: A Bêbeda, uma Fox do Pel Rec 839 que ficará imortalizada no diorama (Nuno Rubim)

23 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1781: Ambulância do PAIGC, de fabrico soviético, capturada pelo Marcelino da Mata, em Copá (A. Santos)

(2) Sobre a utilização desta nova arma, o foguetão 122 mm, há já vários posts no nosso blogue:

2 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCLXXII: Esquadrão de Reconhecimento Fox 2640 (Manuel Mata) (5): Foguetões 122 mm no Gabu

(...) " Maio de 1970: O Pel Rec, em Piche, continuava a sua actividade e a sofrer as flagelações do inimigo, agora com foguetões de 122 mm. Volta a acontecer, felizmente sem consequências, no dia 26 de Maio, depois de uma escolta aos Adidos Militares Estrangeiros que visitaram a Guiné. Ao chegar de Nova Lamego foram flagelados com foguetões de 122 mm" (...).

30 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1800: Álbum das Glórias (14): De Alferes (CCAÇ 1420, Fulacunda, 1965/67) a Capitão (CCAÇ 18, Quebo, 1970/72) (Rui Ferreira)

(...) "Guiné > Aldeia Formosa > CCAÇ 18 (1970/72) > 1971 > Os primeiros foguetões 122 capturados aos guerrilheiros do PAIGC. O Cap Mil Rui Ferreira, comandante da CCAÇ 18, é o elemento do meio, na fotografia" (...).

24 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1784: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (4): Queridos pais, é difícil de acreditar, mas Guileje foi abandonada !!!

(...) O pessol fugiu, abandonando tudo lá, de Guileje, porque estavam a cair foguetões e granadas de canhão sem recuo, desfazendo padaria, depósito de géneros... O chão estava cheio de crateras , devido às granadas. Os militares de lá estavam há 96 horas debaixo de bombardeamento, sem beber nem comer (só algumas rações de combate que conseguiram apanhar), pois não podiam sair dos abrigos" (...).

4 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1338: Memórias de um comandante de pelotão de caçadores nativos (Paulo Santiago) (5): estreia dos Órgãos de Estaline, os Katiusha

(...) "Chegou-se à conclusão que as granadas estavam a cair em zona entre Saltinho e Queboe a arma era desconhecida. Passados alguns dias veio informação do Com-Chefe: naquele ataque falhado a Aldeia Formosa, o IN tinha utilizado pela primeira vez Foguetes Katiusha, também conhecidos por Órgãos de Estaline" (...).

6 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1155: Álbum fotográfico (Hugo Moura Ferreira) (1): Bedanda, CCAÇ 6, 1970: O Obus 14 contra o foguete Katiusha

quarta-feira, 6 de junho de 2007

Guiné 63/74 - P1820: Catió: No rasto da família Pinho Brandão: Quem era o patriarca ? (Victor Condeço / Luís Graça)

1. Mensagem do Victor Condeço (ex- Fur Mil Armamento, CCS do BCAÇ 1913, Catió , 1967/69), residente no Entroncamento:

Caro Luís:

Tudo de bom. Após ler o P1817 (1) e sobre as interrogações no teu comentário, tenho a acrescentar o seguinte:

Na verdade falta ali naquela foto, o Pinho Brandão, decerto terá sido convidado tal como outros comerciantes que também não aparecem na foto, caso dos Srs. Coelho, Adib e João da casa Gouveia.

Poderão estar na foto Catió_Quartel-31 junto do edifício da direita, junto de outra população mas não dá para reconhecer quem é quem. De memória também não sei se estiveram ou não.

Contudo pela lembrança que tenho do Sr. Manuel Pinho Brandão (2), é muito provável que não tenha estado presente. Era pessoa bastante reservada, nunca o vi no quartel nem sequer na rua.
As falas dele com militares ou civis resumiam-se ao Bom dia ou boa tarde, entre dentes, quando ao passarmos à sua casa o cumprimentávamos.

A maioria dos seus dias passava-os na sala de sua casa de esquina frente ao mercado [foto Catió_Vila-26], de portas abertas, na sua cadeira de repouso, fumando.

A lembrança que tenho da família que com ele vivia em Catió é muito vaga, mas lembro-me perfeitamente de duas bonitas, mestiças, suas filhas, das quais não me lembro o nome, jovens na casa dos 20 anos, que confeccionavam bolos de aniversário por encomenda.

Relativamente ao pai do Dr. Leopoldo Amado, pese embora as muitas vezes que terei falado com ele quando ia aos Correios à Caixa Postal nº 24, buscar o meu correio ou comprar selos, não tenho memória do Sr. Mateus e por isso o não identifico na foto, só o Leopoldo Amado nos poderá ajudar.

Luís das tentativas que te disse ter feito, só ainda tive a informação do (meu) ex-cabo Camarinha, fez a diligência que me tinha prometido, mas não conseguiu chegar á fala com o senhor por questão de minutos, no entanto disse-me que se confirma que a pessoa em questão é efectivamente de Catió, vai no entanto proceder a nova tentativa de encontro.

E é tudo por agora, recebe um abraço.

Victor Condeço

2. A Gilda acaba de nos agradecer tudo o fizemos (e ainda estamos a fazer) por ela. São palavras singelas e sinceras, que merecem publicitação:

" Acabei de ler as suas palavras e, estou a tentar encontrar algumas para lhe agradecer, mas não consigo, por isso envio-lhe um abraço do tamanho do mundo e toda a minha gratidão.

"Para a semana vou estar de férias, pois ando em mudanças mas, assim que regressar, vou enviar uma foto minha tirada ainda na Guiné e outra mais recente, para que passe a pertencer a esta fantástica família. Um grande abraço com amizade. Gilda Brás".


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Nota de L.G.:

(1) Vd. post de 5 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1817: Catió: Em busca da família Pinho Brandão (Leopoldo Amado / Victor Condeço / Armindo Batata / Gilda Pinho Brandão)

(2) Que era, presumivelmente, tio ou até avô da nossa amiga Gilda Pinho Brandão (O seu pai, Afonso, morreu, ou foi morto, quando ela tinha tenra idade, possivelmente em 1963, no início da guerra; recorde- se que ela veio para Porugal, acolhida pela família do Pina, em Junho de 1970, com sete anos, vivendo até então com a avó materna).

Repare-se, por outro lado, que o Victor só faz referência ao comerciante Manuel Pinho Brandão, que ele conheceu em Catió (1967/69), e a duas filhas, mestiças, de cerca de 20 anos. O Victor não conheceu, nem poderia ter conhecido o Afonso, que seria mais novo que o Manuel: daí eu pensar que poderia ser seu filho ou seu irmão mais novo. A Gilda não tem a certeza sobre o grau de parentesco de ambos.

Por sua vez, o Mário Dias, quando descreve a Op Tridente (1964), refere-se ao Manuel Pinho Brandão como o dono da ilha do Como... O que terá acontecido ao Afonso ? Terá sido morto pelos guerrilheiros do PAIGC ? Terá morrido num acidente de caça ou de viação ? Foi assassinado por alguém da região, por causa de negócios ? Ou até por outras razões: ciúme, vingança, ajuste de contas... Com numerosos filhos de diferentes mulheres, poderá ter havido ajustes de contas entre famílias... A Gilda refere, por exemplo, a existência de meio-irmão, ainda hoje comerciante estabelecido na Guiné-Bissau, que usa o apelido da família e não reconhece, como Pinho Brandão, os filhos do Afonso...

Por outro aldo, o velho Brandão de Ganjola, natural de Arouca, desterrado para a Guiné possivelmente no final dos anos 20 ou princípíos dos anos 30, uma figura tão bem evocada pelo Mendes Gomes (que esteve no Como, Cachil e Catió, entre 1964 e 1966) - " O Sr. Brandão, agora, era um velhote, rodeado de filhos e netos que foi gerando, ao sabor das madrugadas de batuque e da liberdade de escolha, sem custos, entre as mais viçosas bajudas da tabanca" (3)…, esse Brandão de Ganjola, pergunto eu, seria o mesmo de Catió ? Quem era, afinal, o patriarca da família ?

Enfim, não vale a pena especular sobre isto, embora esta estória (trágica, a do Afonso) também possa ser reveladora do clima social que então se vivia em Catió, no início da década de 1960...

Pela casa que existia no centro de Catió, a família Pinto Brandão deveria ser (ou ter sido) poderosa, tendo entrado possivelmemte em decadência com o início da guerra... Mas o mesmo se poderia dizer de outros comerciantes locais, de origem portuguesa ou libanesa, citados pelo Victor e que compareciam a cerimónias públicas militares (como aquela que é referida no Post P1817).

Vd. posts de:

30 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1798: Região de Catió: Descendentes da família Pinho Brandão procuram-se (Gilda Pinho Brandão)

3 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1811: Vim para Portugal aos 7 anos, em 1969, e não tenho uma fotografia de meu pai, A. Pinho Brandão (Gilda Pinho Brandão, 44 anos)

6 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1819: De Catió a Lisboa, de menina a Mulher Grande ou uma história triste com final feliz (Gilda Pinho Brandão / Luís Graça)

(3) Vd. post de 22 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1455: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (7): O Sr. Brandão, de Ganjola, aliás, de Arouca, e a Sra. Sexta-Feira