sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Guiné 63/74 - P15359: Notas de leitura (775): “Nos Celeiros da Guiné”, por Albano Dias Costa e José Jorge Sá-Chaves, Chiado Editora, 2015 (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 15 de Setembro de 2015:

Queridos amigos,
É evidente que este precioso relato se dirige em primeiro lugar aos que viveram aquela saga a partir dos últimos meses pacíficos de 1963, que cirandaram pelo Morés e foram pau para muita colher. Mas é igualmente um documento de relevo para entendermos como tudo se passou, na muita ignorância e na compreensível falta de previsão sobre o poder combatido daqueles guerrilheiros começavam a marcar presença por todo o Centro-Norte da Guiné.
Com o passar dos tempos, vou-me convencendo cada vez mais que faltam relevantes documentos sobre o que se passou entre 1963 e 1968, não há hipótese de ajuizar o que foi o bom ou o mau comando, do lado português, na eclosão e ascensão da guerrilha.

Um abraço do
Mário


Nos Celeiros da Guiné (2), por Albano Dias Costa e José Jorge Sá-Chaves

Beja Santos

“Nos Celeiros da Guiné”, por Albano Dias Costa e José Jorge Sá-Chaves, Chiado Editora, 2015, é uma obra muito particular nas chamadas publicações relacionadas com as histórias das unidades militares que combaterem em África. Tem a particularidade de se centrar na vida de uma companhia independente que percorreu um bom rincão do território guineense, no exato momento em que a guerrilha ganhou fôlego na região Centro-Norte. Referiu-se no texto precedente a atividade operacional desenvolvida até agosto de 1963, retoma-se a obra com a chamada de atenção para o período de 1 de Setembro de 1963 até finais de Junho de 1973.

Em 1 de Setembro, o BCAÇ 512 passa a ocupar a área que estava à responsabilidade da CCAÇ 413, o que imediatamente nos faz refletir o grau de improvisação e o desconhecimento do peso do PAIGC entre o Senegal e Mansoa. Com a chegada deste batalhão, a CCAÇ 413 passou a constituir a força de intervenção do Batalhão: assegurava escoltas, desimpedia itinerários, montava segurança a elementos da população durante as colheitas, e o mais que se sabe. Observa o autor que foi um período extremamente duro em combate e missões distintas em pontos diferentes do setor. Em 3 de Setembro o PAIGC ataca Porto Gole, foi necessário destacar um grupo de combate da CCAÇ 413, instalou-se o aquartelamento de raiz. A Companhia anda por toda a parte: Enxalé, Infandre, Enxugal. Em Outubro, primeira emboscada entre Porto Gole e Enxalé. A guerrilha anda à solta: ataques entre Porto Gole e Mansoa tornam-se um facto, com o crescendo das hostilidades o itinerário irá ficando sucessivamente cortado. Em 2 de Novembro decorre a primeira grande operação no Morés, no dia 4 destruíam-se no local 16 casas de mato. Em Novembro começam as destruições de viaturas entre Mansoa e Bissorã. Está tudo em movimento: Porto Gole fica na dependência de uma Companhia que está no Enxalé. Em Janeiro de 1964 repara-se a estrada Porto Gole Enxalé. Tudo se complica entre Mansoa e Bissorã, as emboscadas não faltam e a vida torna-se cada vez mais difícil entre Mansoa e Mansabá. Cutia é a primeira povoação em autodefesa, a população comporta-se galhardamente. Com minúcia, o autor vai detalhando o calendário das atividades operacionais e já estamos em Maio, o Brigadeiro Louro de Sousa é substituído por Arnaldo Schulz. O PAIGC tem uma base perto do Enxalé, é inicialmente desalojado e depois regressa. Em 1 de Julho de 1964, a CCAÇ 413, devido ao seu grande desgaste é rendida pela CART 564 e instala-se em Nhacra.


Este novo período da vida da CCAÇ 413 na Guiné é menos atribulado mas não menos agitado. Aos patrulhamentos, nomadizações e emboscadas para impedir infiltrações na área sensível da península de Bissau. Há um destacamento na ponte de Ensalmá. Fazem-se obras para melhorar as instalações, construem-se casernas, balneário, refeitório, paiol, etc.

Já estamos em Janeiro de 1965, começa a formação de companhias de milícias. Destroem-se canoas no rio Mansoa. Há um grupo de combate aquartelado em Encheia, aqui os guerrilheiros atacam forte e feio. Relata-se um dado que não se pode descurar: em Abril de 1965 já existiam 18 Companhias de Milícias, muitos destes homens irão até Bolama, no centro de instrução militar serão preparados para pelotões e companhias de caçadores. A prestação da CCAÇ 413 aproxima-se do seu termo, teve 6 mortos em combate, 47 feridos dos quais 10 foram evacuados.

A fotonarrativa é abundante, integra dados da preparação, a instrução em Faro, imagens em Mansoa, em inúmeros lugares por onde a Companhia andou disseminada, mostra-se o seu armamento, a sua alimentação, os lazeres, os trabalhos nos aquartelamentos, a vida dura em Encheia e em Cutia, as relações com a população, a atuação operacional, os convívios, imagens daqueles que voltaram à Guiné e que percorreram os aquartelamentos de outrora, deixando-nos imagens deslumbrantes de uma natureza que não se rende às dores de uma economia parada.

Um documento que nos obriga a pensar na chegada daqueles jovens a Bissau e depois a Mansoa, tudo parecia pacífico até que tudo se tornou explosivo e devastador para os nervos. É um longo documento sobre a metamorfose e o endurecimento. Só temos a ganhar em ler um relato destes primeiros combatentes que tiverem que se abrigar nos celeiros da Guiné.
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Nota do editor

Último poste da série de 9 de novembro de 2015 Guiné 63/74 - P15343: Notas de leitura (774): “Nos Celeiros da Guiné”, por Albano Dias Costa e José Jorge Sá-Chaves, Chiado Editora, 2015 (1) (Mário Beja Santos)

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