sexta-feira, 10 de abril de 2015

Guiné 63/74 - P14452: Blogpoesia (412): 3 poemas recentes: (i) Mergulhei na Polónia; (ii) O barco na praia; e (iii) Rua dos impossíveis... (J. L. Mendes Gomes)

Mergulhei na Polónia…


Estou encantado.
Saí de Berlim.
Pela calada da manhã.
Noventa quilómetros apenas.
...
Atravessei a fronteira.
E mergulhei na Polónia.
Só um cheirinho.
Para ver como é.
Vim a uma feirinha,
No meio dum bosque.
Numa pequena cidade rural.
Slubice!...

Um mundo diferente.
Mais natural.
A primeira sensação foi a de
De ter recuado no tempo.
Reencontrei muito do que havia em Portugal,
Antes do 25 de Abril.
O rosto das pessoas
É recatado e contido.
Seu porte é sóbrio.
Sem os ademanes da futilidade
Que impregnou e descaracterizou de raiz
As gentes que se julgam mais avançadas.
E, alienadas, carregam à cerviz
O jugo da moda.
No restaurante,
Todo em madeira,
Rústica,
Paredes e tecto.
Muito discreto.
Uma enorme lareira,
De frente, ao centro,
Enchia de calor
E bem-estar
Todo o ambiente.
Pelas mesas, em harmonia
Sincera,
Muitas famílias.
Pais e filhos,
Pequenos e grandes.
Num abraço total.
Sorrisos.
Olhos brilhando,
Azuis,
Como o céu.
Comida abundante.
Para todos sem dor,
Na carteira.
Se olhando ao centro,
Sem precisar exibir
Para chamar atenções.
Havia alegria e respeito
Entre filhos e pais.

Depois, fui para a feira.
Uma aldeia apinhada,
Com ruinhas cobertas,
Escaparates em festa,
Abundantes de tudo,
Espalhados à mão.
Vestir e calçar,
De pele e de lã,
Último grito.
Por cinco tostões.
Queijos, licores,
Bebidas alegres,
De os todos os matizes.
Uísques, vodkas e vinho
Em garrafas.
Bugigangas e artefactos
Originais.
Muita gente comprando.
Parecia Istambul!…

Hei-de voltar muita vez.
Só queria que vissem...
Polónia, Slubice… no hotel
"Horda" - 3 estrelas…mas parecendo de 5…

21 de Dezembro de 2014, 3h7m

Joaquim Luís Mendes Gomes



O barco na praia...

aquele barco,
amarrado ao cais,
sem mastros nem velas,
é um arado do mar.
sua raviça luzente,
bem funda
e cortante,
são remos, possantes,
rasgam as ondas,
ele vai para diante,
à procura do pão
que cresce abundante,
no seio do mar.

pintado de azul.
tem Jesus,
levantado de pé
mesmo à proa,
de vestes compridas,
olhando ao longe,
num barco poveiro,
carregadinho de peixe,
regressando da faina.
e uma multidão de varinas,
cheias de esperança,
de açafates vazios,
o esperam na praia.
de verão e de inverno,
afoito e ladino,
sem medo do mar,
da fúria das ondas,
ele cumpre o destino
de ir e voltar.

ouvindo Grieg

Berlim, 1 de Fevereiro de 2015, 8h9m

Joaquim Luís Mendes Gomes

Rua dos impossíveis...

vim viver em Berlim,
ao cabo da minha vida,
na rua dos impossíveis.
não vim por mim,
foi o destino
do meu país
que o quis assim.

preferia ser feliz,
naquele pedacinho de terra à beira-mar.
atravessado de serras, lezirias e rios belos.
povoado de muitos pinhais
e bons vinhedos.
onde o sol nasce sempre a nascente
e se vai deitar no mar poente.
onde se ergueram no cume de montes,
tantos castelos possantes
e fortalezas.
uns em pedra, 
resistentes,
outros de sonhos
que um vendaval desfez.
tantas igrejas e catedrais.
ermidas brancas,
com procissões de culto.

foi um império,
multicontinente.
de lá partiram caravelas,
rumo ao ignoto,
com muito arrojo,
descobrindo o mundo,
ligando os povos.

gerou um épico,
dos luminares,
Luís de Camões.
e dois prémios Nobel.
até um papa em Roma.

foi grandioso,
cultivou a honra,
até à hora presente
do infortúnio.
uma horda louca,
de gente incauta,
tomou o poder
pela democracia falsa,
e se fez tirana,
espoliando o povo.
só sobreviverá
quem conseguir fugir...

Berlin, 3 de Fevereiro de 2015, 23h23m

Joaquim Luís Mendes Gomes 

[ex-Alf Mil, CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66]




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Nora do editor:

Último poste da série > 2 de abril de  2015 > Guiné 63/74 - P14429: Blogpoesia (411): A Estrada do Tempo (José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enf da CCAÇ 2381)

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