Blogue coletivo, criado e editado por Luís Graça, com o objetivo de ajudar os antigos combatentes a reconstituir o puzzle da memória da guerra da Guiné (1961/74). Iniciado em 23 Abr 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência desta guerra. Como camaradas que fomos, tratamo-nos por tu, e gostamos de dizer: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande. Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
terça-feira, 30 de abril de 2024
Guiné 61/74 - P25461: Convívios (991): 51.º Almoço/Convívio da CCAÇ 12, Pelotões Daimler e Caçadores Africanos, dia 25 de Maio de 2024, em Mora (Jaime Pereira, ex-Alf Mil Inf)
Caros Companheiros
Este ano, o almoço organizado pelo nosso companheiro Vítor Marques, será em Mora no dia 25 de Maio, seguido de visita guiada ao Fluviário.
Os detalhes do programa encontram-se no documento anexo.
Convidamos para este encontro as esposas e filhos dos companheiros já falecidos, os ex-militares da CCaç12, Pelotões Daimler e Caçadores Africanos e ainda os amigos e companheiros dos BART 2917 e BART 3873 que quiserem participar neste nosso convívio.
Contamos convosco...
Confirmem a vossa presença até ao dia 19 de Maio para um dos seguintes contactos:
Vítor Marques - Email: vtor.marques@gmail.com - Tlm. 964 752 356
José Sobral - Email: mzsobral@sapo.pt - Tlm. 969 800 826
Jaime Pereira - Email: jaimenpereira@gmail.com - Tlm. 917 265 026
Contamos com todos…
Um abraço e até breve
Jaime Pereira
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Nota do editor
Último poste da série de 25 DE ABRIL DE 2024 > Guiné 61/74 - P25446: Convívios (990): XXXVII Convívio da CART 3494 / BART 3873, dia 8 de Junho de 2024, com concentração no antigo RAP 2, na Serra do Pilar - Vila Nova de Gaia e almoço em Matosinhos (Sousa de Castro, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista)
quinta-feira, 25 de abril de 2024
Guiné 61/74 - P25446: Convívios (990): XXXVII Convívio da CART 3494 / BART 3873, dia 8 de Junho de 2024, com concentração no antigo RAP 2, na Serra do Pilar - Vila Nova de Gaia e almoço em Matosinhos (Sousa de Castro, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista)
Meus amigos,
Sou a informar que o 37.º Encontro da CART 3494 irá realizar-se no dia 08 de junho de 2024 a partir das 10,00 horas no Regimento de Artilharia - 5 (ex-RAP 2) na Serra do Pilar, em Vila Nova de Gaia, local onde o Batalhão de Artilharia 3873, foi formado para servir Portugal na guerra da Guiné.
Vamos comemorar o cinquentenário da nossa chegada (03/04/1974).
Prestaremos homenagem aos mortos em combate e a todos aqueles que de alguma forma deixaram a vida terrena, junto do memorial, com deposição de uma coroa de flores.
Lembro que é do nosso conhecimento, que, 39 camaradas já deixaram a vida terrena, deixaram a saudade eterna, principalmente, das suas famílias, mas na certeza de que um dia vamo-nos encontrar novamente.
Prevemos uma Guarda de Honra por um Pelotão do Regimento.
Pelas 11,30 horas seguiremos em caravana auto até Matosinhos onde será servido um excelente almoço no “Restaurante Mariazinha”, findo o qual cada um rumará aos seus destinos, fazendo votos para que no próximo ano (2025) nos encontraremos de novo.
Apelamos à tua participação com família e amigos, contacta até ao dia 30 de maio impreterivelmente, por favor!
Contactos:
Ex-Fur Mil Trms – Luís Coutinho Domingues, 961 070 184 ou 22 013 76 18
Ex-Fur Mil Art – Manuel Benjamim Martins Dias, 965 879 408
MENU DO ALMOÇO
ENTRADAS
- Salgadinhos, rissóis, pataniscas, pata de gamba, recheio de sapateira e bolinhos de bacalhau
PEIXE
- Bacalhau à Zé do Pipo
CARNE
- Vitela assada com batata
BEBIDAS
Vinho da casa – tinto ou branco, verde ou maduro, cerveja, água e refrigerante
Bolo de aniversário, acompanhado com Flute de vinho espumante
Café.
Nota: em ref. a digestivos, quem quiser pode trazer de casa se assim o entenderem.
Preço: 30 bazucas
Um abraço a todos antigos combatentes,
Muito obrigado
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Nota do editor
Último post da série de 17 DE ABRIL DE 2024 > Guiné 61/74 - P25399: Convívios (989): 95º encontro da Tabanca do Centro: Quinta do Paul, Ortigosa, Leiria, 6ª feira, 26 de abril de 2024
sexta-feira, 15 de dezembro de 2023
Guiné 61/74 - P24961: Boas Festas 2023/24 (3): Sousa de Castro, o nosso histórico tabanqueiro n.º 2, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista, CART 3494 / BART 3873 (Xime e Mansambo, 1971/74) e José Firmino, ex-Soldado At Inf da CCAÇ 2585 / BCAÇ 2884 (Jolmete, 1969/71)
Meus caros, para toda a Tabanca votos de um grande e feliz Natal e que o novo ano seja um pouquinho melhor, força nessa vida.
https://cart3494guine.blogspot.com/
Desejo a todos os Antigos Combatentes, familiares e amigos, Boas Festas
Grande abraço
José Firmino
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Nota do editor:
Último poste da série > 13 de dezembro de 2023 > Guiné 61/74 - P24950: Boas Festas 2023/24 (2): António Ramalho, ex-fur mil at cav, CCAV 2639 (Binar, Bula e Capunga, 1969/71)
quinta-feira, 14 de dezembro de 2023
Guiné 61/74 - P24951: Excertos dos melhores escritos de António Eduardo Ferreira (1950-2023), ex-1º cabo cond auto, CART 3493 / BART 3873 (Mansambo, Cobumba e Bissau, 1972/74) - Parte IX: A sorte naquele dia esteve do nosso lado
Guiné > Região de Tombali > Bedanda > 4ª CCAÇ (1965/67) > c. 1966 > Mulheres do mato, oirundas dos arredores de Bedanda, muito provavelmente Cobumba, na altura sob controlo do PAIGX. Ao centro está o alferes Oliveira, da 4ª CCAÇ.
O nosso camarada era natural de Moleanos, Alcobaça. Na tropa e na guerra era mais conhecido por Jerónimo. Lutou quase 20 anos, desde 2004, contra um cancro. Criou o blogue Molianos, viajando no tempo, por volta de 2013 ou 2014.
(...) Certo dia um grupo de elementos da nossa companhia foi a Cufar, como acontecia algumas vezes, tendo usado o nosso sintex.
Nesse dia eu estava de serviço de condutor, ao fim da tarde fui com a viatura e mais três ou quatro camaradas para o cais, junto ao rio Cumbijã, onde estivemos durante algum tempo à espera que eles chegassem para os trazer de volta ao destacamento.
Enquanto esperávamos, os Fiat iam bombardeando não muito longe de nós. Naquele tempo, ao contrário do que acontecia antes dos Strela por lá terem chegado, altura a que eles faziam os bombardeamentos era bastante mais afastada do solo o que nos permitia vê-los.O armamento por eles utilizado estava distribuído por quatro locais:
- os RPG 7, um do lado de Pericuto, outro do lado oposto, início da mata de Cabolol;
- o canhão s/r deles, era daqueles que quando se ouvia a saída, a granada já estava a cair;
- o morteiro 82, dada a precisão com que eles colocaram as granadas junto à picada, só podia estar na direção da mesma, penso eu.
Quando os camaradas chegaram no Sintex, junto de nós, o ataque já tinha terminado, ainda bem que eles demoraram, assim safamo-nos de ter vivido aquela situação na picada no regresso… onde não havia sítios para nos abrigar, se tal fosse necessário.
Entre a população houve uma vítima mortal, uma senhora. No outro dia efetuaram o seu funeral, tendo sido enterrada junto à tabanca onde morava. Nesse dia apareceram por ali algumas pessoas vindas de outros locais.
(Seleção / revisão e fixação de texto / negritos: LG)
Embora tardiamente, aqui vai a resposta à pergunta que o nosso camarada Ferreira nos colocou (em comentarioa um poste que ora não identifico)...
Para ambas as tribos, sendo animistas, a compreensão de que o curso da vida é cíclico e não linear, como uma experiência contínua, permite que a morte seja percebida como um deslocamento para outro espaço habitacional. Consequentemente, existe a noção de que o “enterro perfeito” garante que o espírito do antepassado não fique entre os vivos para assombrá-los ou controlá-los, mas sim para protegê-los enquanto descansa pacificamente. Destacando então a narrativa de que aqueles que estão no reino dos mortos possuem poderes sobrenaturais, podendo amaldiçoar, curar ou abençoar e tirar ou dar vida. Entretanto, a pessoa também pode reencarnar em várias pessoas, como renascidos, ou habitar o mundo espiritual através da sua forma terrena como antepassados, posição muito valorizada nas crenças Africanas. Tornar-se um antepassado é, portanto, uma meta valiosa para muitos.
Após um falecimento, família e amigos reúnem-se para celebrar a vida do indivíduo, denominado Toca Tchur, nome comum entre todas as etnias. Na etnia Balanta, caso seja um homem que tenha cumprido o fanado (conhecido por circuncisão), é lavado pelos anciãos e enrolado num fundinho, um tecido tradicional. Os vizinhos são então informados da morte através dum bombolom (tambor grande). No entanto, se o falecido for alguém mais jovem, por exemplo, como mencionado previamente, a celebração não ocorreria, pois a sua morte seria considerada ultrajante ou talvez uma maldição.
Eventualmente, após a mensagem ser enviada, o falecido será coberto mais adiante por mais panos doados por entes queridos como vizinhos, família e amigos. Ao longo da cerimónia os anciãos, em conjunto, retiram então os tecidos e entregam-nos à família para que os guardem carinhosamente depois de serem lavados, sendo assim uma lembrança permanente. Além disso, caso a família não possa cobrir o montante duma caixa (caixão) para o enterro, eles podem enterrá-lo numa esteira de palha. Assim têm a possibilidade de finalizar a primeira parte da cerimónia, depois de atravessarem por cima do porco sacrificado, abençoando o animal e a futura alimentação dos participantes.
Do álcool à fartura de comida, a celebração evidencia o orgulho que as pessoas carregam por estarem presentes e como vêem como uma bênção o poder duma vida plena e encerrada pela velhice. A celebração tem um impacto significativo no bem-estar dos entes queridos, mesmo que já tenham aceite o falecimento em questão.
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Notas do editor:
quinta-feira, 23 de novembro de 2023
Guiné 61/74 - P24876: Excertos dos melhores escritos de António Eduardo Ferreira (1950-2023), ex-1º cabo cond auto, CART 3493 / BART 3873 (Mansambo, Cobumba e Bissau, 1972/74) - Parte VII: Parte VII - Estar debaixo de fogo não é coisa que se deseja a ninguém, muito menos em Cobumba, na região de Tombali
Foto nº 2 > A segunda Berliet era conduzida pelo furriel mecânico, tinha acabado de chegar de férias naquela tarde vindo da Metrópole: também “apenas” sofreu o susto. Talvez aí, tenha percebido porque em Mansambo queríamos tanto colocar sacos de terra, ou de areia, debaixo do assento e ele não nunca deixou.
Foto nº 3 > A terceira viatura era um Unimog 404, não me recordo quem era o condutor, sei que saiu ileso do meio dos destroços, mas as consequências aqui foram terríveis, houve feridos um dos quais muito grave o popular "periquito". Ao fundo, podem ver-se algumas das casas que a nossa companhia andava a construir para a população (reordenamento).
A quarta viatura que acionou uma mina. não aparece aqui: era também um Unimog 404, mas ainda foi possível ser recuperada e voltar ao serviço.
Guiné > Região de Tombali > Sector S4 (Cadique) > Cobumba > CART 3493 (1972/74)
1. A história da unidade (BART 3873, Bambadinca, 1972/74), a que pertencia a CART 3493, dá-nos uma pálida ideia dos que foram os oito meses desta subunidade em Cobumba, sector S4 (Cadique)... Daí a importància de testemunhos pessoais como estes, do António Eduardo Ferreira(*).
A ocupação de Chugué e Cobumba foi defimida pelo Directva nº 13/73 de 30 de março.A situação nas NT, em 1 de julho de 1973, no subsector de Cobumba / sector S4 (BCAÇ 451472, Cadique: abrangia os subsectores de Bedanda, Caboxanque, Cadique, Cafal, Cabedú, Chugué, Cobumba. Jemberém) era a seguinte:
- CART 3493
- 2 Pel/2ª /BAC 4610/72
- 1 Sec Pel Can S/R 3079
A CART 3493 será rendida em Cobumba em 25nov73 pela CCaç 4945/73 (mobilizada pelo BII 19, Funchal)
O nosso camarada era natural de Moleanos, Alcobaça. Na tropa e na guerra era mais conhecido por Jerónimo. Lutou quase 20 anos, desde 2004, contra um cancro. Criou o blogue Molianos, viajando no tempo, em data difícil de precisar (c. 2013/2014).
E o que tinha acontecido durante a minha ausência, é que a acalmia dos primeiros dias tinha sido quebrada com enorme violência, quando certo dia pela madrugada o inimigo se infiltrou dentro do triângulo que era formado pela disposição das nossas forças no terreno, onde existiam muitas árvores que lhe serviram de abrigo, e estando eles no meio das nossas tropas e muito perto, a poucos metros, foi necessário ter muito cuidado em particular das nossas armas pesadas para não sermos nós a bombardear as nossas próprias forças.
Durante as primeiras semanas foram levantadas várias minas próximo do sitio onde passámos a primeira noite, para sorte nossa estavam uns metros mais ao lado, talvez o sitio onde o inimigo pensasse que íamos acampar. O furriel que levantou essas minas assim como outras que entretanto vieram a ser colocadas, viria a ser uma das baixas da nossa Companhia, vitima dum acidente estúpido como são quase todos os acidentes.
Nessa altura ainda as valas eram de certo modo improvisadas, e abrigos só os destinados às comunicações, era pouca a luz eléctrica que havia, fornecida por um pequeno gerador que quase não iluminava a zona circundante de um dos três sítios em que estávamos sediados.
Para que o buraco a abrir tivesse mais segurança tinha de ser pequeno, assim juntaram-se dois ou três e cavavam até que coubessem de pé, depois era coberto com troncos de palmeiras e com cerca de um metro de terra por cima.
Mas a tormenta não terminou ai, é que a tenda que servia de enfermaria ficou cheia de abelhas, e o enfermeiro que estava por perto enquanto viu por ali uma abelha, não me quis ir tratar, com muita sorte minha não sou alérgico às ferroadas!
Depois de feito o abrigo era tempo de nos organizarmos: aproveitando alguma madeira que por lá havia, fizemos cada um a sua cama onde colocamos o colchão de campanha que tinha sido distribuído a todos os elementos da Companhia, só que o meu durante o tempo em que dormi no chão rompeu dois dos cinco canos de ar que o compunham. A almofada era independente, como não podia dormir assim, foi necessário vazar os três que ainda tinham ar e ficar só com a almofada.
O trabalho dos condutores era quase nada, tínhamos pouco mais de um quilómetro de picada para percorrer desde as nossas instalações até ao rio, à medida que o tempo ia passando também as viaturas que tínhamos eram cada vez menos, a primeira a ficar inutilizada definitivamente foi uma Berliet.
Mas uma vez mais a sorte esteve connosco, perdeu-se a viatura mas os ocupantes sofreram apenas o susto e já não foi pouco, o condutor foi o mesmo que em Mansambo conduzia a viatura que accionou a primeira mina das várias com que fomos contemplados, onde o furriel Ferreira perdeu um pé, - de seu nome José de Sousa
A viatura que tinha accionado a primeira mina em Cobumba, se da primeira vez foi possível ser recuperada, à segunda já não; ficou completamente destruída, ao accionar mais uma mina dentro do arame junto a casas que andávamos a construir para a população. Por essa altura já o PAIGC possuía os mísseis Strela com que tinha abatido várias aeronaves, era a terceira mina a ser accionada em Cobumba e também a que fez mais estragos, para além da perda da viatura houve três feridos graves.
Era já tarde quando o pessoal e barcos utilizados na evacuação regressaram, se o nosso moral era já muito baixo, a partir dai ficou de rastos, todos pensávamos que um de nós poderia ser a próxima vitima do novo rumo que a guerra tinha tomado, necessitar de ser evacuado e não ser possível em tempo útil.
Das quatro viaturas que tínhamos, duas já estavam inutilizadas, mais ou menos de oito em oito dias estávamos de serviço de condução, o resto dos dias era esperar que o tempo passasse, quase sempre por perto dos abrigos.
A razão que nos levava a estar sempre perto dos abrigos é que as flagelações à distância de quando em vez aconteciam, e a qualquer hora, mas mais grave ainda é que eram muitos os aquartelamentos ou acampamentos na zona, e no inicio dos bombardeamentos não sabíamos a quem se destinavam, só depois de começarem os rebentamentos, e de informações via rádio ficávamos a saber quem eram os destinatários.
Em Cobumba quase todos usávamos chinelos de plástico, quando começava um ataque e tínhamos de fugir para os abrigos, perdíamos logo os chinelos. A correr sem ser a medo nunca os perdíamos. Era mais um passatempo que tínhamos, depois da “festa” acabar havia que procurar onde estariam os chinelos.
Os ataques do IN por vezes tinham também como objectivo desmoralizar as nossas tropas, pois chegavam a disparar duas ou três vezes o RPG, uma ou duas morteiradas e depois paravam. De realçar que a zona onde nos encontrávamos era terra do PAIGC. Algumas vezes nem sequer respondíamos às provocações ou respondíamos na mesma medida.
Certo dia apareceu uma mulher com uma galinha para vender, coisa rara naquelas paragens, pois por ali o povo não estava connosco. Passado este tempo chego a pensar se a galinha não terá sido um pretexto para fazer algum reconhecimento atendendo ao que a seguir se passou.
Alguns de nós condutores compramos a galinha, e claro, fomos logo tratar de a pôr a jeito de ir para a frigideira. Ainda que funcionasse poucas vezes, tínhamos uma máquina a petróleo que o condutor Cruz logo se prontificou para pôr a trabalhar para fritar a galinha.
Por essa altura ainda tínhamos duas viaturas operacionais. Certo dia à tardinha o furriel mecânico, acabado de chegar de férias da Metrópole, foi dar uma voltinha com uma Berliet. Andou cerca de quinhentos metros, estava uma mina na picada que o fez ir pelos ares, mas também desta vez com sorte, a viatura ficou destruída mas ele apanhou apenas um grande susto, o que não foi nada que ele não merecesse.
A partir dessa altura ficamos apenas com uma viatura operacional, o serviço dos condutores era cada vez menos, em boa verdade também não podíamos ser sujeitos a grandes esforços físicos, pois a alimentação a que estávamos sujeitos não permitia que tal acontecesse.
Não havia bicho que chegasse ao arame que escapasse. Certo dia, um que os nativos diziam ser gato foi atraído à luz durante a noite tendo sido abatido, mais parecia ser um cão na fisionomia, mas pouco importou se era cão ou gato, o destino foi ser assado com batatas no forno dos padeiros.
A pouco mais de um mês de abandonarmos Cobumba, num dia em que eu estava de condutor de serviço com a única viatura que tínhamos operacional, os picadores como era costume fizeram a picagem do trajecto que eu depois teria de percorrer onde detectaram uma potente mina anti-carro, que foi levantada pelo Furriel Trindade o homem encarregado de fazer esse trabalho.
Uma tarde, passados três dias após o levantamento da mina, estavam três militares junto do local onde ela se encontrava. Nunca ninguém soube o que se terá passado, o certo é que ouvimos um estrondo enorme, nos primeiros instantes chegámos a pensar que teria caído por ali algum foguetão, mas não, depressa encontramos a causa, a mina que tinha sido levantada dias antes, tinha explodido e feito desaparecer as instalações, ferindo gravemente os três homens que lá se encontravam, que viriam a ser evacuados para o Hospital Militar em Bissau.
Na manhã do dia seguinte recebemos a noticia que dois tinham falecido, o Furriel Galeano e um soldado do 2.º Pelotão cujo nome já não me recordo, o outro esteve cerca de um mês no hospital, vindo ainda a tempo de regressar à Companhia que passados poucos dias regressava a Bissau.
Faltavam poucos dias para sairmos de Cobumba sofremos mais um violento ataque que durou cerca de trinta minutos, que pareceram horas, em que o inimigo utilizou várias armas: o morteiro 82, o canhão sem-recuo, o RPG 7 entre outras, mas uma vez mais a sorte esteve connosco, apesar da precisão do bombardeamento pois caíram várias granadas dentro do aquartelamento, e junto há picada que só por sorte ainda não estávamos a percorrer.
Nesse dia também eu estava de serviço de condução, já tinha tomado banho, tomava banho normalmente três vezes ao dia , havia pessoal nosso que tinha ido a Cufar, como de costume via rio Cumbijã, e nós tínhamos de os ir levar e buscar ao rio assim como aos barcos. Era fim da tarde, estávamos no cais à espera que eles chegassem, ao mesmo tempo que a aviação bombardeava não muito longe de nós, ainda os Fiat iam a caminho de Bissau, já estávamos a ser bombardeados, o que levou alguns a pensar que seria ainda a nossa aviação a bombardear, mas não, era mesmo Cobumba que estava a ser atacada, o rio naquela altura estava com a maré baixa cerca de três ou quatro metros, muitos de nós tentamos abrir buracos no lodo deixado pelo baixar da maré para nos protegermos, se é que isso ajudava alguma coisa, mas era o que nos restava fazer, mas as granadas mais próximas caíram a cerca de cem metros de nós.
Passados alguns dias chegou a Companhia que nos foi render a Cobumba. Durante o tempo em que estivemos com os “piras”, cerca de dez dias, fomos atacados uma vez, para eles era o baptismo de fogo, mas também desta vez apesar de nos mandarem alguns foguetões à mistura não nos causaram qualquer dano, a não ser algumas pisadelas pois os abrigos onde nos abrigávamos, durante este ataque ficaram com o dobro da lotação.
(*) Último poste da série > 22 de novembro de 2023 > Guiné 61/74 - P24871: Excertos dos melhores escritos de António Eduardo Ferreira (1950-2023), ex-1º cabo cond auto, CART 3493 / BART 3873 (Mansambo, Cobumba e Bissau, 1972/74) - Parte VI: Cobumba... onde é que isso fica?
(*ª) Vd. poste de 21 de março de 2012 > Guiné 63/74 - P9635: O tempo que ninguém queria (António Eduardo Ferreira) (3): De Mansambo para Cobumba
quarta-feira, 22 de novembro de 2023
Guiné 61/74 - P24871: Excertos dos melhores escritos de António Eduardo Ferreira (1950-2023), ex-1º cabo cond auto, CART 3493 / BART 3873 (Mansambo, Cobumba e Bissau, 1972/74) - Parte VI: Cobumba... onde é que isso fica?
O nosso camarada era natural de Moleanos, Alcobaça. Na tropa e na guerra era mais conhecido por Jerónimo. Lutou quase 20 anos, desde 2004, contra um cancro. Criou o blogue Molianos, viajando no tempo, em data difícil de precisar (c. 2013/2014).
Deixámos Mansambo, e depois de cerca de uma semana em Fá Mandinga e mais três ou quatro dias em Bissau, era chegado o dia de rumarmos ao Sul na LDG que nos haveria de levar até Cobumba.
No dia seguinte fizemos o resto da viagem rio acima acompanhados por um navio patrulha da Armada até Cobumba, sítio onde nunca tinha estado aquartelada tropa portuguesa. Chegámos ao início da tarde, estava na região muita tropa especial (paraquedistas, do BCP 12) mantendo segurança ao nosso desembarque.
As viaturas tinham sido dias antes levantadas em Bissau por quatro condutores que para esse efeito tinham saído mais cedo da Companhia. Durante a descarga foram esses condutores a manobrar as viaturas (eu, não indo a conduzir, fui um dos que foram nas primeiras quatro carradas), à medida que descarregavam voltariam ao rio para novo carregamento.
O condutor Cabral, e o Varela. das transmissões, eram os únicos ocupantes que seguiam na viatura de regresso ao rio, percorreram cerca de trinta ou quarenta metros e a viatura acionou uma mina que, pelo estrago feito, talvez fosse antipessoal, mas mesmo assim ficou alguns dias inutilizada, tendo o Cabral e o Varela ficado feridos, e voltado logo para Bissau, rumo ao Hospital Militar num helicóptero que passados poucos momentos chegou ao local.
O desembarque do resto do pessoal e de carga continuou, mas com atenção redobrada dado as coisas começarem a correr mal logo de início; o resto da operação de desembarque decorreu sem sobressaltos de maior.
A cerca de trezentos metros do pessoal da nossa companhia estavam mais dois pelotões que, estando connosco, pertenciam a outra companhia, ou seja, estávamos distribuídos em três sítios, formando um triângulo separados por poucas centenas de metros, um desses três era como que o equivalente à CCS do Batalhão, já que aí se situava o comando da Companhia, e quase toda a formação.
Depois foi instalarmo-nos o melhor possível, o que não foi fácil, estávamos habituados a ter luz, abrigos com alguma segurança e menos guerra, ali tudo era diferente, houve que fazer valas apressadamente, montar tendas, fazer um forno para cozer o pão, tendo sempre como companhia a inseparável G3.
Entretanto, conforme estava previsto, vim a segunda vez de férias à Metrópole; numa zona sem vias de comunicações viárias, isolada com guerra por todos os lados, restava-nos fazer o trajecto pelo rio ou via aérea("mas pelo ar só em casos especiais"), e lá fui numa coluna de pequenos barcos de fibra, os “sintex”, até ao aquartelamento de Cufar, onde existia uma pista de aviação (creio ser a melhor do sul da Guiné).
Passados dois dias em Bissau, embarquei em Bissalanca rumo a Lisboa onde cheguei ao cair da noite: se da primeira vez que vim de férias, o meu pensamento estava quase sempre no dia em que teria de regressar a África, agora a confusão era ainda maior; mesmo junto da minha esposa e do meu filho muitas vezes a minha ausência era quase total, foi um tempo de tal confusão que quase nada me lembro daquilo que por essa altura terá acontecido.
Se da primeira vez conhecia bem o sítio para onde iria voltar; da segunda apenas sabia ir para uma das zonas de maior actividade operacional do IN. Ainda bem que durante as férias não tive qualquer notícia daquilo que por lá se passava, pois se tal tivesse acontecido a partida teria sido ainda mais dolorosa.
Terminadas as férias lá fui uma vez mais rumo a Bissau onde cheguei ao fim da manhã, no mesmo dia tive transporte para Cufar e de novo no barulhento Nordatlas, como os homens por mais que fossem eram sempre poucos naquela zona, à tardinha arranjaram-me boleia para Cobumba, desta vez de helicóptero com uma breve passagem por Bedanda, onde o heli que me levava se manteve no ar enquanto o helicanhão foi a terra, cheguei a Cobumba ao fim do dia. (...) (**)
(*) Excerto de 21 de março de 2012 > Guiné 63/74 - P9635: O tempo que ninguém queria (António Eduardo Ferreira) (3): De Mansambo para Cobumba
sábado, 28 de outubro de 2023
Guiné 61/74 - P24803: As nossas geografias emocionais (11): Ainda a nascente de água e o fontenário de Bambadinca, inaugurados em 1948 pelo governmador Sarmento Rodrigues
Foto nº 3
Foto nº 4> Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) e Pel Rec Daimler 2046 (1968/70) > A zona ribeirinha de Bambadinca, na margem esquerda do Rio Geba (Estreito), alagada no tempo das chuvas... Foto provavelmente de meados de 1968 ou 1969...
Foto (parcial) de postal ilustrada: "Nova Lamego, Guiné Portuguesa". Colecção "Guiné Portuguesa, nº 153". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal, Imprimarte, SARL).
A partir de exemplar da colecção do nosso camarada Agostinho Gaspar (ex-1.º cabo mec auto rodas, 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72, Mansoa, 1972/74), natural do concelho de Leiria.
Guiné > Reegião de Bafatá > Bafatá > 1959 > "A fonte pública de Bafatá, 1918" [ Esta belíssima fonte, na "Mãe de Água", na zona conhecida como "Nova Sintra", de Bafatá, também aparece no filme de Silas Tiny, "Bafatá Filme Clube" (***), mas já muto degradada, bem, como aliás todo o seu meio envolvente...
02 Fonte de Dandum, Bafatá.
03 Uma Fonte em Fulacunda
04 Fonte de Lenquetó, Gabu.
05 Uma Fonte em Fulacunda
06 Fonte de Várzea do Cabo, Nova Lamego.
07 Fonte de Várzea do Cabo, Nova Lamego.
08 Fonte de Madina, Gabu.
09 Fonte de Quinlandi. 1945-05/1945-05
010 Fonte da Horta de Sónaco, Gabu.
011 Fonte do caminho de Biambe ,Mansôa.
010 Fonte da Horta de Sónaco, Gabu.
011 Fonte do caminho de Biambe ,Mansôa.
012 Fonte Frondosa de Empada, Fulacunda
013 Nascente nº 1, Bafatá. 1946-04/1946-04
014 Depósito nº 1, em Bafatá. 1946-04/1946-04
015 Fonte de Sónaco (circunscrição de Gabu). 1946-05/1946-05
016 Fonte de Madina. 1946-05/1946-05
017 Fonte de Madina no Boé. 1946-05/1946-05
018 Obras de Captação da Nascente nº 2, Bafatá. 1946-05/1946-05
019 Fonte de Nhacra, em Construção. 1946-06/1946-06
020 Poço de Enchudé, Acabado de Reparar. 1946-06/1946-06
021 Fonte de Safim, em Construção. 1946-06/1946-06
022 Fonte de Biambi. 1946-08/1946-08
023 Fonte de Contubel. 1946-09/1946-09
024 Fontanário de Fulacunda. 1947/1947
025 Fonte das Mocinhas. 1948/1948
026 Fonte de Timbó. 1948/1948
027 Fonte de Lenquerim. 1948/1948
028 Fontanário de Bambadinca. 1948/1948
029 Fontanário de Bambadinca. 1948/1948
030 Fontanário de Bambadinca. 1948/1948
031 Fontanário de Bafatá. 1945-05/1945-05
032 Fontes de S. João. 1946-09/1946-09
033 Fontes e Miradouro de S. João. 1946-09/1946-09
034 Fonte de Binar. 1946-08/1946-08
035 Fonte de Tór. 1946-06/1946-06
036 Fonte de Tór. 1946-06/1946-06
037 Fonte de Gam Grande. 1946-08/1946-08
sexta-feira, 27 de outubro de 2023
Guiné 61/74 - P24797: Excertos dos melhores escritos de António Eduardo Ferreira (1950-2023), ex-1º cabo cond auto, CART 3493 / BART 3873 (Mansambo, Cobumba e Bissau, 1972/74) - Parte III: Tem calma, és novo e o tempo há-de passar"
Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadina > Mansambo > CART 2339 (1968/69) > Cartaz humorístico pregado numa árvore nas imediações do "campo fortificado de Mansambo", como lhe chamava a "Maria Turra": "Bem vindo, welcome, bienvenu, bienvenidos. willkommem"
Ao chegar junto da fonte, cinco ou seis homens ficavam por ali a fazer segurança enquanto outros dois andavam com um unimog, o famoso "burrinho", a transportar água para o aquartelamento.
Na minha especialidade de condutor, tinha como função principal o transporte de pessoal, as viagens maiores eram as que fazíamos em coluna a Bafatá, onde íamos com regularidade uma vez por semana, normalmente buscar, entre outras coisas, duas vacas que eram consumidas pelo pessoal da Companhia , eram animais de pouco peso, e outra coisa para nós não menos importante, que era o correio, naquele tempo, a única forma de ter noticias da terra, da família e dos amigos. Eu era um dos que recebia muita correspondência.
As viagens de transporte de pessoal aconteciam também quando elementos nossos iam participar em operações fora da nossa zona, assim como fazer segurança aos que passavam na picada na zona de Mansambo, em especial às colunas de abastecimento que iam de Bambadinca ao Xitole, e regressavam ao fim do dia, enquanto não regressassem tínhamos de estar algures na picada na missão de segurança que nos era destinada.
(...) Quando saíamos de Mansambo, durante cinco ou seis quilómetros na frente do pessoal que seguia a pé e das viaturas, iam três ou quatro picadores tentando descobrir alguma mina que pudesse existir na picada, o que nem sempre conseguiam, eram momentos de grande tensão em particular para os condutores, durante esse tempo de picagem, só o condutor seguia na viatura, porque tinha que ser, senão nem ele lá ia… as minas anti-carro eram demolidoras, pobre daquele que tinha o azar de conduzir o veiculo que as accionasse, principalmente se ela rebentasse do lado do motorista.
O aquartelamento de Mansambo, naquele tempo em que a nossa Companhia lá esteve, de fevereiro de 1972 a fins de março de 1973, não era considerado muito mau, atendendo ao que acontecia em quase todo o território da Guiné.
Certamente não pensam assim… o furriel Ferreira, que seguia numa viatura na picada de Candamã que accionou uma mina e ele ficou sem um pé, ou o Silva do 2.º Pelotão que estava para vir de férias dentro poucos dias, e mais outro de quem já me não lembro o nome, que ficaram cada um sem um pé ao accionarem minas anti-pessoal.
No abrigo dos condutores tínhamos um faxina, era um miúdo da tabanca, que a troco de uns pesos nos ia buscar a comida à cozinha, lavava a loiça e varria o abrigo, a quem eu prometi levar uns sapatos quando fosse de férias; durante o tempo em que estive na Metrópole, os meus camaradas mandaram o Sherifo embora, para ele a chatice maior não era ir embora, o pior é que o Fireira, como ele me chamava, provavelmente já não lhe dava os sapatos; mas não, assim que cheguei, mandei-o chamar à tabanca e dei-lhe os sapatos novos, coisa que ele com treze ou catorze anos de idade nunca tinha tido.
No dia seguinte, o Sherifo na companhia de mais três meninos da tabanca, com alegria e a felicidade estampada no rosto, vieram levar-me uma galinha, momento que jamais esquecerei, e certamente o Sherifo também não, dentro do possível sempre procurei respeitar os nativos como pessoas iguais a todos os demais.
Em Mansambo todos os militares tinham uma lavadeira, que a troco de alguns pesos, moeda da Guiné, lavavam-nos a roupa e passavam-na a ferro. A Califa era a menina que me lavava a roupa, tinha só catorze anos, mas já estava vendida a um homem com cerca de quarenta. (...) (**)