Sobre Copá, onde se encontrava um conterrâneo meu e que foi ferido, foi inqualificável a irresponsabilidade do comando de sector, colocar apenas um pelotão sem quase meios de defesa junto à fronteira.
Jemberém, deixo ao critério do camarada Joaquim Sabido comentar, apenas digo que fizemos fogo de artilharia de Gadamael para o perímetro de Jemberém, o que surpreendeu, digo eu, o PAIGC.
(,,,) [Nunca ouvi falar em] insubordinação do aquartelamento de Jemberém 'devido a frequentes ataques em junho' [...]. Se houve algum ataque a Jemberém foi nos primeiros dias de maio. Eu ainda não estou senil e recordo-me muito bem. [ O Joaquim Sabido diz que, no decurso do mês de maio, ainda embrulharam pelo menos umas seis vezes].
Bedanda foi atacada com viaturas blindadas, mas sem grande êxito, diga-se. Mais uma vez uma estratégia imcompreensível dos altos comandos, visto que entre Gadamael e Mampatá-Quebo não havia qualquer aquartelamento, o que tornava fácil a infiltração até Bedanda.
Gadamael: aqui falo com conhecimento de causa...
Se tentassem o ataque directo, nem com 3 mil homens lá entravam, e seria uma carnificina de parte a parte. Tínhamos material de guerra em quantidades astronómicas. Granadas de obus tínhamos à volta de 10 mil em stock, e em cada espaldão em média 300 e prontas a disparar, isto é, já com espoleta colocada.
Quando éramos flagelados era sempre ou quase sempre do território da Guiné-Conacri.
Foram mobilizados muitos graduados de artilharia de costa para serem reconvertidos em artilheiros de campanha.
Desde de janeiro até abril entregaram-se vários guerrilheiros.
Quando das conversações para o cessar fogo,vários altos quadros do PAIGC me confessaram que estavam exaustos de tantos anos de guerra. Quase metade dos efectivos, na principal base no sul, junto a Kandiafara, tinham gonorreia (isso mesmo, "esquentamentos").
(...) Não sei precisar o dia, mas na segunda semana de Maio [de 1974] acompanhei Pedro Pires e outros altos dirigentes do PAIGC a Cacine, onde decorreram conversações sobre o cessar fogo e retracção das NT.Para mim, em termos políticos, a guerra já estava perdida antes de ter começado, agora afirmar que estávamos a beira de um colapso militar em 74 vai uma grande distância.
Nos primeiros dias de junho iniciou-se a retracção em Gadamael. [...]
Em Gadamael, a retração para Cacine e Bissau foi feita como estava programada e em boa ordem e segundo as normas militares. [...] Aceitámos o cessar fogo com o PAIGC sem sequer consultar o QG, quanto mais pedir autorização. Eu, por exemplo, fui à Guiné-Conacri apenas com o consentimento do Comandante Heitor Patrício. [...]
A propaganda, mas que era apenas e só propaganda, faz parte de qualquer guerra.
Com todo o respeito pela opinião de cada um, eu falo de factos, EU ESTAVA LÁ.
Termino dizendo que "ainda bem que acabou daquela forma", porque se não tivesse sido assim, não sei se ainda estaria no mundo dos vivos.
Um alfa bravo para todos.
Um artilheiro de Gadamael,
C. Martins
Foto (e legenda): © José Gonçalves (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados
PS - Comentário a esta foto, feita pelo C. Martins, em 6 de julho de 2011:
(...) "A foto supra onde aparece o Comandante Patricío com um emblema do PAIGC, um oficial de marinha fuzileiro excepcional e considerado o 'pai' dos fuzos, é bom que não se façam juizos de valor precipitados. Aquilo foi apenas circunstancial, resultou apenas e só da troca de 'galhardetes' entre as partes.. É que se o meu amigo e conterrâneo 'Pedras', fuzo e guarda costas do Comandante Patrício na altura, com três comissões seguidas na Guiné, sabe que estão a pôr em causa a honaribilidade do Comandante Patrício, ainda dá uma 'latada'...ah, ah, ah, em alguém".(...)
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Notas do editor:
(*) Vd. poste de 18 de janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9368: Situação Militar no TO da Guiné no ano de 1974: Relatório da 2ª REP/QG/CTIG: Transcrição e adaptação de Luís Gonçalves Vaz (Parte I)
(**) Último poste da série > Guiné 63/74 - P9388: No 25 de Abril de 1974 eu estava em... (12): Bissau, Liceu Honório Barreto (Nuno Rodrigues / Luís Gonçalves Vaz)