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terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

Guiné 61/74 - P21939: Notas de leitura (1343): Paparratos e João Pekoff: as criaturas e o criador, J. Pardete Ferreira - Parte II: os "mentideros' de Bissau (Biafra, 5ª Rep) e ainda e sempre a retirada de Madina do Boé (Luís Graça)


Guiné > Região do Boé > CCAÇ 1589 / BCAÇ 1894, "Os Tufas (Bissau, Fá Mandinga, Nova Lamego, Beli e Madina do Boé, 1966-68) > 1967 > Madina do Boé: vista aérea, tirada de DO 27, c. 1967. As tão faladas colinas do Boé... "O resto era deserto", diz o fotógrafo..

Foto (e legenda): © Manuel Caldeira Coelho (2018). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Capa do livro

FERREIRA, José Pardete - O paparratos : novas crónicas da Guiné : 1969-1971. Lisboa : Prefácio, D.L. 2004. 169 p., [12] p. il. : il. ; 24 cm. (História militar. Memórias de guerra). ISBN 972-8816-27-8.


1. Continuação da nota de leitura (*):

Este livro, "O paparratos : novas crónicas da Guiné : 1969-1971", publicada sob a chancela editorial da Prefácio,  surge numa coleção , "História Militar" que tem quatro séries: "Batalhas e campanhas"; "Armas de Portugal"; "Memórias de guerra"; e "Estudos e documentos".

A coleção, que se reclama de um "conceito inovador". pretende conciliar a investigação historiográfica com a produção literária e memorialística, como é o caso deste livro do nosso saudoso camarada José Pardete Ferreira, que foi alf médico. no CAOP. Teixeira Pinto (1969) e no HM 241 (1969/71).

O alferes miliciano médico João Pekoff (heterónimo criado pelo José Pardete Ferreira, ou se não mesmo o seu "alter ego") chega a Teixeira Pinto, ao CAOP,  em meados de fevereiro de 1969 (pág. 30). Em Bissau, onde o seu batalhão de origem (, que apostamos ter sido o BCAÇ 2861,) desembarcou em 11/2/1969,  deve ter estado alguns escassos dias, em trânsito, antes de apanhar uma DO-27 que o levou até à capital do chão manjaco , de qualquer modo o tempo suficiente para começar a conhecer alguns dos pontos obrigatórios do roteiro dos cafés e restaurantes da tropa...

Alguns eram obrigatórios como o café Bento, mais conhecido por 5ª Rep, junto à fortaleza da Amura onde estava  instalado o  QG/CCFAG [Quartel General do Comando Chefe das Forças Armadas da Guiné], com as suas 4 Rep[artições]. 

Era o grande "mentidero" de Bissau, onde os "apanhados do clima", vindos do mato, "desenfiados" ou em trânsito, partilhavam notícias e histórias com a malta do "ar condicionado"... Chegados a Bissau, os "periquitos" apanhavam logo ali os "primeiros cagaços", histórias tenebrosas de Madina do Boé, de Gandembel, de Guileje, etc., aquartelamentos no mato, felizmente, longe, muito longe de Bissau e do seu "bem-bom"...

Pardete Ferreira, de cultura francófona,  descreve assim a 5ª Rep, com inegável bom humor, para não dizer sarcasmo, comparanda-a com a situação de um aquartelamento do mato, Tite, na região de Quínara, perto de Bissau em linha recta, pelo que, quando era atacado ou flagelado, toda a gente ficava a saber e até a ver (pp. 54/55):

"(...)  Toda a Guiné Portuguesa tinha esta classificação de zona cem por cento de risco. Naquele território, era indiferente passar calmamente uma soirée [sic] na 5ª Rep ou no aquartelamento de Tite. 

"Na 5º Rep, a arma era  um copo de  uma beberagem qualquer, que ia aquecendo na mão e  que ia sendo municiada periodicamente. O único risco era constituído pelos perdigotos, por vezes sólidos estilhaços de mancarra, que o companheiro de conversa lançava, aproveitando o estar longe do interface do corpo a corpo.

"Em Tite, que se situa mesmo em frente da 5ª Rep, do outro lado do Geba [, na margem esquerda], apenas a alguns quilómetrps à vol d'oiseau [sic], a arma que se tinha na mão era das verdadeiras, daquelas que matam.

"Aquela cómoda sala do QG [Quartel General], no teatro operacional, dava lugar a um abrigo onde o combate mordia. No QG, pelo barulho podia adivinhar-se que Tite estava seguramente a embrulhar, podendo ver-se  as cores das balas tracejantes e ter uma ideia  da intensidade do assalto,pela quantidade e duração do fogo de artifício.

"Na 5ª Rep, assistindo-se ao espetáculo, beberricando um whisky ou despejando rapidamente uma mulher grande [, basuca ?], quase sem tempo para descascar a mancarra acompanhante, estava-se exactamente dentro  dos limites do mesmo Teatro Operacional da Guerra. Todo o pedaço daquela terra era território de guerra. O risco tinha uma graduação muito  relativa, embora fosse sempre uma probabilidade.

"Não se fizeram operações de black out [sic] como treino para a remotíssima hipótese de um ataque dos MiGs da Guiné-Conacry ? Houve quem  dissesse que afirmar isto era um verdadeiro disparate, na medida em que  os MiGs de Conacry eram de um modelo tão antigo que. se atacassem Bissau,  teriam que pedir o favor de ser reabastecidos em combustível no aeroporto de Bissalanca, a fim de poderem regressar à sua base de partida" (...).


2. Na 5ª Rep ou no "Biafra", a messe de oficiais dos Adidos,  o nosso médico terá ouvido logo, ao chegar,  os ecos,  ainda muito frescos,  da tragédia ocorrida no dia 6 desse mês de fevereiro de 1969, no rio Corubal, em Cheche, na sequência da retirada do quartel de Madina do Boé (e que ele vai reconstituir, de maneira superficial e algo fantasiosa, no capítulo XVII, pp. 117-121 de "O Paparratos").

A comoção que "o desastre do Cheche" provocou nas NT prolongou-se por todo esse 1º semestre de 1969, pelo menos, ao ponto de eu ouvir diferentes relatos dos trágicos acontecimentos quando cheguei a Contuboel, em princípios de junho,  para dar instrução aos futuros soldados guineenses da CCAÇ 2590 / CCAÇ 12, e depois, já em na segunda metade de julho de 1969, quando fomos colocados em Bambadinca, às ordens do BCAC 2852 (1968/70). 

A ideia com que os "periquitos", de olhos e ouvidos bem abertos,  ficavam, das conversas até às tantas da noite, regadas com cerveja ou uísque, era que Madina do Boé bem poderia ter sido o Dien Bien Phu português, o que, sabemo-lo hoje, era manifestamente exagerado. 

De qualquer o quartel fora evacuado com o (falso) argumento de que o sítio não tinha qualquer interesse estratégico para as NT. A "inteligência" spinolista não conseguir prever os efeitos perversos desta decisão: a retirada de Madina do Boé veio fragilizar o flanco sul e sudeste do "chão fula" e sobretudo será bem explorada pela propaganda e diplomacia de Amílcar Cabral.(**)

Pardete Ferreira não viveu, diretamente, esse desastre, não participou da Op Mabecos Bravios, mas ouviu também relatos, alguns apocalípticos ou fantasiosos, como eu,  mas ter-se-á documentado minimamente para escrever o "Paparratos". O mito e a realidade andam, muitas vezes,  de mãos dadas, o que numa obra de ficção é perfeitamente aceitável; como o próprio o diz, este não é um  trabalho historiográfico, é um "romance"... 

Podiam, entretanto,  apontar-se alguns exemplos de "factos" criados pelo narrador, que passamos a destacar em subtítulo.


(i) A 1221º Companhia de Paraquedistas foi  "a última a evacuar Madina do Boé" (pág. 117) [, referência à 121ª CCP / BCP 12, comandada pelo cap prqd Terras Marques, que no livro é o tenente paraquedista  Teixeira Martins]

Os paraquedistas não participaram na Op Mabecos Bravios, pelo que não fazia sentido a presença ali do [José Manuel] Terras Marques. Creio que o autor quis fazer uma homenagem a um militar que ele admirava, com quem acamaradou e inclusive fez amizade, no CAOP, e depois em Bissau, enquanto esteve, ano e meio, no HM 241.  E inclusive terá mantido essas relações de amizade na vida civil.  

Sabe-se que o Teixeira Martins [, ou melhor, o Terras Marques] fez duas comissões no TO da Guiné.  E pelo que corre nas redes socais, dos testemunhos de paraquedistas que foram por ele comandados, era um oficial com grande carisma, conhecido pelo "Tigre". E o próprio criador do Paparratos e do João Pekoff não o desmente, ao traçar o seu perfil;

(...) "O Pára Teixeira Martins tinha uma pontaria de exceção. Treinava sempre os seus homens com bala real".  (...). Ah!, e muito importante: dava sempre o exemplo!.

"Como capitão, tinha como guarda-costas o 118. (...) Na sua segunda comissão consecutiva, era um militar experiente, Muito calmo, parecendo dormir, saltava repentinamente e iniciava o tiro, sem que os mais novos tivessem dado por isso. Malditos periquitos. (...)  (pág. 120).

Ora este 118, o guarda-costas do capitão pára  seria nada mais nada menos do que o Cabo 80, que tem, no nosso blogue, alguns referências como sendo outra figura mítica do BCP 12. Foram-lhe atribuídas duas cruzes de guerra por feitos valorosos no CTIG.  Na vida civil, o seu nome completo era o  Jaime Manuel Duarte de Almeida, "Dois senhores da guerra", chamou-lhes o nosso Jorge Félix (***).

Há aqui um outro tenente, cuja identifidade não conseguimos decifrar. No livro "O Paparratos" e no capítulo respeitante a Madina do Boé, surge como o tenente pára Lemos Neves.. Quem seria este oficial  L...N... ? 

Escreve o autor:

(...) "Fez questão de ser o último homem a sair  dessa terra, que mais tarde vai ser a primeira Capital da República da Guiné-Bissau, dita Independente". (...) Nascido na Guiné (...), não vira ele  seus pais e sua irmã serem chacinados pelos turras ? Iniciando o serviço militar como miliciano, acabou por fazer em seguida a Academia Militar e logo após, em Tancos,  obteve o Brevet de Paraquedista ao qual juntou a Boina Verde, pouco tempo depois" (...).

Assim, de repente, só nos lembramos de um paraquedista guineense, pertencente ao BCP 12, o hoje cor ref  e empresário, Chauki Danif, nascido em Bafatá há mais e setenta anos,  e que eu conheci pessoalmente no lançamento do livro do cor prqd ref Moura Calheiros, "A Últma Missão", na Academia Militar, em 29 de novembro de 2010. Tanto quanto sei, ninguém da sua família   morreu, na Guiné, no início da guerra, por acções terroristas.


(ii) "Havia pelo mnos um Batalhão para evacuar" (pág. 118)

A unidade de quadrícula de Madina do Boé era a CCAÇ 1790, comandada pelo cap inf José Aparício. Béli já fora  retirada, em 15 de julho de 1968, em plena época das chuvas. Era um destacamento onde havia um pelotão da CCAÇ 1790.  

Como é largamente sabido, as vítimas do desastre do Cheche foram forças da CCAÇ 2790 e da CCAÇ 2405 (, esta pertencente ao BCAÇ 2852, sediado em Bambadinca),  que atrevessavam o rio, de jangada,  na última viagem. 


(iii) Havia "alguns abrigos reforçados" (...), "construídos à pressa" e que, segundo se dizia, eram "à prova de morteiro 120" (pág. 118)


Não nos é possível confirmar ou infirmar esta afirmação. Não sabemos se o BENG 447 teve tempo ou condições para construir alguns "bunkers" em Madina do Boé.  De resto, havia questões logísticas complexas a resolver (, transporte de materiais de contrução, etc.) e já em junho de 1968 parecia estar tomada a decisão de evacuar Madina do Boé, tal como Beli. 

Como escreveu Hélio Felgas, a companhia de Madina estava ali apenas a defender-se a si própria, quando era precisa noutros pontos do território.


(iv) "Aquela de meter um aquartelamento no vale aconchegado entre os únicos terrenos elevados [colinas] de todo o território guineense parecia não lembrar a minguém" (pág. 118)

Também não sabemos. ao certo, desde quando passou a haver tropa na antiga tabanca de Madina do Boé. O subsector de Madina do Boé (tal como o Buruntuma) foi criado ao tempo do BCAÇ 512, em 23 de maio de  1965.

Segundo o nosso colaborador permanente, José Martins, a primeira unidade a instalar-se em Madina do Boé, foi a CCAV 702 / BCAV 705. Permanceu lá de maio de 1965 a abril de 1966, quando terminou a sua comissão de serviço. A última, como se sabe, foi a CCAÇ 1790, que retira do local em 6 de fevereiro de 1969 (Op Mabecos Bravios).

É possível que o PAIGC tenha utilizado, do outro lado da fronteira, o novo e temível morteiro 120, que se estreou no TO da Guiné, em setembro de 1968, contra Gandembel (****).

Em suma, sobre a retirada de Madina do Boé e o desastre de Cheche, o autor não traz (em 2004), nada de novo. E resume a narrativa do acidente a um ou dois parágrafos,  E comenta do seguinte modo: apesar do "bom planeamento" (pouco habitual mum país que gosta de "magníficos improvisos",os quais , de um modo geral, até "costumam correr bem"), tudo vai correr mal no fim, como sabemos (pág. 119).  

O tema vai ser depois debatido no nosso blogue quase até à exaustão, levando ao confronto de diferentes versões. 

(Continua)

__________



(**) Vd. poste de 10  de novembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21531: Casos: a verdade sobre... (14): as razões da retirada de Madina do Boé em 6 de fevereiro de 1969... Já oito meses antes, em 8 de junho de 1968, havia saído uma Directiva do Comando-Chefe da Guiné para a transferência da unidade ali estacionada, a CCAÇ 1790, comandada pelo cap inf José Aparício

(***) Vd. poste de 28 de dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5552: FAP (42): Dois senhores da guerra: O Cabo 80 e o Cap Pára Terras Marques (Jorge Félix)

domingo, 17 de janeiro de 2010

Guiné 63/74 - P5668: FAP (45): Em defesa do meu amigo Oitenta (Silvio Fagundes Abrantes, Hoss, ex-Sold Pára, BCP 12, 1970)




Guiné > Bissau > Brá> 1970 > "Os meus grandes amigos da Companhia de Caçadores Páraquedistas nº. 122: O Hoss e o Rodrigues. Em cima, vê-se o Hoss a aparar um murro no estômago, como mandavam as regras.

"Na segunda foto, o primeiro a começar da esquerda é o famoso Hoss, assim conhecido por todos incluindo os familiares, e julgo também o staf dos CTT, porque bastava escrever na carta ou no aerograma no endereço HOSS Pára-quedista, sem SPM nem nada, que a correspondência lhe ia chegar às mão. Era 1º Cabo Enfermeiro (julgo eu). O segundo era o Soldado Manuel Conceição Rodrigues, que era meu amigo desde há muitos anos, quando ele esteve a trabalhar na construção dos Estaleiros da Lisnave. Daí quando ía a Bissau, em vez de ficar no Depósito Geral de Adidos, ía comer, beber e pernoitar no quartel de Brá com estes meus grandes amigos. O terceiro da fotografia sou eu" (...) (*)

Fotos (e legendas): © Tino Neves (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentário, com data de 4, ao poste de 2 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5580: FAP (44): A verdade sobre os incidentes, em Bissau, em 3 de Junho de 1967, entre páras e fuzos... (Nuno Vaz Mira, BCP 12)

Caro amigo Luís Graça, em primeiro vou-me apresentar: Ex-soldado paraquedista, cumpri serviço no BCP 12. Chamo-me Sílvio Fagundes Abrantes, mais conhecido pelo Hoss.

Vou falar do que sei sobre o meu amigo Jaime Manuel Duarte de Almeida, 1º Cabo Paraquedista RD 85, mais conhecido pelo Cabo 80.

Sobre a sua vida de civíl antes da tropa pouco ou nada sei. Sei que teve uma infância muito dura e a certa altura foi para Lisboa onde se alistou na vida da noite. Quando algumas vezes lhe perguntei o que tinha feito antes da tropa, a resposta era sempre a mesma, ou se calava, ou não quero falar disso.

Era um bom jogador de cartas e exímio na vermelhinha. Não tinha escrúpulos em sacar a massa ao maior amigo, daí o pessoal não simpatizar muito com ele, como diz o Sr. Coronel Mira Vaz, meu comandante de companhia na altura.

Grande guerreiro, dotado de muita força, a MG 42 para ele era um brinquedo. Tínhamos dois inimigos comuns, os pretos e os ranhosos da PM [Polícia Militar], [que] se se bamboleavam por Bissau como se fossem donos e senhores do território, ainda hoje não posso com esses ranhosos.

O Jaime pertencia à CCP 122, veio para a 121 temporariamente pela mão do então Capitão Terras Marques que veio da 122 para a 121 e o Cabo 80 veio com ele. A seguir ao Cap Terras Marques, hoje Coronel na Ref, veio o Sr Mira Vaz.

A última vez que vi o meu amigo 80 foi em Águeda, encontrei-o por casualidade à beira da estrada nacional nº 1. Passámos ao resto da tarde juntos. Disse-me que estava à espera de ir para França, até hoje nunca mais o vi nem soube nada dele de concreto, o que sei é o mesmo que os meus amigos sabem.

O 80 não era nenhum arruaceiro e era digno das tropas Paraquedistas.Não como diz aí um senhor. Ele era um lutador, lutava pela Pátria e sabia o significado da palavra Pátria, ao contrário desse senhor que lhe chama arruaceiro, que não deve saber o significado da palavra Pátria e além disso é nojento tratar de arruaceiro um militar da estirpe do 80, sabendo que ele não está cá para se defender ou esse senhor era da PM a quem o 80 fez a vida negra e agora tenta vingar-se, isso é jogo sujo. Se ele cá estivesse de certo que não dizia uma baboseira dessas. Mais não digo.

Vou esclarecer um mal entendido. Eu era soldado enfermeiro, nunca fui promovido a cabo porque num dia fui duas vezes à missa e tramei-me. Eu era apontador de MG e um colega meu trazia a bolsa de enfermagem. Prometo voltar, Hoss.


2. Comentário, colocado no mesmo poste, pelo Paulo Santiago:

Coronel Mira Vaz: 

Após ler o seu post, liguei ao meu amigo e conterrâneo Hoss (Sílvio Abrantes), visto ter a convicção que ele tinha a especialidade de enfermeiro. Confirmou-me ter essa especialidade,apesar de nas saídas para operações levar a MG 42, sendo outro camarada a levar a bolsa de enfermagem. Falou-me numa emboscada no Pelundo (?) em que morreram 6 Páras, e após o combate ter exercido em vários camaradas as funções de enfermagem, o que acontecia, segundo ele, sempre que havia combate com feridos.

Abraço
P.Santiago
Alf Mil Pel Caç Nat 53

3. Comentário de L.G.:

Já tinha feito a sugestão ao Paulo:

"(...) Por que não trazes o Hoss até nós, tal como fizeste com o Victor Tavares ? Tu tens esse condão especial de saber levar a água ao teu/nosso moínho"...

E acrescentava: "O Victor, 1º Cabo da CCP 121 / BCP 12, foi o primeiro pára a 'abrir o livro', no nosso blogue... Publicámos, dele, um conjunto notável de depoimentos sobre a actividade operacional e humana da CCP 121, nomeadamente a actuação em Guidaje e depois em Gadamael em Maio/Junho de 1973. Também era um homem da MG 42. Ficámos amigos. Dá-lhe os meus melhores cumprimentos quando o vires"...

Julgo que a alcunha Hoss tenha sido atribuída ao Sílvio por analogia com a figura do Hoss Cartwrigh, da popular série televisiva norte-americana Bonanza...(Quem,da nossa geração, não era fã da família justiceira mas bonacheirona do Faroeste, o pai Ben, e os filhos Adam, Hoss e Little Joe ?... Comecei a vê-los desde os princípio da década de 60, se não me engano, na RTP)...

Gostava que o camarada Sílvio lesse as nossas regras de bom senso e bom gosto (por exemplo, não usamos o termo "preto", pela sua conotação racista...) e aceitasse fazer parte desta comunidade de amigos e camaradas da Guiné. Na nossa Tabanca Grande não cultivamos ódio nem raiva por ninguém, incluindo os antigos militares da PM e os homens (e mulheres) que nos combatíam (os guerrilheiros do PAIGC)...

No nosso blogue, simplesmente contamos histórias, partilhamos memórias e até afectos. Vejo que o Sílvio está na disposição de nos contar também histórias do seu tempo de militar da CCP 121 / BCP 12. Peço ao Paulo Santiago, seu amigo e vizinho, que o apadrinhe na sua entrada no nosso blogue. Se ele aceitar o nosso convite, que seja desde já bem vindo, alargando assim a representação dos camaradas do BCP 12.
___________

Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 10 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1512: Estórias de Bissau (11): Paras, Fuzos e...Parafuzos (Tino Neves)

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Guiné 63/74 - P5552: FAP (42): Dois senhores da guerra: O Cabo 80 e o Cap Pára Terras Marques (Jorge Félix)





Guiné  > BCP 12 >  s/ data (c. 1968/´70) > 2 fotos do antigo Cap Pára  Terras Marques, hoje coronel reformado: a primeira, num convívio da CCP 122/BCP 12, em Bissalanca, BA 12; e outra, no mato.

Fotos (e legenda):  © Jorge Félix (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. Mensagem do nosso amigo e camarada  Jorge Felix, ex-Alf Mil Pil Heli AL III (Bissalanca, BA 12, 1968/70), residente em Vila Nova de Gaia;

Assunto - O Oitenta (*)

Caro Luis,

Por se tratar de uma figura mitica dos Paraquedistas, o Oitenta,  envio-te este comentário que escrevi no P5546 (*), e a que darás mais relevo se assim o entenderes.

O Jaime era mais conhecido por Oitenta.

O Jaime foi chinado numa refrega no Bairro Alto. Quando chegaram os PM era tarde.

As lutas do Oitenta em Bissalanca eram, além de mais românticas, para matar o tempo, pois que passado o calor do sangue, o convivio recomeçava. Havia um fuzileiro de estimação chamado Tarzan, mas tudo era , como já disse,  muito romântico.

Transportei muitas vezes o Jaime  para as ZOPS, onde o vi sempre bem disposto, corajoso e solidário. Muitos roncos me ofereceu das investidas que fazia nos TASS (assaltos). Ficou tudo debaixo da minha cama em Bissalanca.

Muitas vezes disse ao Oitenta:
-Tens mais de pescoço que eu de perna !!  - e ríamos.

As histórias do Oitenta parecem todas um exagero mas uma tem que ser contada.

Porque se chamava Oitenta, o Jaime ? Dizem que na carreira de tiro,  na sua recruta, com duas metralhadoras, uma em cada mão, desenhou um oito com a esquerda e ao mesmo tempo um zero com a direita.

Outro Senhor da guerra por quem nutro grande amizade e é falado neste poste é o Terras Marques, companheiro de muitos voos e muita  água da Bolanha.

Junto uma foto sua algures no mato e outra num convivio no BCP 12 com a Companhia nº 122.
Jorge Félix

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Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 27 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5546: FAP (41): Quem foi realmente o Cabo 80, 1º Cabo Pára-quedista nº 85/RD ? (Pedro Castanheira)

domingo, 27 de dezembro de 2009

Guiné 63/74 - P5546: FAP (41): Quem foi realmente o Cabo 80, 1º Cabo Pára-quedista nº 85/RD ? (Pedro Castanheira)


1. Texto de Pedro Castanheira, ex-pára-quedista (*):

Assunto - O famigerado Cabo 80

O Ten Spears,  destemido e bravo oficial pára-quedista norte-americano, distribui cigarros aos 6 soldados alemães, feitos prisioneiros ao 2º dia do desembarque na Normandia. Após ter acendido os cigarros, com toda a lisura, a cada um deles, pega na sua metralhadora, e num impulso de loucura, descarrega o carregador sobre os prisioneiros alemães.

Esta era mais uma história, que circulava entre os homens da companhia Easy, pertencentes à 101ª Divisão de Paraquedistas, criando entre os soldados um misto de temor e admiração pelas suas façanhas, quase no fim da guerra na Europa, já com Spears promovido a capitão.

Lipton, expriente psar da companhia, interroga-o sobre essas "histórias"que se contam sobre ele. Spears sorri, conhecendo de cor todas essas histórias, maior parte delas inventadas, e diz a Lipton:
- Há 2000 anos atrás, havia centuriões à conversa sobre Tercius a dizer que ele decapitara prisioneiros cartagineses. Nunca ouviram Tercius negar as histórias, talvez porque Tercius queria que pensassem que ele era o pior e mais malvado guerreiro de toda a legião romana.

Li neste blogue há algum tempo, excertos do livro do senhor sargento pára Carmo Vicente, em que se refería a "conhecidos arruaceiros, como o famigerado 80", tendo logo aparecido quem defendesse a sua honra e afirmado que era enfermeiro, facto que eu não descionhecia (**).

Já eu nos anos 90, quando cumpria o meu serviço militar nos paraquedistas, ouvi muitas vezes da boca dos veteranos da Guiné, a prestar serviço nos páras, referências ao cabo 80, figura mítica dos páras na Guiné, conflituoso, lixado para a porrada, que partia os bares todos em Bissau, homem que enfrentava tudo e todos... Enfim, também ainda se ouvem sussurros sobre o 80 no dia de unidade dos paraquedistas, entre os páras que prestaram serviço na Guiné.

Mas, o que é feito da nossa personagem? Segundo consta, desapareceu após o fim da sua comissão. Ins dizem que já morreu, mas ouvi também dizer que fugiu do país, após ter morto um polícia, por altura do 25 de Abril... Atenção, são versões não confirmadas.

A certa altura,  estando eu à conversa com um pára de uma associação de paraquedistas, também ele a par da fama do cabo 80, revelou-me o seu verdadeiro nome. Após consulta minuciosa ao livro do BCP12, qual não é o meu espanto, ao ver o famigerado cabo 80 assinalado várias vezes, com reconhecimento por bravura em combate.. . E mais!, na parte das condecorações, lá está o "arruaceiro" Primeiro Cabo Paraquedist nº 85/RD (...) 

MEDALHA DA CRUZ DE GUERRA DE 2ª CLASSE 

e novamente (...) .MEDALHA DA CRUZ DE GUERRA DE 3ª CLASSE.

Não sei, quem era o comandante de companhia, deste nosso cabo paraquedista (Cap Mira Vaz? Cap Terras Marques? Cap Avelar de Sousa? entre outros). Penso que era interessante saber, da parte dos elementos da sua companhia, quem era realmente o cabo 80. Eu, humildemente, e sem querer ofender, penso que era mais um soldado que queria honrar a sua pátria, e que tinha a sua maneira de o fazer.

Um grande abraço

Pedro Castanheira

[Revisão / fixação de texto: L.G.]
_____________

Notas de L.G.:

(*)  Vd. poste de 22 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5518: Cancioneiro da CCP 122 / BCP 12 (1972/74) , a Gloriosa (Pedro Castanheiro)

(**) Sobre o Cabo 80 e os tristes acontecimentos de Bissau, em Janeiro de 1968, vd. postes de:

10 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1512: Estórias de Bissau (11): Paras, Fuzos e...Parafuzos (Tino Neves)

(..) A estória é-me contada em 3ª ou 4ª mão, foi-me contada por uns amigos pára-quedistas, portanto é a sua versão (deles, pára-quedistas).

Então é assim: Não tenho a data do acontecimento, mas julgo ter sido em 1968. Houve um jogo de futebol de onze no campo do Benfica. Não me recordo, ao certo, do nome completo do clube de futebol. Sei que era de Bissau, só me lembro que era do Benfica.

Os contentores eram obviamente os Fuzileiros contra os Pára-quedistas, o jogo estava a correr muito bem, mas a um dado momento gerou-se uma troca de mimos, na assistência, entre as claques que chegaram mesmo a vias de facto (ou seja pancadaria).

Os Fuzileiros, estando relativamente perto do aquartelamento deles, correram a armarem-se, ou pedir reforços, não sei, mas os Pára-quedistas aperceberam-se disso e foram em seu encalço. A praça que estava de guarda na porta de armas do quartel, apercebendo-se do que se estava a passar, chamou o Cabo da Guarda e perguntou-lhe o que deveria fazer neste caso. Foi-lhe dada ordem de disparar, o que fez, originando a morte de um Pára-quedista.

A partir daí, qualquer Fuzileiro não se podia relacionar com Pár-aquedistas, e vice-versa, pelo que acontecia muitas vezes pancadaria entre ambos e, quando acontecia, cada um ia chamar o seu Camarada protector. O Protector dos Fuzileiros era um Cabo (julgo eu) chamado Lages, e da parte dos Pára-quedistas também havia um Cabo, Enfermeiro, conhecido por Oitenta.

Em café, esplanada ou qualquer espaço onde houvesse confrontos entre Fuzileiros e Pára-.quedistas com os seus respectivos Protectores, não restava nada que ficasse de pé. Quando os dois Cabos se encontravam no mesmo passeio, um deles tinha que mudar, porque ambos não se podiam cruzar.

Uma dada altura os Fuzileiros resolveram vingarem-se do Cabo 80, e sabendo que o 80, quase todos os dias antes de se recolher no quartel de Bissalanca, ia visitar a sua bajuda, que ficava relativamente perto, mas tinha que passar por alguns sítios isolados, resolveram fazer-lhe uma espera.

No dia combinado, o Cabo 80 quando já estava de regresso ao quartel, ouviu um cão a ladrar e, como o seguro morreu velho e o acautelado ainda é vivo, ele agarrou num pilão, não viesse o cão morder-lhe, mas para grande espanto dele, não foi o cão que apareceu, mas sim sete ou oito Fuzileiros armados de facas de ponte e mola.

Ele percebendo-se que também estava armado (e bem armado) com um grande pilão na mão, foi só despachar os Fuzileiros e, quando chegou ao quartel, telefonou para o Hospital para que os fossem buscar. (...).

(..) Junto fotos - eu com o meu amigo de longa data, desde a Metrópoloe, o Rodrigues, mais o Hoss, no aquartelamento de Bissalanca (Companhia Caçadores Paraquedistas nº. 122) em 1970. O Hoss assim como o Oitenta, ambos Cabos Enfermeiros, foram bastante condecorados. O Oitenta não cheguei a conhecer mas conheci (vi várias vezes em Bissau) também um grande Homem e combatente que na altura também diziam que ele tinha a cabeça a prémio. Estou a falar do Capitão na altura, hoje Coronel na reforma, Terra Marques (...).

Vd. também:

11 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1515: Antologia (58): A batalha de Bissau em Janeiro de 1968: boinas verdes contra boinas negras... Saldo: 2 mortos (Carmo Vicente)

(...) Extractos de VICENTE, Carmo - Gadamael: memórias da guerra colonial. 2ª ed. Lisboa: Caso. 1985. pp. 25-30. Selecção e digitalização de Jorge Santos. Subtítulos do editor do blogue. (...)

13 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1522: Bissau em estado de sítio por causa dos graves incidentes entre paraquedistas e fuzileiros em Janeiro de 1968 (Álvaro Mendonça)