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sexta-feira, 17 de março de 2023

Guiné 61/74 - P24149: Em busca de... (319): Camaradas do combatente Avelino da Silva Pereira da CCAV 677/BCAÇ 599, natural de Penude - Lamego - e de um exemplar do livro “Vem comigo à guerra do Ultramar”, escrito pelo Coronel António Luís Monteiro da Graça, CMDT da CCAV 677

1. Mensagem de 13 de Março de 2022 das nossas amigas Fátima Soledade e Fátima Silva, ambas filhas de antigos combatentes da guerra do ultramar, procurando camaradas do combatente Avelino Pereira, da CCAV 677:

Boa noite, Carlos Vinhal
Espero que se encontre bem de saúde.

Ontem, estivemos em contacto com o antigo combatente, ferido na Guiné, Avelino da Silva Pereira, de Penude, Lamego. Esteve integrado na Companhia de Cavalaria 677 do Batalhão de Caçadores 599.

O seu capitão foi o célebre Monteiro Graça (Coronel de Cavalaria António Luís Monteiro da Graça,
(n
a foto à direita)falecido em 2014.

Sabemos que este Coronel escreveu as suas memórias num livro intitulado “Vem comigo à guerra do Ultramar” que, com certeza, poderia ajudar a esclarecer alguns episódios referidos pelo antigo combatente.

Sabemos que a publicação foi da responsabilidade do autor, por isso foi limitada a alguns exemplares. O seu amigo João Sena foi presenteado com um exemplar.

Será que conhece alguém que o tenha e nos faculte informação do mesmo, relativa ao período do desembarque em Bissau, 13 de maio de 1964 a 24 de junho/julho de 1964, altura em que o nosso conhecido foi ferido?

Mas também localizamos no vosso blogue, o filho de um furriel miliciano dessa companhia, José Matos. Talvez nos pudesse com algum registo que o pai deixasse (fotografias, …). O nosso conhecido não tem quaisquer registos fotográficos, nunca esteve em convívios, mas é associado da Liga dos Combatentes de Lamego.

Se nos pudessem ajudar a localizar um antigo combatente dessa companhia, gostaríamos muito de o contactar.

Muito gratas,
Fátima Soledade e Fátima Silva

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Notas do editor:

- Sobre o livro "Vem Comigo à Guerra do Ultramar", de António Luís Monteiro da Graça, Combatente do Ultramar, ver aqui a recensão de Mário Beja Santos: Guiné 63/74 - P11399: Notas de leitura (472): Vem Comigo à Guerra do Ultramar, pelo Coronel António Luís Monteiro da Graça (Mário Beja Santos), de 15 de Abril de 2013.

- O filho do nosso camarada José Matos, ex-Fur Mil da CCAV 677, é o nosso tertuliano José Matos, investigador em História Militar, que no nosso blogue tem já uma extensa colaboração.
As nossas amigas Fátimas e o Dr. José Matos já estabeleceram contacto telefónico.

- Ver aqui a apresentação de José Matos à tertúlia: Guiné 63/74 - P15080: Tabanca Grande (472): José Matos, investigador independente em história militar, filho do nosso falecido camarada José Matos, fur mil da CCAV 677 (Fulacunda, São João e TIte, 1964/66)... Novo grã-tabanqueiro nº 701, de 7 de Setembro de 2015

- Último poste da série de 13 DE DEZEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23877: Em busca de... (318): Fernando José Machado Gouveia (1945-2022), ex-militar da FAP, que passou pelo CTIG; era natural de (ou morador em) Crato, distrito de Portalegre... Sobrinha procura antigos camaradas

segunda-feira, 10 de maio de 2021

Guiné 61/74 - P22189: Notas de leitura (1355): "Vem Comigo à Guerra do Ultramar", por António Luís Monteiro da Graça (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Abril de 2021:

Queridos amigos,
É sempre uma surpresa agradável encontrar na Feira da Ladra relatos da guerra da Guiné, mesmo aqueles que já são conhecidos e até já estão repertoriados. É o caso destas notas soltas do coronel António Luís Monteiro da Graça que comandou a Companhia de Cavalaria 677 na região de Tite e São João, entre 1964 e 1966. O que mais me impressionou na releitura foi o cuidado posto pelo autor em mostrar-nos, produzindo as cartas geográficas, as dificuldades quase sobrehumanas de percorrer lamaçais atravessados por cursos de água, com a mata cerrada a boa distância, mas dando boa visibilidade para hostis bazucadas e morteiradas. Monteiro da Graça desmonta a falsidade do nosso controlo daquele território, o penoso das assiduidades, a falta de material, a falta de formação, tudo superado pela galhardia e destemor dos seus homens, lêem-se estes relatos de quatro comissões e vê-se que não é fruto do acaso que estes rastos de memória são dedicados a todos os militares da CCAÇ 677, é importante lê-lo para sentir o peso destas solidariedades que nunca se apagaram.

Um abraço do
Mário


Vem comigo às terras barrentas entre S. João, Enxudé e Jabadá

Mário Beja Santos

Já em 2013 aqui se fez menção ao punhado de apontamentos elaborados pelo Coronel António Luís Monteiro da Graça com o título "Vem Comigo à Guerra do Ultramar", episódios soltos das suas quatro comissões em Moçambique, Guiné e Angola (P11399 de 13 de Abril de 2013). Fora possível fazer tal recensão por existir um exemplar que o oficial oferecera à Liga dos Combatentes. Dá sempre gosto voltar a ler estes conjuntos de memórias, tive agora a dita de comprar exemplar na Feira da Ladra, reler com gosto e talvez fazer um comentário com novo olhar. Logo as razões da dedicatória, a Companhia de Cavalaria 677 merece-lhe essa homenagem, foi ele que formou esta unidade independente, mal chegados à Guiné subtraíram-lhe um pelotão que foi reforçar Fulacunda, a sofrer na época uma grande pressão por parte do PAIGC. Recordações não lhe faltam: o alferes Teixeira, que tinha visão deficiente e que bastantes vezes ia de encontro às árvores, as suas grossas lentes nem sempre lhe davam a panorâmica do que estava à frente. E vem o elogio a todos: “Tive a felicidade de comandar homens que iam suportando todas as contingências da guerra com grande espírito de sacrifício, mas eivado de humor e boa disposição que se prolongaram até aos dias de hoje, em que não faltam aos anuais almoços de confraternização. E o elogio é extensivo aos nativos que iam connosco e que sempre foram elementos de grande valor e lealdade, honrando os compromissos assumidos e a esperança de que com a sua participação estarem a contribuir para uma Guiné mais próspera e melhor preparada para a mudança que se esperava”.

Vendo agora com mais cuidado as cartas melhor se percebe como aquela geografia de terras alagadas à volta de Jabadá, Enxudé, Gã Chiquinho eram um tormento na progressão que a guerrilha experimentada aproveitava a oportunidade para flagelar. Em junho de 1964 a guerrilha dispunha de metralhadoras e bazucas. Naquele tempo havia um médico por companhia e o Dr. Pereira não tinha qualquer preparação física, andara duas ou três semanas em Mafra, ia-se abaixo das canetas nas operações. “Daí nasceu uma guerra entre mim e o comandante. Este obrigava-me a levar o médico para as operações. Eu não o levava pois já tinha a experiência e não estava a ver o doutor a mostrar boa vontade para ir. E não o levei mais, chatices tinha eu de sobra. E também analisando bem, que fazia o médico em caso de ferimento grave? Em estancar o sangue e esperar pela evacuação, se possível, coisa que o enfermeiro podia fazer”. Conta-nos a peripécia da CCAÇ 423 que chegara de Lisboa com o destino de São João. Em vez de se ter utilizado um transporte marítimo para pôr a unidade em poucas horas no seu destino, alguém decidiu que deviam partir de Bissau e ir até Bafatá, descer por Fulacunda e Nova Sintra até São João. Foi bico de obra a remover obstáculos nas picadas e já com o quartel de Nova Sintra à vista sofreram uma grande emboscada. Lá seguiram para Tite, depois Enxudé e finalmente São João, que saga. Mas fica-se a perceber como logo no início da guerra muitos itinerários se tornavam progressivamente mais perigosos.

O coronel Monteiro da Graça não deixa de referir o verdadeiro calvário que era percorrer aquelas bolanhas para chegar aos objetivos próximos do Rio Geba. Fazer operações na península de Gampará era igualmente um tormento, do outro lado do Corubal agentes do PAIGC já cultivavam na Ponta do Inglês, na Ponta Luís Dias em Mangai, Mina e Fiofioli. Bem curioso é o que ele nos relata da Operação Crato que se realizou em 18 e 19 de julho de 1964, envolvia a unidade de São João, dois destacamentos de fuzileiros desembarcados em Jabadá, a companhia de Fulacunda e dois pelotões da 677. Saíram do Enxudé, embarque no meio de uma enxurrada de lama, são embarcados em duas LDM, amarinharam por meio de cordas em plena escuridão para o contratorpedeiro Voga, tornearam a ilha de Bolama, entrou-se no Rio Grande de Buba e a progressão começou na península de Buduco, em direção ao norte. Descobrem um acampamento, recentemente abandonado, e ainda com a comida ao lume. Começou a chover torrencialmente e deram de caras com uma patrulha inimiga. Tudo acabou bem. Ficamos igualmente a saber que o PAIGC flagela quando pode a Ponta de Jabadá.

Destaca atos de heroísmo dos seus militares, dois deles foram condecorados com a Medalha de Valor Militar. O controlo do terreno era dificílimo. “A função de intervenção era só teórica, pois as minhas tropas faziam as operações de intervenção e depois de chegarem faziam também as outras atividades. O meu pessoal pouco tempo depois da chegada, três meses, estava quase inoperacional”. Impraticável qualquer tipo de controlo, o terreno não permitia qualquer permanência, e o PAIGC já flagelava com morteiros e bazucas. Havia as marés que obrigavam embarques e desembarques com imensas dificuldades, por vezes Monteiro da Graça tece comentários cáusticos à Marinha.

Em 3 de agosto desse mesmo ano de 1964 três companhias voltam à península de Gampará, na junção dos rios Geba e Corubal. “Acontece que a noite estava de tempestade. Na margem norte do Geba, existia frente à península o quartel de Porto Gole, que não fora avisado da operação. Com a tempestade, as duas LDM foram atiradas para a praia junto ao quartel que começou a atirar morteiradas contra o possível inimigo, nós, neste caso. O segredo da Operação foi-se. No dia seguinte, nem inimigo nem população estavam nos acampamentos e nas tabancas, pouco mais restante do que destruir os seus quartéis”. Queixa-se da falta de instrução da tropa, desde o uso de armas até às granadas. Viveu uma guerra pobrezinha, experimentou a recusa no fornecimento de granadas, a falta de material, e conta uma história de uma operação em que partir às quatro da manhã e às três da tarde antes o comandante do batalhão informa-o de que teria de emprestar para uma outra operação os três morteiros de 60 mm. Surpreendido com a notícia, achou por bem sugerir que se devia suspender a Operação, o comandante recusou-se a tal cancelamento. Veio um avião a Fulacunda e trouxe um morteiro, já ganhara a perceção de que o PAIGC começava a ter mais e melhor armamento.

Tem muitas recordações avulsas, sente-se nesta escrita a densa camaradagem que se estabeleceu e terá sido interrompida quando a litíase renal o obrigou a um tratamento mais sério. Mas esta CCAÇ 677 ficou-lhe no coração, jamais esqueceu todos aqueles lodaçais que encontrou no Sul. Um relato tocante que justificou a releitura de um lugar pouco aflorado na literatura da guerra da Guiné.
Coronel de Cavalaria António Luís Monteiro da Graça (1925-2014)
Companhia de Cavalaria 677, Tite e São João, 1964-1966
Ruínas do antigo quartel português em Tite. Fotografia de Alfredo Cunha, jornal Expresso, com a devida vénia
Porta de armas do quartel de Tite, 1964. Fotografia do blogue
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Nota do editor

Último poste da série de 3 DE MAIO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22167: Notas de leitura (1354): "Nos Meandros da Guerra, O Estado Novo e África do Sul na defesa da Guiné", por José Matos e Luís Barroso; Caleidoscópio, 2020 (2) (Mário Beja Santos)

terça-feira, 20 de outubro de 2020

Guiné 61/74 - P21469: Notas de leitura (1316): "O Cântico das Costureiras", de Gonçalo Inocentes (Matheos) - V (e última) parte (Luís Graça): Em Brá, no final da comissão, tem como companheiro de quarto o furriel mil 'comando' Vassalo Miranda, uma 'figura ímpar', grande autor de banda desenhada da nossa guerra


Guiné > Bissau > Brá > 1965 > Fur mil at cav Gonçalo Inocentes, de rendição individual, tendo passado pela CCAÇ 423  (São João e Jabadá) e pela CCAV 488 (Bissau e Jumbembem), entre 1964 e 1965. Fez 16 meses de comissão. Foi em Brá que conheceu o Vassalo Miranda, quando ambos aguardavam o regresso à Metrópole.

Foto (e legenda): © Gonçalo Inocentes (20w0) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. Quinto e último apontamento decorrente da leitura  do  livro do Gonçalo Inocentes (Matheos), "O Cântico das Costureiras: crónicas de uma vida adiada, Guiné, 1964/65" (Vila Franca de Xira, ModoCromia, 2020, 126 pp, ilustrado).(*)

De rendição individual,  o fur mil Gonçalo Inocentes juntou-se à CCAÇ 423, em 8 de abril de 1964. Um ano depois acaba a comissão dos "velhinhos". É com consternação que o autor vive esse dia, 14 de abril de 1965. Vê-os partir, por via terrestre, a caminho de Tite, sede do batalhão. 

É então  colocado na CCAV 677, "uma companhia completamente destroçada" (p. 100)... Destroçada, leia-se desmoralizada, em fim de comissão:

"Sem capitão, apenas com um alferes que, quando ouvia  o cantar do morse, se refugiava no quarto e era eu quem tinha de tomar as  decisões e escalar quem ia para o mato, respondendo aos rádios em nome do oficial" (p. 100)...

Mas logo dias depois, no 1.º de maio, passa a integrar a CCav 488 [Bissau e Jumbembem, 1963/65]. Mas por pouco tempo.  Quando estes  cumpriram o tempo, o nosso camarada, nascido em Angola,  Nova Lisboa (, hoje, Huambo)  já tinha mais de 16 meses, pelo que acabou por regressar com eles sem ter cumprido os dois anos de comissão, como era normal na altura.

Foi um tempo de transição, em que se ouvia cantar a "costureirinha" mas também já o temível morteiro 82 (, de maior alcance que o nosso 81), e o PAIGC começou a fazer uso generalizado de minas e armadilhas. 

Foi na Guiné que o autor aprendeu a montar e a desmontar a G3 e trocou, pela primeira vez, o capacete de aço (!) pelo boné... Era ainda, quando chegou, o tempo do caqui amarelo, e do Alouette II, a que ele dedica um belo poema (p. 91):

O Heli

Libelinha mágica, de voo pairante,
A nossa última esperança.
Aquele voar batejante,
Alegria de ouvir ao longe
Que um grito logo soltava
Em unísseno quando o víamos.
Tá ali! (...)

Libelinha levava em gemidos
À ilharga nossos amigos. 


É nesse período de espera, instalado em Brá, que conhece uma "figura ímpar", o furriel 'comando', Vassalo Miranda, seu companheiro de quarto [, foto à direita, da sua página no Facebook]:

"Originário de Vila Franca de Xira, o Miranda saiu da sua companhia quando lá chegou, voluntário para os comandos. Tinha muitas particularidades interessantes que faziam de dele um ser ímpar" (p. 107).

E particulariza: 

"Tipo muito alto, cabelo despenteado, usava óculos. Desenhava primorosamente tipo BD e sempre em cenários de guerra. O lençol que o cobria na cama, estava todo desenhado [com cenas] de combates onde ele era sempre o herói. Inclui nas cenas as imagens das namoradas dos colegas retiradas das fotos que alguns tinham nas mesas de cabeceira. Chegou a dar chapada"...

Vale a pena transcrever o resto da pág. 107:

"Quando o conheci tinha uma das lentes dos óculos pintada com tinta da china negra o que lhe dava uma aspecto tenebroso e que ele adorava.

"Contou-me que esteve castigado e proibido de pegar em armas porque na instrução dos  novos comandos o fazia com balas reais e feriu um instruendo nas costas.

"Tinha terminado a comissão e também iria embarcar no Niassa connosco [, CCAV 488]. Contou-me que quando foi de férias a casa, não avisou a família e apareceu à porta com a lente negra.  Quando a mãe abriu a porta, ele soltou o grito de ataque... A senhora desmaiou." (...)

Temos sete referências no nosso blogue ao Vassalo Miranda e a seguinte nota biográfica:


 (...) "O [António M.] Vassalo Miranda, nascido em Vila Franca de Xira, em 1941,  foi furriel mil 'comando', do Gr Comandos Panteras, participou na Op Tridente, é um veterano da Guiné, c. 1963/65. Passou também por Angola. Como civil, viveu algum tempo em Moçambique, na Rodésia (hoje Zimbábué) e na República Sul-Africana. É amigo do Virgínio Briote, do João Parreira, do Mário Dias... E é grande criador de banda desenhada infelizmente com problemas de saúde ocular. Infelizmente, também, não faz (ainda) parte da nossa Tabanca Grande." (**)

[Foto à esquerda: Lisboa, Belém, 10 de Junho de 2006 > 13º Encontro Nacional de Combatentes >  O Vassalo Miranda,  veterano dos velhos comandos de Brá.  

Foto (e legenda): © Luís Graça (2006). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Chega, por fim, o grande dia, o regresso do Niassa ao Tejo, em 14 de agosto de 1965... Com a companhia a marchar, mal, sob o comando de um alf mil médico que não sabia marchar, o dr. José Hipólito Sousa Franco, o médico da companhia (O que será feito dele?)... 

Aproveitou a peluda para revisitar as noites do fado na "Viela"... e dez anos depois tomou o avião para regressar a casa, à sua Angola. Aqui exerceu durante alguns anos a profissão de Regente Agrícola, antes de se meter noutras aventuras...

Enfim, um livrinho de memórias, em verso e prosa, que se lê num ápice, com agrado. E tem algum interesse documental, pelo seu recheio fotográfico.
___________

Notas do editor:

(*) Vd. postes anteriores da série:

7 de outubro de 2020 > Guiné 61/74 - P21426: Notas de leitura (1313): "O Cântico das Costureiras", de Gonçalo Inocentes (Matheos) - Parte IV (Luís Graça): as primeiras minas e fornilhos A/C

22 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21383: Notas de leitura (1309): "O Cântico das Costureiras", de Gonçalo Inocentes (Matheos) - Parte III (Luís Graça): a conquista da Ponta de Jabadá, em 29/1/1965, importante posição na defesa do rio Geba

10 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21344: Notas de leitura (1305): "O Cântico das Costureiras", de Gonçalo Inocentes (Matheos) - Parte II (Luís Graça): a importância de se ter uma máquina fotográfica e um bloco de notas

9 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21339: Notas de leitura (1303): "O Cântico das Costureiras", de Gonçalo Inocentes (Matheos) - Parte I (Luís Graça): voltar a ouvir a máquina "Singer" da mamã nas matas e bolanas de Quínara,,,

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Guiné 63/74 - P15080: Tabanca Grande (472): José Matos, investigador independente em história militar, filho do nosso falecido camarada José Matos, fur mil da CCAV 677 (Fulacunda, São João e TIte, 1964/66)... Novo grã-tabanqueiro nº 701

1. Mensagem enviada ontem ao José Matos, na sequência do poste  P15077 (*) 

José:  Convite aceite? Posso por o seu nome na coluna do lado esquerdo do blogue, na lista alfabética, de A a Z,  dos "amigos e camaradas" da Guiné?

Vamos naturalmente publicar, mais à frente, o outro artigo, que escreveu em coautoria com o nosso conhecido Matt [Matthew] Hurley, A arma que mudou a guerra", e que também saiu na Revista NMilitar, nº 2553,outubro de 2014, pp. 893-907 (2014).

Sou contemporâneo da Op Mar Verde, em 22/11/1970... Vi os comandos africanos chegarem ao Xime e a Bambadinca, depois do regresso de Conacri... Começámos a dar conta do risco sério de escalada da guerra (Strela, MiG, blindados...). Regressei em março de 1971... Mas 4 dias depois da invasão de Conacri apanhei uma brutal emboscada, com cubanos a enquadrarem a guerrilha... Tivemos 6 mortos e 9 feridos graves, na Op Abencerragem Candente... Isto, em pleno coração da Guiné...

Boa noite para si.. (ou para ti, que na Tabanca Grande, tratamo-nos todos por tu, os camaradas... e os filhos dos camaradas)...

Abração.
Luís


2. Resposta pronta do José Matos, que passa a ser o grã-tabanqueiro nº 701:

Ok,  Luís.

Sim, podes meter o meu nome na coluna da esquerda... não há problema... Tenho feito muita investigação à volta da Guiné e mais novidades vão surgir na RM  [Revista Militar]. no futuro...
Já tenho um outro artigo alinhado sobre o início da guerra na Guiné, que vai sair no futuro e estou agora a trabalhar numa coisa sobre o fim da guerra muito interessante, com o seguinte título: "O fim da guerra na Guiné: dúvidas e factos."

Portanto, à medida que for publicando tenho todo o gosto que o blogue divulge...

Não estou a pensar escrever nada sobre a [Operação]  Mar Verde, porque o [Luís] Marinho já escreveu muita coisa naquele livro de 2005 sobre o tema, portanto é um assunto já explorado... e o meu objectivo é trazer coisas novas à luz dia e não falar de coisas que outros já falaram...

Mas vamos falando... Olha, só uma pequena correcção o meu pai morreu em 1987 e não em 98, morreu novo tinha 45 anos, deu-lhe um AVC que foi fatal... Ele tem dois álbuns de fotos engraçadas da Guiné, e eu arranjei material sobre o Batalhão dele, mas é um tema muito específico, não está nos meus planos publicar nada... agora poderei partilhar algumas fotos, quando calhar...

Abração
José Matos



3.  Sobre o José [Augusto] Matos:

(i)é filho de um camarada nosso, José Matos,  ex-fur mil,  CCAV 677, Fulacunda, S. João e Tite, 1964/66), já falecido em 1987, aos 45 anos;

(ii) vive na região de Aveiro;:

(iii) e investigador independente em história militar, tem feito investigação sobre as operações da Força Aérea na Guerra Colonial, principalmente na Guiné;

(iv) é colaborador da revista Mais Alto, da Força Aérea Portuguesa, e tem publicado também o seu trabalho em revistas europeias, em França, Inglaterra e Itália.

Da CCAV 677, camarada do pai do José Matos, temos, na Tabanca Grande, o António Correia Rodrigues, também fur mil

A CCAV 677, mobilizada pelo RC 7 (Lisboa),  embarcou  em 8/5/1964, chegou a Bissau em 13/5/1964 e regressou à metrópole em 26/4/1966. Foi colocada em Tite com a função de intervenção e reserva do BCAÇ 599 em 14/5/1964, com um pelotão destacado em Fulacunda.

Realizou operações nas regiões de Jufá, Bária, Budugo, Gamol, Jabadá e Brandão, e destacou pelotões para reforço das guarnições de Jabadá e Enxudé. Assumiu, em 24/4/1965, a responsabilidade do subsetor de S. João. Voltou a Tite em 6/4/1966, seguindo para Bissau para efetuar o regresso. Há um livro escrito, com histórias da companhia, da autoria do então capitão António Luís Monteiro da Graça.

O Cap Cav Pato Anselmo foi outro dos comandantes da companhia, segundo informação do nosso camarada Santos Oliveira, contemporâneo do José Matos (pai).
____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 6 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15077: FAP (84): a ameaça dos MiG na guerra da Guiné (José Matos, Revista Militar, nº 2559, abril de 2015) - Parte I

domingo, 6 de setembro de 2015

Guiné 63/74 - P15077: FAP (84): a ameaça dos MiG na guerra da Guiné (José Matos, Revista Militar, nº 2559, abril de 2015) - Parte I





"A Empresa da Revista Militar foi fundada no dia 1 de Dezembro de 1848 por um grupo de 26 Oficiais do Exército e da Armada, dirigido pelo então Tenente do Real Corpo de Engenheiros Fontes Pereira de Mello [1819-1887].

"A Revista Militar - com o primeiro número publicado em Janeiro de 1849 - foi um dos primeiros títulos da imprensa militar portuguesa, sendo actualmente o mais antigo Órgão da Imprensa Militar Mundial com publicação ininterrupta.

"Os estudiosos do seu acervo confrontam-se com a influência exercida pelos Fundadores e por grande parte dos colaboradores da Revista na dinamização das Forças Armadas, e do próprio País, desde 1 de Dezembro de 1848, quando se assinou o Contrato.

"O século em que vivemos tende, sem dúvida,
a consomar o grande pensamento humanitário,
que tem por base o predomínio da inteligência
sobre a força".

"(Tenente Fontes Pereira de Mello, Introdução, do Primeiro Número, Janeiro 1849)"

(Reprodução,. com a devia vénia, da página da Revista Militar, que está "on line" desde 17/2/2013)


1. O José Matos mandou-nos há dias (a 25 de agosto último), este seu artigo ("A ameaça dos MiG na guerra da Guiné"), para divulgação no blogue. 

Agradeci-lhe e dei-lhe os parabéns, dizendo.lhe que tinha "muito gosto em publicar o artigo no nosso blogue, em dois ou mais postes, já que é extenso", mas que precisava também da "autorização do editor (, a Revista Militar)"... Embora o artigo esteja "on line" na Net, insistismos na questão da autorização do editor. O autor respondeu-nos em 4 do corrente: "Olá, Luís. Pode avançar com a publicação do artigo....esta foi a reposta da RM: Não há qualquer problema desde que seja citada a fonte de onde é extraído o artigo, no caso em apreço a Revista Militar nº 2559 de abril de 2015, pp 327-352."

O José Matos é filho de um camarada nosso, o ex-fur mil José Matos, da CCav 677 (São João, 1964/66), já falecido em 1998. Em tempos (23/11/2008) publicamos um poste dele, em que procurava camaradas do tempo do seu pai. O nosso camarada Santos Oliveira respondeu-lhe e pô-lo em contacto com camaradas do seu pai. É sabido que muitos camaradas desse tempo não vão à Net nem conhecem o nosso blogue. De qualquer modo, espero que o José Matos, que mora na região de Aveiro,  tenha encontrado alguns camaradas que conheceram o seu pai. Investigador, especialista em aviação militar, o José Matos já nos tem mandado mais artigos ou links para artigo seus .  Recordo, por um exemplo, um anterior sobre o Mirage, em 16/10/2012:

 Caro Luis Graça: Como o tema dos Mirage na FAP já foi debatido uma vez no vosso blogue, aproveito para chamar a atenção que a revista inglesa Aviation Classics publicou este mês um artigo da minha autoria sobre o tema [vd. links aqui], que aconselho a quem se interessa pelo assunto. Julgo que a revista se vende em Portugal.  

 Vamos publicar o artigo, em português, sobre os MiG, em quatro postes, seguidos. E aproveitamos para convidar, formalmente, o José Matos a integrar a nossa Tabanca Grande. Ele sabe que os filhos dos nossos camaradas nossos filhos são.  Por outro lado, tem fotos do seu pai, no TO da Guiné, que ele gostaria de partilhar connosco. A melhor maneira de honrarmos a memória do seu pai, é pedir-lhe que se sente, connosco, à sombra nosso mágico, fraterno, inspirador e protetor  poilão. Se ele aceitar o nosso convite, será o grã-tabanqueiro nº 701.


2. Revista Militar, nº 2559, abril de 2015, pp. 327-352 > A ameaça dos MIG na guerra da Guiné, por José Matos (Parte I)

por José Matos


No dia 26 de Julho de 1963, um caça português F-86F Sabre destacado na Guiné fazia um voo de teste na região do rio Corubal. A bordo do aparelho, o piloto esperava um voo calmo e sem incidentes, contudo, tem um encontro imprevisto. Enquanto testa o Sabre, avista à distância um jacto desconhecido e, quando muda de rota para tentar verificar a identidade do avião, este foge rapidamente, não permitindo a sua identificação. A única coisa que consegue perceber é que se trata, provavelmente, de um MiG ao serviço da Força Aérea Guineana (FAG) [1].

Este primeiro contacto com um caça guineano é muito raro, ao longo da guerra, embora o comando militar em Bissau receba, com frequência, das tropas terrestres, relatos sobre o avistamento de aeronaves não identificadas. Contudo, convém referir a este propósito, que estes relatos eram baseados em observações visuais feitas pelas forças terrestres, que nem sempre conseguiam identificar correctamente o que viam no céu, sendo difícil saber se os relatos correspondiam efectivamente a voos hostis.

Era sobretudo no sector oeste da colónia que se registava o maior número de avistamentos, o que leva o Exército a deslocar, para Mansoa, em Agosto de 1963, um radar móvel nº 4 Mark VI, que já estava na Guiné nessa altura. Trata-se de um radar de aviso prévio montado num atrelado e que pode facilmente ser deslocado. Durante cerca de um mês de funcionamento detecta oito alvos não identificados, todos a baixa altitude e a baixa velocidade, tratando-se muito provavelmente de helicópteros, sendo, no entanto, difícil de determinar qual a origem dos mesmos [2].

Atento à situação, o Exército já tinha enviado para a capital da Guiné, em Janeiro de 1962, um pelotão de artilharia antiaérea (AA) equipado com peças AA 40 mm Bofors M-42/60, de forma a garantir uma defesa antiaérea mínima contra qualquer acção aérea hostil [3]. Este envio de peças antiaéreas para Bissau, indicava já uma preocupação das chefias militares quanto a uma eventual acção aérea contra as forças portuguesas estacionadas na capital, que só podia ser protagonizada pela aviação militar dos países vizinhos.


Os testes com o radar AN/TPS-1D

Além do envio de armamento AA, o Exército estuda também a expedição de radares AN/TPS-1D, um radar ligeiro transportável, que o Exército Português tinha comprado, em 1960, mas que já estava obsoleto, nessa altura [4].

Nesse sentido, são feitos testes de detecção, na Escola Militar de Electromecânica, em Paço de Arcos, em meados de Maio de 1962, com vista a “avaliar as possibilidades de detecção do radar com aviões de pequena superfície reflectora”. Para o efeito, são usadas duas parelhas de jactos F-86F da base de Monte Real (BA 5), voando uma parelha à altitude de 20 mil pés e a outra a 5 mil pés. Conclui-se então que o radar “é susceptível de permitir a detecção de alvos aéreos de pequena superfície reflectora (parelha de aviões F-86F ou alvo equivalente) embora não garanta a continuidade de detecção quando se afasta, segundo uma linha de rumo que intercepta a estação de radar, dentro dos alcances das experiências (até 100 milhas)”.

Além disso, o AN/TPS-1D é também “capaz de fornecer resultados satisfatórios na detecção de aviões convencionais (de hélice) de média ou grande envergadura dentro dos seus alcances de operação (até 160 milhas).” Em suma, “na falta de equipamento mais adequado, os radares podem ser de grande utilidade no Ultramar para efeitos de vigilância aérea” [5].

Entretanto, no âmbito do Secretariado Geral da Defesa Nacional (SGDN), é dada prioridade ao estudo da defesa área de Cabo Verde e Guiné, em virtude do perigo que pode advir de possíveis ataques aéreos contra os aeródromos destes dois territórios, fundamentais nas ligações aéreas entre Portugal, Angola e Moçambique. Este trabalho é produzido por uma comissão que já existia no SGDN para o estudo da defesa aérea do Ultramar [6].

Em termos gerais, a comissão do SGDN considera que o Aerodrómo Base nº 2 (AB2), em Bissalanca, deve ser dotado de várias estruturas de controlo e comunicações para a gestão do tráfego aéreo civil, mas também para operar um sistema de artilharia antiaérea que seja credível. O estudo considera ainda que as estruturas a criar devem ser apoiadas por radares de vigilância do tipoAN/TPS-1D, além de radares tácticos ligados às baterias de artilharia AA e pelos respectivos meios de comunicação e apoio [7].

No entanto, o estudo aponta também várias limitações para a defesa aérea, que terá de incidir sobre um pequeno número de objectivos, não sendo possível aos F-86 conduzir intercepções por ausência de radares altimétricos. Além disso, “a vigilância exercida pelos radares de cobertura AN/TPS-1D não permitirá mais de 4 a 7 minutos de aviso prévio para aviões de jacto voando a 3000 pés e a artilharia AA disponível não poderá actuar em relação a aviões com velocidades superiores a 800 km/h e a altitudes acima de 2300 pés”.

O estudo refere também a existência no inventário da FAG de alguns caças MiG-15, não havendo qualquer referência à existência do MiG-17 na ex-colónia francesa. No entanto, neste capítulo, existia alguma dificuldade em obter informações fidedignas sobre a existência ou não de jactos de combate no país vizinho. Em Setembro de 1962, uma informação do Ministério do Ultramar português dava conta que, numa parada militar em Conakry, realizada a 19 de Agosto desse ano, tinham desfilado onze caçasMiG-15, embora não tivesse sido possível confirmar essa informação [8].


A retirada dos F-86 da Guiné


Obviamente que a presença dos F-86 na Guiné tinha um efeito dissuasor em relação a qualquer tentativa de incursão aérea. Estes caças tinham chegado a Bissalanca, em Agosto de 1961, e eram usados em vários tipos de missões sobre a colónia, sendo o principal avião de combate da Força Aérea Portuguesa (FAP) na Guiné. Porém, os caças tinham sido cedidos a Portugal para a defesa da OTAN na Europa e os Estados Unidos começam a exigir que os jactos regressem à metrópole [9].

O assunto vai-se arrastando ao longo de 1963, sem que o governo português acate as exigências norte-americanas. O próprio Ministro dos Negócios Estrangeiros português, Franco Nogueira, tem uma longa conversa, em Junho de 1964, com o embaixador americano em Lisboa, George Anderson, em que o problema é novamente abordado. Nogueira argumenta que os F-86 não estavam na Guiné em operações, mas que serviam apenas como factor dissuasor contra possíveis ataques aéreos vindos dos países vizinhos. Anderson concorda com o argumento, mas considera que não era de prever qualquer ataque aéreo estrangeiro e que, “no caso de tal ataque, criar-se-ia uma situação política nova que alterava os dados do problema, mesmo para os Estados Unidos”. Nogueira pergunta então se “Washington tomaria uma posição de activa reacção contrauma agressão aérea provinda de fora”, ao que o embaixador americano responde que “não podia prever como reagiria o seu Governo, e muito menos assumir compromissos”. Anderson insistiu que o problema dos F-86 na Guiné “se tratava de uma questão de princípio” e que era um tema muito explorado pelos inimigos de Portugal, ao que Nogueira comentou que deviam de existir muitos no Departamento de Estado, “porque todos pareciam aferir a política dos Estados Unidos para com Portugal pelo que sucedesse aos F-86” [10].

Pouco tempo depois deste encontro, a pressão americana aumenta, de tal forma, ao ponto dos americanos se recusarem a fornecer sobresselentes para a Força Aérea, caso os portugueses não retirem os caças da Guiné [11]. Para resolver o problema, Lisboa manda retirar os F-86 e compra, na Alemanha, 40 aviões Fiat G-91 R/4 fabricados em Itália, mas ao serviço da Luftwaffe. No Verão de 1966, os G-91 já estão na Guiné em missões de reconhecimento e de apoio às tropas terrestres, mas nunca encontram qualquer jacto da FAG.

Ainda em 1964, são enviados para Bissalanca dois radares AN/TPS-1D para assegurar a vigilância aérea desta base, no entanto, em virtude da dificuldade na obtenção de peças sobressalentes, um dos radares é logo canibalizado para a manutenção do outro, ficando apenas um radar operacional [12]. Com a antena instalada numa torre metálica com cerca de 32 metros de altura, o AN/TPS-1D, porém, nem sempre funciona, devido a problemas de manutenção ou então devido a falta de energia nos geradores de apoio. Para colmatar estes problemas, são enviados outros dois radares do mesmo modelo para a Guiné, mas também acabam canibalizados ou então avariados [13].

Durante os períodos de funcionamento, o AN/TPS-1D faz várias detecções, mas que correspondem provavelmente a aviões civis transitando entre o Senegal e a Guiné-Conakry. O espaço aéreo da Guiné Bissau, acima dos 5 mil pés estava englobado na FIR [14] de Dakar e havia mesmo um corredor aéreo apoiado no VOR [15] de Bissau que vinha de Banjul, na Gambia, e passava à vertical da BA12. Não admira, por isso, que o radar detectasse alguns alvos.


A surpresa dos MiG
O MiG 17 - Cortesia de Wikipedia... [Edição: LG]


Como já foi dito, os Fiat de Bissalanca nunca encontram qualquer caça guineano, mas, em Abril de 1968, dois aviões ligeiros de ataque T-6G Texan são surpreendidos aparentemente por dois caças MiG, a poucos quilómetros de distância da fronteira com a Guiné-Conakry. O incidente ocorre no dia 24 de Abril, quando os T-6 voavam numa missão de escolta a uma coluna do Exército no corredor de Guileje, muito perto da fronteira guineana. Aos comandos dos T-6 iam o Tenente Arantes de Oliveira e o Alferes Oliveira Couto, e o voo decorria sem incidentes quando, subitamente, os dois aviões são surpreendidos pela passagem rápida de dois caças a jacto. Incrédulos, os pilotos observam os dois jactos de asas em flecha, a curvarem, para fazerem uma segunda passagem.

Um dos caças ascende ficando numa posição de ataque, enquanto o segundo passa novamente perto dos aviões portugueses de forma provocatória destabilizando os T-6 devido à deslocação de ar. Os portugueses não reagem e, após mais uma ou duas daquelas manobras, os caças desaparecem no horizonte. Os pilotos julgam inicialmente que foram surpreendidos por dois Fiat vindos de Bissalanca da BA12 e, quando finalmente aterram em Bissalanca participam a ocorrência ao comandante do Grupo Operacional da BA12, o Tenente-coronel Costa Gomes, porém, ao fazerem a descrição do que se passou, Costa Gomes diz-lhes que estão equivocados, pois nenhum G-91 tinha descolado naquele dia. Os dois pilotos percebem então que foram surpreendidos por dois MiG [16].


Medidas de defesa

Em Março de 1969, o Chefe de Estado-Maior da Força Aérea (CEMFA) solicita à “BA12 um estudo urgente das medidas de protecção das aeronaves estacionadas contra eventuais ataques do exterior”, devendo o estudo ter em grande atenção a possibilidade da dispersão dos aviões, pois, em Bissalanca, estavam sempre demasiado juntos, devido ao elevado número de aviões estacionados na base. A preocupação do Estado-Maior da Força Aérea (EMFA) assentava no facto de surgirem, com alguma frequência, notícias sobre a possibilidade da guerrilha guineense ter meios aéreos e alguns pilotos para usar contras as forças portuguesas, nomeadamente contra Bissalanca [17].

Em resposta, o comando de Bissalanca refere que “as possibilidades de dispersão das aeronaves na BA12 são nulas, pois que as áreas consolidadas nem sequer são suficientes para todas as aeronaves existentes no arranjo normal do estacionamento” pedindo que, como primeira medida, sejam aumentadas as áreas de estacionamento. Refere ainda que “a execução dessa área de estacionamento deve ser, não como placa contínua, mas à base de placas para 1 ou 2 aviões, devidamente protegidos”.

Além destas medidas, os responsáveis da base preconizam ainda que, para protecção contra ataques aéreos do inimigo, deve ser montada “uma estação de radar mais adequada à detecção à distância”, além da aquisição de redes de camuflagem, do reforço dos meios de artilharia AA e a introdução de mísseis Sidewinder no Fiat, ou pelo menos, de um visor próprio para tiro ar-ar. Relativamente à ameaça aérea, o comando da BA12 considera que esta pode concretizar-se na forma de um avião isolado, partindo da República da Guiné (Boké ou Conakry) voando a baixa altitude, sendo provável que o ataque ocorra ao cair da tarde ou da noite [18].

Fiat G 91 R/4 , uma versão que equipaou a FAP na Guiné
durante a guerra colonial... Hoje peça de museu...
Cortesia de Wikipedia... [Edição: LG]
No seguimento deste estudo são enviados à Guiné quatro oficiais (dois da Força Aérea e dois do Exército) para, in loco, estudarem o problema da defesa aérea da colónia. Este grupo elabora depois um vasto relatório no âmbito do SGDN em que preconiza diversas medidas que, em linhas gerais, passam pela dispersão e protecção dos meios aéreos em abrigos ligeiros a construir; o reforço do serviço de incêndios da BA12 em pessoal e material; o provimento de material electrónico e de apoio para o bom funcionamento dos dois radares AN/TPS-1D, já instalados na base, e formação do pessoal especialista para operação destes equipamentos; a criação de um Centro de Aviso Aéreo (CAA) e de um Centro de Operações AA (COAA) e respectivas ligações telefónicas com os radares, torre de controlo e baterias AA; a efectivação do programa dos mísseis AIM-9B Sidewinder no G-91 e também uma eventual aquisição futura de mísseis antiaéreos ligeiros do tipo Redeye.

Em resposta a este estudo, o chefe da 3ª Repartição do Estado-Maior da Força Aérea (EMFA), Coronel António da Silva Cardoso, submete ao CEMFA a “Informação nº 104” em que descreve as medidas preconizadas pela referida comissão procurando depois definir quais as medidas exequíveis sem grandes custos para a Força Aérea e quais as que exigem encargos vultosos. Silva Cardoso considera que o fornecimento de alguns componentes electrónicos e de apoio ao bom funcionamento dos radares já está em curso, no entanto, a satisfação de outras necessidades implicará custos não suportáveis pelas verbas normais da Força Aérea, como é o caso da protecção dos meios aéreos, o reforço do serviço de incêndios em pessoal e material, a criação do CAA e do COAA e o reforço da ZACVG com o pessoal necessário à operação dos radares e COAA.

No mesmo documento, Silva Cardoso informa também o CEMFA sobre os testes realizados nas Oficinas Gerais de Material Aeronáutico (OGMA) para a instalação dos mísseis Sidewinder no Fiat e a mudança do visor de tiro usado pelo avião. “No que respeita ao visor, constatou-se ser possível equipar os G-91 com qualquer outro tipo diferente do que actualmente possuem”, procedendo-se à instalação de um visor giroscópico K-14 de origem americana. “Contudo, o material disponível apenas permitirá equipar 3 aviões e, por se tratar de material muito antigo, a aquisição de mais material não será fácil, mesmo através da USAF por intermédio do adido em Washington”, conclui Silva Cardoso.

Quanto à avaliação do AIM-9B no Fiat, nas condições tácticas previstas para o seu emprego na Guiné, os testes não conduziram a resultados satisfatórios. “Numa primeira fase dos testes de verificação de captação de radiação infravermelha produzida por aeronaves de motor convencional, constatou-se que o míssil não capta qualquer radiação quando apontado a aviões convencionais, monomotores ou bimotores, manobrando o avião nos sectores de cauda e entre o nível do mar e os 10 mil pés.

Paralelamente, a utilização dos G-91 em combate aéreo, equipados com Sidewinder, contra aviões do tipo MiG revela-se altamente duvidosa, porquanto as características de utilização do míssil estão em nítida desvantagem face às performances dos prováveis inimigos. Estas restrições de utilização dos Sidewinder contra aviões de maior performance assumem maiores dimensões se o combate aéreo se travar a baixas ou médias altitudes porquanto o míssil será inoperante. Daqui se deduz ser altamente duvidosa a utilização operacional dos G-91 equipados com Sidewinder” [19]. Em suma, Silva Cardoso desaconselha a utilização do AIM-9B no Fiat devido aos condicionalismos detectados nos testes.

(Continua)

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Notas do autor:


[1] PERINTREP n.º 9/63, de 4 de Agosto de 1963, Arquivo da Defesa Nacional (ADN) /F2/02/01/6.


[2] Perintrep n.º 13/63, de 25 de Setembro de 1963, ADN/F2/02/01/6.

[3] Processo P.2.103.1.5/62 do Chefe de Estado-Maior do Exército para o Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, 11 de Janeiro de 1962, Arquivo Histórico Militar AHM/FO/29/1/351/51.


[4] Estrato do Relatório da visita à Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné (ZACVG) do Chefe da Secção de Comunicações, Coronel Albuquerque e Castro, Serviço de Documentação da Força Aérea/Arquivo Histórico (SDFA/AH), 1ª Região Aérea, Cx. 102, Processo 430.201.


[5] Relatório das experiências com o radar AN/TPS-1D, realizadas na Escola Militar de Electromecânica, em Paço de Arcos, 20 de Julho de 1962, AHM/FO/29/1/351/51.


[6] Memorando da 3ª Repartição de Operações do Estado-Maior do Exército sobre a Defesa AA de Cabo Verde e Guiné, 18 de Outubro de 1962, AHM/FO/29/1/351/51.


[7] Estudo da Defesa Antiaérea de Cabo Verde e Guiné, 1963, AHM/FO/29/1/351/52.


[8] Informação n.º 283/62 da 1ª Repartição do Secretariado-Geral da Defesa Nacional, Lisboa, 12 de Outubro de 1962, ADN F2/92/306/1.


[9] Nota nº 94 do Chefe de Estado-Maior da Força Aérea para a Secretaria de Estado da Aeronáutica, 30 de Julho de 1963, SDFA/AH.


[10] Nogueira, Franco, Diálogos Interditos, Volume II, Editorial Intervenção, Braga, 1979, pp. 58-60.


[11] Matos, José, A saga do Sabre Mk.6, 1ª parte, Mais Alto nº 394, Novembro/Dezembro de 2011, pp. 37-38.


[12] Estrato do Relatório da visita à ZACVG do Chefe da Secção de Comunicações, Coronel Albuquerque e Castro, SDFA/AH, 1.ª Região Aérea, Cx. 102, Processo 430.201.


[13] Relatório da Secção de Radar da BA12, Bissalanca, 23 de Março de 1970, SDFA/AH, 1.ª Região Aérea, Cx. 102, Processo 430.201


[14] Flight Information Region.


[15] VHF Omnidirectional Radio Range.


[16] Informação fornecida ao autor pelo Alferes Oliveira Couto.


[17] Verbete n.º 1592/RB da 2ª Repartição do Secretariado-Geral da Defesa Nacional, Assunto: Defesa Aérea da Guiné, 16 de Junho de 1969, ADN, Fundo Geral SGDN 6861/3.


[18] Informação n.º 169 da 3ª Repartição do Estado-Maior da Força Aérea para o CEMFA, Assunto: Medidas para protecção de aeronaves da BA12, 26 de Setembro de 1969, SDFA/AH, 1.ª Região Aérea, Cx. 102, Processo 430-201.


[19] Informação n.º104 da 3ª Repartição do EMFA para o CEMFA, Assunto: Defesa Aérea da Guiné, 28 de Abril de 1970, SDFA/AH, 1ª Região Aérea, Cx. 64.

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domingo, 8 de junho de 2014

Guiné 63/74 - P13257: Tabanca Grande (438): António Correia Rodrigues, ex-Fur Mil Cav da CCAV 766 (Fulacunda, S. João e Tite, 1964/66)

1. Mensagem do nosso camarada e novo amigo, António Correia Rodrigues, (ex-Fur Mil Cav da CCAV 677, Fulacunda, S. João e Tite, 1964/66), com data de 5 de Junho de 2014:

Caro Luís Graça e camaradas da Guiné.
Desde há bastante tempo que tenciono fazer a inscrição na Tabanca Grande. Demorei tanto tempo que ocorreu no passado mês de Abril, dia 13, o 50º aniversário da nossa arriagem… a Bissau.
Digo arriagem porque o Uíge ficou ao largo! Já tive a oportunidade de interagir convosco para completar informação da companhia de cavalaria 677, da qual fiz parte.

Das muitas “estórias” e peripécias passadas ao longo de 2 anos menos 10 dias, permito-me contar a primeira.

Como atrás disse, o desembarque foi efectuado ao largo de Bissau e directamente para bordo de LDMs, que nos transportaram com destino ao Enxudé, para seguir em coluna auto para Tite.
Ainda traumatizados com a vista de Bissau, a cor das águas do Geba, a chaga da pedincha do preto que pedia “branco parte um peso…”, fomos praxados pelos veteranos com uma nota de boas vindas e recomendação contra os perigos eminentes em cada canto…

Foi-nos dito que teríamos de levar uma arma (G 3) e que para a levantar teríamos que entrar num espaço, algo mal iluminado, e mesmo à altura das nossas cabeças havia uma trave (propositadamente…) colocada à altura das nossas cabeças.
O resto da história, não tem piada porque é fácil de adivinhar!...

Assim começou a epopeia da Companhia de Cavalaria 677, que foi adstrita ao Batalhão 599.

Durante mais de um ano, fomos “premiados” com sucessivas operações em toda a zona. Tite, Fulacunda, Jabadá, S. João e outras que não são tão conhecidas.
Se me for proporcionado, terei gosto em relatar outras histórias e transcrever algumas passagens escritas em livro escrito, pelo então, capitão António Luís Monteiro da Graça, que me concedeu autorização para tal.

Abraço amigo para ti caro Luís Graça e todos aqueles que abrigam no mesmo poilão e um até breve.
António C. Rodrigues


2. Comentário do editor:

Caro camarada, e a partir de hoje, amigo tertuliano, António Rodrigues. Sê bem aparecido cá na Tabanca, onde te vais sentir entre iguais.
Pois é, só nós mesmos nos vamos entendendo nesta sociedade em que os mais velhos são pouco considerados, principalmente por quem nos tem governado, por quem nos governa e por quem nos há-de governar, porque somos causa de muita despesa e rendimento nulo. O nosso passado não conta, dando a ideia de que nunca fizemos nada na vida. Mas já fomos novos, responsáveis e até participamos numa guerra que não queríamos, numa terra que não conhecíamos.

Chegados aqui, resta-nos este espaço de convívio e repositório de memórias. Os vindouros hão-de saber que existimos e fizemos parte da História de Portugal. A nossa geração assistiu ao fim do Império, não sem antes dar o seu sangue e a sua vida.

Dizes tu: "Se me for proporcionado, terei gosto em relatar outras histórias e transcrever algumas passagens escritas em livro escrito, pelo então, capitão António Luís Monteiro da Graça, que me concedeu autorização para tal"
Desculpa, caro Rodrigues, mas não só te é proporcionado, como te é pedido. Quanto mais activos formos, mais histórias deixaremos para memória futura. Contamos contigo.

Como é hábito, ficamos por aqui para qualquer dúvida que tenhas.
Sempre que nos escreveres. manda as tuas mensagens e anexos para dois endereços, ou três, para teres a certeza de que alguém te vai ler. Se nos enviares fotos, não esqueças as respectivas legendas que devem identificar pelo menos os locais e os retratados. Se possível a data e a situação.
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Fica aqui um pouco da tua 677, um trabalho do nosso camarada José Martins:

CCAV 677 - Guiné 1964/66

Unidade Mobilizadora: Regimento de Cavalaria 7 – Lisboa

Embarque: 08MAI64
Desembarque: 13MAI64
Regresso: 26ABR66

É colocada em Tite com a função de intervenção e reserva do Batalhão de Caçadores 599 em 14Mai64, com um pelotão destacado em Fulacunda.

Realizou operações nas regiões de Jufá, Bária, Budugo, Gamol, Jabadá e Brandão, e destacou pelotões para reforço das guarnições de Jabadá e Enxudé.

Assumiu, em 24Abr65, a responsabilidade do subsector de S. João.
Voltou a Tite em 06Abr, seguindo para Bissau para efectuar o regresso.
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Posto isto, resta-me enviar-te, caro Rodrigues, um abraço de boas-vindas em nome dos editores e da tertúlia em geral.

Ao teu dispor o camarada e amigo
Carlos Vinhal
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Nota do editor

Último poste da série de 4 DE JUNHO DE 2014 > Guiné 63/74 - P13236: Tabanca Grande (437): Mais dados pessoais e o meu rodopío até chegar à CART 1659 - "ZORBA" (Joaquim Fernandes Alves)

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Guiné 63/74 - P11399: Notas de leitura (472): Vem Comigo à Guerra do Ultramar, pelo Coronel António Luís Monteiro da Graça (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 10 de Dezembro de 2012:

Queridos amigos,
Não, não é uma revelação literária que aqui vos trago, é um tocante quadro de memórias do então comandante da CCAV 677, que operou em Tite e arredores.
Trata-se de uma coletânea de recordações por vezes bem espirituosas, é uma prosa sincera de alguém que vem agradecer aos seus soldados o seu esforço e a elevada qualidade da camaradagem.
Temos aqui operações bem mal sucedidas, momentos de tristeza, relatos de desenrascanço e não falta a gargalhada hilariante. Acaba-se o relato e fica a saber a pouco, já se sabe que a sinceridade toca aos combatentes como fogo inextinguível.

Um abraço do
Mário


Vem comigo à guerra do Ultramar,
pelo coronel António Luís Monteiro da Graça

Beja Santos

O coronel António Luís Monteiro da Graça fez uma edição caseira das suas memórias referentes às suas quatro comissões, duas em Moçambique, uma na Guiné e outra em Angola. Dedica a edição à mulher e à CCAV 677 “por tudo o que sofremos juntos, na Guiné, evidenciando o valor de todos os seus elementos”.

O Coronel Monteiro da Graça que combateu na Guiné entre 1964 e 1966, no setor de Tite, proporciona-nos uma leitura absorvente pois escreve de modo faceto, traz recordações avulsas dos seus subordinados, tira partido das peripécias mais duras de modo positivo, é divertido e sobretudo guardou uma imagem de profunda humanidade dos seus soldados.

E explica porque é que dedica estes apontamentos à CCAV 677: foi ele que os formou, combateu a seu lado nas horas mais duras. “Logo que chegámos à Guiné, ficámos sem um pelotão, dos quatro que levávamos, por isso fomos reforçar Fulacunda. Dos três pelotões restantes, muito cedo ficámos na prática, reduzidos a dois: baixas por doença e ferimentos em combate. Tive a felicidade de comandar homens que iam suportando todas as contingências da guerra com grande espírito de sacrifício mas eivado de humor e boa disposição que se prolongaram até aos dias de hoje em que não faltam aos anuais almoços de confraternização. E o elogio é extensivo aos nativos que iam connosco e que sempre foram elementos de grande valor e lealdade, honrando os compromissos assumidos”. O batismo de fogo foi em 11 de Junho de 1964, foram flagelados enquanto atravessavam a bolanha entre Gamalã e Jabadá Beafada. Um apontador de morteiro feriu-se seriamente, o prato base saltou com a explosão, levou-lhe um pouco da rótula direita. Cheio de bonomia fala do médico da companhia, o Dr. Pereira: “Não tinha qualquer preparação física. Foi mobilizado, teve duas ou três semanas de instrução em Mafra e lá vai ele para o mato. Era bom técnico em princípio de vida e tinha uma tarefa espinhosa. Na primeira operação, um pouco puxada, o Dr. Pereira não aguentou. E dali não saía mesmo depois de algum descanso. Houve que fazer um desvio para evacuar o Dr. Daí nasceu uma guerra entre mim e o comandante. Este obrigava-me a levar o médico para as operações. Eu não o levava pois já tinha a experiência, chatices tinha eu que de sobra. E analisando bem que fazia lá o médico em caso de ferimento grave?”.

Em 20 de Junho, lá vão eles para nova operação, desembarcam em Gã-Chiquinho, não muito longe de Bissássema, era uma operação à base de Sancorlá, quando atacaram, já a base estava abandonada, destruíram cerca de 100 camas, caminharam depois em direção à tabanca de Dodoco, surpreenderam uma formação inimiga, houve troca de tiros. Depois, houve complicações na passagem de riachos, o que os salvou foi terem levado cordas de sapadores; e mal chegaram a terra firme foram flagelados. A partir daí, sentiram sempre a presença do inimigo. Penosamente, e graças ao apoio dos T6 fizeram o caminho até Jabadá.

É um comandante que reteve as picardias, os azares que acabaram em bem, as histórias hilariantes, as tais situações inacreditáveis que polvilham as guerras dentro da mata, caso da operação “Crato” realizada em 18 e 19 de Julho de 1964, envolveu várias companhias e destacamentos de fuzileiros, houve complicações com as marés e tiveram que recorrer aos botes de borracha dos fuzileiros para desembarcar na península de Buduco, descobriram um acampamento, recentemente abandonado, ainda com a comida ao lume, depois levaram com umas morteiradas, felizmente sem consequências, logo de seguida, chovia torrencialmente, deram caras com uma patrulha inimiga, reagiram e outros fugiram.

Chegou a hora das perdas, das perdas irreparáveis, o soldado José Zoio foi atingido por uma bala na cabeça, teve morte instantânea. Morreu também o Ferreira, que era corneteiro. Escreve com orgulho: “Propus-lhes as medalhas de Valor Militar, e foram-lhes concedidas”. As peripécias seguem-se umas às outras, metem abelhas, dificuldades de abastecimento, soldados a dançar o “vira do Minho”, uma miúda a chorar no meio de descampado que foi entregue aos cuidados de uma velhota, igualmente abandonada no mato pelos guerrilheiros e que disse conhecer os pais da miúda. Discreteia sobre tudo: o serviço religioso, a eterna falta de material e munições, o coronel Laranjeira que fazia o chá das 5 bebendo um Grão Vasco, explica-nos o que é o fanado e as etnias do setor de Tite (Balantas, Beafadas e Brames). E aproveita para nos falar do “Penalty”, soldado muito conhecido na Guiné, guarda-redes suplente do Sporting de Bissau. Foi uma operação e deram-no como morto. Quando ele soube da notícia foi queixar-se à 1ª Rep., temendo que a mãe tivesse um choque, exigiu que lhe dessem licença para vir a Lisboa. Apanhando-se em Lisboa, o Penalty nunca mais, corrécio como era, se lembrou que ainda pertencia à guerra da Guiné. Lá o aconselharam a ir bater à porta de um protetor, um médico que o deu como doente, um dia foi ao cais despedir-se de tropa que ia para a Guiné, meteu-se no barco e voltou à guerra.

O rol de peripécias conclui com uma história hilariante, a jiboia “empernadeira”, tal como ele escreve: “No quartel de Tite, na Guiné, havia quatro postos de sentinela, um em cada canto. Eram postos rentes ao solo, com cobertura em cibe, com bancos no interior e seteiras em toda a volta. Os quatro postos tinham um projetor com que quase permanentemente se inspecionava o arame farpado que envolvia o quartel reforçado por armadilhas. A rendição do pessoal de guarda era feita dentro do abrigo onde se alojavam seis praças e um cabo, comandante do posto. Certa noite o cabo não gostou que a praça, no banco onde dormiam, estivesse com a perna encostada à sua e lá o alertou pois não gostava de empernanços. O ambiente ficou trovado por causa da chamada de atenção e porque todos sentiam que havia qualquer coisa de estranho com as pernas a serem roçadas. Ao alvorecer, saíram todos aos gritos: era uma jiboia de cinco metros, meio adormecida, que se arrastara para dentro do abrigo e provocara toda aquela história de pernas encostadas. Aparecido o “500”, um soldado mandinga que estava sempre em tudo o que era sítio, de catana afiada cortou a cabeça à jiboia, vendendo mais tarde a pele por uma bela maquia”.

Esta edição caseira é de grande elevo e ternura. Devo esta agradável leitura do comandante da CCAV 677 à Teresa Almeida, da Biblioteca da Liga dos Combatentes, que anda sempre à cata destes tesouros que não circulam no comércio de livros, edições policopiadas, ingénuas, às vezes de um grafismo enviesado, mas em que subjaz um inquestionável dever de memória e uma incomensurável gratidão aos soldados.
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Nota do editor:

Último poste da série de 12 DE ABRIL DE 2013 > Guiné 63/74 - P11380: Notas de leitura (471): Honório Barreto, Português da Guiné, por Joaquim Duarte Silva e A. Teixeira da Mota (Mário Beja Santos)

terça-feira, 21 de abril de 2009

Guiné 63/74 - P4224: Convívios (116): Pessoal das CCAV 677 e 678, no dia 21 de Junho em Fátima (Santos Oliveira/Rodrigues)

1. Mensagem do nosso camarada e tertuliano Santos Oliveira, ainda em convalescença de um problema de saúde, com data de 18 de Abril de 2009:

Vinhal

O nosso querido Furriel Rodrigues, fez-me chegar este Mail, com o apelo de entreajuda e divulgação.
De acordo com as disponibilidades e na oportunidade...

Cá vou "esperando" a dispensa médica para voltar a ver as novidades do Blogue (que já não o serão, pelo menos desde o dia 30 do mês passado) .
Ontem, pelas circunstâncias que conheces, acabou, no final do dia, por ser difícil para mim.
Ainda não estou estabilizado, mas estou com boas esperanças.
... Mas correu tudo muito bem. Só não houve outro alguém que "botasse" faladura. Eu, nesse momento, estava meio bloqueado pela emoção, pelo que nem me atrevi a tal.
Os Camaradas tiraram fotos pelo que vais acabar por ver e saber como tudo se processou.

Abraços, do
Santos Oliveira


2. Mensagem do ex-Fur Mil Rodrigues para Santos Oliveira

Bom dia.

Meu caro Santos Oliveira.
Votos de boa saude.

Embora de relance, tenho visto algo do que tens escrito no blogue.
Tenho imensa pena que, neste momento, não tenha disponibilidade de tempo para poder participar com alguns testemunhos e vivencias.
Ficará para quando me aposentar... porque reformado sou há 7 anos.

Porque vamos ter o nosso encontro no dia 21 de Junho em Fátima, lembrei-me de te pedir se pode ser inserido, como noticia, a carta que segue como anexo, e se podem fazer divulgação. pode ser que apareça sempre algum que veja o blogue. Teremos gospo em receber toda a "malta que nos conheceu em Tite, S. João ou Fulacunda.

Sei que não é possivel, mas precisava de quem me ajudasse a abrir e ver 350 mails que tenho por abrir!...

Um forte abraço do amigo
Rodrigues


Encontro de 2009, das CCav 677 e 678, dia 21 de Junho em Fátima (*)

António Correia Rodrigues
tonicrodrigues@sapo.pt
Avenida Padre Júlio Fragata, 104
4710-413 BRAGA


Braga, 10 de Abril de 2009
Meu caro amigo e camarada das lides da Guiné.

Um forte abraço extensivo a todos os que te são queridos.

Apesar de termos marcado inicialmente o encontro para o dia 7 de Junho, andamos largos dias a tentar informações que poderíamos realizar o mesmo nesse dia. Começamos por ter indícios que nesse dia seriam realizadas as eleições para o Parlamento Europeu, noticia daqui noticia dali, e veio a confirmar-se aquilo que menos desejávamos. As eleições para o Parlamento Europeu, são mesmo a 7 de Junho.

Não fora saber que muitos dos nossos camaradas estão nesse dia, tal como eu, empenhados nas eleições quer como autarcas, quer como elementos das assembleias de voto, e talvez mantivéssemos a data. No entanto, pretendendo que estejam presentes o maior número de elementos da CCav 677/8 alteramos a data para o dia 21 de Junho em Fátima conforme previsto.

Embora fruto do acaso, ou talvez não, recentemente reparamos que neste ano de 2009, mais precisamente a 13 de Maio, faz 45 anos que chegamos à Guiné, e sem nos termos apercebido da coincidência, escolhemos Fátima para o nosso 17.º Encontro.

O Encontro começa com agrupamento, cerca das 10H45, ao fundo do recinto, junto da estátua do Papa João Paulo II.

Daí seguiremos para a participação na Eucaristia das 11 horas, em cuja celebração será referida a nossa presença.

Para os retardatários, haverá novo reagrupamento no final da Eucaristia e no mesmo sítio.

Partiremos para o restaurante D. Nuno Álvares Pereira
Estrada Minde 326
2495-300 FÁTIMA
Tel.: 249 539 041 que fica na estrada para Minde, a cerca de 6 km.

O valor estabelecido é de 25,00€ e comporta já um pequeno contributo para as despesas de organização.

A confirmação para este almoço deverá ser feita até ao dia 10 de Junho para qualquer dos contactos indicados nesta carta.

Porque foi uma boa experiência, quando fomos para Évora de autocarro, também, todos os do Norte, poderão beneficiar desta possibilidade que se traduz em mais economia, maior conforto e mais convívio.

O preço e locais de entrada serão indicados quando fizerem marcação. Terá a sua partida de Braga às 6,45 horas, passará pelo Porto para recolher quem lá pretender entrar, às 7H30.

Deves manifestar desejo de ir no autocarro o mais breve possível, para que possamos saber com o que contar.

Tal como no anterior encontro, não será ofertada qualquer lembrança, as coisas estão negras… Vamos fazer troca de prendas e como sempre, só tem prenda quem trouxer para trocar. O valor não deverá exceder os 2,50€.

Este convite é extensivo a todos os Camaradas da Companhia de Cavalaria 678, nossos convidados em encontros anteriores. Bem-vindos.

Contactos:
Rodrigues
Mail – tonicrodrigues@sapo.pt

Telemóvel 919 717 832
Trabalho 253 262 824
Telefones fixos:
Casa depois das 20 horas: 253 693 615

Manuel Fernandes (2001)
Telemóvel 917 634 474
Telefone casa 253 577 883

Restaurante D. Nuno
Telefone 249 539 040

MAPA DE LOCALIZAÇÃO


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Notas de CV:

(*) Vd. postes de:

1 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3551: Brasões, Guiões ou Crachás (4): CCAÇ 728; CCAÇ 2617; CCAÇ 3566; PEL CAÇ NAT 63; CCAV 677 e CCAÇ 2402 (José Martins)

25 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3516: Em busca de... (54): Companheiros da CCAV 677/BCAÇ 599 (Resultados) (Santos Oliveira)
e
23 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3504: Em busca de... (53): Companheiros da CCAV 677/BCAÇ 599, Guiné, 1964/66 (José Matos)

Vd. último poste da série de 20 de Abril de 200): Guiné 63/74 - P4219: Convívios (113): Pessoal da CCAÇ 3491, no dia 16 de Maio, em São Martinho de Antas, Sabrosa, Vila Real (Luís Dias)

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Guiné 63/74 - P3551: Brasões, Guiões ou Crachás (4): CCAÇ 728; CCAÇ 2617; CCAÇ 3566; PEL CAÇ NAT 63; CCAV 677 e CCAÇ 2402 (José Martins)

COMPANHIA DE CAÇADORES N.º 728

CCAÇ 728 - Guiné 1964/64 - Divisa: Os Palmeirins

Mobilizado no Regimento de Infantaria n.º 16 - Évora

Embarque em 08Out64
Desembarque em 14Out64

Regresso em 07Ago66

Divisa – Os Palmeirins

Faz uma curta estadia em Bissau, realizando a Instrução de Aperfeiçoamento Operacional em Nhacra.
Segue para Cachil (Ilha do Como) em 27Nov64, onde assume a responsabilidade do subsector.
Desloca-se em 22Set65 para Catió como unidade de intervenção e reserva do escalão superior ali estacionado.
Foi colocada em Bissau para colaborar na segurança e defesa das instalações e populações em 18Jun66, até à data do seu embarque.

É Companhia independente.
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COMPANHIA DE CAÇADORES N.º 2617

CCAÇ 2617 - Guiné 1969/71 - Divisa: Sempre Excelentes e Valorosos

Mobilizado no Batalhão de Caçadores n.º 10 - Chaves

Embarque em 15Nov69
Desembarque em 20Nov69

Regresso em 25Set71

Divisa – Sempre Excelentes e Valorosos

Em 02Dez69 assume a responsabilidade do subsector de Pirada, com um destacamento em Paunca.
Assume o subsector de Guileje em 24Mar70 até 07Fev71.
Em 23Fev71 segue para Quinhamel, destacando forças para Ponta Vicente da Mata, Ome e Ondame.
Segue para Bissau em 30Ago71, onde fica a aguardar embarque.

É uma subunidade orgânica do BCaç 2893
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COMPANHIA DE CAÇADORES N.º 3566

CCAÇ 3566 - Guiné 1972/74 - Divisa: Os Metralhas

Mobilizado no Batalhão de Caçadores n.º 10

Embarque e desembarque em 23Mar72

Regresso em 18Jun74

Divisa – Os Metralhas

De 27Mar72 a 22Abr72 realizou a Instrução de Aperfeiçoamento Operacional em Bolama, no CIM.
Assume a responsabilidade do subsector de Empada em 17Mai72.
Em Abr73 destaca dois pelotões para reforço de Catió, onde ficam até 23Jan74.
Desenvolve uma acção ofensiva na área de Ingoré em 19Out73, com bons resultados.
Regressa a Bissau em 14Jun74 para aguardar embarque.

É Companhia independente.
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PELOTÃO DE CAÇADORES NATIVOS N.º 53

PEL CAÇ NAT 53 - Guiné 1966/74 - Divisa: Continuaremos

Mobilizado no Comando Territorial Independente da Guiné

Criado em Setembro de 1966

Desactivado em Agosto de 1974

Divisa – Continuaremos

Colocado inicialmente no Xime, foi transferido, sucessivamente, para Bambadinca (Jan69), Canjambari (Abr69), Bambadinca (Jul69) e Saltinho (Set69), onde se manteve até ser extinto.

Pequena unidade da guarnição normal.
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COMPANHIA DE CAVALARIA N.º 677

CCAV 677 - Guiné 1964/66

Unidade Mobilizadora: Regimento de Cavalaria 7 – Lisboa

Embarque: 08Maio64
Desembarque: 13Mai64

Regresso: 26Abr66

É colocada em Tite com a função de intervenção e reserva do Batalhão de Caçadores 599 em 14Mai64, com um pelotão destacado em Fulacunda.

Realizou operações nas regiões de Jufá, Bária, Budugo, Gamol, Jabadá e Brandão, e destacou pelotões para reforço das guarnições de Jabadá e Enxudé.

Assumiu, em 24Abr65, a responsabilidade do subsector de S. João.

Voltou a Tite em 06Abr, seguindo para Bissau para efectuar o regresso.

Foto - Página Guerra Colonial, com a devida vénia
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COMPANHIA DE CAÇADORES N.º 2402

CCAÇ 2402 - Guiné 1968/70 Divisa: Se É Impossível Há-de Fazer-se

Mobilizado no Regimento de Infantaria n.º 1 - Amadora

Embarque em 24Jul68
Desembarque em 29Jul68

Regresso em 04Mai70

Divisa – Se é impossível, há-de fazer-se

Em 30Jul68 segue para e assume a responsabilidade do subsector.
A 19Mar69 inicia o deslocamento para Mansabá, para reforço do seu batalhão.
Assume a responsabilidade do subsector de Olossato a 10Abr69.
Transferida para Bissau em 25Abr70, colabora na segurança e protecção das instalaçõese população até ao embarque.

É uma subunidade orgânica do BCaç 2851.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 22 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3501: Brasões, guiões ou crachás (3): CAOP 1: BCAÇ 2885; CART 2732 e CCAÇ 5 (Jorge Picado/Carlos Vinhal/José Martins)