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quarta-feira, 10 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25053: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte XLI: Canquelifá, a ferro e fogo, no 1º trimestre de 1974


Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4

Guiné > Zona leste > Região de Piche > Setor de Piche > Canquelifá >  Março de 1974 > A desolação da guerra: a tabanca, depois das violentas e prolongadas flagelações, diárias  por parte do PAIGC, à luz do dia, com morteiros 120, foguetões 122 e canhões s/r, entre 18 e 22 de março de 1974, e partir de várias direções (e sobretudo Norte e Leste).

Houve mortos e feridos e graves danos materiais: pelo menos, 1 morto e 5 feridos graves entre as NT; 3 mortos, 2 feridos graves e 4 feridos ligeiros entre a população. Essas acções, que devem ter sido dirigidas pelo comandante do PAIGC Manuel dos Santos (Manecas),  revelam um certo "sentimento de impunidade", com o IN escudado nos mísseis terra-ar Strela,  russos, tentando "engodar" a nossa aviação... Nesta altura, no 1.º trimestre de 1974, Canquelifá corria o risco de tornar-se a Guileje da zona leste, o que é confirmado pelo testemunho do Amadu Djaló. 

Nuno Rubim escreveu a propósito: "Sempre presumi que a base de fogos tivesse instalada do outro lado da fronteira. O Perintrep é omisso sobre este ponto. Mas não, ao que parece era na antiga tabanca de Chauara, a escassos 10 km de Canquelifá, com o PAIGC entrincheirado, e sua artilharia defendida por sapadores e infantaria... A escassos 4 km a norte, havia outra posição, Sinchã Jidé. No caso de Chauara, o reabastecimento era feito por estrada próxima que vinha do Senegal e atravessava a Guiné-Conacri." (*) 

Pelo testemunho do ex-ten pilav António Martins de Matos, nosso grão-tabanqueiro, sabemos que da parte da FAP houve bombardeamentos nocturnos com o Dakota, chegando-se a utilizar bombas de 750 libras para aliviar a pressão sobre as NT.

Estas fotos são do álbum do nosso camarada (e amigo)  Jacinto Cristina, o famoso padeiro do destacamento da ponte de Caium (CCAÇ 3546, Piche, Ponte Caium e Camajabá, 1972 / 1974), e que vive em Figueira dos Cavaleiros, Ferreira do Alentejo,  estando ainda vivo, rijo e valente.

Observ. - O José Peixoto, ex-1º cabo radiotelegrafista, da CCAÇ 3545, que vive emVila Nova de Famalicão, e é membro da nossa Tabanca Grande, diz que estas fotos terão sido tiradas pelo "saudoso alferes (Fernando de Sousa) Henriques" (falecido em 2011),  e que se reportam aos primeiros grandes ataques de 3, 4 e 5 (sic) de janeiro de 1974 (e não de 18-24 de março), altura em que a população abandonou a tabanca e o houve um princípio de pânico e amonitação do pessoal da companhia (bem como  do Pel Art) (que queria abandonar Canquelifá), situação que o cap mil inf Fernando Peixinho de Cristo (1947-2016)  conseguiu resolver com grande calma e coragem (feito que lhe terá valido a Cruz de Guerra de 3ª classe, a par da defesa heróica de Canquelifá nos últimos meses  do final da guerra).

Fotos: © Jacinto Cristina (2010). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné] 


Guiné > Zona leste > Região de Gabu > Mapa de Canquelifá (1957) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Canquelifá (NT) e das bases de fogos do PAIGC, em março de 1974: Sinchã Jidé, a 4 km a norte, junto à fronteira com o Senegal, e Chauara, a menos de 10 km, a leste, junto à fronteira com a Guiné-Conacri.


Guiné > Zona leste > Região de Gabu > Mapa de Canquelifá (1957) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Canquelifá, Copá, Nhunanca e Chauará, bem como  da fronteira do Senegal, a norte.

Infografias: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2024)

1. Continuação da publicação das memórias do Amadu Djaló (Bafatá, 1940-Lisboa, 2015), a partir do manuscrito, digitalizado, do seu livro "Guineense, Comando, Português: I Volume: Comandos Africanos, 1964 - 1974" (Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp, + fotos, edição esgotada) (*).

O nosso  camarada e amigo Virgínio Briote, o editor literário ou "copydesk" desta obra,  facultou-nos uma cópia digital. O Amadu Djaló, membro da Tabanca Grande, desde 2010, tem mais de nove dezenas de referências no nosso blogue. Tinha um 2º volume em preparação, que a doença e a morte não  lhe permitaram ultimar.



Capa do livro do Amadu Bailo Djaló,
"Guineense, Comando, Português: I Volume:
Comandos Africanos, 1964 - 1974",
Lisboa, Associação de Comandos,
2010, 229 pp, + fotos, edição esgotada.



O autor, em Bafatá, sua terra natal,
por volta de meados de 1966.
(Foto reproduzida no livro, na pág. 149)

Síntese das partes anteriores:

(i) o autor, nascido em Bafatá, de pais oriundos da Guiné-Conacri, começou a recruta, como voluntário, em 4 de janeiro de 1962, no Centro de Instrução Militar (CIM) de Bolama;

(ii) esteve depois no CICA/BAC, em Bissau, onde tirou a especialidade de soldado condutor autorrodas;

(iii) passou por Bedanda, 4ª CCaç (futura CCAÇ 6), e depois Farim, 1ª CCAÇ (futura CCAÇ 3), como sold cond auto;

(iv) regressou entretanto à CCS/QG, e alistou-se no Gr Cmds "Os Fantasmas", comandado pelo alf mil 'cmd' Maurício Saraiva, de outubro de 1964 a maio de 1965;

(v) em junho de 1965, fez a escola de cabos em Bissau, foi promovido a 1º cabo condutor, em 2 de janeiro de 1966;

(vi) voltou aos Comandos do CTIG, integrando-se desta vez no Gr Cmds "Os Centuriões", do alf mil 'cmd' Luís Rainha e do 1º cabo 'cmd' Júlio Costa Abreu (que vive atualmente em Amesterdão);

(vii) depois da última saída do Grupo, Op Virgínia, 24/25 de abril de 1966, na fronteira do Senegal, Amadu foi transferido, a seu pedido, por razões familitares, para Bafatá, sua terra natal, para o BCAV 757;

(viii) ficou em Bafatá até final de 1969, altura em que foi selecionado para integrar a 1ª CCmds Africanos, que será comandada pelo seu amigo João Bacar Djaló (Cacine, Catió, 1929 - Tite, 1971)

(ix) depois da formação da companhia (que terminou em meados de 1970), o Amadu Djaló, com 30 anos, integra uma das unidades de elite do CTIG; a 1ª CCmds Africanos, em julho, vai para a região de Gabu, Bajocunda e Pirada, fazendo incursões no Senegal e em setembro anda por Paunca: aqui ouve as previsões agoirentas de um adivinho;

(x) em finais de outubro de 1970, começam os preparativos da invasão anfíbia de Conacri (Op Mar Verde, 22 de novembro de 1970), na qual ele participaçou, com toda 1ª CCmds, sob o comando do cap graduado comando João Bacar Jaló (pp. 168-183);

(xi) a narrativa é retomada depois do regresso de Conacri, por pouco tempo, a Fá Mandinga, em dezembro de 1970; a companhia é destacada para Cacine [3 pelotões para reforço temporário das guarnições de Gandembel e Guileje, entre dez 1970 e jan 1971]; Amadu Djaló estava de licença de casamento (15 dias), para logo a seguir ser ferido em Jababá Biafada, sector de Tite, em fevereiro de 1971;

(xii) supersticioso, ouve a "profecia" de um velho adivinho que tem "um recado de Deus (...) para dar ao capitão João Bacar Jaló"; este sonha com a sua própria morte, que vai ocorrer no sector de Tite, perto da tabanca de Jufá, em 16 de abril de 1971 (versão contada ao autor pelo soldado 'comando' Abdulai Djaló Cula, texto em itálico no livro, pp.192-195) ,

(xiii) é entretanto transferido para a 2ª CCmds Africanos, agora em formação; 1ª fase de instrução, em Fá Mandinga , sector L1, de 24 de abril a fins de julho de 1971.

(xiv) o final da instrução realizou.se no subsector do Xitole, regulado do Corunal, cim uma incursão ao mítico Galo Corubal.

(xv) com a 2ª CCmds, comandada por Zacarias Saiegh, participa, em outubro e novembro de 1971, participa em duas acções, uma na zona de Bissum Naga e outra na área de Farim;

(xvi) em novembro de 1971, participa na ocupação da península de Gampará (Op  Satélite Dourado, de 11 a 15, e Pérola Amarela, de 24 a 28);

(xvii) 21-24 dezembro de 1971: Op Safira Solitária: "ronco" e "desastre" no coração do Morés, com as 1ª e 2ª CCmds Africanos  (8 morts e 15 feridos graves);

(xviii) Morés, sempre o Morés... 7 de fevereiro de 1972, Op Juventude III;

(xix) o jogo do rato e do gato: de Caboiana a Madina do Boé, por volta de abril de 1972;

(xx)  tem um estranho sonho em Gandembel, onde está emboscado très dias: mais do que um sonho, um pesadelo: é "apanhado por balantas do PAIGC";

(xxi) saída para o subsetor de Mansoa, onde o alf cmd graduado Bubacar Jaló, da 2ª CCmds Africanos, é mortalmente ferido em 16/2/1973 (Op Esmeralda Negra)M

(xxii) assalto ao Irã de Caboiana, com a 1ª CCmds Africanos, e o cap cav 'cmd' Carlos Matos Gomes como supervisor;

(xxiii) vamos vê-lo a dar instrução a futuros 'comandos' no CIM de Mansabá, na região do Oio, no primeiros meses do ano de 1973, e a fazer algumas "saídas" extras (e bem pagas) com o grupo do Marcelino, ao serviço do COE (Comando de Operações Especiais), que era então comandado pelo major Bruno de Almeida; mas não nos diz uma única sobre essas secretas missões; ao fim de 12 anos de tropa, é 2º sargento e confessa que está cansado;

(xxiv) antes de ir para CCAÇ 21, como sede em Bambadinca, como alferes 'graduado" (e sob o comando do tenente graduado Abdulai Jamanca, ainda irá participar na dramática Op Ametista Real, contra a base do PAIGC, Cumbamori, no Senegal, em 19 de maio de 1973;  esta parte do seu  livro de memórias  (pp. 248-260) já aqui foi transcrita no poste P23625;

(xxv) no leste, começa por atuar no subsetor do Xime, em meados de 1973;

(xxvi) em setembro de 1973, quando estava em Piche, já na CCAÇ 21, recebe a terrível notícia da morte do seu querido irmão mais novo, Braima Djaló, da 3ª CCmds;

(xxvii)  embora amargurado com a morte do seu irmão mais novo, e cansado, ao fim de 12 anos de tropa e de  guerra, o Amadu Djaló mantem-se na CCAÇ 21, como alferes graduado; vemo-lo agora no início de 1974 em Canquelifá, em reforço da CCAÇ 3545 / BCAÇ 3883 (1972/74).


 Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte XLI:

Canquelifá a ferro e fogo, no 1.º trimeste de 1974 (pp. n 266-272)


A CCaç 21, comandada pelo tenente Jamanca, foi destacada para apoiar a companhia estacionada em Canquelifá 
[CCAÇ 3545 / BCAÇ 3883] . Partimos de Piche com os milícias das tabancas da zona a picarem a estrada.

Quando chegámos reunimo-nos com o capitão[1] da companhia de europeus. A primeira coisa que nos disse foi que não tinha instalações para nos alojarmos. Jamanca respondeu que não havia problemas, que nós nos havíamos de desenrascar. Falámos com o filho de régulo, Mamadu Sané, mais conhecido por Mama Sané, que nos arranjou uma casa com cinco quartos e respectivas camas e um sala grande com mesas e cadeiras. Tínhamos mais do que esperávamos.

Depois de descansarmos um bocado, fomos chamados para o almoço, que dois soldados europeus tinham colocado nas mesas da casa onde ficámos. Enquanto me estava a lavar,  ouvi Demba Chamo dizer qualquer coisa que não percebi mas ouvi a resposta do Jamanca, que comíamos e depois reclamávamos. 

Quando entrei na sala vi duas travessas de alumínio, muito velhas, uma rota e sem pega, os talheres muito velhos também. Estávamos todos muito calados até à chegada do Sada Candé, que mal se sentou perguntou se era naquelas sucatas que íamos comer. Jamanca, muito calmo, voltou a dizer:

- Vamos comer primeiro, depois falámos com o capitão. 

Mas Sada disse que não comia e todos nós ficámos a olhar para ele.

Sada interpelou dois soldados da CCaç 21, que estavam a passar, mandou-os pegar na travessa e na terrina e passou para a frente deles dizendo-lhes para irem atrás. Não o podia deixar ir sozinho, levantei-me e segui-o até ao gabinete do capitão. 

Quando chegámos, Sada perguntou ao capitão se era nessas travessas que nos davam a comida. Quando o capitão ia começar a falar, Sada pegou na terrina da sopa e atirou-a para o chão, enchendo de sopa as calças do capitão. Fiquei muito envergonhado e ouvi o capitão dizer que o assunto não era com ele, era com o alferes tal, não me lembro do nome. Sada, muito excitado, foi à procura do alferes e quando reparámos estavam os dois aos socos, um ao outro, e depois continuaram a lutar no chão.

Soldados africanos e europeus levantaram-se, a ver o espectáculo. Um alferes europeu que estava à minha beira disse-me para o ajudar a separá-los. 

Isto é uma vergonha, dois oficiais a brigar, com os soldados todos a ver, vamos separá-los já disse-me.

O capitão mandou recolher a comida que estava em cima das mesas deles e mandou levá-las para as nossas. Mas nós já tínhamos perdido a vontade de comer.

À noite, mais calmos, reunimo-nos para discutir o assunto. Resolvemos levantar os géneros, entregá-los ao filho do régulo e pedir-lhe que fosse a mulher dele a cozinhar para nós. Jamanca, sempre muito calmo, disse-nos para não contarmos a ninguém o que se tinha passado. Que, como tínhamos visto, o capitão e os oficiais da companhia eram boas pessoas e que devíamos esquecer essa história das terrinas.

Eu tinha conhecido Canquelifá muitos anos atrás, em 1961, quando andei por lá com o meu primo Ussumane Injai a comprar gado para o vendermos depois em Bissau. Nessa altura, Canquelifá era uma terra pequena, tinha só duas ou três lojas.

Agora estava aqui outra vez, no início de 1974[2], e Canquelifá estava muito diferente. As tabancas que havia à volta, junto às fronteiras com o Senegal e com a Guiné-Conacri,  estavam todas arrasadas, a população tinha desaparecido

A zona estava nas mãos do PAIGC e Canquelifá agora era um local muito perigoso, sempre à espera de ataques, do lado do Senegal ou da Guiné-Conacri. As estradas estavam semeadas de minas, se Canquelifá precisasse de apoio à noite, não podia ser socorrida por estrada, de noite não se podiam picar estradas. Foi nesta situação que encontrámos Canquelifá.

Estavam ali duas companhias[3], uma de europeus e a nossa, oito pelotões ao todo. Fizemos um programa de saídas, todos os dias de manhã saía um bigrupo nosso até a uma distância de cinco a sete kms e regressava por volta das duas da madrugada. Julgávamos que,  a partir dessa hora, era mais difícil haver ataque do PAIGC. Num dia saía um bigrupo de africanos, no dia seguinte um de europeus. Desta forma, cada bigrupo descansava três dias.

Em algumas dessas saídas, deixávamos o quartel, de manhã muito cedo, na direcção de Nhunanca. Depois de andarmos um bom bocado, entrávamos numa lala[4], quase sem árvores, com o capim muito alto, que as populações geralmente queimavam na primavera.

Depois de atravessarmos para o outro lado da lala, permanecíamos aí algum tempo, até cerca das 15h00, quando decidíamos abandonar o local. Caminhávamos mais dois a três kms e emboscávamo-nos. Ocupávamos dois caminhos, o que ia para Nhunanca e o que levava a Chauara. Ficávamos naquele local durante cerca de uma hora e regressávamos, contornando o quartel e entrando pela entrada contrária à saída para Copá. Fizemos este trabalho várias vezes, com uma ou outra alteração no percurso.

Numa dessas saídas[5], um dos nossos bigrupos, comandado pelos alferes Ali Sada Candé e Braima Baldé, quando estava emboscado, a cerca de dois kms do aquartelamento, avistou, por volta das 16 horas, um grupo do PAIGC a atravessar uma lala. Estavam a deslocar-se na direcção do quartel.

O nosso bigrupo foi no encalço deles, a observarem o que iam fazer. Cerca de um quilómetro andado o pessoal do PAIGC parou, debaixo de uma grande árvore. Um deles estava a preparar-se para subir a árvore, quando o nosso bigrupo os atacou, de surpresa. 

O pessoal do PAIGC fugiu como pôde, deixando no local três guerrilheiros mortos[6], as armas e um rádio Racal[7], que viemos a descobrir, mais tarde, tinha sido perdido por nós em Morés, em 23 de dezembro de 1971.

Era a vez do meu grupo ficar no aquartelamento, mas quando começámos a ouvir o tiroteio saímos imediatamente. Quando os encontrámos o caso já estava arrumado, ajudámo-los a trazer os corpos dos guerrilheiros que depositámos junto à parada.

Nesse mesmo dia[8], por volta das 17h30, o PAIGC desencadeou um ataque a Canquelifá. Ou de represália, ou porque também tinham ouvido os tiros. Um dos primeiros mísseis acertou na central eléctrica e uma grande bola de fumo negro começou a subir. De vez em quando paravam os bombardeamentos, depois recomeçavam. Durou quase a noite toda este ataque. Não me lembro de ter visto algum míssil cair fora do arame farpado.

A tabanca ardeu e ficou completamente destruída. Morreram durante o ataque três pessoas: um furriel europeu, salvo erro chamado Silva, um soldado negro, o Mica Djaló, que eu tinha eliminado no 4º curso de comandos em Mansabá,  e um rapaz de cerca de 13 ou 14 anos que trabalhava para o furriel europeu que tinha morrido[9].

Durante a flagelação, que nunca mais acabava, a certa altura, chegou-se ao pé de mim um soldado da minha companhia, chamado Ansumane, que me disse que, no local onde se encontrava, tinham morrido todos, que ele tinha sido o único que tinha escapado. Perguntei-lhe pelo comandante do grupo, respondeu que não sabia. Chamei o Mamadu Mané, que era o comandante da milícia local, e disse-lhe para ir comigo, acompanhados de alguns voluntários do meu grupo.

Nessa altura, estávamos debaixo de fogo, continuavam a cair mísseis na zona do quartel, mas não impediram a nossa ida. Quando lá chegámos vimos três corpos enterrados numa vala e alguns feridos. Conseguimos retirá-los, com muita dificuldade, e transportar os feridos para a enfermaria, onde lhes prestaram os primeiros socorros, ainda durante a madrugada, até que, de manhã, foram evacuados.

Foram muitas as operações e emboscadas que fizemos na zona de Canquelifá e Piche. É difícil, para mim, recordar os pormenores de todas. De algumas eu fui tomando pequenas notas. Noutras, eu estava cansado e também aconteceu ter que sair outra vez. E depois esqueci-me.

Recordo-me de duas emboscadas[10], entre Piche e Canquelifá, em que numa, mesmo ao nosso lado, os milícias tiveram um morto e alguns feridos e na outra só tivemos alguns feridos ligeiros.

A minha companhia saiu uma vez com a companhia de europeus, para a zona do Gabu. Saímos de Piche, em viaturas, e cerca de cinco minutos depois caímos numa emboscada[11]. Tivemos seis mortos[12], entre as quais o Bailo, soldado do meu grupo. Nesta emboscada perdemos um carro blindado[13].

De outra vez, deixámos Piche para irmos ao rio Corubal[14]. Quando nos estávamos a aproximar do rio,  vimos pegadas frescas, caixas de fósforos e maços de cigarros vazios. Era uma zona muito utilizada pelo inimigo. 

Na conversa com o guia, este disse-me que todos os acampamentos do PAIGC ficavam na outra margem e que para este lado só vinham quando faziam patrulhas ou para atacarem o quartel, a maior parte durante a noite.
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Notas do autor ou do editor literário (VB):

[1] Nota do editor: cap mil inf inf  Fernando Peixinho de Cristo (1947-2004).

[2] Nota do editor: é início de 1974 (e não em  1973, como por lapso vem no original)

[3] Nota do editor: CCaç 3545 e CCaç 21.

[4] Clareira.

[5] Nota do editor: Acção “Minotauro”, em 7/01/1974. (***)

[6] Um cubano e dois fulas (na realidade, um deles era cabo-verdiano, o Jaime Mota, e o cubano seria o tenente
 Ramón Maestre Infante), que foram transportados para Canquelifá, onde ficaram expostos durante os bombardeamentos. Depois, durante uma acalmia, foram enterrados num local junto à pista de aviação, em dois buracos abertos pelos bombardeamentos. (***)

[7] Quando foi emitida para o QG, a mensagem da operação, com a indicação do material apreendido, alguém confirmou, através do nº do aparelho, que o rádio Racal era o que tínhamos perdido, cerca de dois anos antes, em Morés.

[8] Nota do editor: 7 Janeiro 1974.

[9] Nota do editor: em consequência desta flagelação sobre Canquelifá, executada ao final do dia 7 janeiro 1974, morreram no local o fur mil OE Luís Filipe Pinto Soares e os soldados Donsa Boaró, da CCaç 21,  e Mica Baldé, do 6º PelArt /GAC 7.

[10] Nota do editor: uma no itinerário entre Piche e Canquelifá ocorreu em 26mar74, que causou a morte a Adulai Buaró e Iaia Sissé, ambos soldados milicias do Pel Mil 268, adstrito à CCaç 3545,  e Ibraima Candé, soldado da CCaç 21.

[11] Nota do editor: em Bentém, no itinerário Piche-Canquelifá.

[12] Nota do editor: nesta emboscada, em 22 março 1974, menos de 24 horas depois da operação “Neve Gelada” (às 15h00 de 21mar74, o BCmds capturou ao IN 3 morteiros 120), morreram o soldado-condutor da chaimite, João Costa Araújo, Victor Manuel de Jesus Paiva, soldado-condutor, os furriéis José António da Costa Teixeira e Manuel Joaquim Sá Soares, do ERec 8840, sedeado em Bafatá,  e os soldados Bailó Baldé, da CCaç 21, e Bambo Nanqui, do 12ºPel Art / GAC7.

[13] Nota do editor: viatura chaimite.

[14] Corubal foi o nome que os Fulas lhe deram. Os Futa-Fulas chamam-lhe Coli.

(Seleção, fixação / revisão de texto, negritos, links, fotos, notas adicionais, título, subtítulo: síntese das partes anteriores: LG)
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Notas do editor LG:

(*) Vd. poste de 17 de maio de  2016 > Guiné 63/74 - P16098: O que dizem os Perintreps (Nuno Rubim) (4): A um mês do 25 de abril de 1974, o IN ataca Canquelifá durante 4 dias, com um grande potencial de fogo, e faz violenta emboscada no itinerário Piche-Nova Lamego a coluna auto (Perintrep 12/74, relativo ao período de 17 a 24/3/1974)


(***) Vd. poste de  15 de fevereiro de 2022 > Guiné 61/74 - P23001: Memórias cruzadas da região de Gabu: as origens do desassossego em Copá e as sequelas da metralha entre o Natal de 73 e 7Jan74 (Jorge Araújo)

Vd. também poste de 30 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16656: Tabanca Grande (497): José Peixoto, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista da CCAÇ 3545/BCAÇ 3883 (Canquelifá, 1972/74), nosso 731.º Grã-Tabanqueiro

quarta-feira, 2 de agosto de 2023

Guiné 61/74 - P24527: De volta às montanhas de Liquiçá, Timor Leste, por mor da Escola de São Francisco de Assis, em Boebau (4.ª estadia, 2023): crónicas de Rui Chamusco / ASTIL (excertos). Parte VII: 26, 28, 29 de abril, 1, 2, 3, 4 ,5, 10, 16 de maio de 2023... “Cada criança que nasce é sinal de que Deus ainda não está zangado com a humanidade”...


Timor Leste > Dili  > Palácio do Governo _ 2023 > Foto do Jornal Tornado, "on line" (Jornal global para a lusofonia), 23 de junho de 2023 (com a devida vénia) 


1. Continuamos a publicar alguns excertos das crónicas que o nosso amigo Rui Chamusco (76 anos, professor de educação musical reformado, do Agrupamento de Escolas de Ribamar, Lourinhã, natural de Malcata, concelho de Sabugal, cofundador e líder da ASTIL - Associação dos Amigos Solidários com Timor Leste) nos mandou, na sequência da sua 4.ª viagem àquele país lusófono (março-maio de 2023).

Esteve lá já 4 vezes, em 2016, 2018, 2019 e agora em 2023, no àmbito da construção, organização e funcionamemento da Escola de São Francisco de Assis, em Boebau, ;Manati, município de Liquiçá. Desta vez, juntou-se a ele um casal da Lourinhá, ela, professora de educação especial, já com uns bons anos passados em Macau, e ele, contabilista, reformado.

O Rui Chamusco, o "abô" Rui, é juntamente com a família luso-timorense Sobral um dos grandes pilares deste projeto de solidariedade com o povo timorense. É um exemplo inspirador, de amor à lusofonia e de solidariedade para com o povo de Timor Leste, que merece ser conhecido pelos mossos leitores. Além disso, há aspetos da história, da geografia e da cultura timorenses que nos são totalmente desconhecidos.

Para os leitores que se queiram associar a este projeto, aqui fica a conta solidária da Associação dos Amigos Solidários com Timor Leste (ASTIL)

IBAN: PT50 0035 0702 000297617308 4

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De volta às montanhas de Liquiçá, Timor Leste, por mor da Escola de São Francisco de Assis, em Boebau (4ª estadia, 2023):
crónicas de Rui Chamusco
/ ASTIL (excertos) (*)

Parte VII -26, 28,  29 de abril, 1, 2, 3, 4 ,5, 10, 16 de maio de 2023 



26.04.2023, quarta feira - "Em cada esquina um amigo / Em cada rosto igualdade"...


Ainda em rescaldo do 25 de Abril, hoje tivemos o privilégio de ir receber ao aeroporto Nicolau Lobato os nossos amigos e vizinhos da Lourinhã - o casal João e Maria João Picão. 

Foi uma alegria partilhar beijos e abraços, depois da longa viagem que os trouxe até cá, até este país irmão que alguns temos a sorte de conhecer, mas que muitos outros assim o desejariam também. 

A colega Maria João é educadora com larga experiência no ramo, e sempre manifestou a vontade de visitar a Escola São Francisco de Assis, em Boebau/ Manati e de aí trabalhar alguns dias com as crianças e as cuidadoras do pré-escolar. Para a semana lá iremos nós cumprir a missão. E, como o homem não deve separar o que Deus uniu, vai marido, vai mulher e vamos todos a caminho da montanha.

Para surpresa minha tive conhecimento através deste casal que, a residir na Praia da Areia Branca, na Lourinhã, está o Dr. Pedro Serrano. Quando ouvi o seu nome estranhei e perguntei: “Pedro Serrano? Do Porto? Filho do Dr. Joaquim Serrano?!...

” Sim!” responderam de imediato. Então não é que nos anos 65-70, sendo eu estudante de Teologia no Seminário dos Capuchinhos no Amial (Porto), dei aulas de guitarra ao Pedro, agora sr. doutor, que então era estudante de medicina. Ou seja tão perto um do outro, ambos a residir na Lourinhã, e tão longe, pois nunca mais nos vimos nem tivemos noticias um do outro. Vai ser bonito, quando eu chegar à Lourinhã e bater à sua porta! Obrigado , amigos Picão. (...)


Timor Leste > Liquiçá > Manati > Boebau > 2023 > "Só eu sei por quê. Mas esta despedida da escola, dos lugares, das crianças e das gentes de Boebau custou-me muito. Que seja o que Deus quiser."


Timor Leste > Liquiçá > Manati > Boebau > 2023 > Transporte coletivo, uma "anguna"


Timor Leste > Liquiçá > Manati > Boebau > 2023 > A "pickup" da AstilMB (Associação de Amigos Solidários com Timor Leste de Manati / Boebau).

Fotos (e legenda): © Rui Chamusco (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




28.04.2023, sexta feira  - Solitário ou Solidário?

Quem puder entender que entenda. Assim vai a administração pública neste país. Assim vai a segunda língua oficial em Timor Leste.

É pela quarta vez que temos de vir a Balide, ao edifício da Administração Pública / Serviço de Registos de Veículos Motorizados, a fim de fazermos o registo de propriedade da pick-up em nome da AstilMB (Associação de Amigos Solidários com Timor Leste de Manati / Boebau). 

Muito tempo, muito suor no corpo, muita falta de paciência que nos espera. Mas tem de ser, e “o que tem de ser tem muita força". O que vale é resiliência e a competência do Eustáquio.

E, quando pensávamos que o dossiê já estava quase todo bem, eis que o Eustáquio vem até mim e pergunta: “Tiu, é Associação de Amigos Solidários ou Solitários?” “Solidários” respondi. “Então aqui está escrito Solitário”. 

Ficai danado quando confirmei o que me dizia. Praguejei, chamei nomes e não sei quantas coisas mais. Então se no preenchimento dos nossos papéis estava “Solidários” porque é que “inteligências superiores” escreveram “Solitários”, que é precisamente o contrário. 

Incompetência? Não percebem o português? E vai daí, mais voltas, mais papéis e uma vontade enorme de dar um murro na mesa em sinal de protesto.

Ainda relacionado com este acontecimento, deu para ver os esquemas utlizados para resolver estes assuntos, depressa e bem. Como em todo o lado, quem tiver “cunhas” e conhecimentos, depressa resolve o problema. Há serviços tolerados, mas que têm de ser pagos, com distribuição da importância estabelecida pelos diferentes intervenientes. Todos comem do mesmo. Alguns destes “brokers” (não sei se é nome da marca da camisola ou se é mesmo o nome técnico por que são identificados) são conhecidos e movimentam-se à vontade no átrio de espera, passam de guichê (loket) em guichê  dando andamento ao dossiê, enquanto o proprietário do veículo espera calmamente num sítio qualquer combinado ou até é feito por telemóvel.

Nós, embora pudéssemos pagar a importância que eles levam, não quisemos alinhar neste esquema mafioso e, portanto, não nos podemos queixar dos tormentos por que passamos.


29.04.2023, sábad0 - Companhia Picão & nós

Foi um dia bem passado. Em boa companhia, João e Maria João Picão e nós (Eustáquio, Adobe e eu), visitamos os sítios mais icónicos de Dili: Lahane, cemitério de Santa Cruz, Escola Portuguesa Ruy Cinatti, Catedral, canto do Artesanato, mercado e largo de Tassi Tolo, monumento a João Paulo II (que maravilhosa paisagem sobre o mar!...), Timor Plaza, igreja de Motael, monumento aos jovens resistentes, Páteo, Bairro Pité, Ailok Laran. 

Outros locais interessantes já tínhamos visitado em dias anteriores: Cristo Rei, Praia da Areia Branca. Houve tempo para tudo, até para dar uns passinhos de dança ao toque do acordeão e do violino. E como o “loro mono” (pôr do sol) já se foi, lá fomos nós também levar estes amigos à casa onde pernoitam, em Bidau. (.
 

01.05.2023, segunda feira  - Semana especial

Começa hoje a semana esperada, em que a educadora Maria João, o seu esposo João Picão, o Eustáquio e eu prometemos passar em Boebau, promovendo atividades e ensinamentos na ESFA - Escola São Francisco de Assis “Paz e Bem”. 

Como sempre, as viagens de ida e volta para Boebau causam-nos sempre alguma ansiedade devido às dificuldades do caminho e às peripécias por que teremos de passar. E lá vamos nós “cheios de pica”, desta vez também de Picão (família Picão). 

Em Ai Pelu fizemos uma pequena paragem a fim de recebermos as ofertas que a professora Cristina nos entregou para a ESFA, pois, devido ao atraso com que chegámos, já não lhe foi possível ir connosco até Boebau. Obrigado, professora, pelas bolas e pelo saco de arroz que nos entregou!

Chegámos, sem incidências de percurso, ao princípio da tarde e, como os alunos ainda estavam de férias, foi ocasião de mostrar em pormenor aos nossos amigos vindos de Portugal a Escola e a Casa dos professores onde ficamos alojados. Ainda que com condições mínimas, este espaço permite-nos alguma privacidade e descanso.

E, perante os condicionamentos a que o casal Picão fica sujeito (por exemplo: 2 colchões individuais terem de dormir 3 pessoas), o João Picão sai-se com esta: “O melhor é juntar os dois colchões e dormir por turnos”. Ora toma lá esta!... Coitado, não teve outro remédio que dormir agarradinho á esposa, saindo de vez em quando do leito conjugal para bater com o costeado no chão, ou então roçado à parede. “Ó Costa! A vida costa!”


01.05.2023, segunda feira  - Lagartos, Teques, Toquês, aves e outros répteis

Se já o colchão era tão exíguo, agora são as bichezas cá do sítio que assustam os visitantes. Podem entrar onde quiserem porque todas as casas timorenses têm aberturas suficientes que lhes permitem a entrada. Sobretudo os Teques (osgas) que são presença constante em qualquer espaço. Depois de se taparem alguns buracos, não restava outra alternativa a de não ser fechar os olhos e deixar-se dormir, talvez com sonhos mirabolantes que incluam estas novas experiências.

Mesmo em frente da casa, está uma manga, uma árvore de uns três metros de altura, que serve de poleiro para galos e galinhas da vizinhança. É impressionante os voos rasgados de baixo para cima, ao pôr do sol, e do alto para baixo, ao nascer do sol. É de notar também a hierarquia que respeitam. Primeiro os maiores (galos e galinhas) e depois por ordem decrescente, os mais pequenos. Todos em voo rasgado. Depois cantam, fazem a alvorada, até que aparece alguém com uma mão cheia de milho para onde correm apressados. Logos que os galináceos desarvoram do sítio, chega a reboada das aves mais pequeninas, na sua maioria pardais ou outra espécie qualquer.


02.05.2023, terça feira - Escola, hino da escola 
e fortes emoções

De manhazinha, toca a levantar. Às oito horas estamos a caminho da escola, e quando chegamos (8.15h) já as crianças povoavam o átrio da mesma. Muitas saudações, muitos beija-mão, muitos sorrisos. 

Uma grande alegria de rever estes rostos de crianças e adultos, que já fazem parte da minha vida. O carinho que manifestam sobretudo ao abô Rui emociona-me, e às vezes até me faz chorar. (Sim, porque os homens também choram.) 

Depois da entrada organizada, onde cada criança nos saúda (Bom dia professor! Bom dia, professora!), cantámos o hino da escola. Um momento indescritível devido ao entusiasmo com que estas crianças cantam. E eu também vi a Maria João com a lágrima no canto do olho. (Sim, porque as mulheres também choram.)

Quem não estava nada à espera era o João, que foi mandado chamar, a fim de impor o tais de boas vindas às visitas. Creio que ele também se emocionou. Foi o que eu senti no abraço que nos demos.

Foi uma manhã repleta de coisas boas, em que educadores e educandos participaram de alma e coração.

De tarde, fomos visitar a família do Bô Zé e a família do senhor Francisco, pois tinha o donativo dos padrinhos para lhe entregar. Um momento único que muito nos interpelou, pela simplicidade e generosidade com que nos receberam e partilharam o espaço da sua humilde habitação. Que São Francisco olhe também por este Francisco de Boebau!


02.05.2023, terça feira  - O inesperado acontece


Já noite, sentados à soleira da porta, aparece a família Francisco (o próprio, a esposa e o filho Joel) que trazia ao colo um bonito galo, talvez o rei da capoeira, e que eu pensava que seria para vender, com certeza para a luta de galos que por Timor é habitual.

Surpresa! Afinal este galo não é para vender, não. É para oferecerem ao abô Rui, por que lhe estão muito gratos pelo que tem feito por eles. Fiquei sem palavras. E ainda que eu me escusasse a recebê-lo, argumentando que não era necessário, que eu não o podia levar para Portugal, etc, etc... não houve outra alternativa que aceitá-lo e trazê-lo para Ailok Laran, para a casa do Eustáquio, que é onde ele vai ficar, mas com um pedido meu: “por favor não matem este galo. Deixem-no cantar até morrer”. Tenho a certeza de que irão respeitar a minha vontade.

Mas o galinheiro foi crescendo, através de novas ofertas do Cesáreo, do Bô Zé, do Sr. Manuel (antigo comandante de guerrilheiros no tempo da invasão indonésia). Ou seja, quem quer galinhas,  venha até Boebau, e faça por merecê-las.


03.05.2023, quarta feira - Vida dura,  a da montanha!...

Hoje aconteceu aos outros. A angunan do Silvestre, que vai e vem todos os dias transportando pessoas com os seus bens e haveres, de Manati até Liquiçá, estava a tardar em chegar. Com alguma preocupação, tentamos saber o que se passava, pois nunca mais chegava. A Adelina que estava nesta viagem de ida e volta ficou de nos fazer algumas compras, e esperávamos por ela a todo o instante. Por isso pedimos ao Nico, seu marido, que a contatasse. 

Foi então que ela explicou: “ a angunan não pode passar, devido a obras no caminho. Teve de ficar do lado de lá, e nós vamos todos a pé”. Mais de uma hora, de noite, com o peso das compras aos ombros ou na mão. Alguns ainda fomos ao seu encontro, mas já pouco caminho fizemos. Pela luz das pilhas de gente a falar, pdressa nos demos conta que estavam muito perto, quase a chegar. É assim a vida nas montanhas. De repente, surge algo de imprevisto e toca a desenrascar nem que seja fazer o caminho a pé.


04.05.2023, quinta feira  - Instrumento da paz: 
encontro com os desavindos

Ouvi dizer da rivalidade existente, em Boebau, de dois dos meus primeiros amigos, que até são familiares, e que por incompreensão um do outro, até já se ameaçam violentamente (aqui em Timor a arma mais utilizada é a catana). 

Não conforme com esta atitude de vingança mútua, pedi ao Eustáquio que os avisasse de que eu queria ter um encontro com eles. A minha dúvida era se eles aceitariam esse encontro.

À hora marcada, na Escola São Francisco de Assis “Paz e Bem”, aí estava eu, o Eustáquio e os dois desavindos. Como o katuas do grupo pedi a palavra para lhes dizer o motivo desta reunião, apelando à nossa amizade, ao espírito de Paz e Bem de Francisco de Assis, padroeiro da nossa escola, à necessidade de nos perdoarmos uns aos outros nem que seja 70 vezes 7, à concórdia e à união. 

Por sua vez o Eustáquio, pessoa que eles muito estimam e consideram, também lhes falou ao coração. As minhas palavras finais foram:” A decisão é vossa. Mas, eu ficarei muito triste se tiver de partir para Portugal sabendo que vós continuais em guerra. Pelo contrário, ficarei muito, muito contente se perdoarem um ao outro e fizerem as pazes”. 

Dada a palavra a cada um, ambos manifestaram, até com emoção e com lágrimas, que estavam dispostos a perdoar. E agradeceram ao abô Rui ter proporcionado este encontro, pois já há muito tempo que o desejavam, mas ninguém os ajudava a encontrar e perdoar.

Abraçaram-se, perdoaram e até parece que ficaram mais aliviados. Esperemos que este acordo de paz seja duradoiro, e que São Francisco lhes sirva de exemplo e proteção. Quanto a mim, estou feliz por ser, à semelhança de Francisco de Assis, um instrumento de paz.


04.05.2023, quinta feira  - “Cada criança que nasce é sinal...”

“Cada criança que nasce é sinal de que Deus ainda não está zangado com a humanidade”.

Talvez o habitante mais novo de Boebau. Nasceu a noite passada. Os pais, dois jovens que moram mesmo à nossa beira, foram pais pela primeira vez. Agora são quatro, porque vivem em casa da avó paterna.

E, como a criança apresentava bastante fraqueza devido à mãe não produzir o leite suficiente para o amamentar, foi convocada a família com relevo para o irmão mais velho, a fim de fazerem o ritual prescrito para esta situações. A crença desta gente faz-nos pensar e repensar. Acredita quem quiser…

À família, aos pais e à criança, que Deus os proteja. Que o menino cresça em estatura, sabedoria e graça. Parabéns Zé, esposa e menino!


05.05.2023, sexta feira  - Meninas que leem tão bem!

A Adelina, que trabalha na ESFA e ajuda na preparação da liturgia na igreja (capela), transbordava alegria e alguma vaidade ao contar-nos o que as pessoas diziam das meninas Titânia,  alunas da nossa escola, depois de lerem as leituras na missa do domingo passado. 

“Quem são aquelas meninas que leem tão bem?” Pois, estas meninas frequentam o 4º ano do ensino primário da Escola São Francisco de Assis em Boebau. Até nós nos envaidecemos com estes elogios. O que quer dizer que, apesar das dificuldades que a nossa escola enfrenta, nomeadamente com contratação de professores credenciados, o nível de ensino tem-se distinguido pelas boas prestações que alunos e professores têm demonstrado. 

Por vezes, a boa vontade e a dedicação ao trabalho valem mais que canudos e diplomas. Parabéns, meninas e “professores” ! Continuem a fazer o melhor que souberem. O nosso apoio nunca lhes irá faltar...


05.05.2023, sexta feira - Um “adeus” sentido

Só eu sei por quê. Mas esta despedida da escola, dos lugares, das crianças e das gentes de Boebau custou-me muito. Que seja o que Deus quiser.

À hora combinada lá estamos nós de partida, rumo a Dili. Talvez a viagem menos penosa das que fizemos de Boebau/Liquiçá, percorrendo outros caminhos. Mas, como diz o ditado, “todos os caminhos vão dar a Roma”. Por isso a chegada ao destino processou-se dentro da normalidade.

Obrigado, Maria João e João Picão,  pela vossa disponibilidade e generosidade. É dando que se recebe, e penso que depois de tudo o que destes a esta gente também vos sentireis “de alma cheia” com esta experiência radical. “Adeus! Adeus! Adeus, Maria João”, cantavam as crianças, com música do Avé de Fátima. Inesquecível!...


10.05.2023, quarta feira - Em digressão

Merecido ou não, resolvemos dar uma volta turística por Timor-Leste. A comitiva destes dias (Eustáquio, Maria João, João Picão e eu) partiu de Dili rumo a a Baucau, Los Palos, Tutuala e Com, à procura das paisagens e das pessoas maravilhosas deste país. 

Se não fora as estradas com péssimo piso que tivemos de percorrer, diríamos que este passeio teria sido o máximo. Mas, feitos os descontos desta carência, podemos dizer que valeu bem a pena. Foram três dias maravilhosos. 

Então a estadia em Com, roçou a imagem do paraíso na terra. Que beleza de mar, que esplendor do sol poente e do sol nascente, que delicadeza destas gentes! Mais a mais, Com é terra que viu nascer Kon Santana, um dos heróis da resistência que sucedeu a Xanana Gusmão após a sua prisão pelas forças indonésias. 

Com foi também o palco principal para observar o fenómeno natural do eclipse solar que ocorreu no passado mês de abril. Observadores de todo o mundo (até dois portugueses) instalaram-se aqui para contemplar esta maravilha. Não estranho nada a atitude contemplativa de Francisco de Assis ante o Irmão Sol e o cântico que compôs chamando irmãs a todas as criaturas.

Depois foi o caminho do regresso, percorrendo as estradas (?) que nos conduziram a Dili.


16.05.2023, terça feira - Alvorada ou Desgarrada?

Ao ouvir todos os dias, logo de manhãzinha, o canto dos galos fico a pensar no termo correto: Alvorada ou Desgarrada?

Ainda que o seu canto pareça ser uma repetição, cada vez que os ouço cantar encontro nuances em cada resposta que me encantam e me dão vontade de entrar também no desafio. Então o meu Xico, que posso observar bem perto, enche bem o peito de ar, estica-se todo e bota lá de dentro um vozearão que o faz campeão, solista principal, desta alvorada matinal. À hora certa, aí está ele a desafiar. Já tentei responder-lhe, mas ele vence sempre, é mais forte do que eu, canta bem melhor do que qualquer um. “O nosso galo é bom cantor”, diz a canção. Foi feito para cantar. Por isso já deixei expresso o meu desejo, a minha ordem que, enquanto ele assim cantar não o podem vender e muito menos matar. Pois “quem canta, o seu mal espanta”.

“...ó do qui ri qui - có ró có - cá rá cá / Festa como a nossa no mundo não há!”

(Seleção / revisão e fixação de texto / negritos / subtítulos: LG)

(Continua)
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quarta-feira, 9 de março de 2022

Guiné 61/74 - P23061: "Lendas e contos da Guiné-Bissau": Um projeto literário, lusófono e solidário (Carlos Fortunato, presidente da ONGD Ajuda Amiga) - Parte XII: Conto - O hipopótamo dá boleia ao lobo

 



Ilustrações ( (pp. 69-71) do mestre Augusto Trigo, pai da pintura guineense e grande ilustrador, 
a sua obra é uma referência
 



O autor, Carlos Fortunato, ex-fur mil arm pes inf, MA,
CCAÇ 13, Bissorã, 1969/71, é o presidente da direcção da ONGD Ajuda Amiga


1. Transcrição das págs. 69-71 do livro "Lendas e contos da Guiné-Bissau", com a devida autorização do autor (*)



J. Carlos M. Fortunato 

Lendas e contos da Guiné-Bissau



Capa do livro "Lendas e contos da Guiné-Bissau / J. Carlos M. Fortunato ; il. Augusto Trigo... [et al.]. - 1ª ed. - [S.l.] : Ajuda Amiga : MIL Movimento Internacional Lusófono : DG Edições, 2017. - 102 p. : il. ; 24 cm. - ISBN 978-989-8661-68-5



Conto - O hipopótamo dá boleia ao lobo
(pp.  69-71)



O lobo (hiena) queria atravessar o rio, mas não podia porque este tinha muita água. Então foi pedir ajuda ao hipopótamo, para este o levar para o outro lado do rio.

O hipopótamo não gostava do lobo, porque este era malandro, e respondeu-lhe:

 Não tenho tempo, tenho que ir comer e depois vou descansar.

O lobo não desistiu, e pedia, pedia, sem parar:

 Tem paciência, ajuda com boleia, tem paciência, ajuda com boleia, tem paciência, ajuda com boleia, tem paciência…  – repetia o lobo sem parar.

O lobo não se calava e a cabeça do hipopótamo já não aguentava mais, e então disse:

– Está bem, vou levar-te para o outro lado nas minhas costas, mas se me fizeres mal, vais-te arrepender.

 Obrigado, obrigado  – disse  logo o lobo, ao mesmo tempo que se ria baixinho.

O hipopótamo desconfiou daquele risinho, mas pensou que talvez fosse porque o lobo estava contente.

E o lobo lá foi às costas do hipopótamo, até ao outro lado do rio.

Quando chegaram à outra margem, o lobo deu uma dentada no hipopótamo, arrancando-lhe um bocado de carne e fugiu rapidamente com ela na boca.

O hipopótamo ferido, lançou um grito de dor e de raiva:

 
  Aaarrgh!

O hipopótamo estava furioso, e zangado, mas ferido não podia correr atrás do lobo.

Algum tempo depois passou por ali uma lebre, que, ao ver o hipopótamo ferido, lhe perguntou o que tinha acontecido.

Ao saber da maldade do lobo, a lebre que também não gostava dele, disse:

 Esse lobo é mesmo muito mau! Eu vou-te ajudar. Eu vou trazer o lobo aqui. Fica aí deitado e finge que estás morto. Não te mexas!

A lebre foi para o mato e começou a tocar o bombolom (35), chamando todos os animais.

Quando estavam todos os animais reunidos a lebre disse:

 Está um hipopótamo morto na margem do rio, vamos comê-lo.

Ao ouvir isto, o lobo disse logo:

 
  Esse hipopótamo é meu, fui eu que o matei, e eu é que vou comê-lo.

Dito isto, o lobo correu para o local onde estava o hipopótamo, mas, quando se preparava para o comer, o hipopótamo abriu a sua grande boca e deu-lhe uma dentada.

E foi assim, que o lobo foi castigado pela sua maldade.

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Nota do autor:

(35) Bombolom - é um instrumento musical, que é tocado com dois paus, batendo-se num tronco de árvore ao qual foi retirado o seu interior, ficando com uma abertura em cima, de modo a servir de caixa de ressonância.


2. Como ajudar a "Ajuda Amiga"?

Caro/a leitor/a, podes ajudar a "Ajuda Amiga" (e mais concretamente o Projecto da Escola de Nhenque, que já foi inaugurada dia 8 deste mês, com pompa e circunstância), fazendo uma transferência, em dinheiro, para a Conta da Ajuda Amiga:

NIB 0036 0133 99100025138 26

IBAN PT50 0036 0133 99100025138 26

BIC MPIOPTP


Para saber mais, vê aqui o sítio da ONGD Ajuda Amiga:

http://www.ajudaamiga.com
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sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Guiné 63/74 - P15072: (Ex)citações (289): A propósito de Casamansa: a Guiné-Bissau não devia alimentar orgulhos caducos e tem a obrigação de respeitar as fronteiras coloniais existentes, se quiser continuar a existir como país.

1. Comentário de Cherno Baldé ao poste P15066 (*)


[Cherno Naldé: natural de Fajonquito, setor de Contuboel, região de Baftá, fez a sua formação universitária  na Ucrânia (ex-União Soviética) entre 1985/90 e depois em Portugal (Pós-graduação no CEA - Centro de Estudos Africanos /ISCTE); é quadro superior em Bissau, onde vive]

Caro amigo Luis,

Bem que gostava de fazer uma apreciação crítica o conteúdo sócio-cultural e ideológico dos artigos apresentados sobre Ziguinchor e suas gentes por apresentarem grandes similitudes com as realidades sócio-culturais das chamadas 'praças' vs 'presídios' na actual Guine-Bissau, infelizmente o tempo escasseia.

A Casamansa é a grafia antiga, portugues,  que, pouco a pouco, por influência do francês passou para Casamança aà francesa (Casamance) e acabou por ser a grafia oficialmente adoptada nas diferentes línguas e nas cartas geográficas modernas.

A terminologia ou conceito oportunista de "fijus de terra" que é prática corrente em toda a região foi desde sempre fonte de discórdia, de intrigas e de instabilidade social e política cujos efeitos nocivos podemos encontrar quase em todas as organizações, agrupamentos (os famosos Gan) ou partidos políticos como o PAIGC, FLING e outros.

Penso que o prefixo "mansa" estaria ligado ao poder tradicional (autoridade) na altura derivado ou por extenão do poder longínquo do Mansa de Mali e nao é sinónimo de mansidão como o pretende Torcato.

O declinio da aristocracia crioula em Ziguinchor, de certo modo, também, está relacionada com o declínio e pauperizacção dos centros de cultura crioula da Guiné-Bissa,  fruto do retrocesso desta desde a independência.

Quanto a interferência "guerreira" no Casamansa,  a pequena Guine-Bissau não fica a dever em nada ao vizinho Senegal, pois o tráfico de armas e de alianças duvidosas estão na origem da maior parte dos conflitos que ocorreram nos últimos anos.

Pessoalmente, sou de opinião que a Guine-Bissau não devia alimentar orgulhos caducos e tem a obrigapção de respeitar as fronteiras coloniais existentes,  se quiser continuar a existir como país. (**)

Com um abraço amigo,

Cherno Baldé

Igreja católica nos arredores de Ziguinchor. Cortesia de Wikipedia
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 2 de setembro de  2015 > Guiné 63/74 - P15066: Em bom português nos entendemos (12): Casamança ou Casamansa ? Como se deve grafar este topónimo do Senegal ? A resposta do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

(...) Comentários de LG:

Uma chamada de atenção para a página "República Cultural Lusófona" (RCL)... onde se (re)descobrem inesperadas comunidades onde a lusofonia parece estar viva ou ainda não morreu (...)

Sobre Ziguinchor, capital da região de Casamansa, pode ler-se o artigo "Ziguinchor, a vila crioula do Senegal"... Desconhecem,os o autor, mas aqui vão uns excertos, com a devida vénia (. A revisão e fixaçãon de texto é nossa):

(...) "Ziguinchor foi fundada pelos portugueses no sec. XVII, em 1645, na margem sul do Rio Casamansa. O seu nome deriva da expressão portuguesa 'cheguei e choram', porque os nativos pensavam que os vinham escravizar. Esta feitoria fora aí sediada para comerciar com o reino de Casamansa o qual era um aliado dos portugueses.

"Segundo as crónicas este era o reino mais amigo dos portugueses, ao longo da costa da Guiné. O rei vivia à moda europeia, com mesa, cadeiras e roupas ocidentais, na sua corte habitavam muitos portugueses onde comerciavam e faziam cortesia ao rei. No entanto o progressivo desleixo por Portugal de África, a favor da Índia e depois do Brasil,  deixou esta zona praticamente abandonada. Cedo a feitoria se transformou num mero presídio, praticamente vazio...

"Hoje Ziguinchor é a capital da provincia senegalesa de Casamansa que luta pela sua independência do norte.

(...) "A população era constituida pelos fijus di terra que ainda hoje se auto-intitula a verdadeira população de Ziguinchor. Esta população era constituída por descendentes de portugueses e mulheres Diola, e ainda hoje mantêm os apelidos portugueses como Alfonso, Barbosa, Carvalho, da Silva, Fonseca, só para citar alguns. Para além dos fijus di terra são ainda distinguidos os fijus di fidalgu, a aristrocracia de Zinguinchor que se distinguem pelo prestígio nobiliárquico que exibem.

"Os fijus di terra eram os proprietários da terra, destinguiam-se dos outros grupos étnicos pela língua crioula, pela religião católica pelas maneiras, hábitos e roupas europeus. Talvez a característica mais sonante desta população fosse o bem conhecido domingo de Ziguinchor em que a população vai à missa e se passeia elegantemente de paletó e chapéu pelas ruas e jardins de Ziguinchor. Daí que, para os franceses, os crioulos tivessem sido os interlocutores por excelência com o resto da população. E tiveram eles mesmo de aprender o crioulo, língua que era bem mais fácil que as outras línguas nativas para um europeu. Mesmo os funcionários do norte que os franceses mandavam vir devido ao facto de serem mais escolaralizados que os sul, aprendiam rapidamente a falar o crioulo, este era o mais falado pela população, e até as outras etnias aprendiam a língua crioula por ser a língua do comércio, devido não só à proximidade com a Guiné-Bissau e ao contrabando que se fazia entre os dois países, mas ainda ao comércio do mercado local que atraía os camponeses do interior.

"Os laços com a Guiné-Bissau são muito fortes, desde familiares, sociais, religiosos e étnicos, de tal forma que em 1985,  num questionário, 70% repondeu já ter visitado a Guiné-Bissau. E, mesmo apesar do crioulo de Ziguinchor ser do tipo de Cacheu,  a influência do de Bissau faz ainda sentir-se aqui. Para além dos fijus di terra vieram da Guiné-Bissau principalmente durante a guerra colonial muitos refugiados, os manjacos, os  manés e os papeis, para reforçar a população crioula. Nas familias mais abastadas costuma-se ainda casar com membros das famílias de Bissau ou Cacheu.

"Numa pirâmide que ilustrasse a estrutura social de Ziguinchor poderiamos colocar quatro bases: na mais alta os fijus di fidalgu a seguir os fijus di terra,  de seguida os manjacos, vindos da Guiné-Bissau, e por fim as outras etnias locais. " (...)

(...) "Nos censos de 1963, dos 42.000 habitantes de Ziguinchor, 35.000 falavam o crioulo (83%), e 30.000 tinham o crioulo como lingua materna (71,4%).

"Depois de 75 anos de domínio francês e de 37 anos de independência,  os crioulos de Ziguinchor ainda são conhecidos como "les portugais" - portuguis, na população local. No entanto o crescimento da cidade e o aparecimento dos subúrbios tirou a terra aos fijus di terra, deixando-os na pobreza. 

"Depois da independência a situação alterrou-se por completo, os crioulos eram vistos como cúmplices dos franceses. Os cargos públicos ocupados pelos crioulos foram substituidos pelos funcionários vindos do norte que falavam wolof, e assim começou o declínio da população crioula de Ziguinchor que fora sempre a maioritária. De tal modo que em 1985 apenas 37% da crianças que iam para a escola falavam em crioulo. (...)

"As diferenças étnicas e culturais entre os povos de Casamansa, da qual Ziguinchor é a capital, e os do norte maioritariamente wolof [, islamizados,] são bastante grandes. Há já alguns anos que Casamansa luta pela sua independência (desde 1982). Muitos historiadores veem neste fenómeno uma herança dos conflitos luso-franceses sobre o território e que nomeadamente a Guiné-Bissau e o Senegal herdaram. São sabidas as interferências das tropas senegalesas em território guineense mas há ainda a ter em conta a grande ligação afectiva que liga as populações de Casamansa e da Guiné-Bissau. Esta última tentou servir de mediadora no conflito armado dos rebeldes do MFDC (Movimento das Forças Democráticas de Casamansa) mas a neutralidade da Guiné-Bissau nunca foi muito segura e a verdade é que o exército guineense tem fornecido armas ao movimento liderado por um padre de origem crioula,  Sengor (Senhor).

"Os fijus di terra acabaram por apoiar os rebeldes e tem ainda por isso sido exterminados culturalmente. Por outro lado enfrentam uma senegalização imposta. Ser-se crioulo era um estatuto privilegiado que tem começado a desaparecer, pois passou a ser secundário em relação aos wolof que anteriormente nem sequer existiam na região. (...)"

(**) Último poste da série > 3 de agosto de 2015 > oesGuiné 63/74 - P14964: (Ex)citações (288): Estações dos CTT na Guiné (Jorge Araújo)

sexta-feira, 11 de abril de 2014

Guiné 63/74 - P12968: 10º aniversário do nosso blogue (4): Para além do Mário de Oliveira e do Arsénio Puim, terá havido mais capelães militares expulsos do CTIG... Terá sido o caso do alf mil capelão, também de nome Mário, do BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala, Buba, 1973-74), ainda em Bolama, na IAO... (Testemunho de um leitor e camarada nosso que pede reserva de identidade)


Guiné > Zona Leste > Setor L1 > Bambadinca > CCS / BART 2917 (1970/72) > s/d> O Alf Mil Capelão Arsénio Puim, expulso do Batalhão e do CTIG em Maio de 1971.

Foto: © Gualberto Magno Passos Marques (2009). Todos os direitos reservados



Guiné-Bissau > Região do Oio > Mansoa > 1995 > O jornalista Mário de Oliveira com o padre missionário que foi encontrar em Mansoa.

Foto: © Padre Mário da Lixa (2003) (com a devida vénia...)


1. Mensagem de um nosso leitor (e camarada) que não quer ser identificado, por razões que me apresentou e que eu aceitei como válidas, estando esta situação prevista nas regras originais do nosso blogue. 

Será apenas identificado pela última letra do alfabeto, Z (*). Tenho os contactos de telefone e endereço de email. Vive na região Centro.


Data: 27 de Março de 2014 às 03:07

Assunto: Capelães militares expulsos

Caríssimo Luís Graça.

Antes de mais, permite-me que me apresente. Sou [Z...],  ex-Alf.Mil. da 2ª CCaç. do BCaç. 4513 (Aldeia Formosa-Nhala-Buba - 1973-74), actualmente reformado.

Hesitei bastante antes de me decidir por este contacto, duvidando se valeria a pena. Mas, tudo vale a pena, vale sempre a pena... Isto, porque, li ontem (dia 25 de Março) no Blog que tão bem "comandas", e que visito diariamente desde que o descobri por acaso, há já uns anos, li, dizia, o seguinte: [vd. poste P12897]: «Em toda a história da guerra colonial, no CTIG, houve dois casos de capelães militares que foram "expulsos"», a propósito das referências ao Padre Mário da Lixa. 

Ora, acho que vale a pena corrigir esta afirmação e pôr em dúvida se, estaremos nós, hoje, em condições de saber quantos padres e não padres terão sido subtilmente, (ou com mediatismo como é o caso do Padre Mário da Lixa), afastados do território da Guiné sem deixar rasto. 

É preciso ter presente que a PIDE agia sem espalhafato e com muito profissionalismo. O caso que conheci de perto, o do Alf Mil Capelão que integrava o meu Batalhão no início, e que ainda não vi referido no Blog, é um indício de que podem ser muitos mais os padres que "desapareceram", ou foram afastados.

 Este que cito, e com quem me dava muito bem, "desapareceu" da noite para o dia, literalmente. Ao princípio, com ingenuidade e a medo, alguns ainda perguntavam: «Viste o Capelão? O que é que lhe aconteceu?». Mas a compreensão veio rápida e também o silêncio tácito e sensato. Todos pensaram: «O caso não me diz respeito». Caso abafado!

Tudo isto aconteceu apesar de, no dia de apresentação do Batalhão ao General Spínola em Bolama e na reunião que se lhe seguiu com ele e com todos os oficiais, ele lhe ter dito: «O nosso Alferes pode falar à vontade, dizer o que pensa, porque daquela porta - e apontou - não sairá uma palavra. (O Cmdt do Batalhão, enfiado, transpirava e bufava...). 

O General, antes, interpelara-me a mim. Queria saber o que eu pensava da nossa presença em África, da nossa acção na Guiné, do contributo dos militares naquela sociedade, etc. E eu, cobardemente, (sensatamente?), recitei-lhe a cartilha oficial, a que me ensinaram, sem introduzir originalidades nem virtuosismos, enfim, pensando que era o que ele queria ouvir (e não era), mesmo se o meu pensamento estava nos antípodas do que lhe dizia, devido à minha sólida politização, muito anterior à entrada para o Exército. 

O General ouviu-me em silêncio (e eu a ler-lhe o pensamento: «Mais um idiota!»), e depois interpelou o Alf Capelão. Quando este começou a falar, sem tibiezas e com uma audácia a roçar o desaforo, para as circunstâncias e para a época, eu não sabia onde me havia de enfiar... Foi então que o Gen. Spínola o interrompeu para o pôr à vontade, como citei antes. E ele continuou, pondo em dúvida o colonialismo e a legitimidade de tudo quilo que a maioria entende por legítimo, natural, a ordem das coisas..., mas também questionando o estado social da colónia, em pleno século XX, depois de 500 anos de colonização. 

Era um valente. E não apenas intelectualmente: vi-lhe dar um murro nos queixos a um soldado que apalpou o rabo a uma adolescente estudante de Bolama que seguia à nossa frente no passeio, que ele até voou!. Ficámos amigos e com muito respeito mútuo: ele era padre católico e eu ateu empedernido. Desapareceu depois de uma distribuição clandestina de panfletos à tropa sobre, creio, a má alimentação que era distribuída aos soldados, (ou a toda a tropa?).

Há uns anos comecei na Net a fazer tentativas de o encontrar, mas em vão. Nem do seu nome já estou certo, apenas me recordando que era Mário. Daí que tenha entrado em contacto com o Padre Mário da Lixa, nome que já conheço há muitos anos, mas apenas o nome, na esperança de que fosse ele próprio, (tinha muitas reservas), ou que me soubesse dar pistas. Ele foi muito amável comigo, mas não me pôde ajudar. Foi então que dei conta do desfasamento das nossas passagens pela Guiné. Desisti.

Muito mais teria para dizer, mas acho que já me excedi. Poderás, se o entenderes, fazer uso deste texto, (ou eliminá-lo), desde que não seja referido o meu nome. 

Porquê? Porque fiquei mal impressionado e muito preocupado quando, em tempos li no Blog referências a um "caso" que foi mediático e que se passou na minha Companhia, entre os alferes e o capitão e, desde aí, fiquei sempre a pensar que, pese embora a nobreza e os objectivos do Blog, e de ser um veículo honesto para o reencontro das pessoas e das ideias, também pode permitir intromissões despudoradas e mal informadas (intencionadas?), que foi o que se passou no caso da minha Companhia. 

Senti-me visado. Vi pessoas vangloriar-se de actos que não praticaram e outros fazerem críticas sem conhecimento de causa. Tudo foi mais complexo do que as pessoas pensam. E mais melindroso. As pessoas que opinaram não sabem, por exemplo, que a dada altura esteve eminente um acto da maior violência, que poderia ter "descambado" e provocado muitos mortos. Porque o caso gerou partidários e, no envolvimento, vieram ao de cima as piores qualidades humanas, traduzidas em vinganças, traições e cobardias, mesmo de quem não se esperaria. Imperou o bom-senso, felizmente. 

Sei do que falo porque estive directamente envolvido. (Foram precisos 40 anos para eu falar assim abertamente. E não sei se a despropósito). No Blog, apenas um veio a terreiro, honesto e sem papas na língua pôr os pontos nos iis: um furriel miliciano da minha Companhia, que não citarei. E ninguém falou mais no assunto. Por tudo isto, prefiro "não dar a cara". Não esquecerei o assunto mas não quero polémicas. E não só eu, pelos vistos... De toda a Companhia, que eu saiba, apenas um antigo camarada "dá a cara". Não é por acaso.

Caro Luís Graça. Repito que podes simplesmente apagar este relato sem qualquer melindre da minha parte. A menos que aches que traz alguma novidade em relação aos capelães afastados.

Se o entenderes, podes usar este mail para dizer alguma coisa.

Um abraço deste admirador do teu excelente trabalho (bem coadjuvado é certo),
o ex-combatente,  Z [...]


 2. Caro camarada:

Obrigado pela tua desassombrada e oportuna mensagem... Agradeço-te igualmente a sinceridade das tuas palavras. Devo dizer-te, desde já, que quero publicar o teu poste, sem te identificar pelo nome (conforme teu pedido)... É mais um contributo, importante, para este dossiê, delicado, que tem a ver com a "santa aliança" Estado Novo-Igreja Católica, nomeadamente em África e durante a guerra colonial...

Tens toda a razão em contestar a minha afirmação segundo a qual «em toda a história da guerra colonial, no CTIG, houve dois casos de capelães militares que foram "expulsos"... Em boa verdade, eu não me exprimi de maneira clara, concisa e precisa: queria eu dizer que apenas conhecia "dois casos", de que o blogue, de resto, já se tinha feito eco... No fundo, o que eu queria é que aparecessem mais depoimentos sobre os "nossos capelães", e eventualmente mais casos como os do Mário de Oliveiraário e do Arsénio Puim... Falamos de testemunhos em primeira mão, como o teu...

Falas-me do capelão do BCaç 4513 (Aldeia Formosa, Nhala, Buba, 1973-74),.. Que desapareceu sem deixar rasto, e cujo primeiro nome seria Mário...Vamos tentar descobrir o seu paradeiro, E para isso é importante a divulgação da tua mensagem. Não é habitual publicarmos mensagens sem identificação do autor, mas eu entendo a tua relutância e o teu melindre em dar a cara...Preciso, em todo o caso de saber em que data e em que poste foi abordado ou comentado o caso que referes:

(... ) Porque fiquei mal impressionado e muito preocupado quando, em tempos li no Blog referências a um "caso" que foi mediático e que se passou na minha Companhia, entre os alferes e o capitão e, desde aí, fiquei sempre a pensar que, pese embora a nobreza e os objectivos do Blog, e de ser um veículo honesto para o reencontro das pessoas e das ideias, também pode permitir intromissões despudoradas e mal informadas (intencionadas?), que foi o que se passou no caso da minha Companhia. 

Senti-me visado. Vi pessoas vangloriar-se de actos que não praticaram e outros fazerem críticas sem conhecimento de causa. Tudo foi mais complexo do que as pessoas pensam. E mais melindroso. As pessoas que opinaram, não sabem, por exemplo, que a dada altura esteve eminente um acto da maior violência, que poderia ter "descambado" e provocado muitos mortos. 

Porque o caso gerou partidários e, no envolvimento, vieram ao de cima as piores qualidades humanas, traduzidas em vinganças, traições e cobardias, mesmo de quem não se esperaria. Imperou o bom-senso, felizmente. Sei do que falo porque estive directamente envolvido. (Foram precisos 40 anos para eu falar assim abertamente. E não sei se a despropósito). (...)

Sobre o teu BCAÇ 4513 (e as suas várias companhias), temos apenas 18 referências... e não me lembro do tal "caso" (de insubordinação ?) a que te referes. É natural, o blogue tem 10 anos, 13 mil postes, 652 camaradas registados, fora os "visitantes", e mais de 45 mil comentários... Tens que me ajudar a identificar essa "cena"... de eu não me lembro:

(...) No Blog, apenas um veio a terreiro, honesto e sem papas na língua pôr os pontos nos iis: um furriel miliciano da minha Companhia, que não citarei. E ninguém falou mais no assunto. Por tudo isto, prefiro "não dar a cara". Não esquecerei o assunto mas não quero polémicas. E não só eu, pelos vistos... De toda a Companhia, que eu saiba, apenas um antigo camarada "dá a cara". (...)

Sim, o ex-1º cabo cripto José Carlos Gabriel, 2.ª CCAÇ / BCAÇ 4513 (Nhala, 1973/74)... Há outro camarada, o Fernando Costa , ex-fur mil trms, mas esse pertenceu à CCS/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, mar73 / set74)...

Sobre os nossos capelães, há dois Mário Oliveira, o da Lixa (1967/68), que esteve em Mansoa, e um outro que andou por Catió (1971/72)... E este último era tenente miliciano...  Mas nenhum deles é do teu tempo.

Se tiveres um telefone fixo, diz.me, que eu ligo-te... De qualquier modo, vou ter um intervenção cirúrgica, a partir de 3ª feira, dai 1 de abril... e devo ficar uma semana no "estaleiro", sem poder editar o blogue... Mas os coeditores continuam de serviço... Se me quiseres contactar (ou responder por esta via), fico-te grato. Gostaria de publicar, até lá, o teu texto.... Tens os meus contactos: . Diz-se se posso (e devo) referir a tua companhia e batalhão omitindo o teu nome e posto... Concordas ?

Um alfabravo (ABraço). Luis

3.  No dia 30 de Março último, o nosso camarada Z... responmdeu-me nestes termos:

(...) Olá, caro amigo Luís Graça.

Fiquei muito contente ao abrir o Mail e ver logo que te deste ao trabalho de me responder.
É uma honra muito grande. Porque já sou teu amigo há algum tempo, mesmo sem o saberes nem me conheceres e porque tenho uma grande admiração (e respeito) pelo gigantesco trabalho que tens feito, mesmo ajudado, para manter em funcionamento este "veículo" que leva a todo o lado e a toda a gente uma mensagem, uma recordação, um abraço e muita divulgação. (***)

Como é possível? Como consegues ter tempo para me dar atenção em particular e ainda disponibilizar os teus contactos pessoais? Por tudo isto, espero que a "tal" intervenção cirúrgica não seja nada de especial... já agora, desejo-te uma rápida recuperação.

Ainda tentei à tarde ligar-te para casa, para te poupar o trabalho de leres estas linhas, mas não resultou. Eu também não me sentia muito à vontade para devassar a tua privacidade.
Sobre as questões colocadas, gostaria de as separar em duas partes: a questão dos alferes de Nhala [, sobre a qual peça reserva e é só para teu conhecimento].

Sobre a questão da publicação do texto sobre os Alferes Capelães, tem menos que saber: podes publicar todos os elementos menos o meu nome, embora para os daquela "guerra" seja facilmente identificável. Os Capelães que me referenciaste são anteriores à minha comissão. Já agora só mais uma curiosidade: tal como o Alf Capelão não chegou a sair de Bolama onde fazíamos o IAO, também o Cmdt. do Batalhão, Ten Cor Andrade e Sousa seria substituído (nunca soube as razões, ou não recordo), pelo Ten Cor. Carlos Ramalheira até ao fim da comissão. Cordelinhos do Spínola...

Não te roubo mais tempo. Muito gostaria de te dizer como, não "dando a cara", perco horas esmiuçando o "nosso" blog no prazer de rever as terras da Guiné e as suas gentes (tão maltratadas ainda hoje), rever caras conhecidas e rever amigos que não me conhecem. Outro deles, é o Mário Beja Santos, de quem já li tudo o que havia para ler, e que continuei a acompanhar no seu regresso à terra e às pessoas que ama, lá onde todos nós deixámos um pouco da pele, mas de onde trouxemos muito mais do que levámos.

Para me contactares, para além deste mail; fica com o meu telefone fixo e telemóvel [...]

Boa recuperação e um abraço.

Sempre ao dispor (...)

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Notas do editor:

(*) Vd. página II Série do Blogue > Como entrar para a Tertúlia dos Amigos e Camaradas, ex-combatentes, da Guiné (1963/74)

(...) Os autores são sempre identificados pelo seu nome (excepcionalmente, por pseudónimo, ou iniciais, em caso de razões ponderosas) e são responsáveis pelo que escrevem ou editam. O mesmo acontece [, utilização de pseudónimo ou iniiciais] com militares ou combatentes, de um lado e de outro, ainda vivos, cujo comportamento possa ser objecto de crítica, por razões criminais, éticas, disciplinares ou outras. (...)

(**) Sobre o Mário Oliveira, tenente miliciano capelão que esteve em Catió, ver aqui:

30 de janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1474: O capelão Mário Oliveira, de Catió, que ia a Bedanda (Mário Bravo)

28 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1469: Bedanda, manga de saudade ou uma dupla sinistra, o padre e o médico (Mário Bravo, CCAÇ 6)