Mostrar mensagens com a etiqueta Lições de artilharia para os infantes. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Lições de artilharia para os infantes. Mostrar todas as mensagens

segunda-feira, 27 de novembro de 2023

Guiné 61/74 - P24891: Lições de artilharia para os infantes (10): Uma maneira simples de calcular a distância entre dois locais referenciados por coordenadas geográficas (Domingos Robalo, ex-fur mil art, BAC 1 / GAC 7 / GA 7, Bissau, 1969/71, cmdt do 22.º Pel Art, em Fulacunda , 1969/70)



Guiné > Carta antiga província portuguesa  (1961)  > Escala: 1/500 mil > Coordenadas geográficas  de Bissau e de Mansoa

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2023)



Domingos Robalo
1. Comentário do Domingos Robalo, ex-fur mil art, BAC 1 / GAC 7 / GA 7, Bissau, 1969/71; foi comandante do 22º Pel Art, em Fulacunda (1969/70); nasceu em Castelo Branco, trabalhou na Lisnave, vive em Almada; tem 27 eferências no nosso blogue (coomentário que escreveu  em 19/10/2023, às 11h29,  no nosso Facebook, e que a seguir reproduzios no blogue):

Tabanca Grande Luís Graça,  olá,  amigo Luís, espero que estejas bem. Agradeço a tua atenção. Costumo 
dizer que; só não se engana quem nada faz. Também tenho um mapa  igual ao que partilhaste. Sem pretender ser "professor" , nem "chico esperto", mas tão só com a intenção de partilhar conhecimento, que poderá ser interessente para os camaradas menos familiarizados com a matéria. Assim permite-me o seguinte acréscimo:

No mapa partilhado temos duas opções para medir distâncias.

(i) Na margem inferior da carta, temos uma escala ( 1/500000) que nos indica uma forma de medir distâncias. 

Mas nem sempre esta escala é apresentada.

(ii) Como alternativa ao descrito em (i), temos nas margens inferior e direita do mapa uma graduação que nos indica pelo sistema de coordenadas, (escalas em latitude e longitude) a localização de um qualquer ponto no mapa. 

Exemplo; Bissau, está localizada a 11° 52' de latitude e 15° 35' de longitude, aproximadamente. 

Na falta da escala indicada em (i), podemos sempre considerar, sem erro, este tipo de escala cartesiana, sendo que cada " minuto" corresponde a uma milha. Concluindo; um minuto corresponde a uma milha e esta a 1,8km. (...)


2. Comentário do editor:

Obrigado, camarada artilheiro. Encontrei a Net uma ferramenta muito simples para calcular a distância entre dois locais referenciados por coordenadas geográfica. Ver aqui 

Federação Portuguesa de Columbofilia  (FPC) > Cálculo de Distâncias


Só temos que saber qual a latitude e a longitude do ponto de partida, e a  latitude e a longitude do ponto de chegada... Um exemplo prático: a distância entre Bissau e Mansoa (sabendo que a latitude de Mansoa é 12º 04' e a longitude 15º 19', coordenadas obtidas através da nossa velha carta de 1961, escala 1/ 500 mil, em que desprezamos os segundos).

O resultado é 60 108 metros...Arredondando: 60,1 km...

Obs: A FPC adoptou o formato de coordenadas geográficas +GGG.MM.SS.D, em que:

  • + representa o sinal, que poderá ser + ou -  
  • em Portugal, as latitudes são sempre positivas (sinal +) e as longitudes são sempre negativas (sinal -); em Espanha, os valores a Oeste (O,W) do meridiano de Greenwich têm sinal negativo (-) e os valores a Este (E) têm sinal positivo (+).
  • GGG representa os graus da coordenada;
  • MM representa os minutos da coordenada;
  • SS representa os segundos da coordenada;
  • D representa as décimas de segundos da coordenada ;
  • Representação das coordenadas da FPC (que tem sede em Mira): 40°12'54.8" N, 8°26'9.8" W: Latitude: +040.12.54.8; Longitude: -008.26.09.8
  • Representação das coordenadas de Barcelona : 41°37'10.2" N, 1°23'57.6" E; Latitude: +041.37.10.2;    Longitude: +001.23.57.6
____________

quinta-feira, 2 de junho de 2022

Guiné 61/74 - P23319: Guidaje, Guileje, Gadamael, maio/junho de 1973: foi há meio século... Alguém ainda se lembra? (1): A pontaria dos artilheiros... (Morais da Silva / C. Martins)

Peça de artilharia 130 mm M-46, de fabrico soviético (ano de introdução: 1954). Este tipo de armamento foi usado pelo PAIGC contra Guileje em maio de 1973, a partir do território da Guiné-Conacri. O seu alcance (máximo, com cargas propulsoras suplementares) pode ir aos 27,5 km. Tem uma guarnição de 7 homens.

Fonte: Wikipedia (em finlandês) (2007) (com a devida vénia...)

1. Guidaje, Guileje e Gadamael, os famosos 3 G, ou a "batalha dos 3 G", já aqui tão acaloradamente discutida, analisada, comentada, ao ponto de alguns de nós termos perdido a serenidade e a contenção verbal que devem ser apanágio deste blogue de antigos combatentes...  

Para o ano, os três G vão fazer meio centenário... Bolas, como estamos velhos!

Estamos em crer que ainda há muito coisa para dizer, e aprender, sobretudo aqueles de nós que não viveram na pele as agruras daqueles longos, trágicos mas também heróicos dias de maio e junho de 1973... Dias que  não se podem resumir à contabilidade (seca) das munições gastas ou das baixas de um lado e do outro (e foram muitas). (*)

Hoje, que passam 49 anos sobre a Op Amílcar Cabral, em que o PAIGC jogou forte (em termos de meios humanos e materiais mobilizados) contra as posições fronteiriças de Guidaje (no Norte) e Guileje e Gadamael (no Sul), parece-nos oportuno repescar alguns postes e comentários que andam por aí perdidos... E publicar novas histórias. Daí esta série "Guidaje, Guileje, Gadamael, maio/junho de 1973: foi há meio século... Alguém ainda se lembra?"...

Felizmente que ainda temos muitos camaradas vivos, que podem falar de cátedra sobre os 3 G, Guidaje, Guileje e Gadamael... Outros, entretanto, já não estão cá... Já do lado do PAIGC, é cada vez mais raro poder-se contar com testemunhos, orais ou escritos, sobre os acontecimentos de então.

Referências não faltam no nosso blogue... Alguns dirão, "ad nauseam"... Citemos entre outras:

Dossiê Guileje / Gadamael (56)

Gadamael (384)

Guidaje (255)

Guileje (540)

Op Amílcar Cabral (6)

Curiosamente, não temos nenhum descritor "Batalha dos 3 G", consagrado pela historiografista pró-PAIGC...


2. C
omecemos pelo poste P20103, que é já um "clássico" (**). O cor art ref António Carlos Morais da Silva, membro da nossa Tabanca Grande [, foto atual à esquerda], instrutor da 1ª CCmds Africanos, em Fá Mandinga, adjunto do COP 6, em Mansabá, e comandante da CCAÇ 2796, em Gadamael, entre 1970 e 1972 (***), professor de tiro de artilharia na Escola Prática de Artilharia e da Academia Militar, é um homem frontal, nortenho, natural de Lamego, que gosta de chamar os bois pelos cornos

O cor art ref Morais da Silva tem autoridade para falar sobre as nossas (e as do PAIGC) "perícias artilheiras" porque é um especialista em tiro de artilharia e conheceu o terreno, passou por Gadamael, embora já não sendo contemporâneao da famigerada "batalha dos 3 G"...

(...)  A  narrativa artilheira deste senhor [o Osvaldo Lopes da Silva, ] é uma salgalhada sem ponta por onde pegar. (****)

"Calcula" coordenadas geográficas de que locais? Das posições? Para quê, se não as tem do objectivo pois procurou obter orientação azimutal via clarões das bocas de fogo de Guilege?! 

Ligou as posições com uma poligonal?! Como assim? Como define azimutes sem linha de vista? Como calcula distâncias? A passo, a corta-mato?! E como orienta a caminhada? 

Ou também calculou latitudes e longitudes? Apurou a posição relativa das bocas de fogo de Guilege! Para quê? Fazer de cada uma um objectivo?!

Enfim, basófia muita, ciência pouca e assistência benévola ou ignorante. 

O que certamente aconteceu foi ajustar fogos com observação avançada consentida pelo "recolhimento" das NT.  Assim aconteceu em Fevereiro de 71, em Gadamael, mas felizmente os intervenientes na observação e no cálculo eram analfabetos na direcção do tiro. Tomadas medidas de interdição,  nunca mais o conseguiram fazer,  passando a executar fogos escalonados em alcance (tiro rolante). 

Na Guiné, as artilharias das NT e do IN eram baratas tontas que actuavam por "intuição" a partir do som e do conhecimento do terreno (quem o conhecia a palmo). 

Muitas vezes pedi ao meu Cmdt-Chefe que me arranjasse um radar contra-morteiro e o problema da artilharia IN era assunto arrumado. Infelizmente nunca recebi o "presente".

Morais da Silva
Cor Art Ref
Professor de tiro de Artilharia 
na EPA [Escola Prática de Artilharia] e na Academia Militar  (...)


3.  E fiquemos por agora pelo comentário do C. Martins, beirão, hoje médico reformado, antigo comandante de um Pel Art que esteve em Gadamael (1973/74) (*) (. Nunca se increveu formalmente na Tabanca Grande, por razões pessoais e profissionais, mas é um leitor assíduo e ativo, com mais de 35 referências no blogue)

(...) Guerras, guerrinhas, obuses, peças, granadas, cargas e por aí vai....

Factos: por vezes flagelavam com morteiro 82, canhão s/r, grad [fogute 122 mm] e possivelmente com a peça, essa de longo alcance. [peça de artilharia 130 mm, M-46, do exxército da Guiné-Conacri].

Felizmente raramente acertavam.

Ninguém contava as granadas IN 
[muito menos de lápis e papel na mão]  .

Nós éramos bem treinados na EPA [Escola Prática de Artilharia, emVendas Novas] e nos cálculos de tiro. As cartas eram muito boas.

Alguns subvertiam o número de disparos para que a reposição fosse aumentando de forma a ter cada vez mais granadas.

As granadas do obus 14 eram de fabrico USA, apesar de o obus ser de fabrico inglês.

Após a desgraça de maio/junho de 1973, em Gadamael houve um reforço de material e humano, a saber; 3 companhias, 2 pelotões de milícias, 1 pelart de obus 14, 1 pelotão de canhão s/r, 1 pelotão de morteiro 81, o que dava em média cerca de 600 homens em permanência.

Raramente a contrabateria surtia efeito, a alternativa era fazer batimento de zona que tinha pelo menos bastante efeito psicológico no IN (soube à posteriori).

Tínhamos bons abrigos subterrâneos.

E assim se passavam os dias,  uns melhores outros piores mas sempre arruinando o orçamento de Estado.

Na atualidade as melhores peças de artilharia são as de fabrico sueco, como quase todo o material de guerra fabricado por eles. (...)
____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 31 de maio de 2022 > Guiné 61/74 - P23317: A nossa guerra em números (17): chuva de granadas sobre Guileje (18-21 mai 1973) e Gadamael Porto (31 mai-11 jun 1973)

(**) Vd. poste de 28 de agosto de 2019 > Guiné 61/74 - P20103: Dossiê Guileje / Gadamael (33): "Basófia muita, ciência pouca e assistência benévola ou ignorante" (diz o cor art ref Morais da Silva, antigo professor de tiro de artilharia da EPA e da Academia Militar), a propósito da comunicação de Osvaldo Lopes da Silva, apresentada em Coimbra, em 23/5/2013`

(***) Vd. poste de 20 de junho de 2016 > Guiné 63/74 - P16218: Dossiê Guileje / Gadamael (28): A situação de Gadamel, ao tempo da CCÇ 2796 (1970/72), que teve dois grandes comandantes, Cap Op Esp Fernando Assunção Silva e Cap Art António Carlos Morais Silva (Vasco Pires, (ex-Alf Mil Art, cmdt do 23.º Pel Art, Gadamael, 1970/72)

(****) Vd. poste de 27 de agosto de 2019 > Guiné 61/74 - P20100: Dossiê Guileje / Gadamael (32): O texto, inédito, de Osvaldo Lopes da Silva, um dos principais cérebros da Op Amílcar Cabral; mesa-redonda em Coimbra, 23/5/2013: " O ataque a Gadamael, na sequência da queda de Guileje, não foi a melhor opção. Melhor seria um ataque a Quebo (Aldeia Formosa) com forte pressão sobre Tombali. Com a queda de Guileje, Gadamael tornara-se uma inutilidade que não incomodava a ninguém. A sua guarnição devia ser deixada entregue aos mosquitos e ao tédio."

Vd. também poste de 30 de agosto de 2019>  Guiné 61/74 - P20107: Lições de artilharia para os infantes (7): Tal como o Strela reduziu a liberdade do nosso movimento aéreo, o radar de localização de armas (vulgo contra-morteiro) teria congelado a artilharia do PAIGC... (Morais da Silva / António J. Pereira da Costa / Luís Graça / Manuel Luís Lomba)

quinta-feira, 14 de abril de 2022

Guiné 61/74 - P23167: Humor de caserna (47): O Gasparinho, que eu... não conheci no BAC 1 / GA 7 (Domingos Robalo, ex-fur mil art, BAC 1 / GAC 7 / GA 7, Bissau, 1969/71; ex-comandante do 22º Pel Art, Fulacunda, 1969/70)

1. Comentário publicado na nossa página do Facebook, Tabanca Grande Luía Graça, pelo nosso camarada Domingos Robalo, com data de 11 de abril de 2022, 21h18;

Domingos Robalo, ex-fur mil art, BAC 1 / GAC 7 / GA 7, Bissau, 1969/71; foi comandante do 22º Pel Art, em Fulacunda (1969/70); nasceu em Castelo Branco, trabalhou na Lisnave, vive em Almada; tem 26 eferências no nosso blogue. 

[ Foto atual, à esquerda, Tabanca da Linha, Algés, 2019; foto de Manuel Resende].



Olá amigos, camaradas. 

Li os relatos do blogue (*) e algo não bate certo em termos de datas em relação ao major Gaspar. Irei confirmar, pois sou desse tempo na BAC1/GA7. 

Em março de 1969, estava eu colocado no RALIS, tendo como 2° Comandante o Coronel Ferreira da Silva. Já na altura não era militar de quem se gostasse. 

Em maio de 69 embarco para a Guiné, sendo mobilizado em rendição individual,  colocado ns BAC1, então comandada pelo capitão Moura S. 

Em novembro de 69 venho de férias e em Almada conversei casualmente com um anterior camarada do RALIS, que me informou da mobilização do Coronel Ferreira da Silva para comandar a BAC1, em vias de passar a GAC7, o que viria acontecer pouco tempo depois.

 Quando regressei de férias e me apresentei na unidade eu e o "novo comandante" já eramos conhecidos por termos tido alguns arrufos no RALIS. 

"Ó filho" era um termo muito do agrado deste militar. Um dia, o Sargento Canário do QP e encarregado das obras da unidade, já falecido, teve um caso com o " Ó filho" e foi de imediato recambiado para o mato. Disse o Coronel:  "Então Canário, as obras andam ou não andam? Resposta do Seiras,  sargento; "Meu comandante, como quer que as obras andem se não têm pernas ?". 

O Comandante não gostou do à vontade do "pobre Canário", que já teria mais de 50 anos de idade, eu era um puto com 21 anos. 

Ao tempo do capitão Moura S. era eu que participava na regulação de tiro em todos os PELART do TO juntamente com o capitão Viriato O. alternando com o capitão Fradique. O coronel, comandante da unidade resolveu ir fazer uma regulação de tiro a um PELART. Deu os elementos ao chefe de secção, furriel Monj.... fez-se a pontaria, tudo pronto?! Fogo...!!!

Granada pelo ar..., vai cair numa palhota amiga, vários feridos... Aqui deu- se a bronca. De quem foi a culpa? Dos dados mal calculados, mal introduzidos na BF ou deficiente comunicação? 

Levantou-se um auto que andou enrolado muito tempo até que chegaram mesmo a propor ao furriel que assumisse culpa e poder embarcar e passar à peluda. Só que este não aceitou porque entendeu não ter de assumir uma culpa que não sentia ter. 

Entretanto, o Coronel tinha dado baixa e regressou à Metrópole. Em maio de 71 sou desmobilizado e regresso com mais um louvor, desta feita dado pelo 2° Comandante, recém chegado de Piche, o major Mexia, já falecido. 

O major Gaspar será figura posterior à minha desmobilização. Do coronel, nunca mais ouvi referência, a não ser agora no blogue.

Os oficiais do QP, à data de maio de 71 eram ; major Mexia, capitães Viriato, Fradique, Pereira S, Evaristo e Lourenço, estes últimos da A.A. [Artilharia Anti-Aérea].

Mais estórias haveria, mas a prosa já vai longa. 

Abraço. Saudações artilheiras. Domingos Robalo.

__________

Nota do editor:

(*) Último poste da série > 11 de abril de 2022 > Guiné 61/74 - P23158: Humor de caserna (46): Histórias pícaras: O Gasparinho - Parte III (António J. Pereira da Costa / Luís Faria / José Afonso / José Borrego): (vi) Picagem automática: as rajadas de G3 em vez da pica; (vii) Mensagem-relâmpago: Quem viu passar as minhas chapas de zinco, levadas pelo tornado? (viii) Informo Vexa que Sexa passou na mecha

sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

Guiné 61/74 - P21746: Histórias... com abracelos do Carlos Arnaut (ex-alf mil, 16º Pel Art, Binar, Cabuca, Dara, 1970/72)(3): Lições de artilharia para infantes..., sob a forma de piadas do passado


Foto nº 2 
 

Foto nº 1


Foto (e legenda): © Carlos Arnaut (2020). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem de Carlos Arnaut,  membro nº 817 da nossa 
Tabanca Grande, ex-alf mil art, cmdt do 16º Pel Art (Binar, Cabuca,  
Dara, 1970/72):

Data - 7 jan 2021 12h03
Assunto - Paródias do passado (*)


Camarigo Luís, em primeiro lugar quero desejar a todos os Tabanqueiros votos sinceros de um 2021 que finalmente nos liberte desta opressão Covidiana.


Tendo vindo a seguir com atenção as estatísticas referentes à vida do blogue, deixa-me agradecer-te, e aos co-editores, o trabalho tão meritório que tens vindo a desenvolver de uma forma apaixonada, mas rigorosa, na defesa das nossas memórias.

No meu currículo não referi que sou filho de militar, Coronel de Artilharia falecido há alguns anos, com várias comissões em Angola, país onde ele prestou serviço pela primeira vez de 1949 a 1954 [António M. Arnaut]. 

Cheguei ao colo da minha mãe, os primeiros anos da minha vida foram assim passados entre Luanda e Sá da Bandeira, hoje Lubango. Regressei nos anos sessenta, o meu pai foi mobilizado em 63, tendo estudado em Luanda até 65 quando ele terminou aquela comissão como Ten Cor.

Foi pura coincidência o facto de eu ter vivido a minha guerra como artilheiro, tanto mais que logo que entrei para a recruta o intimei a não interferir, fosse de que maneira fosse,  no meu percurso militar, tendo essa coincidência dado origem após o meu regresso a divertidas e acesas discussões sobre a rapidez e eficácia da nova geração de artilheiros, ao conseguir, por exemplo, pôr à noite granadas no ar em menos de três minutos. 


Todo este arrazoado visa sobretudo contrariar a tendência de queda das participações no blogue, pelo que me lembrei de contribuir com dois menus que vigoraram em duas confraternizações distintas entre artilheiros, meu pai e camaradas seus contemporâneos.


A imaginação posta ao serviço da ementa terá especial significado para os meus camaradas da Arma de Artilharia, dada a especificidade da linguagem.


A primeira tertúlia, realizada na extinta Cooperativa Militar, infelizmente não foi datada (Foto nº 2), tendo a segunda ocorrido em Março de 81 (, foto nº 1).


Se entenderem que este modesto contributo vale a pena ser publicado, o meu velhote, lá onde estará, ainda se vai rir, (**)


Abracelo grande, conto voltar em breve.


Carlos Arnaut
___________

domingo, 8 de dezembro de 2019

Guiné 61/74 - P20425: Lições de artilharia para os infantes (9): Os Pel Art, de vez em quando, tinham que "tocar uma punheta" aos obuses, por razões de manutenção... (C. Martins, ex-alf mil art, cmdt do 23.º Pel Art, Gadamael, 1973/74)


Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > Agosto de 1972 > Espetacular foto noturna do obus 14 em ação...

Algumas características técnicas do Obus 14 cm m/943:  (i) Origem Reino Unido; (ii) Ano de fabrico: 1941 (entrada ao serviço: 1943); (iii) Calibre: 140 mm; (iv) Guarnição: 10 elementos; (v) Peso do obus 6190 Kg; (vi) Peso da granada HE; 40,5 Kg; (vii) Alcance: 15600 m; (viii) Campo de tiro horizontal:  -530 mil a +530 mil; (ix) Campo de tiro vertical;  -90 mil a 800 mil; (x) Cadência de tiro: 2 TOM; (xi) Locomoção Tração Automóvel... Observ: Foi descontinuado em 1987, é hoje peça de museu...

Foto (e legenda): © Vasco Santos (2011). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentário do nosso camarada C. Martins (, ex-alf mil art, cmdt do 23.º Pel Art, Gadamael, 1973/74; hoje médico, reformado), ao poste P20423 (*)

Foto: Cortesia de António Rios (2019)
O GA7 [Grupo de Artilharia nº 7, em Bissau]  tinha uma oficina de reparação de obuses chefiada por um 1.º sargento.

Quando avariava um ou mais obuses,consoante o tipo de avaria, podia-se eventualmente fazer a reparação no próprio local, os Pel Art  tinham material de substituição, ou então deslocava-se um mecânico de Bissau, e em último caso o obus era substituído.

Os tubos (que para os infantes são canos) tinham estrias e, após mil tiros, tinham que ser substituídos porque estas se desgastavam, mas, para evitar isso, aconselhavam avivá-las o que dava uma trabalheira do "caraças".

Os graduados dos Pel Art  tinham uns conhecimentos de mecânica dos obuses não só para a manutenção como para eventuais pequenas reparações.

Algures no sul da Guiné um alferes de um Pel Art  perdeu um "cogumelo", que era uma peça em aço da culatra cujo o formato era isso mesmo, um cogumelo, e como ia ser substituído tinha que fazer o espólio do Pel Art.

Pediu ao Pel Art  da vizinhança, que amavelmente cedeu um. Este por sua vez resolveu a falta do dito incluindo-o no relatório dos estragos feitos por um ataque, evidentemente com mais uma picareta, uma pá e tralhas várias em armazém.

Sabia-se que ninguém lia o dito relatório, e se lessem que fossem lá verificar a veracidade da coisa.

Também se tocava periodicamente uma "punheta" aos obuses que consistia na lavagem dos tubos,  e esta parecia que os tubos estavam a ejacular, daí o respectivo nome.

Mais lições de artilharia, têm que pagar, porque andei eu a queimar os neurónios para vocês passarem a saber tanto como eu, só faltava mais essa!

Ah, na foto [, à esquerda],  está-se a reparar o aparelho de pontaria que era uma avaria frequente.

Saudações artilheiras (**)
C.Martins
____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 7 de dezembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20423: Facebook...ando (54): António Rios, ex-fur mil mecânico de artilharia (GA 7, Bissau, 1972/74), algarvio de Vila Real de Santo António, a viver em Tavira

(**) Último poste da série > 23 de novembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20375: Lições de artilharia para os infantes (8): Algumas características técnicas do obus 14 e da peça 11.4 (C. Martins, ex-cmdt do 23.º Pel Art, Gadamael, 1973/74; João Martins, ex-alf mil art, BAC1, Bissum, Piche, Bedanda, Gadamael e Guileje, 1967/69)

sábado, 23 de novembro de 2019

Guiné 61/74 - P20375: Lições de artilharia para os infantes (8): Algumas características técnicas do obus 14 e da peça 11.4 (C. Martins, ex-cmdt do 23.º Pel Art, Gadamael, 1973/74; João Martins, ex-alf mil art, BAC1, Bissum, Piche, Bedanda, Gadamael e Guileje, 1967/69)


Guiné > Região de Gabu > Coluna Bafatá - Nova Lamego - Piche > Setembro de 1968 > Picada a caminho de Nova Lamego, com três peças 11.4.  As peças foram desembarcadas em Bambadinca, vindas de Bissau, na LDG 101. Seguiram depois em estrada alcatroada, até Bafatá. Só mais tarde é que foi construída uma estrada alcatroada entre Bafatá e Nova Lamego, com seguimento até Piche. Estas peças participaram na Acção Mabecos, 22-24 de fevereiro de 1971.

Foto (e legenda): © João José Alves Martins (2012). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné] (*)


Guiné > Região de Tombali > Bedanda > 1969 > Álbum fotográfico do João Martins > Foto nº 135/199 > O temível obus 14... mais um elemento da guarnição africana do  Pel Art ali destacado.

Foto (e legenda): © João José Alves Martins (2012).   Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].(**)


VI Encontro Nacional da Tabanca Grande, 4 de junho de 2011.
Uma das  raras fotos do C. Martins, aqui de óculos escuros,
ao lado do J. Casimiro de Carvalho,
dois heróis de Gadamael.
Foto: Luís Graça (2011)
1. Comentário ao poste P20370 (***), por parte do nosso C. Caria , ex-alf mil art, cmdt do 23º Pel Art, Gadamael, 1973/74


O C. Martins - nosso leitor e camarada, mais conhecido por ter sido o "último artilheiro de Gadamael" , comandante do Pel Art 23, que acabará por (con)fundir-se com o 15, mas também médico, reformado,  a viver no Portugal profundo, - não faz parte formalmente da nossa Tabanca Grande (TG), por razões que ele invocou, de natureza  deontológica, éticas e profissional, razões que sempre  entendemos e respeitámos. . Isto quer dizer que: (i) nunca pediu para aderir à TG; (ii) nunca aceitou o nosso convite para ingressar na TG; (iii) nunca se apresentou ao "pessoal da caserna", como mandam as NEP do blogue; (iv) nem nunca enviou as duas fotos da praxe. Tem cerca de 3 dezenas de referências no blogue, foi em tempos presença assídua nos Encontros Nacionais da Tabanca Grande, em Monte Real

Alcance do obus 14...16 km. E da peça 11,4...18 km
Peso de ambos sensivelmente 7 toneladas

Para pôr a peça ou obus em posição de tiro,(abrir sapatas,colocar espoleta na granada e introduzi-la no tubo, colocar carga,fechar culatra principal,introduzir escorva na culatra auxiliar, puxar cordel para accionar disparo) levava no mínimo 1 minuto para artilheiros experientes.

Após o obus estar pronto para disparar,  o comandante introduzia os dados de tiro no aparelho de pontaria,  verificava níveis e fazia a respectiva rectificação com a cruzeta colocada normalmente atrás do obus.

Convém referir que em situação normal de estacionamento em quartel, o obus estava em posição de tiro e as granadas estavam já com a respectiva espoleta e as cargas à disposição.

A espoleta era armada pela rotação da granada após a saída do tubo.

A velocidade da granada à saída era de 600 m /s

A elevação do tubo ía de -5º a 45º-

Se se fizessem vários tiros directos com uma elevação baixa corria-se o risco de rebentar os hidráulicos.

O grande perigo que todos os artilheiros temiam era o rebentamento da granada à boca do tubo..Invocava-se Santa Bárbara e vai disto!...

Se bem que a dotação de cada obus 14 fosse de 10 serventes,  fazia-se tiro com menos, dependia da experiência de cada um.

Havia um Pel Art  algures na guiné que conseguia fazer tiro de 20 em 20 segundos e,  para gáudio dos infantes,  terminava-se sempre com 3 tiros em simultâneo,  era um "mini ronco".

Ah!, já me esquecia,  a granada do 14 pesava 45 kg e da peça 11,4 25 kg. (**)

Saudações artilheiras

C.Martins

2. Informação do João Martins (ex-alf mil art, BAC1, Bissum, Piche, Bedanda, Gadamael e Guileje, 1967/69; vive em Lisboa: tem 55 referências no nosso blogue]


Sobre o obus 14 (cm e não mm...), ele já nos deu, em tempos,  as seguintes explicações técnicas (**)::

(...) "14 cm é o diâmetro da alma do canhão. Recordo que um obus é constituído por "reparo", a parte que assenta no chão e que tem duas "flechas" à retaguarda para que não recue, o "canhão" que começa na "culatra" que é a parte onde se colocam as "granadas" e os "cartuchos" com diferentes dimensões e cargas, conforme a força impulsionadora que se pretende, e que está relacionada com a distância, e, finalmente, a "massa recuante" que é o sistema hidro-pneumática que, após o tiro, leva o "canhão" à posição inicial.

Quando estive em Bedanda, e antes de rumar a Gadamael-Porto, com destino a Guileje, os 3 obuses estavam dirigidos para 3 direções bem distintas porque os ataques eram provenientes de 3 lados bem diferenciados, pelo que, regra geral, não disparavam simultâneamente, além de que estavam em extremos do aquartelamento.

Recordo-me que um dia, alguém vestido de modo "estranho" me perguntou se os obuses disparavam só para longe, ou, também, para perto. Respondi que só para longe. É claro que, naquela noite, perceberam quando queriam entrar no aquartelamento, que também disparava para perto. Os africanos que se encontravam no interior da moranças é que não gostaram do "festival" porque as granadas, que pesam 45 kg, passaram-lhes a rasar, eu diria que entre 1 metro e 2 metros. Numa das fotografias das minhas memórias, vê-se um furriel a acimentar o chão, onde o obus rodava... 


Enfim, algumas das minhas muitas recordações...que não esquecerei facilmente.. (...) (**)

Portanto, , no  essencial, pode dizer-se o seguinte:

(i) a peça de 11.4 cm e o obus 14 cm eram parecidos (mesmo reparo );

(ii) a peça 11. 4 era de menor calibre mas tinha o tubo mais comprido que o obus 14.(****)
____________

Notas do editor:


(**) Vd. poste de 26 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9947: Memórias da minha comissão (João Martins, ex-alf mil art, BAC 1, Bissum, Piche, Bedanda e Guileje, 1967/69): Parte VI: Bedanda, com o obus 14: um dos locais que me deixou mais saudades...

(***) Vd. poste de 22 de novembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20370: Fotos à procura de uma... legenda (113): Camaradas artilheiros, quando media, em comprimento, o conjunto Berliet ou Mercedes ou Matador + reboque + obus 14 ou peça 11,4 ?.. 15 metros!... E quanto pesava ? 15 toneladas!... Façam lá o TPC: 9 bocas de fogo, mais 9 rebocadores, mais 9 Unimogs e Whites, mais 300 homens em armas... mais 500 granadas... Qual o comprimento (e o peso= de uma coluna destas, a progredir numa picada, no mato, de Piche, a caminho da fronteira, "Acção Mabecos", 22-24 de fevereiro do século passado, numa guerra do outro mundo ?!..

(****) Último poste da série > 30 de agosto de 2019 > Guiné 61/74 - P20107: Lições de artilharia para os infantes (7): Tal como o Strela reduziu a liberdade do nosso movimento aéreo, o radar de localização de armas (vulgo contra-morteiro) teria congelado a artilharia do PAIGC... (Morais da Silva / António J. Pereira da Costa / Luís Graça / Manuel Luís Lomba)

Postes anteriores:

10 de junho de 2012 > Guiné 63/74 - P10019: Lições de artilharia para os infantes (6): O obus 14 de Bedanda em tiro direto... (C. Martins / Rui Santos)

17 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9915: Lições de artilharia para os infantes (5): Quando o oficial de dia fez um levantamento de rancho... (C. Martins, Cmdt do Pel Art, Gadamael, 1973/74)

4 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9852: Lições de artilharia para os infantes (4): O que era uma bateria (ou bataria)... (C. Martins, Cmdt do Pel Art, Gadamael, 1973/74)

16 de fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9496: Lições de artilharia para os infantes (3): Fazer a rotação, de 180º, do obus 14, para apoiar Jemberém (C. Martins, CMDT do Pel Art, Gadamael, 1973/74)

15 de fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7791: Lições de artilharia para os infantes (2): O artilheiro Doutor, Mansambo, CART 2339, 1968/69 (Torcato Mendonça)

14 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7782: Lições de artilharia para os infantes (1): Como era feito o tiro de obus 14 (C. Martins, ex-Alf Mil, Pel Art, Gamadael)

sexta-feira, 30 de agosto de 2019

Guiné 61/74 - P20107: Lições de artilharia para os infantes (7): Tal como o Strela reduziu a liberdade do nosso movimento aéreo, o radar de localização de armas (vulgo contra-morteiro) teria congelado a artilharia do PAIGC... (Morais da Silva / António J. Pereira da Costa / Luís Graça / Manuel Luís Lomba)


Peça de artilharia 130 mm M-46, de fabrico soviético (ano de introdução: 1954). Este tipo de armamento foi usado pelo PAIGC contra Guileje em maio de 1973, a partir do território da Guiné-Conacri. O seu alcance (máximo) é de 22,5 km.

Fonte: Wikipedia (em finlandês) (2007) (com a devida vénia...)



1. Teceram-se, aqui no blogue, recentemente,  uma série de comentários, interessantes, sobre a artilharia na Guiné, na sequência da publicação uma comunicação, já antiga (2013), mas inédita, do comandante do PAIGC, Osvaldo Lopes da Silva (*). Esse documento chegou-nos pela mão de Coutinho e Lima.

Seria uma pena "perder" esses comentários, deixando-no no limbo da caixa de comentários... O poste que se segue, é uma seleção desses comentários,  e insere-se na série "Lições de artilharia para os infantes" (**)


Morais da Silva (***):


[...] A narrativa artilheira deste senhor [, Osvaldo Lopes da Silva,]  é uma salgalhada sem ponta por onde pegar. "Calcula" coordenadas geográficas de que locais? Das posições? Para quê se não as tem do objectivo pois procurou obter orientação azimutal via clarões das bocas de fogo de Guilege?!

 Ligou as posições com uma poligonal?! Como assim? Como define azimutes sem linha de vista? Como calcula distâncias? A passo, a corta-mato?! E como orienta a caminhada? Ou também calculou latitudes e longitudes? Apurou a posição relativa das bocas de fogo de Guilege! Para quê? Fazer de cada uma um objectivo?!

Enfim, basófia muita, ciência pouca e assistência benévola ou ignorante.
O que certamente aconteceu foi ajustar fogos com observação avançada consentida pelo "recolhimento" das NT. Assim aconteceu em Fevereiro de 71, em Gadamael, mas felizmente os intervenientes na observação e no cálculo eram analfabetos na direcção do tiro. Tomadas medidas de interdição nunca mais o conseguiram fazer passando a executar fogos escalonados em alcance (tiro rolante). 

Na Guiné, as artilharias das NT e do IN eram baratas tontas que actuavam por "intuição" a partir do som e do conhecimento do terreno (quem o conhecia a palmo). Muitas vezes pedi ao meu Cmdt-Chefe que me arranjasse um radar contra-morteiro e o problema da artilharia IN era assunto arrumado. Infelizmente nunca recebi o "presente".
[...]

Manuel Luis Lomba:


[...] O Coronel Coutinho e Lima continua activista em defesa da sua honra, por ter decidido - em desobediência, o que não será displicente - a retirada de Guileje. Como sei, por experiência própria, o que é a viver horas, dias, semanas e meses sob as ameaças em permanências das granadas vindas do céu pelas armas de tiro curvo, estou convencido e respeito a sua honestidade.

A retirada de Guileje é facto acontecimental, como a caixa de Pandora do colapso militar de Portugal na Guiné. E não me escuso ao reparo de que o Coronel Correia de Campos  procedeu em Guidaje exactamente ao contrário de Coutinho e Lima,  o que faz outras ilações...

O virtuoso "militante armado" do PAIGC,  dr. Osvaldo Lopes da Silva [OLS], patrono do aeroporto internacional do Sal, sempre falou com sobranceria, pelos seus talentos militares, ante o 'Nino' Vieira, os seus pares e ante a oficialidade portuguesa politicante correcta.

Não obstante o reconhecimento de "olho e ouvido" junto ao arame farpado dos alvos da sua poderosa e destruidora artilharia ter sido feito por cubano, ele foi tão derrotado em Guileje quanto o Manecas dos Santos em Guidaje. 

A infantaria do PAIGC não conquistou nem uma nem outra posição.  A Artilharia não ganha batalhas; todas as guerras são ganhas pela Infantaria - a arma mais viril de todos os exércitos (ainda não havia a "igualdade de género").

OLS diz que a transferência dos bombardeamentos de Guileje para Gadamael foi um erro (do seu par Pedro Pires), que deveria ser sobre Aldeia Formosa (Quebo). Pois, pois. Ele mandaria as bojardas lá de longe, mas o 'Nino' recusaria investir a sua infantaria a essa distância da fronteira.

Com a não ocupação de Guileje e o fracasso de Gadamael, o PAIGC trouxe à evidência a fragilidade concepcional táctico-estratégica da Spinolândia. Se o General Spínola, quando foi e fugiu de Gadamael no seu helicóptero, empurrado pelo Coronel Rafael Durão, tivesse pegado naquela briosa e valente malta e fosse reocupar Guileje - talvez a história e a situação da Guiné tivesse sido outra.

O texto de OLS é bem elaborado. Entre outras falácias, respigo esta: se o poderio do PAIGC e da sua artilharia era capaz de conquistar qualquer ponto da Guiné, por que é que a operação Amílcar Cabral incidiu apenas sobre guarnições fronteiriças ?  Onde estava a sua ocupação do terreno? [...]



Tabanca Grande Luís Graça:

[...] Parece que não é só o Euromilhões que cria "excêntricos", a guerra também. A guerra e a guerrilha e a contra-guerrilha, e muitas outras atividades humanas, da política ao desporto, da arte à cultura...

A "guerra da Guiné" foi fértil em mitos, de um lado e do outro... Limitando.me aos "operacionais", podíamos citar, de cor, o 'Nino' Vieira (comandante de região), o Osvaldo Lopes da Silva (artilharia), o Manecas Santos (Strela), do lado do PAIGC; Alpoim Calvão, Marcelino da Mata, sargento aviador Honório, do lado das NT... Sem esquecer, o "capitão-diabo", o Teixeira Pinto das "campanhas de pacificação" (1913-1915).

Não fui artilheiro, fui infante, mas gosto de ouvir as lições dos artilheiros para os infantes... Afinal, a guerra é uma arte e uma ciência... Ou é mais arte do que ciência ?

PS - Os académicos também têm culpa na criação de alguns destes mitos... Como vivem, uma boa parte deles, nas "redomas de vidro dos laboratórios sociais", desatam às vezes a falar do sexo dos anjos... Foi por isso que Bizâncio perdeu a guerra contra os otomanos. [...]




António J. Pereira da Costa
 [,de alcunha,  PK]:

António [Carlos Morais da Silva], venho só recordar-te que os radares contra-morteiro, que já existiam no nosso tempo e poderiam ser comprados no "mercado local", a dinheiro, claro, nunca estiveram nas perspectivas dos nossos bem-amados chefes, mentores, motores e garantes ideológicos.

Eles não acreditavam naquela traquineta que o Exército tinha deixado de usar, mas que os exércitos estrangeiros e fabricantes produziam. E a tua extinta DAA ia por essa ideia, lembras-te?

A compra de uma dessas traquinetas, como calculas, arrastar-se-ia no tempo entre subornos, consultas ao mercado e pareceres "técnicos". Daí que a necessidade imediata não seria satisfeita.  Além disso era necessário preparar pessoal para operar e isso, como sabes era cá um dificuldade que nem imaginas...

Por outro lado, a guerra tinha de ser barata e um radar contra-morteiro ou um referenciador pelo som ou pela luz (que também tinham existido) custava os olhos da cara ao erário público. Só o pessoal era (talvez) barato e podia ser rapidamente(?) substituído.

Por acaso, recentemente, descobri que desde os turnos de 1970/71 o pessoal tinha começado a ser artigo crítico, "mas isso são outras lendas, outros mitos e, seguramente outros caminhos da História".
 


Morais da Silva:

Caro PK: na EPA [, Escola Prática de Artilharia, em Vendas Novas,] lembro-me de ter visto o material que referes mas nunca operamos com ele. Apareceu por cá graças ao levantamento da divisão SHAPE. Nunca consegui saber porquê não se adquiriu o radar contra-morteiro que pedi, insistentemente, e que teria permitido congelar a ameaça da artilharia do PAIGC sobre as unidades de fronteira na Guiné. "Malhas que o Império tece".[...]



António J. Pereira da Costa: 


[...] Na EPA, até havia folhetos na Secção Técnica (lembras-te?) sobre esse aparelho... E não era só para ti. As companhias deveriam ter uma traquineta daquelas e devidamente melhorada. Mas não era necessário! 

Os Paigêcês  atacavam sempre da "bolanha do costume" os nossos quartéis instalados em localidades que vinham no mapa e estavam bem iluminadas, e a malta respondia com brevidade e na direcção devida. Se eles estavam inspirados era uma chatice: caiam todas lá dentro. Se tinham feito uma daquelas preparações topográficas que ouviste descrever,  ´távamos safos. O resto era com Jesus Cristo.

Já em 1968, Cameconde foi atacada com Mort 120 mm. Ninguém sabia o que era e todos perguntámos a todos donde vinha, até que houve uma que acertou primeiro numa árvore e explodiu quase à superfície do solo. Já se justificava, portanto,  a distribuição de um aparelho daqueles, só que...


Seria boa ideia termos algo que localizasse as "saídas", mas como não davam, era a olhómetro mão-travessa, como dizia o "Americano" dos motores...[...]

Morais da Silva:


[...] O que me continua a incomodar é não perceber como gente inteligente permitiu que a nossa artilharia na Guiné actuasse como uma "barata tonta".

Notar que o radar, que insistentemente pedi, não só detecta a origem da trajectória dos fogos IN como permite a observação electrónica e consequente ajustamento dos fogos amigos. 

Tal como o Strela reduziu a liberdade do nosso movimento aéreo,  o radar de localização de armas (vulgo contra-morteiro) teria congelado a artilharia do PAIGC.[...]

______________


Notas do editor:

(*) Vd. poste de 27 de agosto de 2019 > Guiné 61/74 - P20100: Dossiê Guileje / Gadamael (32): O texto, inédito, de Osvaldo Lopes da Silva, um dos principais cérebros da Op Amílcar Cabral; mesa-redonda em Coimbra, 23/5/2013: " O ataque a Gadamael, na sequência da queda de Guileje, não foi a melhor opção. Melhor seria um ataque a Quebo (Aldeia Formosa) com forte pressão sobre Tombali. Com a queda de Guileje, Gadamael tornara-se uma inutilidade que não incomodava a ninguém. A sua guarnição devia ser deixada entregue aos mosquitos e ao tédio."



(***) Último poste da série > 10 de junho de  2012 > Guiné 63/74 - P10019: Lições de artilharia para os infantes (6): O obus 14 de Bedanda em tiro direto... (C. Martins / Rui Santos)

Vd postes anteriores:

17 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9915: Lições de artilharia para os infantes (5): Quando o oficial de dia fez um levantamento de rancho... (C. Martins, Cmdt do Pel Art, Gadamael, 1973/74)

4 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9852: Lições de artilharia para os infantes (4): O que era uma bateria (ou bataria)... (C. Martins, Cmdt do Pel Art, Gadamael, 1973/74)

16 de fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9496: Lições de artilharia para os infantes (3): Fazer a rotação, de 180º, do obus 14, para apoiar Jemberém (C. Martins, CMDT do Pel Art, Gadamael, 1973/74)

15 de fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7791: Lições de artilharia para os infantes (2): O artilheiro Doutor, Mansambo, CART 2339, 1968/69 (Torcato Mendonça)

14 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7782: Lições de artilharia para os infantes (1): Como era feito o tiro de obus 14 (C. Martins, ex-Alf Mil, Pel Art, Gamadael)


quarta-feira, 28 de agosto de 2019

Guiné 61/74 - P20103: Dossiê Guileje / Gadamael (33): "Basófia muita, ciência pouca e assistência benévola ou ignorante" (diz o cor art ref Morais da Silva, antigo professor de tiro de artilharia da EPA e da Academia Militar), a propósito da comunicação de Osvaldo Lopes da Silva, apresentada em Coimbra, em 23/5/2013

1. Comentário do cor art ref António Carlos Morais da Silva, membro da nossa Tabanca Grande [, foto atual à esquerda], instrutor da 1ª CCmds Africanos, em Fá Mandinga, adjunto do COP 6, em Mansabá, e comandante da CCAÇ 2796, em Gadamael, entre 1970 e 1972, professor de tiro de artilharia na Escola Prática de Artilharia e da Academia Militar  (*)


A narrativa artilheira deste senhor [, Osvaldo Lopes da Silva,] é uma salgalhada sem ponta por onde pegar.

"Calcula" coordenadas geográficas de que locais? Das posições? Para quê,  se não as tem do objectivo pois procurou obter orientação azimutal via clarões das bocas de fogo de Guilege?! 

Ligou as posições com uma poligonal?! Como assim? Como define azimutes sem linha de vista? Como calcula distâncias? A passo, a corta-mato?! E como orienta a caminhada? 

Ou também calculou latitudes e longitudes? Apurou a posição relativa das bocas de fogo de Guilege! Para quê? Fazer de cada uma um objectivo?!

Enfim, basófia muita, ciência pouca e assistência benévola ou ignorante. 

O que certamente aconteceu foi ajustar fogos com observação avançada consentida pelo "recolhimento" das NT.  Assim aconteceu em Fevereiro de 71, em Gadamael, mas felizmente os intervenientes na observação e no cálculo eram analfabetos na direcção do tiro. Tomadas medidas de interdição,  nunca mais o conseguiram fazer,  passando a executar fogos escalonados em alcance (tiro rolante). 

Na Guiné, as artilharias das NT e do IN eram baratas tontas que actuavam por "intuição" a partir do som e do conhecimento do terreno (quem o conhecia a palmo). 

Muitas vezes pedi ao meu Cmdt-Chefe que me arranjasse um radar contra-morteiro e o problema da artilharia IN era assunto arrumado. Infelizmente nunca recebi o "presente".

Morais da Silva
Coronel de Artilharia
Professor de tiro de Artilharia na EPA [Escola Prática de Artilharia] e na Academia Militar

_____________

Nota do editor:

(*) Vd. poste de 27 de agosto de 2019 > Guiné 61/74 - P20100: Dossiê Guileje / Gadamael (32): O texto, inédito, de Osvaldo Lopes da Silva, um dos principais cérebros da Op Amílcar Cabral; mesa-redonda em Coimbra, 23/5/2013: " O ataque a Gadamael, na sequência da queda de Guileje, não foi a melhor opção. Melhor seria um ataque a Quebo (Aldeia Formosa) com forte pressão sobre Tombali. Com a queda de Guileje, Gadamael tornara-se uma inutilidade que não incomodava a ninguém. A sua guarnição devia ser deixada entregue aos mosquitos e ao tédio."

quinta-feira, 21 de maio de 2015

Guiné 63/74 - P14644: (De)caras (21): Em defesa da artilharia e dos artilheiros... e contra o lugar-comum "Importante é a versão, não o facto"... (Vasco Pires, bairradino em terras do Novo Mundo, fazendo também aqui prova de vida, sob o sagrado poilão da Tabanca Grande)


Vasco Pires, um artilheiro de corpo inteiro, fazendo aqui prova (pública) de vida, a meio corpo...



1. Mensagem do nosso camarada, o grã-tabanqueiro Vasco Pires, que no passado século, por volta de 1970/72, lá no cu de Judas, na África profunda, em terras de Tombali, num sítio chamado Gadamael,  foi bravo artilheiro, comandante do 23.º Pel Art, numa guerra que já se varrei da memória dos povos...

Data: 19 de maio de 2015 às 16:19

Assunto: ...Ainda a Artilharia.

"Importante é a versão, e não o facto " (Anónimo).


Caríssimos Carlos e Luis, 

Nós (Artilharia), fomos (somos) poucos e quase esquecidos, uma meia dúzia, talvez, nesta "Grande Tabanca"

Ultimamente as referências que tenho lido, aqui e em outras média, falam de fogo amigo, folclorizando e apequenando a atuação da Artilharia.

Tenho a convicção que,  além de um ou outro estudioso, só nós mesmos lemos os nossos escritos.
Mais tarde, um ou outro antropólogo vai dar uma olhada na nossa versão da História.

Será justo, passar a ideia de Artilheiros relapsos ou trapalhões?

O GAC7 (GA7), teve trinta e dois Pelotões espalhados pelo TO da Guiné, apoiando tropas debaixo de fogo IN, atingindo importantes alvos, quer por ordem superior, quer como fogo de contra-bateria, por vezes apoiando outros aquartelamentos, até tiro direto, para impedir supostas invasões do quartel.

Como somos minoria, a nossa voz quase não é ouvida, mesmo ténue, aqui fica registrada a minha.

Forte abraço.
E siga a Artilharia (que na Guiné estava parada)

VP
Ex-soldado de Artilharia

PS - Conforme solicitado pelo nosso editor-chefe, segue em anexo foto atual.

______________

domingo, 10 de junho de 2012

Guiné 63/74 - P10019: Lições de artilharia para os infantes (6): O obus 14 de Bedanda em tiro direto... (C. Martins / Rui Santos)






Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > Agosto de 1972 > Espetacular foto noturna do obus 14 em ação... Segundo o nosso camarada Nuno Rubim, e um dos maiores especialistas portugueses de história da artilharia portuguesa, "de acordo com um relatório oficial português que encontrei no AHM [Arquivo Histórico Militar],
no dia 16 de Maio [de 1973], isto é, dois dias antes do ataque, as três peças de 11, 4cm foram substituídas por 2 obuses de 14 cm (3). Agora se compreende a polémica sobre o assunto. Um deles veio sem aparelho de pontaria e não foi recebida nenhuma tábua de tiro ! Sem comentários... Esses 2 obuses foram pois abandonados, mas sem possibilidades de entrarem em acção e capturados pelo PAIGCTenho uma fotografia desse facto." (Vd. poste P1672).
Foto: © Vasco Santos (2011). Todos os direitos reservados.

1. Resposta, com data de 28 de maio último, de C. Martins,  a um comentário do Rui Santos (*):


(i) Comentário do Rui Santos:

João Martins:


Quem conhece Bedanda, aliás Amedalai, pois Bedanda é lá em baixo a 700 metros do Ungauriol, fica de facto num pequena colina (23 metros de cota de nível) e se o inimigo atacasse vinha de baixo...Assim,  como é possivel um aparelho que faz tiro tenso (suponho) dispare por cima das moranças e vá cair a cerca de 1.000 metros à cota de 2/3 metros ???  (...)

Rui Santos
Ex-alferes miliciano
Bedanda 1963/1964

(ii) Resposta de C. Martins:

Caro camarada Rui Santos

Não conheço Bedanda nem Amedelai.

O obus 14 tinha uma elevação de - 5º a + 45º, por isso podia fazer tiro de uma cota superior para uma inferior e tiro directo.


Tinha um grande inconveniente, que era se se fizessem muitos tiros com graduação negativa ou tiro directo,  normalmente rebentava com os hidráulicos e ainda para armar a espoleta esta necessitava de percorrer cerca de 500 m. 

Esta armava pela força centrífuga devido ao seu movimento de rotação. A granada saía sempre a uma velocidade superior à do som. A maior ou menor velocidade dependia da carga. Com carga 4 e a + 45º saía a 640 m/s.

Mesmo que não rebentasse, convenhamos que uma "ameixa" com 14 cm de diâmetro e com 45 cm de comprimento e ainda com 45 kg,fazia "ronco" de certeza.

Fiz uma vez uma experiência em Gadamael com tiro a -2º para o outro lado do rio a uma distância de 600m, onde nos dias da "brasa"estava um posto avançado de observação do IN. A granada explodiu só que alguns estilhaços caíram no perímetro do quartel. Não voltei a fazer a experiência, e felizmente nunca foi necessário fazê-lo em nenhuma flagelação.

A artilharia é a arma dos fogos largos e profundos e de tiro tenso, mas como a necessidade aguça o engenho, também em circunstâncias especiais podia ser de fogos curtos e pequenos,  só que podíamos levar com estilhaços na "mona" ou em outro sítio, fica à vontade do freguês.

Ah, o raio de acção da explosão da granada podia atingir os 400m, tudo dependia da dureza do terreno no impacto.

Julgo que esclareci os infantes (**) e o camarada Rui Santos.
Um alfa bravo

C.Martins

(iii) Comentário de Rui Santos, com data de 29 de maio último:

Amigo C. Martins>


Obrigado pelos esclarecimentos, mas quem conheceu Bedanda/Amedalai, sabe que a cota de Amedalai onde estavam estacciondos os obuses é de cerca de 22, e que as bolanhas circundantes estão a uma cota 4, bem como se houver um ataque jamais será executado a menos de 200 metros do aquartelamento, pois lá de baixo para cima só com morteiro, e não estou a ver o IN a atravessar qualquer linha de água com o morteiro ás costas. 

Diga-me então como é possivel fazer fogo 3/4 metros acima das moranças e as granadas cairem a 200 metros??? quase no topo da colina?? 

Nunca fomos flagelados em Amedalai como o fui em Bedanda, pois a aproximação do IN mais segura seria directamente pela mata do Cantanhez que ficaria a cerca de 100 metros da sebe de arame farpado.

Falarei com este amigo João Martins pessoalmente no dia 9 (***), se Deus quiser  (...)
 ______________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 26 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9947: Memórias da minha comissão (João Martins, ex-alf mil art, BAC 1, Bissum, Piche, Bedanda e Guileje, 1967/69): Parte VI: Bedanda, com o obus 14: um dos locais que me deixou mais saudades...

(**) Último poste da série > 17 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9915: Lições de artilharia para os infantes (5): Quando o oficial de dia fez um levantamento de rancho... (C. Martins, Cmdt do Pel Art, Gadamael, 1973/74)


(***) Data do 2º encontro, na Mealhada,  dos bedandenses, organizado pelo António (Tony) Teixeira e que, segundo conversa telefónica que tive ontem com o Pinto de Carvalho, reuniu umas boas dezenas de camaradas (Tenho ideia de ele me ter falado em 50)...

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Guiné 63/74 - P9915: Lições de artilharia para os infantes (5): Quando o oficial de dia fez um levantamento de rancho... (C. Martins, Cmdt do Pel Art, Gadamael, 1973/74)


[Foto à esquerda, de Lázaro Ferreira, nosso próximo grã-tabanqueiro: malta de Gadamael, 1974].


1.  O C. Martins - nosso leitor e camarada, mais conhecido por ter sido o "último artilheiro de Gadamael" , comandante do Pel Art 23, que acabará por (con)fundir-se com o 15, mas também médico, hoje, no Portugal profundo, -  não faz parte formalmente da nossa Tabanca Grande (TG), por razões alegadamente deontológicas, éticas  e profissionais que eu entendo e respeito. Isto quer dizer que: (i) nunca pediu para aderir à TG; (ii) nunca aceitou o meu convite para ingressar na TG; (iii) nunca se apresentou ao "pessoal da caserna", como mandam as NEP do blogue; (iv) nem nunca enviou as duas fotos da praxe... 

Em contrapartida, é leitor assíduo, fã do nosso blogue, comentador diário dos nossos postes, frequentador dos nossos encontros nacionais, e profundo conhecer da Guiné, amigo das suas gentes... Tem, além disso - e excecionalmente - uma série feita com os seus comentários neste blogue... Ele é um bom contador de histórias, tem sentido de humor, e muitas memórias da tropa, da guerra e da paz, por partilhar... Seria uma pena que esta, que a seguir (re)publicamos, ficasse  escondida (e perdida) na montra traseira (que é a caixa de comentários) do nosso blogue... 

Sem sequer lhe pedir autorização (já foi dada tacitamente), aproveitei esta história, que considero exemplar, para mais um poste da série Lições de artilharia para os infantes... Pode perguntar-se: Foi a tropa uma escola de virtudes ? Quero eu dizer, a tropa do nosso tempo... Aprendia-se lá só coisas de artilharia, infantaria, cavalaria, transmissões ? Mas também valores ?... 

A pergunta não tem uma resposta dicotómica: como de resto tudo na vida, nada  pode ser visto a preto e branco... Depois da história do J.L. Mendes Gomes, a do C. Martins: são duas histórias que têm direito a "mural ao fundo"... Não confundir com "moral"... São histórias que se prestam a que a gente, os grã-tabanqueiros e demais leitores deste blogue, escrevem os seus grafitos na parede (mural), ao fundo... Eu diria que são "contos morais"... Mas ao leitor é que é reservada a última palavra. 

O C. Martins que me perdoe a partida, mas achei que este seu comentário era um pequeno diamante em bruto, que merecia ser lapidado... Podia tentar adivinhar quando e com quem se passou... Seguramente, gente da artilharia, mas para o caso não interessa. Os "contos morais" não têm historicidade, isto é, a espessura e a ganga do tempo e do espaço... (Quanto a mim, limitei-me a fazer o papel do escriba de serviço, neste turno, que foi o de fazer a fixação do texto; os méritos vão inteirinhos para o C. Martins).

Para o J.L. Mendes Gomes vai também o meu apreço pela coragem e frontalidade com que ele partilha, connosco (e com os netos...), uma história que alguns poderiam/poderão achar "politicamente pouco correta"... (LG).


 2. Lições de artilharia para os infantes > Quando o oficial de dia fez uma levantamento de rancho...


por C. Martins

Este tema é muito interessante: Relação entre comandantes e comandados e vice-versa (*).

Atitudes, justiça, injustiça, abuso de poder, capacidade de liderança ou não, coesão ou espírito de corpo.
Todos nós tivemos casos, independentemente da categoria ou posto hierárquico.

A propósito de rancho... Lembro-me de um caso passado num regimento de uma cidade alentejana. O oficial de dia fez um levantamento de rancho !!!!.

Este tinha por hábito não se limitar a provar a comidinha da bandeja, mas verificar as pesagens dos géneros segundo as NEP. Era vitela à jardineira: tanto de ervilhas, cenouras, batatas e a carne da dita.


Iniciado o repasto, que a bem da verdade o pessoal comia com sofreguidão, o dito oficial, olhando de soslaio para pratos e travessas repara que havia ervilhas, cenouras, grande quantidade de batatas e, surpresa,  a carne praticamente tinha-se evaporado!. 
-  NINGUÉM COME MAIS, CAR...!!! - berra o gajo com um galãozito transversal no ombro, e enceta uma corrida frenética até à cozinha onde se depara com grandes nacos de carne sobre a bancada.

Transtornado, enfia uma cabeçada no 1º sargento vago-mestre ou lá o que era:
- Você está preso,  seu f... da p...!. E estão todos presos, seus cabr...f...das p..., bandidos, gatunos! ...

Mais calmo, tenta contactar o comandante que não estava, o 2.º também não... Bem, a alternativa era o contacto com o QG da região militar. Atende o oficial de dia da respectiva:
- ... Fez o quê ?!! Você já desgraçou a sua vida!

Nesse dia almoçou-se só às cinco da tarde. 

O sorja f... da p... tinha por hábito gamar a carne e outros géneros que vendia a talhos e estabelecimentos civis,  com a conivência dum cabo RD... Os outros elementos da cozinha eram ameaçados para se calarem. A justiça militar atuou com penas exemplares... O aspiranteco teve um elogio verbal e foi mobilizado para o CTIG.

Qualquer coincidência com a realidade não foi mera ficção.

C.Martins (**)
_______________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 16 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9910: Cartas do meu avô (4): Segunda Carta: Em Catió (Parte III) (J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil, CCAÇ 728, Bissau, Cachil e Catió, 1964/66).



(**) Último poste da série > 4 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9852: Lições de artilharia para os infantes (4): O que era uma bateria (ou bataria)... (C. Martins, Cmdt do Pel Art, Gadamael, 1973/74)