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terça-feira, 19 de março de 2024

Guiné 61/74 . P25286: Facebook...ando (52): António Pina, ex-sold, CCAÇ 3399 / BCAÇ 2892 (Aldeia Formosa, 1971/73); natural de Loriga, Seia, vive em São João da Talha, Loures, e é membro da Tabanca da Linha



 
"Eu também estive no mato 26 meses e 8 dias...foram tempos muito dificeis que nunca foram ultrapassados e jamais o serão... 71/73"


"Esta foto foi tirada junto ao Hotel... a chamada caserna onde dormíamos"


"Foto tirada no meio do capim, passados uns dias depois de saber que a minha querida mãe tinha falecido... quando eu mais precisava dela."


"Foto tirada, com o dilagrama, junto ao arame farpado,em Aldeia Formosa"



"Esta foto foi tirada em cima de um bunker a onde era guardado o matrial de guerra (paiol)" (...) "Esta era a minha arma de defesa nas matas da Guiné...Tinha que ter um grande sentido de responsabilidade porque era uma arma eficaz em clareiras mas imensamente perigosa em matas muito densas  porque havia perigo de embater em qualquer vegetação e ferir os nossos irmãos de guerra quando ca~iamos numa emboscada" (...)
.

Em dia de ir à lenha, uma velha GMC



Junto  ao obus 14, em Almeida Formosa


Passagem por Mampatá


"Como se pode ver na foto, eu e os meus irmãos de guerra estamos no restaurante ao mais alto nivel, em Aldeia Formosa."... Um dos companheiros é o António Alberto Salgado Raposo, que era soldado condutor.  o https://www.facebook.com/antonioalbertosalgueiro.raposo

Não sabemos qual foi o petisco, mas náo faltou o vinho portugugês, incluindo um Dão... A mesa é feita com tábuas de restos de caixas que acondicionavaam géneros alimentícios, num delsas pode ler-se: "Massa superior. Esparguete.Pacoteas"... O famoso "esparguete" que foiu a salvação dos nossos vagomestres...)


"Esta foto foi tirada em março de 1973 estava eu aqui com meus irmãos de guerra todos felizes...pois estávamos á porta de armas esperando a companhia que nos vinha render"...

Guiné > Região de Tombali > Alderia Formosa >: CCAÇ 3399 (1971/73) >  Seleção de fotos do álbum do António Pina


 Fotos (e legendas): © António Pina (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Oeiras > Algés > Restaurante Ca4ravelaq de Ouro > 55º almoço-conmvívio da Magnífica Tabanjca da Linha > 14 de marçlo de 2024 > O João Crisóstomo (Nova Iorque), o José Colaço e o António Pina, ambos de  São João da Talha (Loures).

Foto: © Manuel Resende (2024). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. O Alberto Bastos (1948-2022), ex-alf mil op esp, é até à data o único representante da CCAÇ 3399 / BCAÇ 3852 (Aldeia Formosa, 1971/73), na nossa Tabanca Grande (embora tenha entrado a título póstumo, e "por mão" do Joaquim Pinto Carvalho). há dois anos atrás (*).

Gostaríamos que outros seus camaradas,  da CCAÇ 3399 / BCAÇ 3852  pudessem vir a preencher o vazio deixado pela sua morte. Descobrimos há dias que o António Pina (ou António Santos Pina) foi também desta subunidade, tendo estado a maior parte da sua comissão em Aldeia Formosa. 

É membro da Magnífica Tabanca da Linha (**), que frequenta com regularidade, e gostavámos de o convidar a integrar o nosso blogue. Já participou, em 15 de abril de 2015, no X Encontro Nacional da Tabanca Grande, em Monte Real, juntamente com o seu amigo e vizinho José Botelho Colaço. 

Peço ao Colaço, que é um histórico do nosso blogue, que "apadrinhe#" a sua entrada, no ano em  que comemoramos os 20 anos da Tabanca Grande (e estamos a fazer uma campanha para chegar aos 900...).  O Pina é também amigo da página do Facebook da Tabanca Grande  (temos mais de um centena de amigos comuns).  

Sabemos que é natural de Loriga, Seia, e vive em São da Talha, tal como seu  amigo José Botelho Colaço. Profissionalmente foi mecânico de apoio de avião na TAP Air Portugal.  

Da sua página no Facebook selecionámos algumas das fotos do seu álbum, para partilhar com os nossos leitores. (***)

___________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 11 de janeiro de  2022 > Guiné 61/74 - P22897: Tabanca Grande (529): Alberto Bastos (1948-2022), ex-alf mil op esp, CCAÇ 3399 / BCAÇ 3852 (Aldeia Formosa, 1971/73), natural de Vale Cambra, o primeiro grã-tabanqueiro do ano, o nº 856, embora infelizmente a título póstumo

(**) Vd. poste de 16 de março de 2024 >  Guiné 61/74 - P25277: Convívios (984): 55.º Almoço-convívio da Magnífica Tabanca da Linha, Algés, 14 de março de 2024 - Parte I

(***) 16 de fevereiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25175: Faceboook...ando (51): seleção do álbum fotográfico de Nicolau Esteves, o "brasileiro de Cinfães", ex-1º cabo radiotelegrafista, CCAÇ 797 (Tite, São João e Nhacra, 1965/67) - II (e última)

terça-feira, 29 de novembro de 2022

Guiné 61/74 - P23826: Humor de caserna (57): O anedotário da Spinolândia: "Porra, porra, lá iam lixando o Comandante-Chefe" (Gen Spínola, abril de 1972, quando o seu heli terá aterrado, por engano, numa clareira do mato, cercada de "turras", confundidos com comandos africanos)

Guiné > Algures > s/d (c. 1969) > O alf mil pil heli Al III Jorge Félix (BA 12, Bissalanca, 1968/70) e o gen Spínola (Com-Chefe e Governador Geral, CTIG, 1968/73)...  O Jorge Félix terá sido um dos pilotos de heli, com quem o general mais terá gostado de voar...   E com ele não nenhum susto como o de abril de 1972, uma história insólita contada neste poste...

Foto (e legenda): © Jorge Félix (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Capa do livro do Rui Alexandrino Ferreira, "Quebo: Nos confins da Guiné" (Coimbra, Palimage, 2014, 364 pp.).


1. Não sei se esta história é verdadeira ou não. Mas tenho que a  tomar como verídica, já que foi contada em primeira mão por um capitão do quadro, comandante da CCAÇ 3399/ BCAÇ 3852 (Aldeia Formosa, 1971/73), o cap inf Horácio José Gomes Teixeira Malheiro, que esteve na "periferia dos acontecimentos" (*).

Temos que admitir que, quando se falava das peripécias do gen Spínola,  no CTIG, muitas vezes se mistura(va)  ficção e realidade.  Daí esta história  vir "engrossar" a nossa série "Humor de caserna" e o "anedotário da Spinolândia" (**). A história do heli  é perfeitamente verosímil e desta vez o general (e os seus acompanhantes) terá apanhado um valente susto...

A história consta do livro do nosso já saudoso Rui Alexandrino Ferreira (1943-2022),  "Quebo: Nos confins da Guiné" (Coimbra, Palimage, 2014, 364 pp.), cuja capa se reproduz acima. 

Vamos reproduzir aqui um excerto do capítulo 10º ("O capitão de Aldeia Formosa, Horácio Malheiro"). É um depoimento do comandante da CCAÇ 3399 sobre a excelente articulação e cooperação, em operações, com o cap inf Rui Ferreira e os seus homens da CCAÇ 18 (pp. 179-196), não obstante os graves incidentes do Natal de 1971, rapidamente ultrapassados e esquecidos (*).

O cap inf Horácio Malheiro (não sabemos que posto tinha em 2014, aquando da publicação do livro, "Quebo"), dá vários exemplos de ações conjuntas que se traduziram em  "êxitos para o Batalhão" (pág. 191).

Uma delas, louvada de resto pelo gen Spínola, terá sido na sequência da Op Muralha Quimérica, em abril de 1972. "uma operação que visava evitar a entrada na Guiné de elementos da ONU que vinham verificar a existência de Zonas Libertadas onde o Exército Português não entrava e assim seriam reconhecidas internacionalmente como legítimas representantes dos Povos da Guiné" (pág. 192).

Decorreu durante 12 dias e envolveu forças  da CCAÇ 3399, CCAÇ 18, paraquedistas, comandos africanos e o Grupo Especial  do Marcelino da Mata. A operação teve como comandante, o ten cor paraquedista, Araújo e Sá, do BCP 12.


2. Um situação insólita em que o Com-Chefe se ia lixando...

por Horácio Malheiro

(...) Lembro-me de uma situação insólita que se passou nessa altura. Estava a minha Companhia de reserva em Aldeia Formosa quando recebo ordens urgentes  para embarcar nos helis, que  estavam estacionados  na pista,  e seria já no voo que teria conhecimento do destino  e missão.

Embarcámos de imediato e quando nos preparávamos  para descolar, soube nessa altura  que a missão era resgatar o general Spínola que presumivelmente teria sido aprisionado  pelo IN quando o seu heli  teria aterrado no meio de forças IN na altura confundidas com os Comandos Africanos.

Na altura da descolagem,  o meu piloto, comandante da  esquadrilha de helis, recebeu, via rádio, uma comunicação do heli do general Spínola informando que já vinha a caminho, pelo que apeámos s e aguardámos a sua chegada.

Quando chegou o heli do general, este saiu todo sujo de fuligem bem como o seu ajudante de campo, capitão Tomás, cujas mãos tremiam descontroladamente ao cumprimentar-me.

O general teve só um comentário ao desembarcar: "Porra, porra, lá iam lixando o Comandante-Chefe", e seguiu para a sede de Batalhão.

Já no bar,  em conversa, soube que o general tinha mandado aterrar o heli numa clareira da mata onde vislumbrou  militares africanos IN de camuflado que confundiu com os Comandos Africanos por terem adoptado no terreno um dispositivo de segurança à aterragem.

Quando aterrou e apeou,  foi recebido a tiro e todos se atiraram ao chão que tinha sido queimado e daí o terem ficado cheios de fuligem. Passado este instante de estupefacção, entraram a correr para o heli que descolou de imediato, debaixo de fogo IN,  que mal adivinhava  que tinha tido ao seu alcance o maior "ronco" da guerra da Guiné, que seria a captura ou abate do (...) Comandante-Chefe  [do Exército Português] " (pp. 192/193).

[Selecção / revisão e fixação de texto / parênteses retos, para efeitos de publicação deste poste: LG]

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 26 de novembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23817: In Memoriam (463): Rui Alexandrino Ferreira (1943-2022)... Um excerto do livro "Quebo" (2014): Recordando os tristes acontecimentos que ensombraram Aldeia Formosa, na noite de Consoada de 1971, "se não a pior, uma das mais trágicas da minha vida"

segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

Guiné 61/74 - P22916: Antologia (82): Mariema, mãe-mártir... [Poema de Alberto Bastos (1948-2022), ex-alf mil op esp, CCAÇ 3399 / BCAÇ 3852, Aldeia Formosa, 1971/73), poeta, dramaturgo, encenador e ator, natural de Vale de Cambra]


Alberto Bastos - “Bailam Flores: poemas”. Vale de Cambra: Câmara Municipal de Vale de Cambra, 1999. Capa de Joana Rodrigues.


Dedicatória do autor: "Ao meu 'irmão' Joaquim Pinto de Carvalho com amizade. (...)  99/11/17"


Dedicatória do autor no livro de teatro "A Máscara": "Ao meu velho camarada de armas, e meu atual e grande amigo,  Joaquim A. Pinto de Carvalho que muito, muito, me tem incentivado em tudo, mormente nas 'coisas' do teatro. Agradecido, o autor  (...)  15/11/2015"

Fotos (e legenda): © Joaquim Pinto Carvalho (2022). Todos os Direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




1. Mais um  tocante poema do Alberto Bastos (1948-2022), ex-alf mil op esp, CCAÇ 3399 / BCAÇ 3852, Aldeia Formosa, 1971/73, poeta e homem de teatro (dramaturgo, encenador e ator), natural de Vale de Cambra. 

Entrou para a Tabanca Grande a título póstumo (*). É o único representante da CCAÇ 3399.










Fonte: Excerto de Alberto Bastos - “Bailam Flores: poemas”. Vale de Cambra: Câmara Municipal de Vale de Cambra, 1999, il Honório Rodrigues e Joana Rodrigues, pp. 127/  128.

Seleção e digitalização: Joaquim Pinto Carvalho. (**)
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Notas do editor:


terça-feira, 11 de janeiro de 2022

Guiné 61/74 - P22897: Tabanca Grande (529): Alberto Bastos (1948-2022), ex-alf mil op esp, CCAÇ 3399 / BCAÇ 3852 (Aldeia Formosa, 1971/73), natural de Vale Cambra, o primeiro grã-tabanqueiro do ano, o nº 856, embora infelizmente a título póstumo

 

Foto nº 1 > Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa > CCS/BCAÇ 3852 (1971/73) >  De pé,  Manuel Gonçalves, alf mil manutenção (CCS); em 1º palano: da esquerda para a direita, Alberto Bastos,  alf mil op esp (CCAÇ 3399) e Carlos Santos, alf mil sapador (CCS)


Foto nº 2 > Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa > CCS/BCAÇ 3852 (1971/73) > Da esquerda para a direita: Mesquita, alf mil (Artilharia antiaérea); Rodrigues alf mil (C CAÇ 3399) Alberto Bastos, alf mil op esp (CCAÇ 3399(; Manuel Gonçalves alf mil manutenção (CCS) (em pé); e António Faria, alf mil cavalaria.


Foto nº 3 > Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa > CCS/BCAÇ 3852 (1971/73)

Da esquerda para a direita: Mesquita, alf mil (Artilharia antiaérea); Manuel Gonçalves, alf mil manutenção (CCS) (em pé); Rodrigues,  alf mil (CCAÇ 3399); Alberto Bastos, alf mil op esp (CCAÇ 3399); Trindade, alf mil médico (CCS) (em pé); e Carlos Santos, alf mil sapador (CCS).


Fotos (e legendas): © Manuel Gonçalves (2022). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Mafra > EPI > COM > 1970 > 3º Turno de Instrução > 6ª Companhia de Instrução > 4º Pelotão > O soldado-cadete  Alberto Tavares de Bastos, nº  127 (Imagem extraída da clássica fotografia de grupo. Cortesia de Joaquim Pinto Carvalho, que também pertenceu ao 4º Pelotão da 6ª Companhia)

Fotos (e legenda): © Joaquim Pinto Carvalho  (2022). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. O Alberto Bastos, ex-alf mil op esp, CCAÇ 3399 / BCAÇ 3852 (Aldeia Formosa, 1971/73), foi o primeiro camarada da Guiné, que saibamos, a morrer este ano, logo no primeiro dia do ano de 2022 (*).

Foi desde logo nossa intenção, em honra da sua memória, integrá-lo na Tabanca Grande, a título póstumo.  Acabámos de receber  fotos dele do seu do tempo da tropa e da guerra,  enviadas pelos seus camaradas e amigos Joaquim Pinto de  Carvalho e Manuel Gonçalves.

Será, por outro lado,  o primeiro representante da CCAÇ 3399 no Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. O seu lugar, à sombra do nosso poilão, será  o nº 856 (**) . E o seu nome passa a figurar na lista daqueles que "da lei da morte já se foram libertando" (Vd. badana do lado esquerdo do blogue, ou coluna estática).

Poeta  (e homem de teatro: dramaturgo, encenador, ator), com vários livros publicados, foi ele o autor da letra do hino do BCAÇ 3852, datada de 12/6/1971, e reproduzida no seu livro de poesia Alguém (Lisboa, Chiado Editora, 2008, pp. 125/126).

É também autor do poema "Na estrada do Cumbijã", dedicado ao cap mil Vasco da Gama, comandante da CCAV 8351 (Cumbijã, 1971/73), "Os Tigres do Cumbijã" (, já publicado no poste P3640), e reproduzido, a pp. 138/139, no recentíssimo livro do Joaquim Costa, "Memórias de Guerra de um Tigre Azul: O Furriel Pequenina (Guiné, 1972/74)". (Rio Tinto, Lugar da Palavra Editora, 2021.)

Deste batalhão, o BCAÇ 3852,  temos vários camaradas registados na Tabanca Grande:

  • Joaquim Pinto Carvalho,ex-alf mil at inf, CCAÇ 3398 (Buba) e CCAÇ 6 (Bedanda) (1971/73) (nº 633)
  • Manuel Carmelita (ex-fur mil mecânico radiomontador, CCS/BCAÇ 3852, Aldeia Formosa, 1971/73) 
  • Manuel Gonçalves, ex-alf mil mec auto, CCS/BCAÇ 3852 (Aldeia Formosa, 1971/73) (nº 776);
  • Silvério Lobo, ex-sold mec auto, CCS/BCAÇ 3852, Aldeia Formosa e Buba, 1971/73

Da CCAV 8351, além do Vasco da Gama, temos também o Joaquim Costa (, imagem à esquerda), que todavia não privou com o Alberto Bastos, mas que escreveu no poste P22878 (*), surpreendido pela notícia da sua morte repentino, o seguinte comentário:


(...) "Fomos contemporâneos e pisamos o mesmo chão minado da estrada Mampatá-Cumbijâ. Nunca privei com ele mas era muito conhecido na região. No Cumbijã era conhecido por Poeta.

Vivíamos isolados no nosso buraco, pelo que só nos cruzávamos com camaradas de outras companhias em operações de risco onde apenas trocava-mos algumas palavras de circunstância.

"O poema que dedicou ao Cap Vasco da Gama, para além de pôr em evidência as suas qualidades literárias , mostra um homem atento ao que o rodeia, amigo e fundamentalmente solidário.

"O meu singelo livro de memórias é pequeno para a grandeza do poema que dedicou à CCav 8351 e ao seu Capitão. Como alguém já referiu: Um Poeta não morre.

Joaquim Costa. (5/1/2022)" (...)

O Joaquim Pinto de Carvalho (, imagem  à direita), que o conhecia bem desde o COM em Mafra, e na Guiné pertenceu ao mesmo batalhão, tendo ambos ficado amigos para a vida, fez-lhe o restrato físico e psicológico nestes versos (que constam da contracapa do livro de poesia Alguém, Chiado Editora, Lisboa, 2008);

(...) “Tem a fúria do viver no olhar, como um vulcão,
mas no verbo a leveza da corrente
genuína!

Tem nos gestos a garra e o voo do falcão
e a volúpia da serpente
que nos fascina!” (...)

quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

Guiné 61/74 - P22879: Fichas de unidades (23): BCAÇ 3852 (Aldeia Formosa, 1971/73), CCAÇ 3398 (Buba), CCAÇ 3399 (Aldeia Formosa), CCAÇ 3400 (Nhala)

 

Guião do BCAÇ 3852 (Aldeia Formosa, 1971/73) (Há um erro de impressão no canto superior esquerdo: CCC em vez de BCAC). Imagem da preciosa coleção do incontornável Carlos Coutinho, grande parte da qual está disponível no portal UTW, Dos Veteranos da Guerra do Ultramar. (Com a devida vénia...)

Batalhão de Caçadores nº 3852

Identificação: BCaç 3852

Unidade Mob: BC 10 - Chaves

Cmdt: TCor Inf António Afonso Fernandes Barata | TCor Inf José Fernando de Oliveira Barros Basto | 

2º Cmdt: Maj Inf José Fernando de Oliveira Barros Basto | Maj lnf Raul Pereira da Cruz Silva

OInfOp/Adj: Maj Inf Raul Pereira da Cruz Silva (acumulava)

Cmdts Comp: CCS: Cap SGE Augusto Ferreira | CCaç 3398: Cap Inf Filipe Ferreira Lopes | CCaç 3399: Cap Inf Horácio José Gomes Teixeira Malheiro | CCaç 3400: Cap Inf Gastão Manuel Santos Correia e Silva | Cap Mil Inf Manuel de Sousa Moreira

Divisa: "Viver-Lutar- Vencer"

Partida: Embarque em 26Jun71; desembarque em 2Jul71 | Regresso: Embarque em 1Set73 (CCaç 3398), 2Set73 (CCaç 3399), 6Set73 (Cmd e CCS) e 8Set73 (CCaç 3400)

Síntese da Actividade Operacional

Após realização da IAO, de 5 a 31Ju171, no CIM, em Cumeré, seguiu com as suas subunidades para a região de Aldeia Formosa em 01 e 2Ago71, a fim de efectuar o treino operacional e sobreposição com o BCaç 2892.

Em 26Ago71, assumiu a responsabilidade do Sector S2, com sede em Aldeia Formosa e abrangendo os subsectores de Empada, Mampatá, Buba, Nhala e Aldeia Formosa. 

De 14Jun72 a 8Dez72, a área da península do Cubisseco foi atribuída ao CDMG  [Comando de Defesa Marítima da Guiné] para actuação operacional das suas forças.

Em 22Jan73, o subsector de Empada foi transferido para a zona de acção do BCaç 4510/72. 

De 13Mai73 a 26Jun73, foi reforçado pelo BCaç 4513/72 e suas subunidades, com vistas à intensificação do esforço de contrapenetração no sector. 

A partir de 27Jun73 até 10Ago73, a área de Cumbijã-Colibuia-Nhacobá foi atribuída temporariamente ao BCaç 4513/72. 

As suas subunidades mantiveram-se sempre integradas no dispositivo e manobra do batalhão.

Com as subunidades que lhe foram atribuídas na sua zona de acção, desenvolveu intensa actividade operacional de patrulhamento, reconhecimento e de vigilância e controlo da fronteira e das linhas de infiltração do inimigo, particularmente do corredor de Missirá e das passagens do rio Grande de Buba.

Impulsionou e coordenou a execução dos trabalhos de realojamentos das populações recuperadas e da sua promoção socioeconómica, em particular em Colibuía e Afiá, garantindo ainda a segurança, protecção e apoio da construção e reparação dos itinerários logísticos, com especial destaque para as reacções a fortes e frequentes flagelações a aquartelamentos e aldeamentos situados junto da fronteira.

Dentre o material capturado mais significativo, salienta-se: 1 morteiro, 1 metralhadora ligeira, 4 pistolas-metralhadoras, 6 espingardas, 2 lança-granadas foguete, 172 granadas de armas pesadas e a detecção e levantamento de 34 minas.

Em 10Ago73, foi rendido no Sector S2 pelo BCaç 4513/72 e recolheu, em 14Ago73, a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

***

A CCaç 3398, após o treino operacional e a sobreposição com a CCaç 2616 desde 1Ago71, assumiu a responsabilidade do subsector de Buba em 26Ago71.

Em 15Ago73, foi rendida pela 1ª Comp/BCaç 4513/72 e recolheu, em 19Ago73, a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

***

A CCaç 3399, após treino operacional e sobreposição com a CCaç 2614 desde 1Ago71, assumiu a responsabilidade do subsector de Aldeia Formosa em 26Ago71.

Em 13Ago73, foi rendida pela 3.ª Comp/BCaç 4513/72 e recolheu, em 15Ago73, a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

***

A CCaç 3400, após treino operacional e sobreposição com a CCaç 2615 desde 03Ago71, assumiu a responsabilidade do subsector de Nhala em 26Ago71, tendo destacado pelotões para reforço das guarnições locais de Buba, de finais de Set72 a finais de Nov72, de Mampatá, de finais de Jan73 a meados de Jun73 e de Colibuia, a partir de meados de Jun73.

Em 18Ago73, foi rendida pela 2.ª Comp/BCaç 4513/72, seguindo para Buba e no dia seguinte para Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

Observações: Tem História da Unidade (Caixa n.º  94 - 2.ª Div/4.ª Sec, do AHM).

Fonte: Excertos de: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 7.º Volume - Fichas das Unidades: Tomo II - Guiné - 1.ª edição, Lisboa, Estado Maior do Exército, 2002, pp. 155/156.

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Nota do editor:

Último poste da série > 30 de novembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22766: Fichas de unidades (22): CCAÇ 4541/72 (Caboxanque, Jemberém, Cadique, Cufar e Safim, 1972/74)

segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

Guiné 61/74 - P21779: Notas de leitura (1334): As Grandes Operações da Guerra Colonial, a Guiné, 1972 a 1974, por Manuel Catarino (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 21 de Maio de 2018:

Queridos amigos,
O mérito da iniciativa é indiscutível, estes fascículos venderam-se pelo país todo, pode muito bem ter acontecido que os mais jovens tiveram pela primeira vez acesso a imagens da nossa guerra. Houve muito trabalho a angariar os dados, o que se lastima é que a sua apresentação tem tais e tantos ziguezagues que o não iniciado forçosamente anda para ali a dar braçadas em seco, lê-se e o que fica é um produto final difuso, com muitos tiros, mortes e feridos.

Um abraço do
Mário


As Grandes Operações da Guerra Colonial, a Guiné, 1972 a 1974

Beja Santos

Publicada sob a forma de fascículos, em duas séries, os textos de Manuel Catarino contemplaram por diversas vezes a guerra da Guiné. O número 8, a que aqui se faz alusão, inclui na primeira parte uma série de operações (Muralha Quimérica, 1972, Lince Azul, Palanca, Tigre Poderoso e Gato Espantado, 1973) e na segunda parte a viagem de Spínola ao Senegal e o terror dos mísseis.

Há a lamentar que nem sempre as imagens ilustrativas são as mais adequadas para os acontecimentos versados. No caso da operação Muralha Quimérica, foi uma ação militar de envergadura numa zona compreendida entre Ural e Guileje, e que decorreu de 28 de março a 8 de abril de 1972, ao tempo da visita de uma delegação da ONU a outro ponto da região Sul, temos de facto um mapa mas as demais ilustrações nada abonam sobre a operação.

Spínola estava informado da visita da delegação da ONU e pretendeu estragar a festa, contrariando a ideia (comum nos fóruns internacionais) de que a guerrilha controlava a maior parte da Guiné. Três companhias do batalhão de paraquedistas, duas companhias de comandos africanos, a CCAÇ 18, a CCAÇ 3399, a CCAÇ 3477 e um grupo do Centro de Operações Especiais, cerca de 500 homens, organizados em 14 agrupamentos operacionais sob o comando do Tenente-coronel Araújo e Sá. Foi apreendido muito material, houve mortos e feridos de parte a parte, mas a operação foi considerada um êxito.

José Tavares, do Destacamento de Fuzileiros Especial 4, descreve a sua vida em Ganturé (“Não havia lá nada. Fomos nós que construímos o aquartelamento, numa das margens do rio Cacheu, a cerca de 5 quilómetros de Bigene”). Descreve o inferno de Guidage (“A nossa sorte piorou quando ficámos sem comunicações. A minha família pensava que eu tinha morrido. Não morri porque não calhou. Em Guidage já não tínhamos para comer. Sobrevivemos com carne de crocodilo”).

A obra colhe o depoimento do nosso confrade Eduardo Magalhães Ribeiro sobre o último arrear da bandeira portuguesa. Creio haver ali um lapso tratando a viúva de Amílcar Cabral por Luísa Cabral, a viúva chama-se Ana Maria Cabral. 

O episódio seguinte que merece destaque ao autor é a reconquista do Cantanhez, entre dezembro de 1972 e junho de 1973 foram executadas no Sul da Guiné, com especial incidência nas zonas de Cacine, Gadamael e Guileje uma série de ações (com os nomes ‘Lince Azul’, ‘Palanca’ e ‘Gato Espantado’), o objetivo era desarticular e criar forte instabilidade na guerrilha, todas estas ações faziam parte de uma manobra mais alargada designada por Operação Tigre Poderoso. 

Na essência, Spínola estava determinado a transferir para o Sul o principal esforço de guerra na Guiné, seria uma reconquista que tinha como objetivo fazer do rio Cacine a principal linha de defesa do Sul da Província. 

Como observa o autor, era absolutamente necessário que as forças portuguesas ocupassem a Península do Cantanhez, onde instalariam novos quartéis que servissem de apoio aos aquartelamentos de Cacine, Guileje e Gadamael. Foi posta em marcha a Operação Grande Empresa e envolveu-se um formidável contingente. Ao mesmo tempo que se desenvolvia ação militar (na qual participaram duas companhias do batalhão de paraquedistas, dois destacamentos de fuzileiros especiais e um conjunto de unidades de infantaria, cavalaria e artilharia), um outro conjunto de unidades ocupava fisicamente o território. O nosso confrade Vasco da Gama já aqui contou ao detalhe este esforço impressionante.

O fascículo dá permanentemente saltos, é interpolado por depoimentos, chega-se agora à Operação Neve Gelada, que aqui é relatada pelo Coronel Raul Folques, Comandante do Batalhão de Comandos Africanos. Cai imprevistamente no documento uma cronologia de acontecimentos em 1974 e uma análise do que representou a publicação do livro “Portugal e o Futuro”, de Spínola.

A segunda parte retoma de novo o livro que abalou o regime e segue-se a descrição do encontro de Spínola com Senghor, em 18 de maio de 1972, que se realizou em Cabo Skirring, no Senegal, a história é bem conhecida, pelo meio temos o assassinato de Amílcar Cabral, a zanga entre Marcelo Caetano e Spínola. 

E assim se chega ao terror dos mísseis, regista-se a lista dos aviões abatidos pelos mísseis Strela, Spínola descreve a situação como crítica, episódio que está igualmente bem descrito nas páginas do blogue. Salta-se de novo para a reocupação da Península do Cantanhez, vem referência a um nome que nos é muito comum, o então Major Moura Calheiros, Chefe da Secção de Informações e Operações do Batalhão de Caçadores Paraquedistas que tinha referenciado a posição do mais importante quartel do PAIGC na região: 

“A posição inimiga, sensivelmente entre Guileje e Bedanda, foi localizada durante um voo de reconhecimento pelo Capitão Morais e Silva. O êxito da Operação Grande Empresa dependia da capacidade portuguesa para atacar e destruir o quartel da guerrilha”

Três foram as tentativas de assalto, o Capitão Valente dos Santos, ferido na primeira tentativa, recusa a abandonar os seus homens, só à terceira tentativa é que o Oficial aceita ser evacuado. 

“O Chefe de Operações do Batalhão de Paraquedistas, Moura Calheiros, que durante os combates esteve sempre no ar a bordo de um DO-27, respira de alívio. Pode dar início à segunda fase da Operação – a ocupação de Caboxanque, Cadique e Cafine, na margem sul do rio Cumbijá, por paraquedistas e fuzileiros especiais”.

Não se pode minimizar um trabalho de que resulta sempre apreço ao dever de memória. Tem-se, porém, dúvidas sobre a eficácia destes documentos esparsos e onde o pendor cronológico não é consistente, há documentação repetitiva e erros arreliantes que teriam sido evitados em casos de revisão técnica. Mas não se pode deixar de saudar a enorme difusão que o trabalho teve por todo o país.
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Nota do editor

Último poste da série de 11 de janeiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21758: Notas de leitura (1333): “De Lisboa a La Lys, O Corpo Expedicionário Português na Primeira Guerra Mundial”, por Filipe Ribeiro de Meneses, Publicações Dom Quixote, 2018 (Mário Beja Santos)

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Guiné 63/74 - P15116: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (20): De 5 a 21 de Agosto de 1973

1. Em mensagem do dia 12 de Setembro de 2015, o nosso camarada António Murta, ex-Alf Mil Inf.ª Minas e Armadilhas da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74), enviou-nos a 20.ª página do seu Caderno de Memórias.


CADERNO DE MEMÓRIAS
A. MURTA – GUINÉ, 1973-74 

20 - De 5 a 21 de Agosto de 1973


Da História da Unidade do BCAÇ 4513:

AGO73/05 – Durante a Op. “OUSADIA SATÂNICA”, na região (GUILEGE 3 E 8-93) foi detectado GR IN NEST (grupo inimigo não estimado) progredindo no sentido S/N que ao aperceber-se da presença das NT, após breves disparos, se pôs em fuga, não tendo resultado a perseguição que lhe foi movida. Dada a ausência absoluta de guias para a região do UNAL era fundamental conseguir-se capturar algum elemento IN que pudesse servir de guia. Chuvas intensas e constantes prejudicaram toda esta acção.

AGO73/06 – No prosseguimento da Op. “OUSADIA SATÂNICA”, surgiram alguns casos de doença entre as NT (paludismo, esgotamento, etc.) que obrigaram a fazer regressar uma das CCAÇ até BOLOLA para promover as evacuações. Três horas depois novos casos de doença surgiram e dada a impossibilidade de prosseguir a operação, por o objectivo ainda estar muito distante, não haver guias, se ter perdido o trilho e as NT se encontrarem esgotadas pelo esforço e pelas chuvas que continuam a cair insistentemente, foi determinado o regresso das forças a BUBA. [Sublinhados meus].

AGO73/07 – As forças empenhadas na Op. “OUSADIA SATÂNICA” foram autotransportadas para os respectivos aquartelamentos.


Do Resumo dos Factos e Feitos do BCAÇ 4513: [Tudo em maiúsculas no original]

D – Por determinação do CCFA o BCAÇ 3852 que já havia terminado a comissão, desloca-se para BISSAU a fim de embarcar para a Metrópole. O BCAÇ 4513/72 assume a responsabilidade do Sector S-2, com as suas companhias sediadas em A. FORMOSA, BUBA e NHALA, além de duas companhias de reforço sediadas respectivamente em MAMPATÁ e CUMBIJÃ. É durante este período que chega ao sector o BCAÇ 4516, que substitui na missão de intervenção na área de CUMBIJÃ-NHACOBÁ o BCAÇ 4513/72. A missão do Batalhão agora de quadrícula, abrange todo o Sector S-2, com excepção da subsector de CUMBIJÃ atribuída ao BCAÇ 4516.


Das minhas memórias:

7 de Agosto de 1973 – (terça-feira) – O regresso a “casa”. 

Era o tão aguardado regresso a casa: Nhala, finalmente. Ainda que quase todos combalidos, ainda que com um futuro de muito esforço pela frente, ainda que sujeitos a actividades de risco, nada importava, se pudéssemos sempre regressar a casa. Por poucos dias ainda estaríamos em sobreposição com a CCAÇ 3400 do BCAÇ 3852 que viemos render, mas depois tudo ficaria por nossa conta. Era uma sensação indescritível, que nos incutia confiança e optimismo. Quando cheguei a Nhala vi que a cobertura da minha palhota-estúdio/fotográfico tinha sido arrancada em parte, por maldade de um macaquinho domesticado pela população (segundo me disseram). Em plena época das chuvas o efeito no material e nos equipamentos foi devastador e definitivo. O que numa situação normal me causaria profunda tristeza, naquelas circunstâncias somente me deu pena. Às urtigas o “estúdio”! O importante era que tinha regressado a casa.

Às 00h01 do dia 10, (preciosismo da tropa), o Sector S-2 passou para a responsabilidade do BCAÇ 4513. Era como se nos houvessem devolvido os territórios que tinham sido sempre nossos. Para os protegermos, protegendo-nos a nós, ainda teríamos muitas canseiras mas, no final regressaríamos a casa. Já não era sem tempo: tínhamos chegado ali em Abril e só então, já entrados em Agosto, parecia termos destino definitivo. Havia que limpar os lustres e os espelhos, mudar os cantos à casa, arejar e sermos felizes. Patacoadas... No resto dos dias nem sempre foi assim.

Carta para a Metrópole:

Com data de 10 de Agosto, em carta para a namorada, depois de pedir desculpa pela longa ausência de correspondência e como que a justificar essa ausência, dou nota de detalhes das operações atrás referidas a caminho do Unal, que se me haviam apagado completamente da memória, mas também do meu optimismo em relação ao regresso a Nhala. (...).

”Estou há três dias em Nhala e, desta vez, creio que será definitiva a minha estadia aqui, a menos que, novamente surjam alterações imprevistas. Estou a recompor-me lindamente dos efeitos causados por estes últimos tempos. [Sobre a ida ao Unal]: Houve uma altura em que se supôs que já lá não iríamos, até que o Comandante do Batalhão foi a Bissau falar com o Spínola para que ele autorizasse o nosso regresso aos locais que nos tinham distribuído ao princípio, ou seja, a minha Companhia vinha para Nhala, e as outras iriam para os respectivos sítios, enquanto Cumbijã e Nhacobá seriam ocupados pelo Batalhão novo que está a chegar. O General autorizou os nossos regressos, mas pouco depois impôs como condição a nossa ida ao Unal. [Não tenho a menor ideia desta informação].
(...) Todas as companhias estão desfalcadas de pessoal por doença e, o meu grupo, por exemplo, tinha passado de 21 para 7 homens apenas.
(...) [Sobre a primeira operação, “Ousadia”]. Saída no dia 1 do destacamento de Cumbijã para o mato. Algumas horas a andar à chuva e dormida no mato. Noite perturbada pelo ruído de barcos a motor no estreitíssimo rio que teríamos que atravessar, mas não podemos denunciar a nossa presença. Partida de manhã (cerca de 250 homens). Depois de algum tempo a andar, caímos numa emboscada junto ao tal rio.
(...)  [Depois do regresso a Cumbijã], descansámos o resto do dia mas, no dia seguinte, fazem-nos sair em viaturas até Buba, onde também descansámos o resto do dia. Nessa altura eu já não aguentava mais e resolvi não alinhar no dia seguinte. [Inicia-se a operação “Ousadia Satânica”].
(...) Chegaram a pouco mais de meio caminho e houve novo contacto com os turras, quando os nossos surpreenderam uma enorme coluna apeada de carregadores, fortemente defendida por militares. Houve “festa rija” e o pessoal prosseguiu, chegando a andar cerca de 30 km. Como já tinham dormido no mato duas noites, e já se tinham acabado as rações de combate, além de andarem já com mais doentes nas macas, resolveram regressar. [A seguir faço comentários a uma reportagem passada aqui na televisão sobre a inauguração – não sei de quê -, feita pelo Ministro do Ultramar na Guiné. Ao cenário montado para a cerimónia, chamo-lhe uma fantochada que envolveu cerca de 3000 homens (não visíveis) na protecção e que, ainda assim, na véspera, entre eles houve um soldado pára-quedista morto e vários feridos].

[Acabo a carta dizendo que eram 24 horas e estava a escrever ao livre, de vez em quando sobressaltado por disparos na cercadura do aquartelamento].

“(...) É que os rapazes que estão de vigia nos postos são da Companhia “velhinha” que nós viemos render e, como daqui a 6 dias vão embora por terem terminado a comissão, estão excitadíssimos e não param de dar tiros”.


Da História da Unidade do BCAÇ 4513:

AGO73/08Regressou a CUFAR o Exmo. Coronel CURADO LEITÃO, Comandante do CAOP-1. que fizera PC (Posto de Comando) em A. FORMOSA durante a Op. “OUSADIA” e Op. “OUSADIA SATÂNICA”. [Sublinhados meus].

AGO73/09 – (...)

AGO73/10 – A partir das 00.01 o Sector S-2 passou à responsabilidade do BCAÇ 4513.

AGO73/12 – Em 121315AGO73, GR IN estimado em 40 elementos foi interceptado por forças da 1.ª CCAÇ na região (XITOLE 2 F 0-20). O IN reagiu com armas automáticas e RPG sem consequências para as NT. O IN sofreu 3 ou 4 feridos a avaliar pelos rastos de sangue. Foram capturados 3 elementos da população, um dos quais DEMBA DJASSI, de 17 anos, aluno da ESCOLA PREPARATÓRIA MARECHAL CARMONA DE BISSAU, confessou estar voluntariamente com o GR IN. Foram todos enviados à REPINFO/CCHEFE. Foram apreendidas 2 GR/RPG ao IN.

AGO73/14 – Deslocamento para Buba do Comando e CCS/BCAÇ 3852 e CCAÇ 3399.

AGO73/15Chegada ao Cumbijã do 1.º escalão do BCAÇ 4516, constituído pela sua 1.ª CCAÇ.


Das minhas memórias: 

15 de Agosto de 1973 – (quarta-feira) – Os que partem e os que chegam.

Começou o movimento extraordinário de colunas auto entre A. Formosa/Buba/A. Formosa. De saída, passou no dia anterior para Buba parte do BCAÇ 3852. Deviam ir felizes, imagino, mas exauridos por uma comissão muito prolongada para além do tempo normal. Nesta data (15), passaria no sentido Buba/A. Formosa a 1.ª CCAÇ do novo batalhão (BCAÇ 4516) com destino ao Cumbijã. Fui com o meu grupo fazer a protecção à coluna na picada Nhala/Mampatá. Saímos cedo e instalámo-nos perto de Samba-Sabali, creio, sob uma chuva gelada. Gelada, mas pior que todas as outras que antes nos flagelaram. (Seguem-se umas fotografias de um dia assim, mas no aquartelamento de Nhala, submetido a verdadeiro dilúvio).

Foto 1 - Aproximação do dilúvio. Cada um foge como pode.

Foto 2 - Começa o dilúvio. Seria assim também para quem estivesse no mato.

Foto 3 - Fotografia na direcção da luz, que era cada vez menos embora se estivesse a meio da tarde.

Foto 4 - Fotografia feita para o lado oposto, que era a saída para a fonte. Parecia noite.

Voltando à mata de Samba-Sabali. Foi uma espera longa e martirizante e, apesar de estarmos habituados à chuva, nunca antes tínhamos passado tanto frio. Recordo bem que tive de sair da mata para ficar na picada em pé, de braços e pernas abertos, por não suportar o contacto da roupa gelada com a pele. E foram horas assim. Num aerograma para a Metrópole refiro que estava um céu de chumbo, dia escuro, e de chuva tão prolongada e fria que, apesar de serem 15 horas, tinha as mãos azuis.

Só mais tarde e com menos chuva, passou então a coluna. Como era hábito, o meu pelotão estava invisível na mata e eu junto à picada a dar sinal da nossa presença e de que tudo estava bem.

Fiquei a ver passar aqueles rostos assustados, ainda sem saberem que iam para o inferno. Às tantas, entre todos aqueles soldados anónimos, reconheci um e tive um “baque”. Fitei-o sempre até perder de vista a sua viatura e, julgo, ele também me reconheceu. Era o Manel. O Manel era um rapazinho do interior, - Beiras ou Norte -, do nosso querido Portugal que, como tantos outros, era analfabeto. Isto nos anos 1972/73 do século XX e em plena Europa Ocidental, etc., etc. (Tinha acrescentado mais uma notas mas nem as transcrevo, porque se o tema já na época me era insuportável, ainda hoje me deixa furibundo. Podem-me vir falar do colégio de Bissau, de Luanda ou de Lourenço Marques, para as elites já se vê, mas neste rectângulo de 1 por 2 metros, fora das grandes cidades e do litoral, poucos completavam a instrução primária. Era o atraso, a miséria e o desamparo que imperavam. Sei do que falo, pois fiz a minha instrução primária por várias escolas do Norte e do Centro e fiquei marcado por tanta miséria que vi. Cheguei a ir descalço sobre a neve para a escola da Praia de Esmoriz, (1961-62), quase 2 km, em solidariedade com os desgraçados dos meus companheiros que era assim que andavam sempre. Fi-lo à revelia dos meus pais que achavam que eu não resolveria nada com a solidariedade. Mas fi-lo, e depois ainda tinha de dar parte do meu pão com marmelada quando na escola enxameavam a pedir uma “bucha”. Mais a Norte, do concelho de Paredes, nem quero falar).

Voltando ao Manel: era um analfabeto especial, não sendo único. Só sabia que era Manel, não sabia a data de nascimento, não sabia dizer de onde era, tão só o lugarejo onde nascera, não sabia para que lado era o Porto, Lisboa ou o mar. Não sendo doente mental, era tão primário e básico que o seu intelecto não devia ser superior ao de uma criança de menos de dez anos (dessa época). Para saber mais dele, pedi ajuda aos seus novos companheiros na tropa que me explicaram tudo, enquanto ele, com um sorriso de menino, se limitou a ouvir sem abrir a boca. Eram os seus amigos que o traziam no comboio para Tomar e, no sentido inverso, o deixavam na estação mais próxima do seu lugarejo, bem como lhe resolviam todos os pequenos problemas que se lhe deparavam na sua nova vida.

Quando formámos batalhão em Tomar e eu dei a formação de Especialidade ao que seria o meu pelotão, ele integrava-o como muitos outros analfabetos. (Em Nhala cheguei a ter uma classe de alunos que começaram pelo ABC e outros para fazerem a 4.ª classe). Salvo erro, dei como inaptos três soldados nessa Especialidade de Tomar, ele obviamente incluído, não sem alguma resistência dos superiores que viam escassear os homens que, para canhão, serviam perfeitamente. A minha ideia era safá-los da Guiné, nessa altura com a pior reputação em termos de guerra, e quando se dizia que os próximos batalhões iriam para Angola e Moçambique. Agora constato que, com as boas intenções, apenas prolonguei em muitos meses o seu tempo de tropa. Não recordo se tive oportunidade de o procurar após a instalação em Cumbijã.

O novo batalhão, agora a chegar, foi flagelado em Bolama com 8 foguetões. Houve 6 mortos e 15 feridos, quase todos da população. O meu batalhão escapou à regra, porque houve flagelações antes e depois de te termos lá estado.


Da História da Unidade do BCAÇ 4513: 

AGO73/17 – Em 172230AGO73, GR IN NEST dinamitou a estrada MAMPATÁ-COLIBUIA, numa extensão de 40 metros na região (GUILEGE 4 G 6-21) local situado entre os dois pontões destruídos anteriormente. NT reagiram com fogo de artilharia e morteiro.

AGO73/18A CCAÇ 3400 foi deslocada para BUBA, para seguir para BISSAU. [De Buba partiu, juntamente com a CCAÇ 3398, em LDG para Bissau no dia 19 e, para a Metrópole, em 8 de Setembro. (Da H. da U. do BCAÇ 3852)].

[Finalmente iria abandonar a minha palhota e passar a dispor de instalações boas e quase novas. Passaria a dormir numa cama de madeira, ter casa-de-banho, tudo paredes meias com a messe e o bar. O que é que se poderia querer mais? Sorte...].

AGO73/19 – Apresentou-se em A. FORMOSA vindo de BISSAU no NORDATLAS o novo Comandante do Batalhão – TEN COR INF.ª C. A. S. R.
- Chegaram a A.FORMOSA, vindos de BUBA o Comando e CCS/BCAÇ 4516 e a sua 2.ª CCAÇ.
- Em 191500AGO73, forças da CART 6250, quando procediam ao levantamento de minas NT na região (XITOLE 4G 7-22) encontraram cerca de 30 cargas trotil em petardos de 200gr, abandonados pelo IN aquando da sabotagem da estrada em 172230AGO73.

AGO73/20 – (...)

AGO73/21 – Comandante do Batalhão deslocou-se a NHALA e BUBA.
- Chegou de BUBA a 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4516.
- Em 211815AGO73 GR IN NEST flagelou durante 25 minutos o destacamento de CUMBIJÃ da direcção de NHACOBÁ com cerca de 40 GR CAN S/R 82 da região (GUILEGE 6 A 2-34) e 30 GR MORT 82 da região (GUILEGE 6 A 7-54) causando 1 morto e 3 feridos ligeiros às NT. NT reagiram com fogo de Artª e Mort. [Sublinhei a negrito].


Das minhas memórias: 

21 de Agosto de 1973 – (terça-feira) – Grande flagelação a Cumbijã).

Apenas chegados há quatro meses ao Sector e parecia já ter decorrido uma vida, tal a intensidade com que se viveu esse curto período de tempo. Este dia não fugiu à regra. Em Nhala recebemos o novo Comandante do Batalhão, a quem foi apresentado o pessoal e mostradas as instalações. Pessoa simpática e acessível, no final deixou-se fotografar com alguns dos graduados presentes.

Foto 5 - O novo Comandante do Batalhão Ten Cor C. A. S. R. ao centro com o Comandante da Companhia Cap. B. C. e um grupo de alguns graduados. Eu sou o primeiro da direita à frente. (Fotografia adquirida em Nhala)

Não era sem tempo a sua vinda para o Batalhão, substituindo o Comandante Interino Major D. M. sobre quem, até à data, tinha pendido toda a responsabilidade dos atribulados meses antecedentes.

Chegou de Buba com destino ao inverosímil aquartelamento de Nhacobá a 3.ª CCAÇ do novo BCAÇ 4516. Nem quero pensar no choque que deve ter sido para estes “periquitos”.

Cumbijã foi mais uma vez flagelada mas, agora, com uma brutalidade inusitada, havendo um morto a registar e vários feridos. Mereciam melhor sorte, estes infaustos valentes. Em carta de 23-08-1973 para a Metrópole, dou conta de mais este duro golpe para a CCAV 8351 de Cumbijã, e refiro ter sofrido um morto a Companhia do Cap. Vasco da Gama que ainda devia estar na Metrópole de férias. Dos feridos, um em estado grave, digo que pertenciam à nova Companhia ali instalada há uns dias apenas, (1.ª CCAÇ do BCAÇ 4516). (...).

Este ataque certeiro a Cumbijã, sempre o supus, devia ter sido o resultado do aperfeiçoamento, ao longo das anteriores flagelações, dos militares de IOL (Informação, Observação e Ligação) do PAIGC formados na ex-URSS. Isto sabia-se mas faltavam elementos que o confirmassem. Dizia-se que conseguiam pôr uma granada de canhão dentro do espaldão dos nossos obuses. Só precisavam de um bom ponto de observação próximo do alvo. Certo dia, no regresso do mato com o meu grupo vi, acima das copas altas das árvores, uma palmeira que sobressaía em altura das demais e que tinha algo de diferente que, de longe, parecia um serrote vertical. Andámos às voltas até chegar junto dela e, nunca visto, tínhamos à nossa frente um tronco enorme com degraus desde o chão até ao topo. Eram travessas de madeira pregadas ao tronco pelo centro, fazendo um “degrau” para cada lado. Isto aconteceu nas imediações de Cumbijã. Era, de certeza, um posto IOL. Já não recordo mas, devo ter destruído o escadório ou registado a sua posição para a comunicar ao Comandante de Companhia.

Resumindo este 21 de Agosto, diria que foi muito marcante para todos: para nós do BCAÇ 4513 porque, várias vezes flagelados em Cumbijã sem consequências, pensámos então com alívio, mas sem gáudio, obviamente, que sorte tivemos de já não estarmos lá; para os “periquitos” do novo Batalhão porque, mal chegados, apanharam um susto que os deve ter deixado em pânico e a maldizer a sorte; e para a CCAV 8351 que, repito, tem sido martirizada no seu próprio aquartelamento, para não falar das acções espinhosas em que esteve envolvida. Aproveito para, a todos esses bravos Tigres do Cumbijã, render a minha sincera homenagem: aos seus mortos e aos que resistiram e ainda resistem.

(continua)
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Nota do editor

Poste anterior da série de 8 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15087: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (19): De 26 de Julho a 4 de Agosto de 1973

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Guiné 63/74 - P3640: A história dos Tigres de Cumbijã, contada pelo ex-Cap Mil Vasco da Gama (4): 1973, Ano Novo... Vida Velha

1. Mensagem de Vasco da Gama, ex-Cap Mil da CCAV 8351, Cumbijã, 1972/74, com data de 11 de Dezembro de 2008, com mais um episódio da História dos Tigres (*).

Ano novo… Vida velha

Janeiro de 1973 inicia-se porco, feio, violento, e o primeiro aviso de que a Guiné era a sério acontece-nos a 10 de Janeiro.

Um dos nossos Grupos de Combate fazia patrulhamento em IEROIEL - SAMBA SEIDI - Rio Nafa, portanto na zona de Aldeia para a fronteira, quando o quarto elemento da coluna accionou uma mina antipessoal.

Contactado o quartel de Aldeia, logo saí a comandar um Pelotão reforçado, com a colaboração de um guia, e rapidamente chegámos ao local. Tomadas as devidas precauções, evacuei de imediato o ferido grave, de seu nome Francisco da Silva Ribeiro Mota, para Aldeia Formosa, de onde foi transportado para Bissau e, mais tarde, ainda no decurso do mês de Janeiro para Portugal. Fizemos o reconhecimento da zona e constatámos vinte e cinco abrigos bem cavados situados a cinco metros do trilho minado. Picámos cuidadosamente todo o trilho e encontrámos e levantámos duas minas anti-pessoais. Segundo o guia que me acompanhou e com quem tanto aprendi numa aula prática forçada, teria estado preparada uma emboscada por um grupo que havia abandonado o local cerca de duas horas antes, seguindo na direcção do rio Habi e flectindo depois para o sul.

Uma nota de apreço e louvor aos nossos guias

Uma pequena nota, para mim de importância fundamental, no sentido de elogiar o papel dos guias que comigo trabalharam, verdadeiros mestres de caminhar no mato e com um sentido de orientação apuradíssimo, sempre atentos a indícios que passavam despercebidos à grande maioria dos nossos soldados, e que eu exigia que eles me explicassem para que os homens que eu comandava pudessem mais tarde absorver.

Já que falo nos guias, foi com grande estupefacção que li há uns tempos atrás num poste da nossa Tabanca que o capitão de determinada companhia mandava matar os guias, finalizada que fosse a Operação em que estes participavam. Acabei por não saber se era ficção ou realidade.


Se era ficção dela ressalta o desprimor com que alguns conseguem aguiar (consultar dicionário) (**) com cores escuras e adjectivos caluniosos os que foram obrigados a combater; pelo contrário se foi realidade, não entendo o silêncio cobarde dos que não foram capazes de tornar público crimes de tal tipo no momento próprio. Nunca tive medo de nenhum superior hierárquico, sempre os respeitei, como respeitei todos os meus camaradas, mas a nenhum deles consenti que me pusessem o pé no cachaço. Nem a militares nem a civis.

Sou do tempo em que na Faculdade de Economia se fez greve a um ditador, enganei-me, a um professor muito antes do 25 de Abril! Exactamente, antes do 25 de Abril! Soube arcar com as consequências e ainda hoje aos sessenta e dois anos prefiro a fome do lobo à coleira do cão.

A minha modesta participação na Tabanca Grande, que em boa hora descobri, e que julgo ter também como fundamento um convite à vida participada, vai no sentido, atrevo-me a dizê-lo, de que as gerações que se nos seguiram, incluindo os que nos (des)governam, tenham o respeito por quem tanto sofreu e não se esqueçam de se curvar respeitosamente perante todos os camaradas que tombaram em combate numa guerra que não era a deles.

A esmagadora maioria dos ex-combatentes tem a humildade e a solidariedade, que são conceitos sem significado na vossa sociedade de senhores de anéis e de podres compadrios. Penso não conhecer pessoalmente nenhum dos camaradas da Tabanca (***), mas sinto-os como elementos da minha família; vocês, os que não nos conhecem, também não conhecem nem cumprimentem o vosso vizinho que mora no andar de baixo ou de cima.

Ex-combatentes, quem são esses gajos? Eram pedreiros, carpinteiros, médicos, engenheiros, padeiros, universitários, analfabetos, arrancados à família e ao emprego e obrigados, na sua esmagadora maioria, a partir para o desconhecido com a preparação militar, em muitos casos de pouco mais de seis meses, que dependiam uns dos outros para sobreviver. A amizade que se criou e que perdura há quase quarenta anos é algo que os senhores nunca vão conseguir descobrir…

Voltemos ao malfadado ano de 1973 e , se ainda não me perdi, estamos em Janeiro.

Segurança à construção da estrada Aldeia Formosa-Cumbijã

Volvidos quatro dias, portanto a 14 de Janeiro, estávamos em preparação para uma saída que consistia numa emboscada nocturna, seriam umas 15 horas, um camarada do mesmo grupo do Mota, por distracção, ao preparar a G3, deu um tiro que felizmente só lhe arrancou parte da falangeta. Teve no entanto de ir para Bissau curar-se dessa maleita.

A 19 desse mês os Tigres voltam a ser visitados pelo Sr. Comandante Militar, novamente para apreciar a nossa evolução. Pareciam visitas a mais dos Graúdos, mas elas continuaram como vamos ver e ilustrar.

Por esta altura a estrada ia caminhando a bom ritmo e a nossa Companhia, em conjugação com outras forças, picava a frente dos trabalhos. À noite emboscávamos na Zona do Cumbijã ou vínhamos dormir a Aldeia, tudo dependia da articulação com as outras Companhias. Quando dormíamos em Aldeia seguíamos na coluna militar que protegia centenas de capinadores e outros trabalhadores da Engenharia, bem como as máquinas. Os vestígios de passagem de grupos do PAIGC eram cada vez mais evidentes. Sabíamos que antes da estrada chegar ao Cumbijã as coisas iam aquecer.

No dia vinte avancei um pouco mais com a Companhia e detectámos um carreiro enorme por onde tinham passado havia pouco tempo um grupo estimado em mais de quarenta homens. Redobrámos os cuidados, apresentou-se um relatório detalhado dos movimentos na frente dos trabalhos e, curiosamente, a vinte e cinco de Janeiro, Aldeia Formosa é flagelada durante quinze minutos, tendo sido referenciados 60 rebentamentos. Digo curiosamente pois os ataques a Aldeia Formosa provinham de bases situadas do lado contrário ao da frente de trabalhos.

Na manhã seguinte, dia 26 de Janeiro, ainda comentando o embrulhanço da véspera, que mais uma vez não causara qualquer mossa, lá vai a malta toda para a frente da estrada em coluna auto quando em XITOLE 4G 7-21 (vd carta militar) levámos com uma emboscada a parecer bem.

Para além da minha Companhia seguiam também dois grupos da CCaç 18. As crónicas oficiais rezam que fomos emboscados por um Bigrupo IN com morteiros, RPG e armas ligeiras. Na reacção à emboscada a CCaç 18 teve dois feridos graves, um dos quais era um graduado, penso que furriel. A nossa Companhia não teve feridos. Passadas umas horas uma viatura do Batalhão de Engenharia accionou uma mina anticarro na região da Pedreira, mas o condutor saiu ileso.

No dia 29 dois Gr Comb dos Tigres em conjunto com um Pelotão da 6250 detectaram uma mina anticarro com dispositivo antilevantamento e 12 minas antipessoais.

A morte de Amílcar Cabral, chorada por uns, festejada por outros

Janeiro havia chegado ao fim, mas algo de muito importante não pode deixar de ser referido: O assassinato de Amílcar Cabral que ocorreu a 20 de Janeiro de 1973 em Conacri (e não no Senegal, como alguém por distracção postou no blogue).

Não vou entrar em considerações sobre a pessoa de Amílcar Cabral, não tenho capacidade para tal e os entendidos já publicaram literatura suficiente para todos os gostos sobre essa personalidade que, quer se queira quer não, foi o paradigma das lutas de libertação das ex-colónias.

Apenas dois pequenos registos, o primeiro para dizer que um amigo do meu pai, também homem do reviralho, mas bastante mais jovem e bastante mais contundente na forma como manifestava os seus ideais, fora colega do, também como ele, engenheiro Amílcar Cabral. A segunda nota é uma nota de tristeza para a alegria com que pelo menos duas pessoas festejavam, bebendo à saúde da morte do Cabral. O nome tinha outra terminação e os artistas eram oficiais. Curiosamente ou talvez não, nenhum dos dois era operacional.

Lembro-me de cena semelhante com outros personagens, era eu professor no Instituto Superior de Contabilidade e Administração, quando a morte do Dr. Sá Carneiro foi também comemorada, dizem-me que durante toda a madrugada de 4 para 5 de Dezembro de 1980. Lembro-me da data, pois eu havia casado a 5 de Outubro de 1970. Palavras para quê?

Fevereiro, dia primeiro, mais um ataque ao aquartelamento de Aldeia durante cerca de, cito, 50 minutos com cerca de setenta granadas de canhão sem recuo e 6 Foguetões 122. Nunca tinha ouvido o estrondo de um foguetão. Esses assustaram-me, mas foram um bom treino para o que nos aguardava no Cumbijã e posteriormente em Nhacobá. Houve sempre uma coisa que me intrigou durante todo o tempo em que estivemos em Aldeia, não me lembro de nenhuma granada ter caído dentro do quartel. Teria o PAIGC receio de acertar na população que se acantonava à volta do quartel?

O Cancioneiro de Cumbijã

Seria fastidioso enumerar todos os ataques que sofremos neste período sobretudo na protecção à estrada, como seria injusto não referir uma das Companhias do Batalhão que, já muito perto do final da comissão, foi fustigada por uma série de azares: a Companhia de Caçadores 3399, vulgarmente conhecida pela 99 e comandada por um capitão do quadro chamado Horácio Malheiro, de quem voltarei a falar mais adiante. Foi meu companheiro de longas conversatas, homem extraordinariamente simpático, com quem me identifiquei pouco tempo após a chegada a Aldeia, e era sobretudo solidário nos reveses que iam surgindo.

Não o vejo desde Julho de 1973, pois a partida do seu Batalhão coincidiu com a minha vinda de férias a Portugal. Deixou-me uma carta muito simpática que ainda hoje conservo, tendo também herdado alguns dos seus bens.

Neste período de Fevereiro/Março em que a guerra das minas era tremenda, pelas minhas notas registo, relativamente à 99, um ferido grave e dois ligeiros a 4 de Fevereiro, outro ferido grave a 26 de Fevereiro também por accionamento de mina e ainda um outro em finais de Março. Também um dos nossos camaradas de Mampatá, Companhia comandada pelo Marcelino, meu colega de curso e amigo, teve a infelicidade de accionar uma mina a 16 de Março na frente de trabalhos da estrada.

A CCav 8351 havia passado incólume a este vendaval de minas. Apenas uma pequena nota pessoal para o meu camarada Manuel Félix, o melhor pica da Guiné.

Os dados estavam lançados, o destino dos Tigres era... o CUMBIJÃ.

Termino mais um capítulo, desta feita com um poema premonitório que o meu camarada Tavares de Bastos, alferes da CCaç 3399 me dedicou

NA ESTRADA DO CUMBIJÃ

Vêm picadores
Incertos descobridores
da oculta traição
e deixam pedaços de si próprios
nas bermas alagadas.
Os camaradas raivosas lágrimas
a mata ri, quietamente.
Vêm também atiradores caçadores
naquelas viaturas
às centenas os negros descapinadores
e a engenharia.
Há calor de emboscada tiroteio estrondos
crepitam as armas infernais.
Berros caralhadas ais.
Sangue.
E alguém morre sozinho no chão estranho
E o irmão de longas horas não sente
Já não quer
Apaga a dor.
O hábito queima a dimensão do perigo.

Pela manhã
Há escura guerra
Nesta terra
Do Cumbijã.

Máquinas malucas ( orgulho da técnica )
Com fúria galgam bolanhas irrompem capim selvas;
As árvores tombam… amanhã levantar-se-ão… depois…
Poeira
suor
nuvens nos olhos
a terra é rasgada violentada.
Atrás o alcatrão arrasta-se
Mas os dias, os dias não fogem
nesta terra
do Cumbijã
onde logo pela manhã
há guerra.

Lá,
onde o rio solteiro (?!) alaga extensos arrozais,
Nhacobá,
longe da confusão,
promete rebelde vulcão
que não parará jamais.


Por esta altura estava desfalcado de dois alferes. Um tinha ido para a Chamarra, outro para Bissau.

Estou cansado, camaradas, deixo-vos com duas imagens do que era o Cumbijã.

Vasco da Gama (***)


Guiné > Regiãod e Tombali > Cumbijã > 1973 > CCAV 8351 (1972/74) >A triste paisagem de Cumbijã, na época seca...

Guiné > Região de Tombali > Cumbijã > 1973 > CCAV 8351 (1072/74) > As minas, sempre as minas, as malditas minas...

Fotos: © Vasco da Gama (2008). Direitos reservados

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Notas de CV:

(*) Vd. último poste da série de 16 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3638: A história dos Tigres de Cumbijã, contada pelo ex-Cap Mil Vasco da Gama (3): Jan 73: Com o Cherno Rachide, em Aldeia Formosa

(**) Aguiar, o m.q. fazer tratantadas

(***) O que era verdade no dia 11 de Dezembro, mas não no dia 13: O Vasco apareceu na sessão de lançamento do livro do Coutinho e Lima e teve oportunidade de fazer novos amigos...

(****) Subtítulos e negritos da responsabilidade do editor