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segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Guiné 63/74 - P15607: Álbum fotográfico de Armando Costa, ex-fur mil mec auto, CCAV 3366 / BCAÇ 3846 (Susana, 1917/73): Parte I: A caminho de CTIG, de 3 a 9/4/1971, no navio "insular" Angra do Heroísmo, fretado nesse ano ao Exército para transporte de tropas


Foto nº 1 > Lisboa, Cais da Rocha Conde de Óbidos, 3/4/1971: um dia chuvoso...


Foto nº 2 > Lisboa, 3/4/1971> T/T Angra do Heroísmo e, ao fundo, na margem direita do Tejo, o Monumento dos Descobrimentos e o Mosteiro dos Jerónimos


Foto nº 3 > Lisboa, estuário do Tejo, 3/4/1971 > Largada do T/T Angra do Heroísmo, vendo-se ao fundo o Bugio onde, dizem, acaba o rio e começa o mar...


Foto nº 4 > T/T Angra do Heroísmo, 3/4/1971 > A caminho da Guiné... A proa do navio


Foto nº 5 > T/T Angra do Heroísmo, 3/4/1971 > Convés: ao centro o Capitão QEO Daniel António Nunes Pestana, cmdt da CCAV 3366


Foto nº 6 >  T/T Angra do Heroísmo, a caminho da Guiné, em viagem de 3 a 9/4/1971...



Foto nº 7 >  T/T Angra do Heroísmo, a caminho da Guiné; 3 a 9/4/1971... Mais aspeto da proa...


Foto nº 8 >  T/T Angra do Heroísmo, a caminho da Guiné; 3 a 9/4/1971... Eu num dos barcos salva-vidas


Foto nº 9 >  T/T Angra do Heroísmo, a caminho da Guiné; 3 a 9/4/1971... Uma cena insólita... Uma Berliet no convés do navio...

Fotos (e legendas): © Armando Costa (2016). Todos os direitos reservados. 

1. Início da publicação de fotos do álbum de um dos nossos mais recentes grã-tabanqueiros, o n.º 707,  o Armando Costa, de seu nome completo Armando Silva Alvoeiro da Costa (ex-fur mil mec auto,  CCAV 3366 / BCAV 3846, Susana, 1971/73) (*).

O Armando, que ainda não tinha paga a sua "jóia", mandou-nos um lote de fotos (49) "das que possuo da Guiné  (Bissau, Cumeré, Susana e Varela), do período de 1971 a 1973". Prometo mandar mais... Diz-nos que "a qualidade é a que se pode arranjar, resulta da digitalização de postais de fotos que tirei, Os negativos perdi-lhes o rasto"...

Ele partiu para a Guiné em 3 de março de 1971, em dia chuvoso, como se depreende, da foto n.º 1 (Lisboa, Cais da Rocha Conde de Óbidos). O mais insólito (ou talvez não...) foi ter ido num navio da carreira Lisboa-Madeira-Açores, o T/T Angra do Heroísmo. O navio devia ir a abarrotar (foto n.º 7), transportando homens e material de guerra (foto n.º 8)...

Além do pessoal do BCAV 3846, deve ter levado também o pessoal da Companhia Independente CCAV 3378 (Olossato, Brá).

O BCAV 3846, além da CCAC 3366 (Susana, Cumeré), era composta pelas CCAV 3364 (Ingoré, Cumeré) e CCAV 3365 (S. Domingos, Cumeré), A unidade mobilizadora foi o RC 3. O Comando e a CCS ficarm em Ingoré. Cmdt do batalhão: ten cor cav António Lobato de Oliveira Guimarães. O pessoal deste batalhão regressou a casa em 8/3/1973, exceto o da CCAV 3365 que embarcou mais tarde (17/3/1973).


O T/T Angra do Heroísmo. Cortesia do blogue  Dicionário de Navios Portugueses, de   Luís Miguel Correia (um especialista neste domínio)


2. Já agora ficamos a conhecer as características do T/T Angra do Heroísmo:

(i) navio de passageiros de 1 hélice;

(ii) construído em Hamburgo, Alemanha, em 1954/55;

 [, "baptizado com o nome de 'Israel', foi oferecido nesse mesmo ano ao estado judaico, como indemnização pelos prejuízos causados à comunidade hebraica entre 1933 e 1945 pelos nazis e integrado na frota da companhia Zim Israel Navigation, com sede em Haifa"; (...) "colocado na linha regular de Nova Iorque, o navio manteve esse serviço durante dez anos";  (...) "em 1959 foi abalroado por um cargueiro norte-americano e reparado no estaleiro naval de Brooklyn"... Vd. o blogue Alernavios]

(iii) registado no porto de  Lisboa, depois de comprado, em segunda mão,  pela Empresa Insulana de Navegação, SARL,  de Lisboa, para fazer a carreira Lisboa - Madeira - Açores;

(iv) ano de abate: 1974;

(v) comprimento ff 152,71m;

(vi) comprimento pp 138,34m;

(vii) boca 19,87m;

(viii) pontal 11,00m;

(ix) calado máximo 8,71m;

(x) capacidade de carga 4 porões com capacidade para 9019m3 de carga, incluindo 536m3 de carga frigorífica;

(xi) tonelagem 10.187 TAB, 6.230 TAL, 6.870 TPB, 13.900 T deslocamento;

(xii) aparelho propulsor um grupo de turbinas a vapor AEG, construídas em Berlim Ocidental, por Allgemeine Electric Gesellschft, 2 caldeiras;

(xiii) potência 11.500 shp a 119 r.p.m.;

(xiv) velocidade máxima 19 nós;

(xv) velocidade normal 18 nós;

(xvi) passageiros: alojamentos para 80 em primeira classe, 43 em turística A, 80 turística B e 120 em turística C, no total de 323 passageiros;

(xvii) tripulantes 139

Esta detalhada e preciosa informação é da Revista do Clube de Oficiais da Marinha Mercante Nov/Dez 96, reproduzida  no sítio Navios Mercantes Portugueses: frota existente em 1958

Durante o ano de 1971, para além da carreira para a Madeira e Açores, o Angra do Heroísmo fez diversas viagens Lisboa - Bissau, fretado ao Ministério do Exército, para transporte de tropas e material de guerra.

Em 14/10/1973 saiu de Lisboa na última viagem à Madeira e Açores, imobilizando no Mar da Palha após regresso ao Tejo em 25.10.1973. Em 4/2/1974 passou a pertencer à CTM - Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos, SARL, na sequência da fusão entre as empresas Insulana e Colonial.

Em 5/4/1974 foi vendido a sucateiros espanhóis e a 14 desse mesmo mês chegava a Castellon, a reboque, procedente de Lisboa, para ser desmantelado. Assim acabou mais um glorioso navio da nossa gloriosa marinha mercante. (Sobre a curiosa história deste navio, ver mais informações aqui).

PS - Temos aqui mais camaradas da CCAV 3366 / BCAV 3846 (Susana, 1971/73), nomeadamente o Luís Fonseca, ex-fur mil trms, e o Delfim Rodrigues, ex-1.º cabo aux enf.

sábado, 27 de outubro de 2012

Guiné 63/74 - P10580: Memória dos lugares (193): O inferno de São Domingos, em março de 1972, ao tempo da CCAV 3365 / BCAV 3846, Os Quixotes (Bernardino Parreira / Plácido Teixeira)








Guiné > Região do Cacheu > São Domingos > Meados de 1972 > CCAV 3365, Os Quixotes (Domingos,1971/1973) > Testemunhos do "inferno" que se viveu em São Domingos, em resultado de vários dias de ataques do PAIGC

Fotos : © Plácido Teixeira / Bernardino Parreira  (2012). Todos os direitos reservados



Bernardino Parreira
1. Mensagem do nosso camarada Bernardino Parreira, na sequência do poste P10525, de que lhe enviei uma cópia (*)


Data: 16 de Outubro de 2012 14:31

Assunto:  Guiné 63/74 - P10525: Um história do artilheiro de Gadamael, Vasco Pires (...) 

Caro amigo, Luís Graça

Aí envio essas fotografias de meados de 1972, que me foram facultadas pelo meu camarada e amigo Plácido Teixeira, que cumpriu toda a comissão em S. Domingos,[na CCAV 3365,]  desde Maio de 1971 a Março de 1973, e que ilustram bem o estado em que ficou o aquartelamento de S. Domingos após mais um ataque ao quartel que durou alguns dias. 

Conforme consta num relato efectuado pelo meu camarada e amigo Plácido Teixeira, que já vos facultei, em que o mesmo manifestava agradecimento ao General Spinola pela visita que fez àquele aquartelamento na sequência desses episódios.(**)

Refiro ainda que à data já não me encontrava lá, em virtude de no princípio de 1972 ter sido destacado para a companhia africana, CCaç 16, sediada no Bachile -Teixeira Pinto, onde acabei a comissão. Mas recordo-me de muitos ataques ao quartel enquanto lá estive, tendo sentido grande alivio quando saí de lá, e parti preocupado com os camaradas que lá deixei a ferro e fogo.


Enquanto estive em S. Domingos vi e vivi situações de guerra e nunca me senti num "resort". No período que lá estive, os Furrieis dos Obuses eram os meus amigos Pimenta e Rebelo. Tudo isto pode ser testemunhado pelos meus camaradas da CCAV 3365 [, Os Quixotes].

No entanto, regozijo-me que a situação estivesse calma no período em que o Alferes Vasco Pires lá esteve. Ainda acrescento ter conhecimento que, depois da minha saída de S. Domingos, o meu amigo Furriel Pimenta, dos Obuses, ficou gravemente ferido numa operação no mato, tendo sido evacuado para Lisboa.

Um abraço

Bernardino Parreira

2. Mensagem do Vasco Pires (*):


Caro Luís,

Muito obrigado pelo informe. Li o depoimento do nobre camarada Bernardino Parreira, e conclui que devemos ter estado lá em datas diferentes, pois não tenho memória de nenhuma flagelação, tão pouco me lembro de ter havido um disparo dos nossos obuses. A única hipotética acção seria uma pretensa operação perto da fronteira, para onde o Major de Operações pretendia levar os obuses. Ora a ordem do Comando do GAC 7 era de que os obuses não deveriam sair nunca do aquartelamento, se o Comando da unidade a que estávamos adidos insistisse na saída, deveria ser dada ordem por escrito, e, quando eu solicitei essa ordem, ficou por isso mesmo. Creia-me,  caro Luis, que na minha memória, a palavra "resort", não é exagero, excepto, que a essa data, por direito, já devia estar em casa. abraço, VP

3. Comentário do L.G.:

Meu caro Bernardo, gostaria que transmitisses ao teu amigo e nosso camarada Plácido Teixeira o meu desejo de o ver mais perto de nós, sentado sob o poilão mágico e fraterno da nossa Tabanca Grande. No caso dele, basta-lhe mandar as duas fotos da praxe, uma do antigamente e outro do agora. Fazes isso por todos nós ?... Um abração. LG (***)

_______________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 13 de outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10525: Um história do artilheiro de Gadamael, Vasco Pires, à beira da peluda, no 'bem-bom' de São Domingos... (Vasco Pires, Brasil)



Plácido Teixeira (Cortesia do blogue Luar da Meia Noite)


(**) Reproduz-se, de novo aqui, o texto escrito por Plácido Teixeira, da CCAV 3365 / BCAV 3846, colocado em S. Domingos,1971/1973, e que vive atualmente nos EUA, em Boston. [O  BCAV 3846, 1971/73,  era composto pelas CCAV 3364 (Ingoré), CCAV 3365 (S.Domingos) e CCAV 3366 (Suzana)].

(..:) Senhor Spínola... sim, Senhor, porque outros tempos vão longe! Mas,  Senhor Spínola, com muito respeito eu digo e escrevo o seguinte:

Muito obrigado pelas palavras que proferiu uma vez em S. Domingos, para uma Companhia abusada, e maltratada e deitada ao abandono. Lembro-me que uma vez, num horrível mês, do ano de 1972, a nossa Companhia foi um alvo, uma carreira de tiro. Sim, uma carreira de tiro e nós o alvo!!! Era bombardeamento diário. Não havia comida, não havia bebida ou até luz.

Lembro-me que andava a passar uma ronda e fomos apanhados no meio do campo de futebol. Todos saltámos do Jeep, uns para a direita, outros para a esquerda. Como fomos apanhados no meio do campo de futebol, a vala e os abrigos estava muito longe. Corri e cheguei finalmente a vala, sem arma, sem sapatos e sem oculos! Bonito para a minha defesa. Mais uma vez a ideia era sobreviver. Havia fumo por todo o lado. Como tinha chovido, na vala era só lama. Não havia luz e com o fumo nada se via para fora da vala. Era até impossível por a cabeça de fora. O tiroteio do outro lado do arame era intenso. Constou que estávamos a ser atacados com bombas de fumo e que até já tinham entrado para dentro do "quartel".

Ficámos toda a noite nos abrigos. Mesmo após o tiroteio ter parado, estava tudo cansado e desmoralizado, sabe-se lá até com que ideias... Sabíamos que do lado de fora do arame, o ataque estava bem organizado e como tal para sobreviver não havia que dar chances ou oportunidades.

Na manhã seguinte com a luz do dia só se via destruição. Poucos foram os que se aventuraram para fora dos abrigos. No entanto como era normal principiaram os boatos... o Jeep está destruído... o bar está acabado... ha dois mortos... há inúmeros feridos... na enfermaria só há sangue etc. etc.

Foi bombardeamento diário durante muitos dias. Era afinal S. Domingos. Era a razão pela qual a sede do Batalhão foi para lugar seguro. Foi assim o nosso pesadelo!

Durante os ataques e certas vezes podia-se ouvir o outro lado, sabiamos portanto que eles não estavam longe, e que afinal eram seres humanos como nós, só que defendiam a sua terra a qual não nos pertencia. Eles tinham razão. Nós éramos invasores, éramos seres humanos como eles, com pais e irmãos, alguns casados e com filhos. Ficámos esgotados e sem energia para sobreviver, água não havia a não ser a da chuva, comer não havia, e munições também estavam a esgotar rápido.

A lama acabou por secar e as pernas foram ficando presas como no cimento. As armas, muitas não trabalhavam de sujidade. Estávamos deitados ao abandono e à mercê da sorte ou do destino.

Não veio ajuda... nem do ar, nem por terra, nem tão pouco por água. Esperávamos somente ajuda, mas do Céu. Mais um dia e seríamos todos mortos ou prisioneiros tal foi essa semana maldita.

Os aviões não podiam vir, pois eles estavam tão perto, corriam o risco de ser também feridos ou mortos. Helicópteros não vinham mandar mantimentos, medicamentos e o necessário, pois seriam alvejados... estes foram os boatos!.

Finalmente ao fim de uma semana, fomos ajudados. Talvez tenha sido por Deus... Como ratos saímos das valas. A cara estava amarela, a barba enorme as roupas rasgadas, e havia lama por todo o lado e até ao cabelo.

O choque final foi saber quem ficou ferido, quem morreu etc.

Ficou tudo destruído. Gerador, frigoríficos, fogões até as panelas ficaram como um assador de castanhas! Água não havia. Passamos a beber água amarela dos "poços" da tabanca. Estávamos portanto sujeitos a malária etc.

Era uma Companhia desmoralizada, sem energia sem sono! Uns choravam com o stress de Guerra, outros não falavam, outros ficaram sem o sorriso da juventude.

Finalmente. um dia, um helicóptero!

Foi tudo reunido para ouvir o Governador da Guiné. Senhor Spínola,  eu agradeço imenso e esteja onde estiver, esteja em paz, como em paz nos deixou! Agradeço as palavras, não de um General mas palavras de um amigo, palavras de reconhecimento. Agradeço ter compreendido estes jovens que foram deixados a mercê das armas e da sorte.

Senhor Spínola... muito e muito obrigado por ter dito a todos nós, em frente do Comandante da Companhia que... a culpa não foi nossa... que: "a culpa foi do vosso Comandante que deixou que o vosso quartel fosse uma carreira de tiro..."!

Resta-me portanto dizer que fomos bombardeados diariamente, que sofremos porque gente sem escrúpulos, sem dignidade, gente agarrada à
s ideias fascistas e de poder, orgulhosos de uma farda e de peso nos ombros famintos por medalhas ao peito, nunca pediu ajuda! Esse Comandante não teve dignidade humana...

Senhor Spínola, muito obrigado é verdade... aquele senhor desumano, realmente deixou fazer do nosso quartel uma carreira de tiro, onde todos nós fomos o alvo.

Bem-haja.
Plácido Teixeira (...) 



(***) Último poste da série > 13 de outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10523: Memória dos lugares (192): Cufar (Mário Fitas, 1965/67; Eduardo Campos, 1972)

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Guiné 63/74 - P10028: Recordando aquele malfadado jogo de futebol, em 31 de janeiro ou 1 de fevereiro de 1973, entre a CCS/BCAÇ 3863 (Teixeira Pinto) e a CCAÇ 16 (Bachile) (Bernardino Parreira)


Guiné > Zona Leste > COP7 > Margem esquerda do Rio Corubal > Gampará > 38º CCmds (1972/74) > 1972 > "Em Gampará com o meu grande amigo Furriel Cmd Ludgero dos Santos Sequeira, a quem mais tarde na picada do Cufeu (outra vez) numa mina iria ficar às portas da morte, ficando quase cego até aos dias de hoje. Continuamos grande amigos. Um abraço para ti, Sequeira!" (Amílcar Mendes, ex-1º cabo comando).


Foto (e legenda): © Amilcar Mendes (2007). Todos os direitos reservados.


1. Mensagem do Bernardino Parreira, com data de 12 do corrente:

Caro amigo Luís Graça

A 39 anos de distância desta ocorrência (*) já há pormenores que me falham, sobre este acontecimento.  Mas ainda me lembro que por aquela altura - último dia do mês de Janeiro [, 4ª feira,] ou primeiro dia do mês de Fevereiro de 1973 [, 5ª feira] -  já não sei precisar a data -, encontrava-me com "ordem de marcha" para regressar a S. Domingos, à minha companhia de origem, a CCav 3365, para integrar o BCAV  3846, com vista ao nosso regresso à Metrópole, que ocorreu a dia 17 de Março de 1973.

E só não tinha ainda regressado a S. Domingos para poder disputar este jogo. Que era a final do campeonato entre companhias do CAOP1. O jogo que se realizou naquele fatídico dia foi entre a CCS/BCAÇ 3863 e a CCaç 16 à qual eu pertencia.

Devo dizer que o ambiente que normalmente se vivia no Bachile era calmo, os militares eram disciplinados e muito bons seres humanos. O nosso comandante era um Excelente Militar Operacional e uma Excelente pessoa. Havia um espírito de companheirismo e confraternização excepcionais entre todos os militares.

O futebol, no meio daquela guerra, aliviava-nos o stress e o orgulho de uma companhia africana poder ganhar o campeonato era enorme. O que aconteceu ali, naquele dia, em termos de jogo, acontece muitas vezes em estádios de futebol. Ao ser anulado um golo que dava a vitória à nossa CCaç 16, onde seríamos sagrados vencedores daquele campeonato, que tinha a maioria de jogadores africanos, os nossos camaradas africanos que estavam a assistir ao jogo invadiram de imediato o campo.

Julgo que naquele dia estávamos  apenas a jogar 2 brancos, eu e o Figueiredo.  A única diferença é que todos estavam armados, não com cadeiras, como normalmente acontece nos estádios de futebol, mas com armas reais, e álcool à mistura, e a situação só não teve consequências maiores dado o campo de futebol, onde isto aconteceu, estar situado próximo do CAOP1.

Tenho a ideia de que foram logo ali efectuadas algumas prisões e, serenados os ânimos,  regressámos todos ao nosso quartel no Bachile, nas viaturas  militares.

No mesmo dia, por volta da hora de jantar, estava eu na messe dos sargentos, tive conhecimento que a maioria dos militares africanos, revoltados e armados, tinham abandonado o quartel e se dirigiam para Teixeira Pinto no sentido de irem tentar a libertação dos camaradas presos. 

Escusado será dizer a preocupação que se generalizou entre os que ficaram, mas dada a pouca distância entre  o Bachile e a Ponte Alferes Nunes logo se ouviu dizer que tropas da CAOP1 tinham vindo ao encontro dos revoltosos e estes tinham sido obrigados a recuar para o Quartel.

O pior soube-se depois, que foi o acidente ocorrido com os militares  de Teixeira Pinto,[da 38ª CCmds,] no regresso ao seu quartel, com a deflagração de um dilagrama.(*)

Dois dias depois parti, triste, do Bachile, em direcção a S. Domingos, via Cacheu. Achei que não devia ter ficado para disputar aquele malfadado jogo de futebol. Ainda passei por Teixeira Pinto para visitar e despedir-me dos meus camaradas presos, entre eles o meu amigo Policarpo Gomes, que era do meu pelotão.

Por outro lado, S. Domingos continuava a ser atacado, do Senegal, e não sabia o que me poderia acontecer a poucos dias do meu regresso. Ainda retenho na memória a preocupação que os meus camaradas africanos manifestaram ao saberem que eu ia para S. Domingos antes do regresso. Só diziam:
- S. Domingos nega... manga de porrada...!

Graças a Deus cá estou!



Guiné > Região do Cacheu > Bachile > CCAÇ 16 (1972/74) >  Equipa de futebol de sete > Legenda do Bernardino Parreira: "Amigo Luis Graça, não consto dessa foto, editada no blogue, mas  julgo reconhecer, da direita para a esquerda, em cima, primeiro o meu amigo António Branco, e terceiro o Sr. Comandante, na altura capitão Abílio Afonso. Em baixo: Da direita para a esquerda, Pereira, Garcia e Miranda.

Fotos: © António Branco (2010). Todos os direitos reservados.

Tenho pena de não possuir fotografias da nossa equipa de futebol da CCaç 16. Foram bons tempos, de que  destaco um episódio agradável em tempo de guerra.  Num jogo disputado com uma companhia de comandos [, a 38ª CCmds,]  do CAOP1, em Teixeira Pinto, quando foram apresentados os capitães de equipa para a escolha de campo, perante o árbitro desse encontro, sendo eu o capitão de equipa da CCac 16, qual não foi meu agradável espanto ao ver que o capitão da outra equipa era o meu amigo Ludgero Sequeira, de Faro,  meu companheiro de escola, que eu desconhecia que se encontrava em Teixeira Pinto. Maior foi a admiração dele quando viu sair de uma equipa de africanos um único branco que era eu, nesse dia.

Um grande abraço


2. Esclarecimento posterior do José Romão, em mensagem enviada às 23h16:

Boa noite camarada e amigo Luís Graça:
O grave acidente, na sequência do desafio de futebol, entre as equipas de militares do CAOP 1 e do Bachile, deu-se junto à Ponte Alferes Nunes e era eu que estava a comandar um grupo de militares da CCAÇ 16 do Bachile, na referida Ponte. Quem acabou por resolver esse diferendo foi o Coronel Durão, comandante, nessa altura, do CAOP 1 em Teixeira Pinto. Nesse dia, perto da Ponte morreram alguns militares da Companhia de Comandos que estava sediada em Teixeira Pinto.

Um abraço para todos os camaradas,
José Quintino Travassos Romão,
ex Furriel Miliciano.
_____________

Nota do editor:

(*) Vd. poste anterior, de 12 de junho de 2012> Guiné 63/74 - P10025: Excertos do Diário de António Graça de Abreu (CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74) (18): A ponte Alferes Nunes, a CCAÇ 16, o Bachile, a 38ª CCmds, o Canchungo, o cor pára Rafael Durão, o futebol, a violência, a morte...

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Guiné 63/74 – P9494: Convívios (395): Pessoal do BCAV 3846, Lisboa, 18 de Março de 2012 (Delfim Rodrigues)

1. Mensagem do nosso camarada Delfim Rodrigues (ex-1.º Cabo Auxiliar de Enfermagem na CCAV 3366/BCAV 3846, Suzana e Varela, 1971/73), com data de 15 de Fevereiro de 2012:

Mais uma vez venho pedir a publicação do convite para o almoço de meu Batalhão.
O BCAV 3846, composto pelas CCAV 3364 - Sedengal; 3365 - São Domingos; 3366 - Suzana, Varela e Antotinha, e CCS - Ingoré
Desde já o meu muito obrigado

Um abraço
Delfim Rodrigues


____________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 15 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 – P9488: Convívios (315): Encontro de ex-Combatentes da Guiné, dia 30 de Março em Fão (Albino Silva)

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Guiné 63/74 - P6875: Tabanca Grande (236): Bernardino Rodrigues Parreira, ex-Fur Mil da CCAV 3365/BCAV 3846 e CCAÇ 16 (S. Domingos e Bachile, 1971/73)

1. Mensagem de Bernardino Rodrigues Parreira*, ex-Fur Mil da CCAV 3365/BCAV 3846 e CCAÇ 16, S. Domingos e Bachile, 1971/73, com data de 19 de Agosto de 2010:

Caros camaradas
Chamo-me Bernardino Rodrigues Parreira, nasci a 10 de Janeiro de 1949, em Portimão, mas resido em Faro desde criança. Como quase todos os jovens da minha geração, fui obrigado a prestar o serviço militar e a participar na guerra colonial.

Na vida profissional, trabalhei no sector automóvel, cerca de 40 anos, e encontro-me na situação de reformado.

Já há algum tempo que efectuei uma breve apresentação e, a partir daí, foram-me franqueadas as portas desta Grande Tabanca, mas ainda não tinha correspondido ao convite feito pelo camarada Luis Graça, e estou agora a fazê-lo como mandam as regras da praxe.
Para o efeito, envio algumas fotografias.

Eis o resumo da minha vida militar:

Assentei praça no CISMI em Tavira a 06 de Abril de 1970, onde fiz a recruta e tirei a especialidade, tendo aí permanecido até Dezembro de 1970 como instrutor dos novos recrutas.

A 6 de Dezembro de 1970, após a minha mobilização para a Guiné, apresentei-me no Regimento de Cavalaria 3, em Estremoz, com vista a formar Batalhão.
A 3 de Abril de 1971 embarquei no Navio Angra do Heroísmo com destino à Guiné, como Furriel Miliciano, integrando a CCAV 3365, do BCAV 3846.
Desembarquei em Bissau a 9 de Abril de 1971, e fui transportado para o Cumeré onde tirei o IAO. Ali ouvi pela primeira vez a guerra de perto, porque a poucos quilómetros foram atacadas pelo PAIGC as estações emissoras de Nhacra.

Chegada da CCAV 3365 ao Cais S. Domingos
Foto: © Plácido Teixeira (2010). Todos os direitos reservados

A CCAV 3365 foi colocada em S. Domingos, Norte da Guiné, a cerca de 4,5 km da fronteira com o Senegal, e desembarcámos no Cais de S. Domingos na manhã de 13 de Maio de 1971, onde éramos aguardados por elementos da CCAV 2539, que fomos render.

Depressa me adaptei ao meio e às circunstâncias..., tendo como principal objectivo a minha sobrevivência e a dos meus companheiros.

Fomos alertados desde a nossa chegada de que a situação em S. Domingos era muito perigosa, e que a sede do Batalhão, que até ao ano anterior havia estado ali sediada, tinha sido transferida para Ingoré por ser local mais seguro.
No início, a vida no aquartelamento aparentava calma e alguma normalidade, quando não estávamos de serviço, ocupávamos os tempos livres a jogar à bola, a fazer petiscos e a desfrutar do convívio na Tabanca. Mas, ao fim de pouco tempo as coisas agravaram-se, e o aquartelamento passou a ser constantemente flagelado com bombardeamentos vindos do Senegal, de inicio só atacavam de madrugada, não acertando nas instalações. Quando acertaram a primeira vez no alvo, já era raro falharem. Passámos a ser atacados de dia e de noite, e tinhamos que nos refugiar nos abrigos.
Já não sabiamos onde estávamos mais seguros, se no quartel se no mato.

Os acidentes com minas foram uma constante desde o início, o primeiro ocorreu com o meu camarada e amigo Nunes, da Trafaria, que teve de ser evacuado devido a ferimentos graves. Em quase todas as saídas para o mato havia vítimas por explosão de minas, sendo os camaradas do Pelotão 60, os milícias, chamados "picadores", os mais atingidos.

Eu e o 1.º Cabo Daniel Santos em S. Domingos

Por volta de Março/ Abril de 1972 intensificaram-se as flagelações ao aquartelamento de S. Domingos, já eu não me encontrava lá, mas existem fotografias que ilustram o grau de destruição. Soube-se que nessa sequência o Governador da Guiné, General António de Spínola, deslocou-se a S. Domingos para se inteirar da situação e rever a estratégia militar naquela zona.

O acidente mais grave que presenciei, que perdurará para sempre na minha memória, com grande mágoa, foi o que ocorreu com o Alferes Abel Fortuna, do meu Pelotão, excelente comandante e excelente pessoa , hoje dirigente da ADFA. Cerca de 6 meses após a nossa chegada a S. Domingos, numa saída do nosso Pelotão para o mato foi detectada uma mina e, como habitualmente, seria o nosso Alferes que a desmontava, só que a mesma, supostamente, estava armadilhada e quando o referido oficial procedia à sua desmontagem esta explodiu-lhe nas mãos, ferindo-o gravemente.
O pelotão ficou desmoralizado. Já tinha havido muitas evacuações de companheiros nossos por ferimentos com minas, por emboscadas, por bombardeamentos, mas nada tão grave.

O poderio militar do PAIGC acentuava a sua supremacia de dia para dia, naquela zona. Os aviões tinham deixado de aterrar em S. Domingos, o saco com o correio era atirado do ar. Sentiamo-nos desprotegidos e desamparados.

Não sei precisar a data, julgo ter sido no primeiro trimestre de 1972, recebi o que considero ser uma boa notícia, fui destacado para uma companhia africana, a CCAÇ 16, sediada em Bachile, em rendição individual. Fui, previamente, fazer o respectivo estágio de adaptação em Bolama, e julgo que devo ter chegado a Bachile por volta de Fevereiro de 1972 . Tenho por base nestes cálculos o facto de o meu camarada 1.º Cabo Upá Gomes, que era do meu Pelotão, ter falecido em Abril de 1972 e de eu ter estado algum tempo com ele em Bachile.
Quando saí de S. Domingos senti-me aliviado, e pensava que se tinha conseguido sobreviver àquele inferno também sobreviria o resto da comissão. Mas parti com muita saudade e preocupação pelos meus camaradas e amigos da CCAV 3365 e do Pelotão 60, que lá ficaram, a ferro e fogo. Fomos uma família muito unida nos bons e maus momentos.

Quando cheguei ao Quartel de Bachile, já noite, fui informado pelos camaradas da CCAÇ 16 de que deveria "alinhar na madrugada seguinte para o mato", mesmo antes da minha apresentação, para "evitar problemas com o Capitão".
Assim fiz, consegui que me fornecessem uma arma e o restante material e lá parti de madrugada com um Pelotão de militares africanos, neste caso manjacos.

Eu e os meus amiguinhos no Poço da Tabanca em Churobrique - Bachile

Mais uma vez, a minha integração foi fácil, ao fim de pouco tempo conhecia todos os camaradas africanos e metropolitanos, e parecia ter sido adoptado por uma nova família.
O ambiente entre os militares era bom, tal como o que havia deixado em S. Domingos. Nos tempos livres, o que eu mais gostava de fazer era jogar à bola e depressa me integrei numa equipa de futebol, de maioria africana. Disputámos o torneio de futebol entre companhias militares pertencentes à CAOP 1, entre 1972/1973.

A Guerra aqui era outra, apesar de termos o IN próximo, na mata da Caboiana, o que é certo é que não sentiamos a sua "pressão" como em S. Domingos.
Sempre estranhei a inexistência de valas e abrigos no Quartel de Bachile, mas ninguém me soube explicar a razão de tão pouca protecção.
Enquanto lá estive, só me lembro de um forte ataque ao quartel, à hora do jantar, em que grande parte da companhia estava no refeitório. Não havendo valas nem abrigos, abrigámo-nos atrás de bidons e de paredes.

Encontrei em Bachile alguns amigos algarvios, em especial os meus conterrâneos Fur. Mil. José Romão, Fur. Mil. Ricardo Pereira, e o Alferes João Barrote.

Além de patrulhamentos diários e emboscadas, na mata dos Madeiros e da Caboiana, participei em inúmeras operações com tropas especiais, entre as quais os Comandos Africanos do grupo do Marcelino da Mata, que era um excelente militar.
Atravessámos situações dramáticas de guerra com o PAIGC e com as forças da natureza, temporais medonhos onde camaradas foram calcinados por raios.

Num patrulhamento do meu Pelotão, comandado pelo Alferes Barrote, que era um grande amigo e excelente militar, entrámos num campo de minas do Pelundo, tendo o referido oficial sofrido um grave acidente que lhe resultou na amputação de um pé. Sem nunca perder a consciência, o Alferes Barrote teve o "sangue frio" de nos pedir que não saíssemos das posições que ocupavamos até chegarem os militares do Pelundo que conheciam a sinalização daquele campo minado, e transmitia-nos força e coragem desvalorizando os seus ferimentos e o seu sofrimento.

Tal como aconteceu em S. Domingos, o Alferes não foi substituido, e o pelotão ficou a ser comandado pelos furriéis até ao fim da comissão.

Durante os 2 anos que permaneci na Guiné tomei consciência de que aquela guerra não era nossa, e que aquele bom povo merecia ser dono da sua própria Pátria.

Finda a comissão, regressei à Metrópole no dia 17 de Março de 1973.

Mas, passados 37 anos do meu regresso, ainda continuo à espera de ver a plenitude da Democracia e Desenvolvimento naquele País.

Dos guineenses com quem convivi, felupes e manjacos, militares e civis, guardo as melhores recordações, e considerá-los-ei para sempre meus amigos e meus irmãos.

Gostaria de voltar a pisar aquele chão vermelho e abraçar os meus amigos ou os seus descendentes.

Não posso deixar de enaltecer o contributo extraordinário que este Blogue está a dar para a preservação das memórias dos ex-combatentes da Guerra Colonial na Guiné, e da História dos dois Países.

Foi através desta Tabanca que reencontrei grandes amigos como o Plácido Teixeira, do meu tempo de S. Domingos, o José Romão e o António Branco de Bachile. E, como um amigo traz outro amigo também, já somos um grupo que se rencontrou passados dezenas de anos.

Encontrei, ainda, o que considero ser já um novo grande amigo o camarada Manuel Seleiro.
A descoberta do ex-1.º Cabo Manuel Seleiro, deve-se a um posting do ex-Alferes Hugo Guerra, neste Blogue, que me sensibilizou, por ter sido gravemente ferido, no ano anterior à minha chegada, em S. Domingos. Contactei o camarada Manuel Seleiro através do seu Blogue "Pelotão 60" e recordámos o chão que pisámos, os mergulhos que demos no Rio S. Domingos, as tabancas, as matas, as picadas, os trilhos, as bolanhas, tanta coisa..., e constatei que o mesmo foi vítima de um acidente idêntico ao sofrido pelo meu Alferes em S. Domingos, quiçá, no mesmo trilho, ou muito próximo, e ficou deficientado com o mesmo tipo de lesões.
Ao ler e ouvir o relato do camarada Manuel Seleiro, foi como se estivesse a rever o mesmo filme de terror passados 39 anos. Mas fico estupefacto com a calma, a tranquilidade, e a resignação que este camarada nos transmite, depois de tantos anos de luta pela recuperação e pela sobrevivência.

Considero que os Deficientes das Forças Armadas são os verdadeiros heróis sobrevivos da guerra colonial que, no meio da adversidade, lutaram com as forças que lhes restavam pela sua recuperação e integração na sociedade. Se a Guerra em África foi árdua, julgo que a guerra travada pela defesa e consagração dos seus direitos não tem sido menos penosa. A Pátria em nome da qual lutaram e ficaram deficientados não tem sabido honrar e ressarcir estes seus filhos do mal que lhes causou.

Por último, presto a minha sentida homenagem a todos os meus companheiros militares mortos naquela guerra e curvo-me perante a sua memória.

Um fraterno abraço para os editores e para todos os camaradas
Bernardino Parreira
Ex-Fur Mil
CCAV 3365 - S. Domingos 1971/1972
CCAÇ 16 - Bachile - 1972/1973


2. Comentário de CV:

Caro Bernardino Parreira
Bem-vindo à Tabanca Grande e ao convívio dos teus camaradas ex-combatentes da Guiné, onde encontrarás pelo menos, o Luís Fonseca e o Delfim Rodrigues da CCAV 3366, Companhia igualmente pertencente ao teu Batalhão.

O nosso camarada Luís Fonseca tem uma série dedicada aos Felupes, seus usos e costumes que representa um documento importante do nosso Blogue.

Voltando a ti, obrigado por te juntares a nós. Esperamos que contribuas com as tuas memórias (histórias e fotografias) que conservas desde o teu regresso, sem suspeitares que um dia iam fazer parte do espólio de uma guerra, pela qual toda a nossa geração passou. Temos já pouco tempo à nossa frente e fazemos parte de um grupo etário um pouco arredado da informática, mas com a ajuda dos filhos, netos, amigos e outros camaradas, podemos e devemos dar a nossa contribuição para que não sejamos esquecidos.

Embora tenhas já participação no Blogue, só agora ficas apresentado à tertúlia. Instala-te, porque estás entre amigos.

Recebe um abraço de boas-vindas dos teus camaradas e dos nossos amigos tertulianos, que ligados de alguma forma à Guiné de ontem ou de hoje, fazem parte do nosso Blogue.

O teu novo amigo e camarada
Carlos Vinhal
________

Notas de CV:

(*) Vd. postes de:

29 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6277: O Spínola que eu conheci (15): Muito obrigado pelas palavras que proferiu em S. Domingos (Bernardino Parreira / Plácido Teixeira)

3 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6304: Ser solidário (67): Maria Buinen e Rosa Mota 'correm' pelo Projecto Viva (água para 85 mil pessoas na Região de S. Domingos) (Bernardino Parreira, CCAV 3365, 1971/73)
e
17 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6610: Em busca de... (136): Procuro qualquer contacto do Bernardino Parreira, ex-Fur Mil da CCAV 3365/BCAV 3846, S. Domingos e Bachile

Vd. último poste da série de 3 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6820: Tabanca Grande (235): António Inverno, ex-Alf Mil Op Esp/RANGER da 1.ª e 2.ª Companhias do BART 6522 e Pel Caç Nat 60 – S. Domingos - 1972/74

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Guiné 63/74 - P6610: Em busca de... (136): Procuro qualquer contacto do Bernardino Parreira, ex-Fur Mil da CCAV 3365/BCAV 3846, S. Domingos e Bachile


1. O nosso Camarada José Quintino Travassos Romão, que foi Fur Mil At Inf da CCAÇ 3461/BCAÇ 3863, enviou-nos uma mensagem em 15 de Junho de 2010, contendo o seguinte apelo:

À procura de contacto do Bernardino Parreira

Camaradas,

O meu nome é José Quintino Travassos Romão ( ex-Fur Mil At Inf. da CCAÇ 3461/BCAÇ 3863), e resido actualmente em Vila Real de Santo António.

Estive na Guiné desde Setembro de 1971 a Outubro de 1973, primeiro em Teixeira Pinto e depois na CCAÇ 16, no Bachile.

Vi no blogue uma mensagem enviada pelo camarada Bernardino Parreira, que foi Fur Mil At Inf da CCAV 3365/BCAV 3846, S. Domingos e Bachile) e que assentou praça comigo em Tavira, tendo estado no Bachile na mesma altura que eu.

Há cerca de trinta e sete anos que lhe perdemos o rasto, tanto eu com o Fur Mil João Codeço, residente em Arcos de Valdevez e temos tentado localizá-lo por diversos meios sem qualquer resultado positivo.

Assim, agradecia que o próprio ou alguém que saiba o seu contacto me o enviasse, através do e-mail:

zecaromao@hotmail.com

Eu e o Parreira na parada da CCAÇ 16, no Bachile

Um grande abraço para todos os camaradas,
José Travassos Romão
Fur Mil At Inf da CCAÇ 3461/BCAÇ 3863
__________
Notas de M.R.:
  • Em nome do Luís Graça e Camaradas da Guiné, aqui deixo o convite ao José Quintino Travassos Romão, para, se for esse o seu desejo, aderir ao nosso batalhão (400 e tal Camaradas), da Tabanca Grande.
  • Em caso afirmativo, apenas terá que cumprir a praxe (habitual para todos os periquito bloguistas), que é o envio de uma foto do tipo passe actual, uma foto do seu tempo da tropa (se a tiver como é óbvio), além dos seus elementos pessoais, posto, unidade, locais por onde andou na Guiné e períodos aproximados da estadia.
  • Óptimo seria se complementasse a sua eventual adesão, com uma das suas estórias da Guiné.

Vd. último poste da série em:

2 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6521: Em busca de... (135): Carlos Miguel (O Fininho), ex-Fur Mil da CCAÇ 5, procura fotos suas do tempo de Guiné (José Corceiro)

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Guiné 63/74 - P6304: Ser solidário (67): Maria Buinen e Rosa Mota 'correm' pelo Projecto Viva (água para 85 mil pessoas na Região de S. Domingos) (Bernardino Parreira, CCAV 3365, 1971/73)


Guiné-Bissau > Região do Cacheu > "Chão felupe" > AD - Acção para o Desenvolvimento, Bissau > Foto da semana > 24 de Maio de 2009 > Produzindo fogões melhorados > Foto tirada em 21 de Março de 2009 > Com o avanço do deserto do Sahara mais para sul, acentuam-se os efeitos degradantes no ambiente e em particular na diminuição dos recursos florestais, tanto mais evidente quanto se está perto da linha da fronteira com o Senegal.


"As mulheres são as primeiras a sofrer as consequências, devendo deslocar-se cada vez mais longe para obter lenha para cozinhar e sofrendo na pele e na vista as consequências do calor e do fumo proveniente do tradicional fogão de 3 pedras.

"Com a introdução e divulgação em grande escala deste novo modelo amigo do ambiente, o consumo energético é drasticamente reduzido, diminuindo o cansaço das mulheres na procura de lenha e poupando-as em termos de saúde. A adesão tem sido extraordinária, o que tem implicado da parte do especialista Numó a formação de grande número de mulheres que passam elas a fazer a vulgarização desta nova tecnologia".


Guiné-Bissau > Região do Cacheu > "Chão felupe" > AD - Acção para o Desenvolvimento, Bissau > Foto da semana > 5 de Abril de 2009 > "S.Domingos tem uma nova Ludoteca > Foto tirada em 4/2/2009 > As crianças de S.Domingos têm agora um novo local de convívio onde desenvolvem actividades lúdicas, reforçam a solidariedade mútua e aprendem novos conhecimentos a partir de jogos e brincadeiras.


"A Câmara Municipal de Elx em Espanha tem sido a principal protagonista desta actividade infantil, contribuindo com a construção da ludoteca, o subsídio da monitora infantil, o fornecimento de um pequeno-almoço, assim como com material escolar e medicamentos.

"Em Março deste ano, foi a vez da Associação Memórias e Gente, de Coimbra, Portugal, fornecer um importante lote de brinquedos, papas alimentares, roupas e cadernos, o que veio melhorar o funcionamento desta ludoteca".



Guiné-Bissau > Região do Cacheu > "Chão felupe" > AD - Acção para o Desenvolvimento, Bissau > Foto da semana > 20 de Setembro de 2009 > "Varela – o mar está a avançar assustadoramente. Foto tirada em 21 de Junho de 2009. O areal terminal da praia de Varela tem vindo a diminuir anualmente a uma média de perda de costa de 8 metros por ano, provocando a queda das construções inacabadas de uma hipótese de Hotel que nunca chegou a ser e que viu ser 'engolido' pelo mar cerca de 8 milhões de dollars de um estranho investimento.


"Em certas zonas, o material destruído fica no areal da praia e causa enorme perigo para quem a utiliza, podendo ser ferido por ferros e outro material metálico que se vai gradualmente escondendo debaixo da areia.

"O mais preocupante é a ausência de alternativas e soluções para minimizar os efeitos da subida da água do mar e da erosão que provoca".

Fotos e legendas: Cortesia de: © AD - Acção para o Desenvolvimento, Bissau (2009). Direitos reservados.



Brazão do BCAV 3846, composto pelas CCAV 3364 (Ingoré), CCAV 3365 (S.Domingos) e CCAV 3366 (Suzana) (1971/73). A este batalhão pertencem os nossos camaradas Luís Fonseca e Delfim Rodrigues, da CCAV 3366.


1. Mensagem de Bernardino Parreira, ex-Fr Mil, CCAV 3365/BCAV 3846 (1971/73), de 7 do corrente:


Assunto - Maria correu a maratona de Lisboa para levar água a 85 mil pessoas na Região de S. Domingos - Guiné-Bissau

Caro camarada Luis Graça e Caros Camaradas Co-editores,

Como já mencionei noutros comentários, cumpri metade da minha comissão em S. Domingos, na Guiné, tendo chegado a essa localidade em 13/05/1971, como Furriel, integrando a CCAV 3365, BCAV 3846.

Nutro pelo Povo Guineense grande sentimento de fraternidade e solidariedade. Venho apelar para que seja divulgado no seu Blogue Luis Graça & Camaradas da Guiné a campanha que se está a desenvolver no sentido de levar água potável àquela localidade. Há cerca de 38 anos que conheci , e sofri, a escassez de água naquela região. Devemos fazer tudo o que pudermos para minimizar o sofrimento daquele sacrificado povo.

Outras iniciativas já foram divulgadas no seu admirável Blogue e tiveram grande sucesso.

Bem haja pela fundação deste blogue, que permite à nossa geração ,(geração dos 60), reciclar memórias que já começavam a apagar-se e permitir aos mais novos adquirir conhecimentos, por enquanto, contados na 1ª. pessoa.

Com os melhores cumprimentos,
Bernardino Parreira


2. Excertos do artigo publicado no jornal Público de 07/12/2009 [com a devida vénia]:

Maria correu a maratona de Lisboa para levar água a 85 mil pessoas na Região de S. Domingos - Guiné Bissau.


Faz todos os dias a maratona para sobreviver, mas ontem participou na corrida de Lisboa com uma meta diferente: angariar dinheiro para 54 poços naquele país africano.


Quando Maria Buinen, 45 anos, chegou, na passada quinta-feira, a Lisboa, vinda de uma pequena terra na Guiné-Bissau, viu algo que os seus conterrâneos nunca viram: água a jorrar da torneira.


Maria conta que ficou parada a assistir a esse "espectáculo": "A primeira vez que vi, não queria sair dali", confessa. Para ter água em casa, Maria faz pelo menos dez quilómetros, duas a três vezes por dia. Uma maratona diária. Não admira, por isso, que ontem tenha encarado a participação na maratona de Lisboa como uma "brincadeira".


Chegou a Lisboa com fôlego, disposta a percorrer os 42 quilómetros da prova, para apresentar aos portugueses o projecto da organização não-governamental VIDA (Voluntariado Internacional para o Desenvolvimento Africano). Rosa Mota, antiga campeã portuguesa, europeia, do mundo e olímpica da maratona, apadrinha esta iniciativa, que pretende fundos para construir 54 poços de água com bomba em São Domingos, região do Norte da Guiné, junto ao Senegal, onde fica a aldeia de Suzana.


A organização da maratona decidiu, porém, dar descanso a Maria e inscreveu-a na corrida da família (minimaratona). Percorrendo 6,5 quilómetros ao lado de Rosa Mota, Maria (foto ao lado) chegou ao fim como se tivesse apenas contornado a esquina. "Aqui é só marchar, lá é trabalhar", atira, com a ajuda do intérprete.


Maratonas para sobreviver


"As pessoas fazem a maratona para quebrar recordes ou por simples prazer. A Maria faz a maratona todos os dias para sobreviver", resume Rosa Mota, que ontem fez a primeira contribuição para a campanha Viva, comprando a primeira garrafa de água com a marca Viva. Uma garrafa que, simbolicamente, está vazia, aludindo dessa forma à escassez de água que atinge a população guineense.


Desde ontem e até final do ano, as garrafas de 1,5 litros estão à venda, por um euro, nos hipermercados Lidl. O dinheiro reverte para o projecto de construção de furos artesianos, que custam cerca de 5500 euros (poço com bomba, protecção e saneamento) e irão beneficiar 85 mil pessoas em São Domingos.


Com um marido, seis filhos e três netos, Maria Buinen tem o dia-a-dia preenchido, tal como as outras mulheres da sua aldeia, que se chama Suzana. Acorda todos os dias às quatro horas da manhã para vigiar os campos de arroz, produto que está na base da alimentação da população. Mais tarde, são os filhos que ficam com a tarefa de afugentar os pássaros dos arrozais, enquanto as mulheres de Suzana começam a maratona diária em busca de água. No mínimo, dez quilómetros, duas a três vezes num mesmo dia. Maria carrega para casa 30 litros de cada vez, que irão servir para cozinhar, para dar de beber à família e aos animais, para tomar banho e para fazer o famoso óleo de palma, que será vendido nos mercados da fronteira senegalesa.


Além de irem buscar água, as mulheres de Suzana têm de percorrer quilómetros para trabalharem as terras dos arrozais, para apanharem a lenha necessária para cozinhar e para trazerem água do mar para produzir sal. "É um grande sacrifício para as mulheres que, nos últimos anos, sofrem cada vez mais devido à falta de chuva", revela Maria, que saiu pela primeira vez do seu país para participar na maratona de Lisboa, carregando o desejo de ajudar a pôr fim à odisseia das mulheres de Suzana em busca de água.


A acompanhar Maria Buinen estiveram Luciana Silva, 68 anos, e Fernando Farinha, 65. Dois amigos de longa data que fazem provas ou caminhadas todos os domingos e que eram antigos corredores da meia-maratona. Mas a idade obrigou-os a "fazer apenas os percursos mais pequenos das provas", revela Luciana. "O grosso do pelotão são pessoas que já correram e agora andam, ou aquelas que estão a começar agora", observa Fernando. A sua ambição era participar na maratona, mas as pernas já não acompanham. "Só temos cinco horas para chegar ao fim na maratona e isso limita muito", diz Fernando. (...).

2. Comentário de L.G.:

Meu caro Bernardino: Obrigado ppor nos teres informado sobre (e sensibilizado para) esta iniciativa. Não conheci nem conheço o "chão felupe", na região do Cacheu, fazendo fronteira com a instável e rebelde Casamança (que, no passado, fez parte da antiga colónia portuguesa, tendo sido trocada pela região de Cacine, no sul, em finais do Séc. XIX, se não me engano). Devido muito possivelmente às alterações climáticas, o norte da Guiné-Bissau está a sofreu um processo (inexorável ?) de desertificação... A resposta a questões tão elementares (mas tão decisivas para o desenvolvimento daquele país irmão) como o acesso à água potável vai tornar-se cada vez mais dramática... O projecto VIVA, aqui sumariamente apresentado, merece, no mínimo, a nossa atenção e interesse.

Bernardino, não tenho ninguém da tua CCAV 3365. Obrigado pelos teus elogios ao nosso blogue (nosso, meu, teu, de todos nós). Está na altura de saltares os muros da parada e apresentares-te ao serviço... Sob pena de eu te considerar "desertor"... A Tabanca é Grande e é Nossa. Conheces as regras da casa. Manda as duas foto da praxe. E conta-nos uma história de São Domingos. Um Alfa Bravo. Luís
__________

Nota de LG

Vd. último poste da série de 2 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6299: Ser solidário (66): A minha homenagem à jovem Marta Ceitil, cooperante na Guiné-Bissau (Paulo Salgado)

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Guiné 63/74 - P6277: O Spínola que eu conheci (15): Muito obrigado pelas palavras que proferiu em S. Domingos (Bernardino Parreira / Plácido Teixeira)

Guiné > Algures > O Alf Mil Pil Heli Al III (BA 12, Bissalanca, 1968/70) e o Spínola (Com-Chefe e Governador Geral, CTIG, 1968/73)
Foto: © Jorge Félix (2010). Direitos reservados


1. Mensagem de Bernardino Parreira (ex-Fur Mil da CCAV 3365/BCAV 3846, S. Domingos e Bachile), com data de 12 de Abril de 2010:

Caro camarada Luis Graça, autor e editor deste Blogue e caros camaradas co-editores.
Começo por apresentar-vos a minha saudação e os meus parabéns pelo trabalho extraordinário que realizam diariamente, neste digníssimo Blogue.

Apesar de não pertencer a esta Tabanca, acompanho diariamente a mesma e tudo que se relaciona com a Guiné, e até já me concederam a oportunidade de comentar alguns posts.

A propósito da homenagem ao Sr. Marechal Spínola, tenho a dizer que tive a honra de o conhecer pessoalmente no dia da minha chegada à Guiné em 09/04/1971 quando apresentou os cumprimentos de "boas vindas" ao BCAV 3846, e no dia do meu regresso à Metrópole em 17/03/1973, quando o mesmo se deslocou ao Aeroporto de Bissau para apresentar os cumprimentos de despedida à CCAV 3365 a que eu pertencia.

Com já referi em anteriores comentários, fiz parte da minha Comissão Militar como Furriel Miliciano em S. Domingos e outra parte no Bachile. Em todos os destacamentos que estive e no contacto com as populações que convivi testemunhei a grande admiração e respeito que a população nativa manifestava pelo Sr. General Spínola.

Enquanto estive em S. Domingos testemunhei muitos ataques ao Quartel e posso dizer que quando de lá saí, em 1972, a situação começava a estar insustentável. Os ataques do PAIGC, vindos do Senegal intensificavam-se.

Há algum tempo, o meu camarada e amigo Plácido Teixeira, que reside nos EUA, e que também pertenceu à CCAV 3365, que esteve sempre colocado em S. Domingos de 1971 a 1973, escreveu sobre o "Inferno" que viveu em S. Domingos, e sobre o General Spínola, o seguinte texto, que vos envio com a devida permissão desse meu amigo, para publicarem se assim o entenderem.

Bem Hajam!

Abraços
Bernardino Parreira


2. Texto escrito por Plácido Teixeira, da CCAV 3365, colocado em S. Domingos,1971/1973:

"Senhor Spínola... sim, Senhor, porque outros tempos vão longe! Mas Senhor Spínola com muito respeito eu digo e escrevo o seguinte:

Muito obrigado pelas palavras que proferiu uma vez em S. Domingos, para uma Companhia abusada, e maltratada e deitada ao abandono. Lembro-me que uma vez, num horrível mês, do ano de 1972, a nossa Companhia foi um alvo, uma carreira de tiro. Sim, uma carreira de tiro e nós o alvo!!! Era bombardeamento diário. Não havia comida, não havia bebida ou até luz.

Lembro-me que andava a passar uma ronda e fomos apanhados no meio do campo de futebol. Todos saltámos do Jeep, uns para a direita, outros para a esquerda. Como fomos apanhados no meio do campo de futebol, a vala e os abrigos estava muito longe. Corri e cheguei finalmente a vala, sem arma, sem sapatos e sem oculos! Bonito para a minha defesa. Mais uma vez a ideia era sobreviver. Havia fumo por todo o lado. Como tinha chovido, na vala era só lama. Não havia luz e com o fumo nada se via para fora da vala. Era até impossível por a cabeça de fora. O tiroteio do outro lado do arame era intenso. Constou que estávamos a ser atacados com bombas de fumo e que até já tinham entrado para dentro do "quartel".

Ficámos toda a noite nos abrigos. Mesmo após o tiroteio ter parado, estava tudo cansado e desmoralizado, sabe-se lá até com que ideias... Sabíamos que do lado de fora do arame, o ataque estava bem organizado e como tal para sobreviver não havia que dar chances ou oportunidades.

Na manhã seguinte com a luz do dia só se via destruição. Poucos foram os que se aventuraram para fora dos abrigos. No entanto como era normal principiaram os boatos... o Jeep está destruído... o bar está acabado... ha dois mortos... há inúmeros feridos... na enfermaria só há sangue etc. etc.

Foi bombardeamento diário durante muitos dias. Era afinal S. Domingos. Era a razão pela qual a sede do Batalhão foi para lugar seguro. Foi assim o nosso pesadelo!

Durante os ataques e certas vezes podia-se ouvir o outro lado, sabiamos portanto que eles não estavam longe, e que afinal eram seres humanos como nós, só que defendiam a sua terra a qual não nos pertencia. Eles tinham razão. Nós éramos invasores, éramos seres humanos como eles, com pais e irmãos, alguns casados e com filhos. Ficámos esgotados e sem energia para sobreviver, água não havia a não ser a da chuva, comer não havia, e munições também estavam a esgotar rápido.

A lama acabou por secar e as pernas foram ficando presas como no cimento. As armas, muitas não trabalhavam de sujidade. Estávamos deitados ao abandono e à mercê da sorte ou do destino.

Não veio ajuda... nem do ar, nem por terra, nem tão pouco por água. Esperávamos somente ajuda, mas do Céu. Mais um dia e seríamos todos mortos ou prisioneiros tal foi essa semana maldita.

Os aviões não podiam vir, pois eles estavam tão perto, corriam o risco de ser também feridos ou mortos. Helicópteros não vinham mandar mantimentos, medicamentos e o necessário, pois seriam alvejados... estes foram os boatos!.

Finalmente ao fim de uma semana, fomos ajudados. Talvez tenha sido por Deus... Como ratos saímos das valas. A cara estava amarela, a barba enorme as roupas rasgadas, e havia lama por todo o lado e até ao cabelo.

O choque final foi saber quem ficou ferido, quem morreu etc.

Ficou tudo destruído. Gerador, frigoríficos, fogões até as panelas ficaram como um assador de castanhas! Água não havia. Passamos a beber água amarela dos "poços" da tabanca. Estávamos portanto sujeitos a malária etc.

Era uma Companhia desmoralizada, sem energia sem sono! Uns choravam com o stress de Guerra, outros não falavam, outros ficaram sem o sorriso da juventude.

Finalmente um dia um helicóptero!

Foi tudo reunido para ouvir o Governador da Guiné. Senhor Spínola eu agradeço imenso e esteja onde estiver, esteja em paz, como em paz nos deixou!
Agradeço as palavras, não de um General mas palavras de um amigo, palavras de reconhecimento.
Agradeço ter compreendido estes jovens que foram deixados a mercê das armas e da sorte.

Senhor Spínola... muito e muito obrigado por ter dito a todos nós, em frente do Comandante da Companhia que... a culpa não foi nossa... que: "a culpa foi do vosso Comandante que deixou que o vosso quartel fosse uma carreira de tiro..."!

Resta-me portanto dizer que fomos bombardeados diariamente, que sofremos porque gente sem escrúpulos, sem dignidade, gente agarrada as ideias fascistas e de poder, orgulhosos de uma farda e de peso nos ombros famintos por medalhas ao peito, nunca pediu ajuda! Esse Comandante não teve dignidade humana...

Senhor Spínola, muito obrigado é verdade... aquele senhor desumano, realmente deixou fazer do nosso quartel uma carreira de tiro, onde todos nós fomos o alvo.

Bem-haja.
Plácido Teixeira"

__________

Nota de CV:

[...]
Bernardino, não tenho ninguém da tua CCAV 3365. Obrigado pelos teus elogios ao nosso blogue (nosso, meu, teu, de todos nós). Está na altura de saltares os muros da parada e apresentares-te ao serviço... Sob pena de eu te considerar "desertor"... A Tabanca é Grande e é Nossa. Conheces as regras da casa. Manda as duas fotos da praxe. E conta-nos uma história de São Domingos. Um Alfa Bravo. Luís
[...]

Vd. último poste da série de 17 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6168: O Spínola que eu conheci (14): Sempre vi naquele homem, trinta e quatro anos mais velho do que eu, o Chefe Militar (Torcato Mendonça)