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quinta-feira, 12 de outubro de 2017

Guiné 61/74 - P17855: As memórias revividas com a visita à Guiné-Bissau, que efectuei entre os dias 30 de Março e 7 de Abril de 2017 (8): 6.º Dia: Bissau, Safim, Nhacra, Jugudul, Bambadinca, Bafatá e Gabu (António Acílio Azevedo, ex-Cap Mil)


1. Continuação da publicação das "Memórias Revividas" com a recente visita do nosso camarada António Acílio Azevedo (ex-Cap Mil, CMDT da 1.ª CCAV/BCAV 8320/72, Bula e da CCAÇ 17, Binar, 1973/74) à Guiné-Bissau, trabalho que relata os momentos mais importantes dessa jornada de saudade àquele país irmão.

AS MINHAS MEMÓRIAS, REVIVIDAS COM A VISITA QUE EFECTUEI À GUINÉ-BISSAU ENTRE OS DIAS 30 DE MARÇO E 7 DE ABRIL DE 2017

AS DESLOCAÇÕES PELO INTERIOR DA GUINÉ-BISSAU (8)

6.º DIA – DIA 04 DE ABRIL 2017: BISSAU, SAFIM, NHACRA, JUGUDUL, BAMBADINCA, BAFATÁ E GABU:

Depois de mais uma noite bem dormida, apesar do calor, e de um bom pequeno-almoço, que todas as manhãs já encontrávamos preparado na nossa habitual mesa, eis-nos preparados para mais uma etapa, entrando no jeep e deste vez com destino a terras do leste da Guiné.

Sempre bem conduzidos pelo motorista Armando, eis-nos sentados na nossa habitual viatura saindo, mais uma vez, em direcção a Safim, localidade onde, num posto de abastecimento da Galp, enchíamos o depósito de gasóleo, cujo preço que penso já atrás ter referido, era de 635 francos guineenses por litro, a que correspondem 98 cêntimos de euro.

Abastecimento concluído, divergimos em Safim, em direcção a Nhacra, pequena vila situada no sector da região administrativa de Oio e local onde, na época da nossa “estadia” por terras da Guiné se sediavam os antigos emissores da rádio da antiga Emissora Nacional, de Portugal, e onde também se sediava o quartel defensor não só daquele posto emissor, bem como da própria Vila, mas sobretudo funcionando como guarda avançada de defesa da Cidade de Bissau.

Foto 78 - Nhacra (Guiné-Bissau): Curiosa foto com o pequeno hospital em fundo (cor rosa), com os doentes na “sala de espera” exterior ao edifício e a placa informativa dessa Unidade de Saúde, colocada ao lado da estrada que segue para Mansoa. Em segundo plano, distinguem-se as duas antenas dos emissores/receptores das comunicações 
Foto: Com a devida vénia a http://www.flickriver.com

Daqui continuámos a nossa marcha, passando primeiro por Jugudul, localidade onde, num posto também da Galp Energia, parámos para encher de água o respectivo depósito da viatura e em cuja loja entrámos para tomarmos uma bebida fresca, já que o calor se começava a sentir e ainda tínhamos algumas dezenas de quilómetros para percorrer até chegarmos à cidade de Bafatá, que também tinha conhecido no ano de 1974.

Encaminhámo-nos para Bambadinca, até atingirmos Bafatá, passando pelo caminho por várias bolanhas onde se cultiva o arroz, uma das principais fontes de alimentação do povo guineense, ao que parece insuficiente, pois vimos em várias feiras/mercados locais, vendas em sacos desse produto, importado da América do Norte e de outros Países.

Ainda em Jugudul, aproveitei também para tirar uma foto ao antigo quartel militar, por sinal, ainda em razoáveis condições de conservação, mas que, soubemos depois, se justificavam pelo facto de parte do espaço ter sido ocupado por uma pequena empresa ligada à área das bebidas, que aí instalou uma destilaria, mas da qual fiquei sem saber o nome. De qualquer forma, uma louvável iniciativa de aproveitar um espaço que, sem isso, cairia no abandono e na ruína como muitos outros edifícios, não só militares, que vimos por toda a Guiné que visitámos.
Não posso deixar de salientar a boa estrada em que circulávamos, toda ela bastante bem asfaltada, em terreno plano e com extensas retas.

Seguindo a nossa viagem, chegámos, cerca de 50 quilómetros depois à vila de Bambadinca, centro estratégico durante o tempo da guerra colonial, também localizada junto às margens do Rio Geba, povoação que depois se foi gradualmente desenvolvendo e onde, nos dias de hoje, também deparamos nas ruas com diversos estabelecimentos comerciais onde, além de produtos agrícolas da região, se vêm à venda sacos com artigos tão diferentes como o arroz e o adubo, mas também se comercializam em pequenas bancadas, outros produtos como a gasolina e óleo destinados às motos e motorizadas, conforme se mostra numa das fotos seguintes, situação idêntica à que já havíamos deparado noutras localidades, como em Susana, no norte da Guiné, junto à fronteira com o Senegal e a que já havia feito referência atrás.

Foto 79 - Jugudul (Guiné-Bissau): As instalações do antigo quartel, actualmente transformadas numa pequena destilaria, explorada, ao que parece, por pequenos empresários locais.
Foto: © A. Marques Lopes. Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

Ultrapassada a localidade de Jugudul, continuámos a nossa viagem em direcção a Bambadinca, sediada a caminho do nosso primeiro destino, que era Bafatá. Que dizer sobre Bambadinca, onde estava instalada uma nossa companhia militar durante a guerra colonial?!
Que é actualmente uma povoação onde ainda se vê algum pequeno comércio tradicional, mas onde a maior parte do piso dos seus arruamentos são em terra e com muitas covas e muito degradadas, mais parecendo estar em sintonia com o que tivemos oportunidade de ver em muitas outras localidades que visitámos.

Era uma zona em que as nossas tropas colocadas nesta povoação bem como em Xime e em Galomaro, ao ocuparem essas posições estratégicas, tinham por principal missão o controlo dos movimentos das tropas do PAIGC de norte para o sul do território e vice-versa.

Foto 80 - Bambadinca (Guiné-Bissau): Aspecto actual de uma das suas ruas, com o antigo edifício dos CTT, a meio da foto
Foto: © Jaime Machado (2015). Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

Foto 81 - Bambadinca (Guiné-Bissau): Espaços comerciais numa rua da localidade, onde, em bancada avançada, lá se vê a venda de óleos e gasolinas, para as motoretas e dentro das lojas, arroz em sacos
Foto: © João Graça (2009) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados

Passadas estas localidades, continuámos a nossa viagem, utilizando uma estrada, sempre em terreno plano e bem asfaltada, marginada por bolanhas onde os naturais cultivam o arroz e aproximando-nos de Bafatá, cidade que tinha conhecido em Julho/Agosto de 1974, período em que acompanhei, por indicação do Comandante de Batalhão de Bula, o Major Dick Daring e outros quadros do PAIGC em acções de cariz psicológico, que tinham por intenção a aproximação e o contacto com as populações das localidades sediadas em três dos sectores da Guiné (creio que os sectores 2, 3 e 5) e de que o Comandante Dick Daring, era o responsável.

Vencidos esses cerca de 120 quilómetros, numa viagem calma e segura, chegámos a Bafatá, terra natal de Amílcar Cabral, fundador do PAIGC, cerca das 11 horas da manhã, cidade que nos recebeu também com tempo quente, mas que, em minha opinião, me decepcionou de imediato, já que aquilo que eu estava a ver, se apresentava muito pior e nada parecido com a que eu tive a oportunidade de conhecer em 1974.

Uma breve passagem de jeep pelas duas principais ruas de Bafatá, deu-me logo para perceber que esta cidade, outrora tão bonita e acolhedora e até com certo ar cosmopolita, está agora muito mais suja e pior conservada, realidades que me entristeceram bastante, principalmente ao olhar a antiga bela avenida que, do centro da cidade, conduz ao Rio Geba e que agora se encontra muito mal cuidada, o mesmo acontecendo com o bonito jardim que existia junto àquele rio que corria no final dessa avenida.

De louvar o aspecto cuidado em que ainda se encontra a elegante Igreja da cidade, localizada sensivelmente a meio e à direita dessa avenida que desemboca no Rio Geba, bem como o bem conservado edifício do hospital, construído um pouco mais acima e do lado esquerdo, para quem desce em direcção ao rio.

Dos antigos e bons restaurantes que ali existiam, resta o “Ponto de Encontro”, situado na Rua Porto e propriedade do casal D. Célia e José Dinis, portugueses das Caldas da Rainha e local onde depois saboreamos um bom almoço de carne de gazela, que com gosto nos prepararam, tendo-nos ainda afirmado que, embora gostem muito de Bafatá, têm muitas saudades de Portugal, onde têm as duas filhas a residir.
Como curiosidade, e porque o vimos chegar conduzindo um carro pesado de instrução, ficamos a saber que o Senhor José Dinis, é também proprietário de uma Escola de Condução, única que existe no interior da Guiné.
Foi muito agradável este “ponto de encontro” com o casal Dinis, porque se para nós foi muito bom termos este convívio em terras do interior guineense, com pessoas nossas conterrâneas, que ali labutam e vivem, para eles, ficámos convictos da enorme alegria que sentiram em contactar e falar connosco, porque segundo nos afirmaram só ali restam três Portugueses Continentais.

Como ainda faltavam cerca de duas horas para o almoço, decidimos dar primeiro uma saltada a Gabu, que dali dista 52 quilómetros, a fim de visitarmos esta cidade do interior leste.

Foto 82 - Bafatá (Guiné-Bissau) – Bela imagem da avenida, creio que dos anos 70 e que ligava a zona central da cidade ao Rio Geba e actualmente bem mais degradada do que a foto mostra. A meio, e à esquerda da avenida, vê-se a bonita Igreja da cidade.
Foto: © Humberto Reis (2006). Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

Foto 83 - Bafatá (Guiné-Bissau): A mesma avenida, com uma foto actual e que foi tirada ao lado da Igreja e em sentido inverso, vendo-se, em comparação com a imagem anterior, a total falta de asfalto naquela avenida
Foto: Com a devida vénia a TV Televisão de Moçambique

Foto 84 - Bafatá (Guiné-Bissau): Busto de Amílcar Cabral, erigido na sua terra natal, num largo junto ao Rio Geba

Foto 85 - Bafatá (Guiné-Bissau): Mercado da cidade, no largo onde existe o busto de Amílcar Cabral e junto ao Rio Geba
Foto: Com a devida vénia a Wikipédia

Foto 86 - Bafatá (Guiné-Bissau): Memorial a Amílcar Cabral, militante do PAIGC e fundador da nacionalidade e erguido numa praça do centro da cidade, situada no topo norte da avenida que desce até ao Rio Geba

Foto 87 - Bafatá (Guiné-Bissau): Hospital da cidade, localizado na avenida de acesso ao Rio Geba

Foto 88 - Bafatá (Guiné-Bissau): Os colegas Monteiro e Cancela, com o casal Célia e José Dinis, portugueses das Caldas da Rainha e proprietários do Restaurante “Ponte de Encontro”, onde almoçámos

A rápida deslocação de ida e volta à cidade de Gabú (ex-Nova Lamego), situada 52 quilómetros para o leste de Bafatá e a cerca de 30 quilómetros da fronteira com a Guiné-Conakry, foi percorrida em estrada asfaltada e de óptimo piso com longas rectas, a última das quais, antes de Gabu, com 20 quilómetros de extensão, conforme pudemos confirmar no regresso através do conta-quilómetros do jeep, deu bem para apreciar toda a paisagem envolvente, recheada de grandes manchas de vegetação verde.

Gabú, é um importante centro económico desta região leste do País, que se aproveita do facto de se encontrar muito próximo da fronteira de Guiné-Conakry, para trazer até ela muitos comerciantes desse País vizinho.
A sua população constituída, maioritariamente por elementos da etnia fula, com fortes raízes ligadas ao islamismo, possui uma população que deve actualmente rondar os 16.000 habitantes.
Embora no tempo da guerra colonial lhe tivesse sido imposta a designação de Nova Lamego, logo após a independência, voltou a designar-se Gabú, tendo nos dias de hoje, retomado o primado na importância das cidades do leste da Guiné-Bissau, em detrimento de outras localidades, como Bafatá, que durante a guerra colonial exerceu essa primazia, sendo no momento actual o centro nevrálgico de toda a movimentação comercial da Guiné-Bissau, logo a seguir à capital, Bissau.
Foi para nós extraordinário ver o enorme mercado de rua que é exercido nas principais artérias de Gabú, onde se expõe e vende de tudo (só não vi automóveis à venda), que atinge alguns quilómetros de extensão, e onde, em por vezes, em improvisadas tendas, são comercializados todos os tipos de produtos e mercadorias, que vão desde pequenos adereços locais, até a motorizadas, passando pela comercialização de arroz, fruta e produtos hortícolas.

Que mais dizer, apenas que é simplesmente espectacular, ver o número elevado de pessoas, que marca presença neste tipo de actividade comercial, quer sejam eles vendedores ou simples compradores.
Gostei de ver e sentir todo o pulsar desta cidade, principalmente na vertente comercial que vimos estar em marcha nesta simpática e acolhedora urbe, sendo difícil admitir que outra qualquer cidade da Guiné-Bissau, possua a pujança que vimos existir em Gabú.

Regressámos pouco depois a Bafatá, onde conforme combinado com o Casal Célia e José Dinis, proprietários do Restaurante “Ponto de Encontro”, nos esperava o almoço.

Foto 89 - Gabu (Guiné-Bissau): Uma das ruas da principal cidade do leste do País, que se enche de vendedores ambulantes, nos dias de feira
Foto: © João Graça. Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

Foto 90 - Gabu (Guiné-Bissau): Panorâmica de uma rua desta cidade, em dia de feira. Reparem no elevado número de tendas que marginam a rua
Foto: © João Graça. Luís Graça & Camaradas da Guiné

Foto 91 - Gabu (Guiné-Bissau): A confusão nas ruas da cidade, em dia de feira
Com a devida vénia a VOA

Foto 92 - Gabu (Guiné-Bissau): Rua da cidade, onde se vêm 2 prédios da era colonial, num dos quais existe uma agência do Banco da África Ocidental, já com multibanco.
Foto: © João Graça – Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

Foto 93 - Gabu (Guiné-Bissau): Venda ambulante de pão. Vimos isto em quase toda a Guiné
Com a devida vénia a mapio.net

Fotos: © A. Acílio Azevedo, excepto as cujos autores e proveniência foram devidamente indicados

(Continua)
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Nota do editor CV

Último poste da série de 10 de outubro de 2017 > Guiné 61/74 - P17844: As memórias revividas com a visita à Guiné-Bissau, que efectuei entre os dias 30 de Março e 7 de Abril de 2017 (7): 5.º Dia: Bissau, Safim, Bula, Binar e Bissorã (continuação) (António Acílio Azevedo, ex-Cap Mil)

domingo, 26 de fevereiro de 2017

Guiné 61/74 - P17084: Agenda cultural (542): "O que é feito da Guiné-Bissau?"... Reportagem de uma equipa da TVI, dirigida pelo jornalista Vítor Bandarra, passa este fim de semana (dias 25 e 26, no Jornal das 8)... A não perder...







Fotogramas do vídeo "O que é feito da Guiné-Bissau ?", da TVI (com a devida vénia)


1. Hoje e amanhã na TVI, Jornal das 8


"A Guiné-Bissau tornou-se um país esquecido, apontado apenas quando se fala de instabilidade política ou de narcotráfico. No entanto, a Guiné-Bissau é muito mais do que isso e podia ser um país rico e próspero, virado para as pescas, a agricultura ou o turismo, por exemplo.

"Apesar da instabilidade política, algumas centenas de portugueses fazem vida e negócios na Guiné-Bissau. Uma equipa de reportagem da TVI viajou pela Guiné, de Bissau a Bafatá, de Cacheu ao arquipélago dos Bijagós."

Uma grande reportagem cuja primeira parte passou este sábado no Jornal das 8. E a II parte parte será apresentada, hoje, domingo.

Para saber nmais, ver aqu,

TVI: O que é feito da Guiné.-Bissau ? > Um paraíso (quase) perdido | Reportagem de Victor Bandarra | Imagem de Bruno Vinhas | Edição de imagem de João Ferreira

Excertos:

(...) "A Guiné-Bissau podia ser o paraíso na Terra. Mas não é! A Natureza é pródiga, a paisagem enche os olhos, os rios espreguiçam-se por recantos lindos de morrer. Com apenas 1,8 milhões de habitantes, o país tem tudo para ser rico. Mas não é! Apenas com o turismo no arquipélagos dos Bijagós (mais de 80 ilhas e ilhotas), além das pescas e respectivas licenças, mais o caju e os produtivos campos de arroz, a Guiné-Bissau podia ser rica. Mas não é! Há petróleo nas suas águas, há minerais nobres no interior, mas a Guiné-Bissau é o 5º país mais pobre do Mundo. E o Povo? Os povos, mais de 30 etnias, são orgulhosos, resistentes e pacíficos. E são solidários, porém pobres, muito pobres, como sempre foram. E ninguém passa fome, apenas e só graças à Natureza e à tradicional solidariedade bantu." (...)

(...) "Para milhares de portugueses que cumpriram serviço militar na então província ultramarina, restam as memórias dos momentos tensos e dramáticos da guerra, mas também as boas recordações do país verde, até bucólico, que podia ser o Paraíso na terra. Que não era, e que não é! Valham as esperança no futuro e o juízo de quem manda e decide." (...) 


2. Comentário do nosso colaborador permanente Hélder Sousa:


Vi, sim senhor. Ou melhor, vi uns bocados, pois houve umas perturbações pelo meio, mas o que vi pareceu-me feito de forma séria.

Vou aguardar pela segunda, hoje domingo,  para ter a visão completa mas fiquei com a ideia que o programa pretende dar uma imagem positiva.

Fala-se das dificuldades, mas não as tornam intransponíveis.

Fala-se daquilo que todos nós, que lá vivemos, a maioria sem tempo, nem paciência, nem apetência, para apreciarmos bem, e que referimos muitas vezes sobre as características afáveis, simpáticas e até 'envolventes' do povo da Guiné, apesar das inúmeras etnias e suas diferenças.

Fala-se de como o País é pobre mas das verdadeiras e reais potencialidades que tem, principalmente turísticas, assim o 'clima social' o permita. A propósito dessa vertente turística talvez não seja por acaso que está previsto (e anunciado, como sabemos) que na próxima BTL (bolsa de turismo de Lisboa) vai ser lançado por um conjunto de operadores e agências de turismo vários programas diversificados para turismo na Guiné, principalmente nos Bijagós.

Fala-se dos portugueses que ainda hoje 'fazem vida na Guiné', alguns deles até já referidos aqui no Blogue, e de como encaram a vida lá. Também sobre 'empreendedores' que trabalham para e com a Guiné.

Parece que vamos acompanhar, em parte, a vivência de três jovens médicos que resolveram (aparentemente contra toda a lógica) "passar férias" a Guiné. Já os vimos a experimentar frutos estranhos e a gostarem (já devem ter bebido 'água do Geba'...) e a movimentarem-se com todo o à-vontade no meio aparentemente caótico daqueles mercados [, em Nhacra, por exemplo, onde a equipa de reportagem da TVI os apanhou a cmainho de Bafatá e do Saltinho].

Já os vimos em 'peregrinação' a Quinhamel e às ostras.

Também me parece que o autor do programa, Vítor Bandarra, salvo erro, já tem muita familiaridade com o meio ou então fez o 'trabalho de casa'.

Encontrar e enquadrar no programa o músico [Juca Delago] e o jogador de futebol [Toni, antogo campeão mundial de júniores pela selção portuguesa] parece-me, também, uma jogada feliz.

Em suma, faltará falar, ver, comentar, muita coisa mas, pelo menos, não está a ser uma reportagem nem 'lamechas', nem 'bota-abaixo', nem 'paternalista'.

Hélder Sousa
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Nota do editor:

terça-feira, 30 de agosto de 2016

Guiné 63/74 - P16431: Álbum fotográfico de Adelaide Barata Carrêlo, a filha do ten SGE Barata (CCS/BCAÇ 2893, Nova Lamego, 1969/71): um regresso emocionado - Parte VIII: Bafatá, o restaurante "Ponto de Encontro", da Célia e do João Dinis, os nossos mais recentes grã-tabanqueiros



´
Guiné-Bissau > Bafatá > Outubro de 2015 > Restaurante "Ponte de Encontro"


Foto (e legenda): © Patrício Ribeiro (2016) Todos os direitos reservados. [Edição: L.G.]


1. Continuação da publicação do álbum fotográfico e das notas de viagem de Adelaide Barata Carrelo, à Guiné-Bissau, em outubro-novembro de 2015 (*)

[Foto à esquerda, a Adelaide Carrêlo mais o dono da casa, o João Dinis, um antigo militar português, natural das Caldas da Raínha,  que fez parte da CART 496 (Cacine e camecon de, 1963/65), que tem também uma escola de condução, e é casado com a Célia (**); a Adelaide conheceu o João Dinis, em 1970, em Nova Lamego, aos sete anos; ambos pertencem agora à nossa Tabanca Grande]. 

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Notas do editor:

´(*) Último poste da série > 29 de agosto de 2016 > Guiné 63/74 - P16429: Álbum fotográfico de Adelaide Barata Carrêlo, a filha do ten SGE Barata (CCS/BCAÇ 2893, Nova Lamego, 1969/71): um regresso emocionado - Parte VII: Bafatá, Rio Geba 
ao pôr do sol

(**) Vd. poste de 5 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14120: Manuscrito(s) (Luís Graça) (43): Notas à margem do documentário de Silas Tiny, "Bafatá Filme Clube", com direção de fotografia da Marta Pessoa (Portugal e Guiné-Bissau, 2012, 78')

(...) )(ix) O João Dinis… Um camarada do nosso tempo que ficou em Bafatá, veio casar a Portugal e levou a esposa, Célia, para a Guiné em 1972… É um homem, desencantado, precomente envelhecido, mas ainda a reconhecer que ama África e a terra que escolheu para viver e trabalhar. 

Quando jovem, vivia melhor em Bafatá do que em Portugal, costumava dizer ele para os seus antigos camaradas de armas... Mas hoje confessa que ainda sonha em acabar os seus dias na sua terra, Portugal… O casal, João e Célia Dinis, abriram um negócio na área da restauração e hotelaria, mas hoje a baixa de Bafatá não tem gente, está às moscas…“O movimnento é que faz falta", diz ele... Havia barcos, havia camiões, sempre a carregar e a descarregar, havia correpios de gente na baixa... Agora é o vazio, diz o Toninho, que deve ser homen dos seus cinquentas e tais anos (, era criança quando das primeiras flagelações do PAIGC a Bafatá, em 1973, de se lembra bem; o pai mandava o Canjajá desligar as luzes do cinema e levar o Toninho e os primos para casa...).

(x) No filme, o João Dinis fala para a câmara, num verdadeiro monólogo, tentando explicar as razões por que se foi deixando ficar até hoje...O realizador e o diretor de fotografia não fazem perguntas nem fornecem informação de contextualização: Bafatá é atravessada por uma "câmara muda"; há momentos de antologia como a sequência da partida de futebol, disputada ao longe (no estádio da Rocha) sob um uma nuvem de pó que se poderia confundir com o cacimbo...); ou a cena em que Canjajá, vestido de preto e com ar de asceta, faz as suas orações virado para Meca, enquanto um grupo de mulheres, a um canto da casa, tagarelam e dão continuidade à vida; ou ainda a cena, bem conseguida, em que um voluntarioso entrevistado se transforma em proativo entrevistador, inquirindo em crioulo, de microfone em punho, a opinião dos seus conterrâneos sobre o futuro de Batafá... E tem um comentário final otimista: "Bafatá há-de mudar para melhor, se Deus quiser" (...)


(...) Não sei se Canjajá e o seu cinema são uma "metáfora de Bafatá" e da própria Guiné-Bissau .... Talvez sim, da Guiné-Bissau e da própria África pós-colonial... É seguramente uma metáfora das nossas ruínas, materiais e imateriais, as que ficaram do nosso império...

Mas o mérito do realizador e da equipa é terem ido para Bafatá, despidos de preconceitos etnocêntricos... E trata-se de cinema lusófono!... Por outro lado, o filme faz-me lembrar o "Nuovo Cinema Paradiso", do italiano Giuseppe Tornatore (1988)... Mas isso daria aso a outras reflexões sobre o cinema enquanto objeto de cinema que não cabem aqui neste blogue e nestes "manuscritos" (...)

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Guiné 63/74 - P16428: Convívios (766): Os "tugas" de Bafatá... Agosto de 2016, restaurante "Ponto de Encontro", do casal Célia e João Dinis a quem prestamos uma emocionada homenagem (Patrício Ribeiro, Impar Lda)




Guiné-Bissau > Bafatá > Agosto de 2016 > Restaurante "Ponte de Encontro" > João e Célia Dinis, os donos anfitriões, e os tugas mais antigos




Guiné-Bissau > Bafatá > Agosto de 2016 > Restaurante "Ponte de Encontro" > Foto nº 2 > Da direita para a esquerda, Célia, Dinis, Sebastião, Nuno, Aprilio e Patrício...  


Fotos (e legenda): © Patrício Ribeiro  (2016) Todos os direitos reservados. [Edição: L.G.]


1. Mensagem do nosso grã-tabanqueiro Patrício Ribeiro [, da empresa Impar Lda]

[Foto à direita: Patrício Ribeiro, de 68 anos de idade, português de Águeda, vivido, crescido, educado e casado em Angola, Nova Lisboa / Huambo, antigo fuzileiro naval, que retornou ao "Puto" depois da descolonização, fixando-se entretanto na Guiné-Bissau, há 3 décadas, país onde fundou a empresa Impar Lda, líder na área das energias alternativas; é um daqueles portugueses da diáspora que nos enchem de orgulho e nos ajudam a reconciliarmo-nos com nós mesmos e afugentar o mau agoiro dos velhos do Restelo, dos descrentes, dos pessimistas; é de há muito tratado carinhosamemte como o ´pai dos tugas´, pelo apoio que dá aos mais jovens que chegam à Guiné-Bissau, em visita ou em missões de cooperação]


Data: 28 de agosto de 2016 às 22:55
Assunto: Os "tugas" de Bafatá


Homenagem:

Junto fotos do nosso almoço de jhm domingo de Agosto, com o petisco que nos brindou a Célia [Dinis].

Este grupo é frequente (, quase todos os dias),  no Restaurante Ponto de Encontro,  de Bafatá.

Somos tugas que por lá trabalhamos há muitos anos e,  como habitualmente, o nosso convívio é no Ponto de Encontro.

Quase todos os dias telefonamos de Pirada, Buruntuma ou Canquelifa.

Depois do nosso almoço, "lata de atum com pão"...
- Ó Célia, hoje à noite há sopa?

Ela lá responde que alguma coisa se há-de arranjar...

Assim sendo, aqui vai uma homenagem a este casal que,  de dificuldade em dificuldade, adoram a sua cidade de Bafatá. Fazem todos os sacrifícios para poderem ajudar os tugas que por lá trabalham, ou que apenas estejam de passagem...

Fotos : 1. João e Célia Dinis; 2. Célia, Dinis, Sebastião, Nuno, Aprilio e Patrício.

Patricio Ribeiro
IMPAR Lda
Av. Domingos Ramos 43D - C.P. 489 - Bissau , Guiné Bissau
Tel, 00245 966623168 / 955290250
www.imparbissau.com
impar_bissau@hotmail.com

PS - Neste almoço, não estiveram presentes os tugas que trabalham nas ONG, porque já estavam de férias em Portugal

2. Comentário do nosso editor LG:

Patrício(s):

Ficamos sem palavras... A milhares de quilómetros de Portugal, essa é seguramente uma "casa portuguesa"... E de repente salta-nos à mente a letra e a música da Amália, tão "maltratadas" antes do 25 de abril... No fundo, podia parecer que esse famoso fado, da Amália, era o elogio, miserabilista,  da pobreza honrada associada ideologicamente ao Estado Novo...

Camarada e amigo Patrício Ribeiro, diz ao nosso camarada João Dinis e à sua companheira Célia que eles já ganharam o direito de figurar, a partir de hoje, e com todo o mérito, no quadro de honra da Tabanca Grande, passando a ser os grã-tabanqueiros nºs 724 e 725. Diz-lhes que é a nossa singela homenagem, a do blogue do Luís Graça & Camaradas da Guiné, não só ao seu portuguesismo como também  à sua grande capacidade de  trilhar as duras picadas da vida, e de sobreviver as todas as minas e armadilhas. O seu exemplo comove-nos e honra-nos... Um abraço fraterno para todos os  demais "tugas" de Bafatá. Um xicoração para ti,  que és o "pai dos tugas" da Guiné-Bissau....LG
_____________


[Imagem à esquerda: cartaz de propaganda do Estado Novo, Cortesia de Susana Simões]


Uma casa portuguesa

Música: V. M. Sequeira; Artur Fonseca

Letra: Reinaldo Ferreira [Barcelona, 1922- Lourenço Marques, 1959]



Numa casa portuguesa fica bem
Pão e vinho sobre a mesa,
E, se à porta humildemente bate alguém,
Senta-se à mesa co'a gente.
Fica bem esta franqueza, fica bem,
Que o povo nunca desmente,
A alegria da pobreza
Está nesta grande riqueza
De dar, e ficar contente.

Refrão:

Quatro paredes caiadas,
Um cheirinho à alecrim,
Um cacho de uvas doiradas,
Duas rosas num jardim,
Um são josé de azulejo
Mais o sol da primavera,
Uma promessa de beijos
Dois braços à minha espera...
É uma casa portuguesa, com certeza!
É, com certeza, uma casa portuguesa!


No conforto pobrezinho do meu lar,
Há fartura de carinho
E a cortina da janela é o luar
Mais o sol que bate nela...
Basta pouco, poucochinho p'ra alegrar
Uma existência singela...
É só amor, pão e vinho
E um caldo verde, verdinho
A fumegar na tigela


Refrão:

sábado, 27 de agosto de 2016

Guiné 63/74 - P16423: Recortes de imprensa (80): Os "últimos tugas" de Bafatá: João e Célia Dinis, entrevistados pelo "Público", em 13/4/2013... O nosso camarada João Dinis, hoje empresário, vive na Guiné desde 1963. Pertenceu à CART 496 (Cacine e Cameconde, 1963/65)


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > Outubro de 2015 >   A nossa amiga e grã-tabanqueira Adelaide Barata Carrelo com o João Dinis, empresário, antigo militar português, da CART 496 (Cacine e Cameconde, 1963/65), integrada no BCAÇ 513 (com sede em Buba). Vive na Guiné desde 1963.

Foto: © Adelaide Carrêlo (2016). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de dezembro de 2009 > 15h13 > O João Graça, médico e músico, fotografado com a Célia Dinis e o filho, Bruno, no seu estabelecimento (Restaurante Ponto de Encontro).  O Bruno virá a morrer mais tarde, devido a acidente de moto. O casal tem duas filhas, casadas, a viver em Portugal.


Em 5 de janeiro de 2015, o Patrício Ribeiro mandava-nos a seguinte mensagem, complementando a legenda da foto acima, bem como o texto do "Público", que reproduzimos abaixo:

"Luís e João, a cidade de Bafatá, está de acordo com as fotos do João, mas há algumas diferenças:
O filho do [João] Dinis e da Célia, o Bruno, infelizmente faleceu a aproximadamente 2 anos, por acidente de moto o que deixou os pais muito abalados, continua a morar em Bafatá, depois de alguns meses passados em Portugal.


Abastecimento de água á cidade: desde há mais de 3 anos, foram instaladas duas bombas solares, estão extrai 80 m3 de água diários, para a canalizações na parte alta da cidade, onde reside a maior parte da população. 

Neste momento estão a ser instaladas outras bombas solares, para mais 250 m3 diários, a partir destas novas bombas, a parte baixa da cidade [, a zona velha,.] também vai ter agua canalizada. Assim como [o bairro d]a Ponte Nova.


Estes trabalhos estão a ser financiados pela União Europeia, em parceria com a Cooperação Portuguesa. A coordenar os trabalhos está a ONG Portuguesa TESE, com o escritório em Bafatá.
A ONG Portuguesa FEC, há longos anos no ensino em Bafatá, reforçou a sua equipa, com apoio da Estado Português, com mais professores: neste momento moram em Bafatá, mais dezena de Portugueses nascidos em Portugal, a maioria são mulheres.

Tenho casa em Bafatá, que tem estado aberta a investigadores portugueses, que na zona fazem os seus estudos. Por vezes também lá passo algum tempo. Patrício Ribeiro."


Foto: © João Graça (2009) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: L.G]


1. Os "últimos tugas" de Bafatá > João e Célia Dinis: “Portugal era um atraso de vida em comparação com a Guiné”

(Excerto do "Público", de 13/4/2013)

Na casa de João e de Célia nunca faltava fruta enlatada, vinho Casal Garcia e pelo menos dez garrafas de whisky “do bom” para receber as visitas. Durante anos, puderam ter na Guiné-Bissau uma série de luxos que na chamada "metrópole" eram ainda uma miragem. Esses foram outros tempos. Hoje todos os gastos são controlados. Bebem vinho do mais barato e só comem bacalhau ou queijo quando algum amigo os visita. A vida obrigou-os a uma cambalhota do 80 para o oito, mas nem por isso deixam de falar com alegria, com um brilho nos olhos e esperança no futuro. A bola é para chutar para a frente e apesar de Célia ter 58 anos e João 71, não duvidam que ainda vão conseguir marcar golo.

João e Célia Dinis são dos portugueses que há mais tempo vivem na Guiné, chegaram numa altura em que “tudo era bonito, não havia falta de trabalho e tinham uma vida mais que boa”. João foi o primeiro. Chegou em 1963 como militar. Gostou tanto que ficou e já como funcionário da administração do porto de Bissau acenou aos colegas da Companhia 496, Batalhão 513, que viu partir num navio. “Não troque os números, são muito importantes para se algum amigo dessa altura me quiser telefonar”, pede ao PÚBLICO.

Só voltaria a Portugal em Setembro de 1971. “Estava há nove anos sozinho e ia com o objectivo de casar, mas não podia ficar muito tempo. Tinha de resolver o problema rapidamente e graças a Deus consegui”. Conheceu Célia num baile e meteu logo conversa. “Ó menina, não se importa que a gente vá bailar um bocadinho? Mas olhe que eu vivo em África há muitos anos, já não sei bem dançar as músicas de cá...”, perguntou-lhe. A resposta foi afirmativa. Casaram no dia 9 de Janeiro e dia 20 vieram juntos para a Guiné. Célia tinha 18 anos e Dinis 31.

Nessa altura, tudo lhes corria bem. Dinis era dono de duas escolas de condução e, alguns anos mais tarde, Célia decidiu abrir o restaurante Ponto de Encontro, que mantém até hoje em Bafatá (no centro-norte do país). “Era uma cidade espectacular, estava tudo pintadinho, arranjadinho. Se vissem esta avenida e aquela ali em baixo. Lindas, lindas. As pessoas juntavam-se para fazer piqueniques, remo, ir ao cinema. E as lojas? Tinhas de entrar só para ver, mesmo que não comprasses. Era uma coisa que atraía. Portugal era um atraso de vida em comparação com a Guiné”, descreve Célia.

O Ponto de Encontro servia mais de 70 almoços por dia e Célia chegou a ter de pedir aos tropas para tomarem conta da filha enquanto despachava o mais depressa possível os almoços. Não tinha mãos a medir. Agora há dias em que não faz cinco mil francos CFA (7,50 euros). De 17 empregados passou para dois e mesmo assim queixa-se que a receita não cobre as despesas. Podiam-se ter ido embora depois do 25 de Abril de 1974. Chegaram a vender tudo, mas os guineenses não os deixaram partir: "Não, não se vão embora porque ninguém vos vai fazer mal. Vocês também não fizeram mal a ninguém.”

“Se eu tenho ido depois da independência, era um senhor em Portugal. O meu cunhado ainda me disse para montarmos uma escola de condução, se eu o tenho ouvido... Teria muito mais dinheiro, mas não tinha esta terra”, projecta Dinis. É um apaixonado pela Guiné. Quando ia a Portugal de férias, não queria ficar mais de 15 dias, “chegava para ver a família”. “Só desejava voltar àquelas pessoas que me conheciam e, do mais pequeno ao maior, me chamavam pelo nome. Nem sequer consigo dizer o que menos gosto neste país porque gosto de tudo. Até das faltas, fomo-nos habituando a elas”.

Foi depois de 1974 que tudo piorou. Durante dez anos ainda viveram bem mas, pouco a pouco, as coisas começaram a escassear. Primeiro faltaram o queijo, as batatas e os chocolates. Até que acabou tudo. “Foi um processo: apetecia-me beber uma garrafa de vinho Casal Garcia e não havia, mas ainda se podia comprar Dão. Quando o Dão acabou, tínhamos o Pias...”, recorda Dinis.

Às vezes perguntam-lhe como consegue viver assim. Ri-se e responde: “Tu também cá estarias se tivesses vivido o que eu vivi. Tínhamos uma vida mesmo bonita. Luz 24 horas por dia, boas estradas, tudo limpo. Onde é que os portugueses comiam pêra enlatada? A nossa bebida era whisky com água das pedras, a cerveja era só para acompanhar as ostras e os camarões”.

A Guerra Civil, em 1998, foi o golpe fatal para a Guiné: “Foi desde aí que deixámos de viver como portugueses na Guiné e passámos a ter condições de vida semelhantes à de um guineense: a ter de carregar água, andar a pé...”, conta Célia.

Apesar do Ponto de Encontro estar quase sempre vazio e dos poucos alunos da escola de condução demorarem mais de dois anos a pagar (a carta custa menos de 150 euros), apesar de dizer que agora já estava na altura de voltar a Portugal, não é isso que Dinis sente. Quando fala das suas dezenas de projectos, quando diz que as coisas vão melhorar – e di-lo muitas vezes como se a sua vida pudesse durar o dobro da do comum dos mortais –, a Guiné é sempre o palco principal da sua felicidade.

As saudades das duas filhas são mesmo o que mais pesa a Célia e Dinis. Há oito anos que não as vêem e há netos que ainda nem conhecem. Mas já lá vai o tempo em que uma viagem a Portugal custava cinco mil francos CFA e a família se juntava toda para passar as férias grandes.

Custas-lhes terem trabalhado a vida toda e não terem nada. “Nem cá nem lá”. Entregaram-se à Guiné e é a ela que pertencem. Por isso, sempre que pensam regressar perguntam “para fazer o quê". “Tenho direito à reforma porque fui militar e funcionário público de Bissau, mas na altura que a porta estava aberta não pude ir a Lisboa e agora está fechada a cadeado. Lá as pessoas vivem lado a lado, mas não se conhecem. Aqui sou o professor, dou cartas de condução desde 1968, ensinei pessoas que já morreram”, gaba-se Dinis.

Célia também tem medo do regresso mas confessa já estar cansada de levar a casa e o restaurante às costas. “Dizem que Portugal está mau mas para nós é um mundo de rosas. Não há dinheiro, é verdade, mas aqui também não há. Lá não se compra mais, compra-se menos, mas não sentes saudades de comer. Abres a torneira e tomas banho de chuveiro. E aquelas auto-estradas todas direitinhas? É uma alegria”, diz num português que já mistura com sotaque crioulo.

Por agora, só têm uma solução: aguentar. “Ando há muitos anos com a palavra esperança na ponta da língua mas ainda não a encontrei. Penso vir a ter uma vida boa na Guiné. Hoje não temos, não saímos de Bafatá há anos. Mas se calhar ainda vamos conseguir ter um carrinho melhor para ir a Bissau dar o nosso passeio. Dançamos, ao toque da música. Se a música saltar, também saltamos. E bem alto”, deseja Dinis.


Fonte: Sofia da Palama Rodrigues > Guiné: entre o paraíso e as saudades de Portugal > Público, 13/04/2013 - 08:02 (Excerto reproduzido com a devida vénia)

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Nota do editor:

Último poste da série > 24 de abril de 2016 > Guiné 63/74 - P16010 Recortes de imprensa (80): João Paulo Diniz (,que vai estar mais logo no Jornal da Meia Noite, da SIC Notícias, para relembrar o seu papel no 25 de abril): "As minhas melhores amizades são do tempo da Guiné, quando fui locutor do PFA - Programa das Forças Armadas, em Bissau, em 1970/72" (Excerto de entrevista, DN -Diário de Notícias, 30/8/2015)