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sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Guiné 63/74 - P15257: Notas de leitura (767): “Como Deus me guardou”, por Agostinho Soares dos Santos, Edição de autor, Porto, 1990 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 9 de Dezembro de 2014:

Queridos amigos,
É a versatilidade de abordagens que enriquece a nossa literatura de guerra, com tantas peças na penumbra.
A mexericar num caixote lá na Feira da Ladra deparou-se um livrinho com capa insólita, pus-me a remexer, lá dentro vinha uma folha falando de livros bíblicos de ambos os testamentos. Sentei-me a ler o que nunca me fora dado ler, o testemunho de um cristão evangélico, tudo escrito com enorme simplicidade e indiscutível sinceridade, uma escrita amena onde a glorificação a Deus é permanente. A esvoaçar para o Divino fora me dado a conhecer o testemunho de alguns capelões, mas nada, nem por sombras, com o vigor desta fé.

Um abraço do
Mário


Como Deus me guardou:
O testemunho de um cristão evangélico na guerra colonial

Beja Santos

Isto de vasculhar sem desânimo nos caixotes da Feira da Ladra acarreta sempre resultados imprevistos, e alguns dão que pensar. É o caso de “Como Deus me guardou”, por Agostinho Soares dos Santos, Edição de autor, Porto, 1990. O autor tem obra feita, indica nesta edição de 1990 sete títulos: “Bíblia, ciência e vida”; “Maravilhas do Criador”; “Ufologia à luz da Bíblia”; “Tudo nos mostra que Deus existe”; “Onde está, evolução a tua ciência?”; “Falsas ciências do nosso tempo”; “Profecias, acontecimentos probabilidades”; “Nuclear apocalíptico”. O autor explica-se: “Este livro é um testemunho da misericórdia de Deus para comigo durante a guerra colonial”. 
Dá o seu testemunho para glorificar o nome do Senhor. É poeta e verseja assim:
“Ó Angola, negro diamante multifacetado
Como deves ser feliz e bela em tempo de bonança
Quisera eu conhecer-te noutras épocas diferentes
Mas entregaram-me uma arma automática FN
E uma seção de morteiros 81!”.

Embarcou em 24 de Julho de 1965. De imediato escreve: “Já li alguns capítulos da Bíblia e acabei de escrever à minha namorada”. E no dia seguinte, desabafa: “Que loucura! Um tempo maravilhoso e os homens a pensarem a matarem-se uns aos outros! Não foi para isso que Deus criou o ser humano”. Agostinho é furriel num pelotão de morteiros, viaja enfastiado e a 28 esclarece os seus leitores: “Hoje passei em revista a minha despedida na Igreja Evangélica de Picoutos. O irmão André Artur da Rocha era o servo escalado para o culto em causa e resolveu chamar-me. Durante a reunião, os irmãos estiveram a animar-me. Alguém leu o Salmo 91, onde diz que mil cairão ao teu lado e dez mil à tua direita, mas tu não serás atingido. Glória a Deus por tudo!”. Já se adaptou à rotina. Converteu-se em 9 de Dezembro de 1962, aos 19 anos de idade. Foi mobilizado para Angola em Abril de 1965. E assim chegam frente a Luanda, cidade a quem ele dedica uma ode. Desembarcam e vão para o Grafanil. Já sabe o itinerário: Caxito, Piri, Úcua e Vista Alegre. Vai descrevendo as povoações por onde passaram. E assim chegam à parada de Zemba, a sua futura casa. Está aqui o batalhão 770, o Agostinho faz parte do Pelotão Independente de Morteiros n.º 1021. Em Zemba escreve à namorada: “Saí hoje para dar proteção aos negros sapadores que efetuaram a colheita do café numa fazenda abandonada desde 1961”. Em 23 de Agosto dá a saber à sua Cindinha que vai para a sua primeira operação, escolta a artilharia, escreve. E temos a primeira nota do seu comportamento face à crueldade: “Em Mucondo deram-nos dois turras para transportamos até ao Zemba. Havia um soldado que queria cortar a orelha a um deles. À cautela fui dizendo que ninguém tocava nos prisioneiros”. Assisto a um sinistro e depois a outro: “Um soldado ao saltar de uma camioneta bateu com a coronha da arma no chão a qual disparou, matando-o quase instantaneamente. Recentemente, um soldado deu um pontapé numa espingarda que estava pousada no chão e ela disparou também atingindo mortalmente um outro soldado. O autor do chuto ficou afetado psicologicamente, coitado, não voltou a sair para a mata. Anda aqui a trabalhar na messe dos sargentos, quase só se ri e mais nada". De Zemba vão até um lugar próximo do rio Dange. À distância ouvem-se tiros. E em 15 de Outubro este acampamento é atacado. Voltam para Zemba. Refere as caçadas que se realizam nas redondezas e apresenta-nos o soldado “Terrinas”, assim designado por ser comilão, não sabia ler nem escrever, o Agostinho escrevia por vezes as cartas. Numa dessas missivas à mãe, Agostinho teve o devaneio de meter uma bucha dizendo que ele era conhecido por “Terrinas”. A mãe respondeu: “Olha, filho, fartámo-nos de rir! É assim mesmo! Olha pela tua vida, não te importes com o que dizem. Come e segue em diante!”. Agostinho arrependeu-se pela imprudência e cita a Bíblia. Anda por vários destacamentos onde há obras de Engenharia. Não gosta da expressão batismo de fogo e recorda o batismo de Jesus. Assim se passou o Natal e o Ano Novo. Critica as enormes colunas militares: “As picadas serpenteiam em volta das colinas. Às vezes acaba-se por passar bem perto do local onde já se passou anteriormente. É fácil nesses pontos a própria coluna envolver-se em tiroteio”.


Segue para Onzo, destacamento próximo de Nambuangongo, queixa-se dos tiros e dos mosquitos e de situações que podiam ter descambado numa tragédia como aquela companhia que ficara cercada num morro e cuja evacuação foi um verdadeiro ato de heroísmo. Os acidentes de viação sucedem-se, Agostinho é cada vez mais envolvido nas operações apeadas. Chegou a hora do batalhão 770 abandonar Zemba, o Pelotão 1021 fica, Agostinho vem passar férias à metrópole. Em Luanda encontra Levi que conhecera em Mafra, ambos estudavam a Bíblia, Levi pertencia à Igreja dos Irmãos de S. João da Madeira e Arrifana, Agostinho era membro da Assembleia de Deus do Porto. Em férias, foi à inauguração de uma Casa de Oração em Serralves. O regresso é muito doloroso e de Luanda até Zemba é uma verdadeira odisseia. Escreve de Cova das Pacaças, em 17 de Agosto de 1966: “Mais uma vez estamos a dar proteção à Engenharia. Desta vez, é de castigo. Os meus soldados embriagaram-se ontem”. No fim de Agosto escreve à sua amada dizendo que vai para um lugar mais pacífico, Portugália, no Nordeste de Angola, anda a ler o "Quo Vadis". Nova viagem e nova odisseia, rumam para o Grafanil, seguirão pela estrada de Catete, depois o Dundo, depois Nova Lisboa. O comboio prossegue a sua marcha interminável, passam por Silva Porto, finalmente Henrique de Carvalho. É daqui que se inicia a marcha para Portugália em território onde pontificam os interesses da Diamang. Agostinho gosta muito de Portugália, uma pequena vila antigamente conhecida por Chitato, a estrada que dá acesso à vila está ladeada por longos canaviais. Explica o porquê da presença da tropa: “As nossas instalações em Portugália já pertenceram às milícias da Companhia dos Diamantes. A certa altura, a população local exigiu a presença do exército português. Foi-me dito que houve problemas junto à fronteira em determinada altura e um dos elementos das milícias disparou uma rajada de metralhadora para os pneus da única viatura que possuíam. Os civis não queriam tropa daquela”. Agostinho descreve as redondezas, estão perto do Congo. Depois é despachado para Cassanguidi, a 80 quilómetros de Portugália e do Dundo, o pelotão vai repartindo. Mais incidentes, mais mortes. A comissão avança para o fim. Em Luanda descobre uma igreja evangélica. E regressa no paquete Vera Cruz. No regresso, descobre que já existe a ponte Salazar. A família e namorada estão à espera dele no Cais da Rocha do Conde de Óbidos. Em Julho de 1990, concluiu a passagem a limpo das suas memórias: “Deus tem-me dado tudo aquilo que necessito. Tem-me abençoado no lar, no emprego e nos estudos. Em toda a minha estada na guerra colonial eu pude ver a mão de Deus a proteger-me. Aqui neste livro contei somente a verdade, porque só a verdade glorifica o nome do Senhor”.
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Nota do editor

Último poste da série de 12 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15241: Notas de leitura (766): "Botânica", por Vasco Araújo, editado pela Sistema Solar, 2014 (Mário Beja Santos)

terça-feira, 8 de julho de 2014

Guiné 63/74 - P13374: Blogpoesia (384): Recriação do mundo (J. L. Mendes Gomes, ex-alf mil, CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66)

Recriação do mundo…

por J. L. Mendes Gomes

E um dia, disse Deus:

Vou recriar o mundo.
Um grande lago sideral.
Sem estrelas nem astros reis.
Sem castelos de rocha
Nem aviões.
...
Sem minérios nem gasodutos.
Sem mistérios de religiões.
Nem ministérios de poderes.

Sem as selvas de avenidas.
Encharcadas de arranha-céus.

Sem casas brancas,
Nem praças vermelhas.
Nem basílicas de oiro
E vaticanos.

Nem um só urânio de ameaças.
Nem os dubais de plástico,
Em lego ou dominó.

Sem bandeiras.
Sem as seitas negras
Do capital.

Sem moeda. Bancos centrais.
Nem os enxames
Dos computadores.

Sem diabos,
E sem arcanjos.
Nem infernos ou caldeirões.

Sem epidemia de seitas.
Nem os pesadelos dos telejornais.

Sem mais cadernos
Nem alcorões.
Livros de missa
Ou ladainhas.

Desaparecem de vez as assembleias.
E todas as fábricas de gravatas.
Não há opas.
Não há fatos,
Não há vestes.


Um mundo de paz e sem fronteiras…

Berlim, 4 de Julho e 2014
8h57m


Joaquim Luís Mendes Gomes

[ J. L. Mendes Gomes foi alf mil da CCAÇ 728 (Cachil, Catió e Bissau, 1964/66)]

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Nota do editor:

Último poste da série > 1 de junho de 2014 >  Guiné 63/74 - P13220: Blogpoesia (383): Velhas crianças (Felismina Costa)

terça-feira, 4 de junho de 2013

Guiné 63/74 - P11670: Blogpoesia (343): Recuso dizer uma oração / ao Deus que te abandonou... (José Manuel Lopes, CART 6250/72, Mampatá, 1972/74)

 1.  Poema, sem título, do nosso camarada José Manuel Lopes (ex-fur mil, CART 6250/72, Mampatá, 1972/74), mais conhecido na região de Tombali pelo seu pseudónimo literário Josema...

Retirado das lides literárias (de resto, eu acho que ele nunca se levou a sério como poeta, embora escrevesse todos os dias alguma da melhor poesia da guerra colonial!), é hoje vitivinicultor na região demarcada do Douro, produzindo belos nectares com a ajuda da sua mulher  Maria Luísa Valente (, uma mulher de armas!) e com o talento do filho de ambos, Vasco Lopes, enólogo (mas também DJ)...

Apesar de já ter sido publicado, no poste P2739, de 20/4/2008, juntamente com mais outros cinco poemas do seu "poemário" (ou do que restou do seu "poemário", em grande parte destruído, num noite de descrença e de fúria),  achamos que é tempo de dar-lhe o devido destaque, agora na nossa série Blogpoesia... 

É um texto, duro, de 1972, escrito em Bolama, no início da comissão... Admito que alguns leitores poderão inclusive achá-lo iconoclasta, se não mesmo blasfemo... Mas quem é que, perante a morte de um camarada no TO da Guiné, não passou por estes momentos de desespero, angústia, raiva ? E, sendo cristão, não chegou mesmo a invectivar Deus e a sua "momentânea distração" ?

É mais um poema do nosso camarada José Manuel Lopes, que vai estar connosco em Monte Real em 8/6/2013, mas que está a passar por um mau momento na sua árdua vida de empresário, tal como a grande maioria dos portugueses, quer trabalhem por conta de outrem , quer trabalhem por conta própria.. Enfim,  é mais  um belo poema do nosso Josema, que merece ser lido em voz alta, pausadamente, nestes dias tristes, de perplexidade e de angústia,   "quando [, citando um poema de Sophia de Melo, do Livro Sexto, 1962, que me acaompanhou no TO da Guiném, em 1969/71 ] a pátria que temos não a temos,  / perdida por silêncio e por renúncia, / até a voz do mar se torna exílio / e a luz que nos rodeia é como grades". Até Monte Real, camarada, amigo e poeta ! L.G.

PS - Muito oportunamente, o António Carvalho, que foi fur mil enf da mesma companhia, e grande amigo do poeta, fez este comentário ao  poste: "Este pungente poema é um brado de dor e revolta em que todas as amarras de ordem religiosa e cultural se quebram num absoluto desafio aos deuses. Não é um insulto ao Criador mas a busca desesperada de uma explicação.O contexto ou o cenário em que este poema foi escrito? Não pode ser outro acontecimento, trata-se da morte do soldado Mata, no acidente com um dilagrama, no dia 10 de Julho de 1972, quando morreu também o alferes Figueiredo do BART 6520. É também para mim um belíssimo poema."


2. Recuso dizer uma oração
ao Deus que te abandonou,
não sei se é do nó
que me aperta a garganta
ou da revolta que brota do meu peito,
só sei que não consigo
desculpa...
sinto ganas de arrancar
o fio preso ao teu pescoço
e atirar dentro da mata essa cruz
no local...
onde encontraste a tua,
onde perdeste a vida
e eu a minha fé, entorpecida;
recuso deixar de pensar
no que aqui nos trouxe,
para onde nos levam,
quero encontrar respostas
a todas as perguntas
que se soltam em turbilhão
dentro de mim,
quero encontrar
algo que justifique,
achar uma razão,
por pequena que seja,
irmão,
para acalmar esta dor
e não encontro
e não encontro... não!

Bolama, 1972
josema

[Fixação de texto: L.G.]
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Nota do editor:

Último poste da série > 29 de maio de 2013 > Guiné 63/74 - P11648: Blogpoesia (342): Antologia: Poemas de Maio, de Ovar a Mafra, entre o céu e o inferno, com as bolanhas de Tombali ao fundo (J. L. Mendes Gomes)

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Guiné 63/74 - P11648: Blogpoesia (342): Antologia: Poemas de Maio, de Ovar a Mafra, entre o céu e o inferno, com as bolanhas de Tombali ao fundo (J. L. Mendes Gomes)



Álbum do José Neto (1929-2007) > Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1966/68) > Foto nº 8: fim de tarde


Álbum do José Neto (1929-2007) > Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1966/68) > Foto nº 6: bando de jagudis 


Fotos: © José Neto (2005) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados

Lavo minha alma…

Encomendo minha alma a Deus,
Todas as noites,
Antes de dormir.
Pode ela não mais acordar. 
E subir ao céu.
Onde, perdidamente,
Para sempre, 
Restaria triste.
Como um anjo
Que voou da terra,
E apareceu a Deus,
Sem se lavar…

Ovar, 17 de Maio de 2013
16h37m

Subindo à montanha

Arregaço as mangas.
Pego na pena.
Lanço meus olhos
Para o infinito do céu.
Estremeço, de medo,
Na escuridão que o cobre.
Nem uma estrela sozinha aparece.
Tremente.
É o silêncio. 
E o ermo.
Ergo uma prece
Uma luz que rasgue e desfaça
Em pedaços as trevas
E negrumes de todas as serras.
Lanço no mar
Minhas cordas e amarras que prendem.
Levanto e bato as asas do sonho,
E parto à sorte e ao vento.
Atravesso as nuvens.
E eis que, num espanto,
Entro num céu vasto de luz.
Só o silêncio
Aqui reina, inunda e seduz.
Surgem flores de todas as cores.
Abro janelas em mim.
Entra uma aragem suave
Que inunda minha alma. 
Meus olhos cerrados voltam a ver.
Passam clarões pela frente.
Que me inundam de rastos.
Tento apanhar pedaços e restos
Como quem colhe flores.
Quando vou a tocar-lhes,
Desfazem-se em fumo,
E se escondem no espaço.
Mas parecem brincar,
Vão a sorrir. 
Corro no encalço,
Encantado e sedento.
Não desisto e tento.
E uma lufada de vento mais forte
Rasga as cortinas
E me mostra um jardim.
Fico suspenso.
Ressoam, cá dentro,
Ondas indizíveis,
Pintadas de tons
De todas as cores
Que me deixam feliz.
E começo a pintar e escrever…


Mafra, 23 de Maio de 2013
7h43m

Que grande estrumeira!

Eles entram-me em bando,
Pelas frestas da minha janela.
Como mosquitos.
Zumbem. Vêm vorazes.
Chupam-me o sangue.
Só me deixam os ossos.

Piores do que larvas.
Piores que serpentes.
Trazem lama nas patas.
Como lagartas.
Minhas escadas ficam sujas
De sangue e terra.
Estou desarmado.
Deixei minha G3,
Nas bolanhas da Guiné,
Tão longe.
Se não correria com eles
Com rajadas de os derreter.
Nem um só ficava.
Assim, só a pontapé.
Já me falta o sangue…
Já pedi socorro.
Ninguém atende.
Só um tornado gigante.
Do Oklahoma.
Que os meta em coma.
Depois o lixo.

Que grande estrumeira
Me restou em casa!...

Mafra, 21 de Maio de 2013
20h49m


Fecunda guerra...

Caem pedras no meu telhado.
Chovem na minha cama
Cinzas negras
Dum vendaval feroz.
Oiço cães na rua.
Vêm esfaimados
Das mansões de luz.
Passam os coveiros
De enxada nas mãos.
Querem enterrar-nos vivos.
Por ordem d’alguém.
Estilhaçaram tudo.
Com vestes de anjos.
Querem o meu sangue
Para o seu festim.
São canibais de fome...
Devoraram os pais.
Não poupam ninguém.
Deixei minha G-3
Nas bolanhas de África.
Minha cartucheira amada.
Agora é que eu a queria
Mesmo à cabeceira.
Nem um só escapava.
Mesmo sem pontaria.
Ia tudo a eito.
Até que, de novo, a paz
Voltasse a nascer...
E minha terra verde
Me visse a morrer.

Ovar, 27 de Maio de 2013
14h53m



Batuque no meu quintal

Armei uma tenda grande
No meu quintal.
De caqui da tropa.
Pequei num tambor
E pus-me a tocar.
Aquele batuque,
Soturno e longo,
Bem à moda da Guiné.
A passarada à volta,
Apardalada,
Foi a primeira.
Debandou em alvoroço.
Por momentos,
Fiquei só eu
E o agudo latir
Dos cães do povoado.
Foi só um pouco.
Um a um,
Depois em grupo,
Foram chegando,
Espavoridos,
Primeiro, os vizinhos,
Depois, de mais longe,
Os mais curiosos.
Ainda assim, eram vizinhos.
Não levou muito.

Uma magna assembleia,
Vinda de longe e perto,
Se prantou a ouvir
O trinado forte
E toques simples
Que não dizem nada...
São só batuque!

Ovar, 28 de Maio de 2013
8h12m

Serei feliz...

Custe o que custar,
Prometi a mim mesmo
Que serei feliz.
Tenho Fé!...
Não há vagas,
Não há rochedos
Que eu não escale
De olhos presos
E o coração livre.
Não preciso de asas.
Basta um balão
E uma chama a arder.
O vento me leva,
Rumo ao infinito.
Basta soltar amarras
E deixar-me ir.
É lá do alto,
Por cima das nuvens
Que se vê o céu.
Como é pequena e simples
Esta terra azul.
Nem os montes mais altos
Me conseguem tocar.
Quanto mais subir
Mais pequenos ficam.
Já não há impérios,
Nem coações ferozes
Que me prendam o leme.
É só neste mundo livre
Que eu quero florir.

Ovar, 28 de Maio de 2013
13h58m

Joaquim Luís Monteiro Mendes Gomes

[ex-alf mil, CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66]

[Seleção dos poemas, enviados por email ao longo do mês de maio, e título da antologia: L.G.]

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Nota do editor:
Último poste da série > 27 de maio de 2013 > Guiné 63/74 - P11638: Blogpoesia (341): Ainda o paludismo... (Manuel Maia)

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Guiné 63/74 - P11580: Blogpoesia (337): Meu testament (J. L. Mendes Gomes)



Meu testamento

por J. L. Mendes Gomes



[ex-alf mil, CCAÇ 728,
Cachil, Catió e Bissau, 
1964/66]



Se Deus um dia 
Quisesse fazer de mim uma árvore,
Só Lhe pediria para nascer 
Em Trás-os Montes.
Ao pé das pedras,
No meio das urzes.

Daria sombra e paz,
Respeitaria o sol
E bebia das fontes.
Cobriria meus ramos
Com muitos ninhos.
Beijaria as estrelas.
Todas as noites.
Passaria toda a minha vida,
De braços abertos,
Orando a Deus
Pelos meus vizinhos. 
Eternamente.
Oferecia minhas folhas mortas,
Para encher as camas
Daquela gente. 


E quando, um dia,
De velho, eu morresse,
Far-me-ia de lenha seca em brasa,
Para aquecer os lares
No rigor do frio.
E semear ao vento,
Em nuvens de fumo,
Minha alma acesa
De amor ardente.

Ouvindo canções dos Andes
Ovar, 16 de Maio de 2013
20h6m
Joaquim Luís Monteiro Mendes Gomes

________________


Nota do editor:

Último poste da série > 5 de maio de 2013 > Guiné 63/74 - P11529: Blogpoesia (336): Suadê, nome de mãe (José Teixeira)

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Guiné 63/74 - P10168: Blogpoesia (193): Deste-me asas para voar... (Joaquim Mexia Alves)


Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > BCAÇ 2852 (1968/70) > 1969 > Heli Al III,. a descolar do heliporto...

Foto: © Humberto Reis a (2006) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados




Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > BART 2917 (1970/72) > c.1970 > Heli Al III, pousado n


Foto: ©  Benjamim Durães (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados


1. Do livro de poemas Orando em verso, de Joaquim Mexia Alves, nosso querido amigo e camarada, régulo da Tabanca do Centro [, foto à direita]:

Deste-me asas para voar

Deste-me asas para voar
e eu não voo.

Tenho uma âncora de orgulho,
de vaidade,
ligada a uma corrente do mundo,
de dinheiro, de sociedade,
que não me deixa voar
nas asas que Tu me deste...

E eu puxo, Senhor,
luto, revolto-me,
mas acabo por deixar-me ficar
preso a este mesmo chão,
rasteiro sem poder voar...

Tens que ser Tu,
Senhor,
a partir a corrente,
a libertar a âncora,
a dar-me golpe de asa
que me levante aos céus
e faça partir à desfilada
nas nuvens da Tua graça.

Quero voar no vento
que sopra do Teu amor,
agora e sempre,
em cada momento,
quero voar para Ti,
voar sempre, sempre, 
cada vez mais alto e melhor.

Derruba, Senhor,
as barreiras,
os medos,
dá força às minhas asas,
que me levantem aos céus
e todos os dias me tragam  
para junto dos filhos teus.

Quero voar aqui,
sem nunca daqui sair,
pois é aqui que se voa
até ao momento de partir...

E quando então me chamares,
que as asas que Tu me deste,
se aquietem, Senhor,
porque apenas quero ser levado
nas asas do Teu amor...

Monte Real, 20 de maio de 2008.

Fonte: Joaquim Mexia Alves - Orando em verso: poemas. Lisboa: Paulus Editores. 2012. 142-143


2. Comentário de L.G.:


Estranha coincidência...Ao Joaquim que me acaba de dizer, por mail, e em post scriptum, que "na terça feira [ passada, dia 17, ] morreu 'mais' uma irmã minha. A família grande vai ficando pequena".., eu respondi-lhe de imediato nestes termos:

"Joaquim: Embora esperada, a morte é sempre um mistério e deixa uma dor muito funda nos seres humanos. És uma homem de fé, e a fé ajuda-nos a superar as nossas limitações humanas e terrenas. Também eu comecei a ir ao cemitério e a falar em voz alta com o meu pai... Recebe um xicoração fraterno... Curioso, hoje ia (vou) 'postar' um poema teu...Vê se gostas. Está agendada para antes do almoço"...

Gosto deste poema, porque ele aborda, de maneira singela mas profunda, o conflito intrapessoal entre o ter e o ser... "Deste-me asas para voar/ e eu não voo"... E o voar aqui deve ser entendido metaforicamente: voar é realizar-se como pessoa, como ser humano, nas suas dimensões mais nobres, na sua plenitude... Há um "lastro" (a materialidade mesquinha das coisas terrenas)  que não nos deixa descolar e ganhar alturas... Não basta "ter" asas para voar, é preciso "saber" voar... Voar que não é o mesmo que "voltear"... (Como diz o nosso povo, prosaicamente, "tudo o que volteia no ar, tem um dia de se aquietar"). Esse mesmo povo que, na sua sabedoria de vida, também nos diz (e, de algum modo, nos tranquiliza): "Dá Deus asas a quem sabe voar"... O mesmo povo, crente mas irónico, que sabe tirar lições do passado, da sua experiência própria: "Muita saúde e pouca vida, que Deus não dá tudo"...

Se sim, se Deus não dá (nem pode dar) tudo, fiquemos então ao menos com a poesia e com os nossos poetas, sob o poilão mágico e fraterno da nossa Tabanca Grande...
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Nota do editor:

Último poste da série > 14 de julho de 2012 >
14 de julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10153: Blogpoesia (192): Quem somos? (Felismina Costa)

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Guiné 63/74 - P9712: Blogoterapia (205): O Cateterismo de Deus (Joaquim Mexia Alves)

1. Aquando de um exame médico a que foi submetido, o nosso camarada Joaquim Mexia Alves publicou no seu Blogue "Que é a Verdade?" um texto intitulado "O Cateterismo de Deus" que deixámos propositadamente para publicar nesta época da Páscoa no nosso Blogue.


O CATETERISMO DE DEUS


Nestes últimos dois dias, (regressei há pouco a casa), por causa de algumas “suspeitas” com a minha saúde, tive de fazer um cateterismo no hospital.

Um cateterismo, em palavras muito simples, é um exame médico, que também pode servir de tratamento, e que é, “grosso modo”, a introdução de um cateter numa veia para poder examinar o estado das artérias, bem como do coração.
Para além do exame, por contraste, esse mesmo cateter também pode introduzir medicamentos onde necessário e desobstruir os vasos sanguíneos que possam estar de alguma forma obstruídos, pelas “gorduras”, etc.

Que me perdoem os profissionais de saúde pela explicação “bacoca”, mas o meu fim não é explicar o que é um cateterismo, mas sim a reflexão que fiz sobre o que o Espírito Santo me quis “dizer” acerca de tal facto na minha vida.
E perdoem-me também os conceitos que possam envolver a medicina no seguimento do texto, mas que são apenas para fazer a analogia que me foi suscitada pela minha reflexão.

Podemos então entender que o cateterismo, ao servir para “examinar, tratar e curar” o que possa estar mal no coração, bem como em todo o processo de afluxo sanguíneo no corpo humano, acaba por “tocar” todas as vertentes do mesmo, visto que nenhum órgão pode viver sem o sangue que lhe dá vida.

Temos no nosso corpo vários sistemas, dos quais saliento o sanguíneo e o nervoso, por serem aqueles que, de uma forma simplista, mais tocam toda a nossa existência.

Tenho então para mim, que temos também um “sistema espiritual”, e que esse sim, toca toda e qualquer parte do nosso corpo, porque é aquele que nos faz exactamente o que somos e como somos, «feitos à imagem e semelhança de Deus», ou seja, a presença de Deus em nós é no todo que nós somos, e não apenas numa parte específica do nosso corpo.

Ora, se para tratar do coração e do nosso sistema sanguíneo Deus deu ao homem a capacidade de descobrir o cateterismo, sem dúvida que Deus também tem para o homem um “tratamento” para o seu “sistema espiritual”!

E é claro que tem e todos nós o conhecemos muito bem, pois chama-se Confissão.

Para fazermos um cateterismo, temos que ir ao hospital, colocarmo-nos nas mãos de um médico, e disponibilizarmo-nos para receber o tratamento, para além de nos comprometermos a seguir as indicações do médico quanto à nossa vida futura, o que por vezes irá implicar alguns sacrifícios de mudança de vida, no que diz respeito a hábitos alimentares, de comportamento, etc.

Para recebermos o “cateterismo de Deus”, a Confissão, temos que nos dirigir à Igreja, (e não me refiro a um edifício), colocarmo-nos nas mãos de um sacerdote, aceitarmos o perdão que nos é dado e fazermos um firme compromisso, um firme propósito de emenda, que também nos irá exigir vigilância contínua e o desistirmos de algumas práticas mundanas que põe em causa os efeitos perenes do “tratamento”.

No cateterismo, o cateter percorre o “sistema sanguíneo”, até ao coração, (“fonte” do nosso sangue/vida), tudo examinando para descobrir problemas que possam existir, e, se for necessário, vai deixando o medicamento apropriado para curar, tratando o que é necessário tratar.

Podemos então reflectir que na Confissão, o cateter é o amor de Deus, que percorrendo o nosso “sistema espiritual” nos vai fazendo examinar a nós próprios, até chegarmos ao coração, receptáculo e fonte do amor de Deus.
Perante a evidência de alguma “doença”, (rancor, falta de perdão, vícios vários, etc.), é necessário o “medicamento” apropriado, pelo que, o amor de Deus, (o cateter da Confissão), leva o perdão a todos os pontos doentes de modo a que, libertos do mal que os envolvia, possam então cumprir a sua missão de, (fazendo o homem completo), ser testemunhas do amor de Deus.

Tal como no seguimento de um cateterismo é necessário que a pessoa tome muito cuidado com o modo de viver no seu futuro, também após a Confissão o homem deve ficar vigilante e fugir do pecado, resistindo-lhe com todas as armas que Deus lhe der.

Obviamente que as diferenças entre um cateterismo e a Confissão são imensas, (não são aliás comparáveis), mas este texto serve apenas para meditarmos mais um pouco neste tempo de Quaresma, (como se fossemos ao hospital fazer o tal cateterismo!), e por isso mesmo gostaria de salientar pelo menos duas dessas diferenças:

O cateterismo tem sempre, apesar de tudo, um risco para a saúde do doente, e até alguns possíveis efeitos secundários, por força da “invasão” a que sujeita o paciente, bem como, não pode ser repetido demasiadas vezes ou muito frequentemente.

A Confissão não tem qualquer risco para a saúde espiritual, mental ou física do homem, (antes pelo contrário), não tem quaisquer efeitos secundários que não sejam bons, (até porque nunca se trata de uma “invasão”, mas de uma aceitação), pode ser repetida sempre e até o deve ser muito frequentemente.

O cateterismo, embora muito bem feito e com todas as condições, pode não resultar, e o doente ter que ser sujeito a outros tratamentos mais complicados e perigosos.

A Confissão bem celebrada alcança sempre o melhor resultado, pela graça de Deus, e o homem fica totalmente curado, até que, por sua exclusiva vontade, volte a pecar.

E no mundo tão materialista em que vivemos, ainda podemos perceber que, enquanto o cateterismo tem custos financeiros para o doente e para o estado, a Confissão é fruto gratuito do “imensamente” infinito amor de Deus.

Por isso mesmo, preparei o cateterismo que fui fazer, com uma prévia Confissão, pois de uma coisa tenho a certeza: o “cateterismo de Deus” não falha, e por Sua graça, alcança-me a salvação.

Deus seja louvado!


Nota:
«O cateterismo cardíaco é um procedimento no qual é inserido um pequeno tubo (cateter) através de um grande vaso sanguíneo no braço ou na perna, que, em seguida, é dirigido até ao coração. Os médicos utilizam o cateter para medir a pressão e os níveis de oxigénio dentro das câmaras cardíacas e, assim, avaliar o funcionamento do coração. Através do cateter, os médicos podem igualmente injectar um corante especial que proporciona uma imagem radiológica da estrutura interna do coração e dos padrões de fluxo de sangue. Em alguns doentes, o corante radiológico é igualmente injectado nas artérias coronárias para identificar áreas que se tornaram estreitadas, procedimento denominado angiografia coronária.
Os cateteres cardíacos podem ser utilizados para transportar instrumentos cirúrgicos especiais até ao coração, possibilitando abrir artérias coronárias estreitadas (um procedimento denominado angioplastia coronária) ou corrigir determinados defeitos cardíacos congénitos (de nascença) nas crianças.»

Retirado daqui: http://hmsportugal.wordpress.com/2011/05/20/sabe-o-que-e-o-cateterismo-cardiaco/

Marinha Grande, 7 de Março de 2012

JMA

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 26 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9667: Blogoterapia (204): Não tenho palavras para agradecer o calor que trouxeram ao meu coração (Joaquim Mexia Alves)

quarta-feira, 4 de março de 2009

Guiné 63/74 - P3978: Nuvens negras sobre Bissau (14): N' cansa tchora guine (Anastacio di Djens / Luís Graça)

Video clip de Anastacio de Djens - N'cansa tchora guine - Produção: TVKlele. Um dos temas, o 4º, inseridos no álbum musical, não comercial, com video clipes da TV Klele, distribuídos juntamente com a pasta do Simpósio Internacional de Guiledje (Bissau, Guiné-Bissau, 1 a 7 de Março de 2008). O álbum tem por título Guiné-Bissau, Terra de História e Cultura. A televisão comunitária TV Klele, do Bairro Quelélé, de Bissau, tem o apoio da AD - Acção para o Desenvolvimento.

O tema musical deste videoclipe é fortíssimo. Mesmo não entendendo a 100% toda a letra (em crioulo de Bissau), não consigo ouvi-lo e vê-lo sem deixar de me emocionar. Anastácio di Djens, que eu conheci por ocasião do Simpósio, em Março de 2008, é uma das vozes mais belas e promissoras da nova geração musical. Oxalá haja oportunidades de trabalho para ele desenvolver e dar a conhecer o seu grande talento, a sua voz, a sua sensibilidade, dentro e fora da Guiné-Bissau, país de grandes músicos e de grandes tradições musicais. Daqui de Lisboa, numa semana de luto, para todos nós, vai um grande abraço, amigo e solidário, para ti, Anastácio, e para todos os jovens da tua terra que cantam e dançam a tua música. Um abraço também para a talentosa rapaziada da TV Klele. E, claro, para o Pepito e a malta da AD... Eles são, todos eles, os melhores filhos da Guiné.

Vídeo (5' 25''): You Tube > TVKlele (2007) (com a devida vénia...)

Guiné-Bissau > Bissau > Simpósio Internacional de Guiledje (1 a 7 de Março de 2008) > Capa e contracapa do álbum Guiné-Bissau, terra de história e de cultura. Bissau, TV Klele Produções, 2008. Foto: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.

Guiné, Tabanca Grande (...) Quem disse que Deus, Alá e os bons irãs não montaram morança nesta terra ? Não foi o muntu. Não foi o tucurtacar pangolim. Não foi a rapaziada do Bairro do Quelélé. Não foi o fula nem o nalu. Não foram as aves do Cantanhez. Não foram os homens grandes do Gabu. Não foi o tuga, nem foste tu nem fui eu. (...) Ah!, como está ainda bem longe, Cabral, o ideal por que lutaste e morreste, uma vez, tu e tantos outros combatentes da liberdade da pátria. Nada que tu não saibas, lá no Olimpo dos deuses e dos heróis, ou não soubesses já, cá na terra dos homens, que a História é fértil em exemplos de efeitos perversos, de Revoluções que devoram os seus filhos... (...) Quem disse, afinal, que tu,Guiné, não tens futuro ? Se não o foi macaco fidalgo, foram os teus inimigos, os de fora e os de dentro, os teus filhos bastardos e os filhos bastardos de outras nações. Os que dizem mal de ti, que te querem comprar a preço de saldo, e que te arrastam pela lama do tarrafo. E que dizem que és um narco-Estado. E que vives da caridade internacional. E que já não tens fé, nem caridade, nem esperança, nem voz, nem lágrimas para chorar. Que já não tens alma, nem salvação, nem pudor. E que Cabral morreu e está enterrado, na antiga fortaleza colonial da Amura. (...) Como te imploram os teus filhos, não queiras chorar mais, Guiné! N ka misti tchora mas! Faz das tuas lágrimas a força do macaréu da tua revolta e do teu ânmimo que te ajudarão a abrir a Picada do Futuro, a construir o Novo Corredor do Povo, a Nova Estrada da Liberdade. Que eu só desejo que seja tão grande, larga e fecunda, como os teus rios míticos, do Cacheu ao Cumbijã, do Geba ao Cacine. Ou tão límpidos e belos e selvagens como o Corubal. E que o Nhinte-Camatchol, o grande irã, te proteja, Guiné, Tabanca Grande. Excertos de: "Que o Nhinte-Camatchol te proteja, Guiné, Tabanca Grande" por Luís Graça (*) ___________ Nota de LG. (*) Vd. poste de 31 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2704: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (12): Que o Nhinte-Camatchol te proteja, Guiné-Bissau Vd. também último poste da série Núvens negras sobre Bissau > 4 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3977: Nuvens negras sobre Bissau (13): Como acabar de vez com esta espiral de violência ? (Pepito)