quarta-feira, 18 de março de 2015

Guiné 63/74 - P14383: (Ex)citações (267): Será que nós estamos escrevendo milhares de postes à procura da juventudo "perdida" na guerra? (José Manuel Matos Dinis)

1. Mensagem do nosso camarada José Manuel Matos Dinis (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71) com data de 12 de Março de 2015:

Olá Carlos,
Peço-te que coloques esta minha interpretação sobre a questão proveniente do outro lado do Atlântico.
O Vasco(*) é muito pertinente na abordagem do tema e, seguramente, valerá a pena conhecer as opiniões dos camaradas.
Também tenho costela de bairradino, pelo lado paterno, por isso evito falar de caçoilas, mas desejo-lhe muitas alegrias.

Com um abraço
JD

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O Vasco lança o repto para respondermos aqui no Blogue, se andamos à procura da juventude "perdida" durante a guerra, e eleva o nível da introspecção pelo cotejo da procura do tempo perdido, de Proust. Também dá tópicos para reflexão, como termos nascido numa "ilha", considerando a localização (influência mediterrânica), e o tempo do pós-guerra, de que o nosso "jardim" ficou imune às devastações ocorridas no resto da Europa.

A propósito da guerra-fria recorda uma linha de orientação adoptada por Salazar, que lançou a ideia neutral do Minho a Timor. Foi uma espécie de realidade da época, pois a neutralidade revelou-se comprometida com os dois lados da contenda, o que ia custando a invasão dos Açores. Também poucos saberão, que depois do 25 de Abril os timorenses, que viviam pacificamente sob a bandeira das quinas, quiseram continuar portugueses, e só uma campanha de dinamização entusiástica os levou à guerra forçada, para escolha do modelo político que a independência exigia.

Sobre a máquina de propaganda de Salazar, provavelmente, não foi tão eficiente para a juventude mais esclarecida que frequentava os meios académicos, quanto tem sido as lavagens aos cérebros desde a revolução, assente nos pressupostos dos 3 dês - descolonização, democratização e desenvolvimento. O primeiro pressuposto foi rápida e miseravelmente realizado, recheado de traições, crimes, e outras ignomínias; o segundo, corresponde a uma quimera, um mito bestial, e a população, nem de perto nem de longe, aceita a acusação de ter vivido acima das possibilidades, nem tem responsabilidades sobre a situação económico-financeira, nem foi consultada e confrontada com a adesão à CE (ex-CEE), nem passou mandatos para a venda de infra-estruturas públicas e estratégicas, pelo que as coisas têm acontecido marginais à democracia, mas em obediência a uma descontrolada "democracia-representativa" que aproveita a espertalhões; e sobre o terceiro pressuposto, como decorre do anterior, tudo tem acontecido sem rei nem ropue, à mercê do investimento estrangeiro (agora a China é que está a dar), ou do crédito internacional, que os sucessivos governos têm desbaratado com vaidade e seleccionada galhardia.

Ah! A nossa juventude?

Durante os 3 anos de tropa que nos eram impostos, dávamos largas à nossa alegria e energia, sempre que as oportunidades o permitiam. Construímos novas amizades e praticamos a solidariedade, de que os encontros de confraternização são bons exemplos, e acabado o serviço militar, entrámos no mercado de trabalho conforme competências, apetências e oportunidades de cada um, e constituímos famílias. Não me refiro aqui aos que tiveram a infelicidade de transportarem sequelas da guerra, que são casos muito especiais que a sociedade, ignorando a solidariedade democrática, parece ignorar.

A guerra parecia perdida "ab initio", mas a generosidade dos jovens portugueses veio a impor-se à admiração do mundo (mau grado algumas artimanhas que contrariaram a dignidade da condição militar pelo aproveitamento pessoal de oportunidades ilegítimas e ilegais. Não se queria saber, ao mesmo tempo, que as maiores colónias mostravam um processo de desenvolvimento económico-social com taxas de crescimento entre os 6 e os 15%, enquanto a metrópole registava médias de 3 a 4%. Outro factor a considerar, é que aquelas colónias registaram o crescimento da população branca para o dobro, pois passaram a catalizar o interesse de uma parte dos ex-combatentes, que ali procuraram futuro, e não usavam chicote, G-3, ou Bazuka. O ambiente era pluri-racial e cada vez mais havia nativos a ombrear com metropolitanos nas diferentes actividades laborais e culturais - mas neste âmbito que consideramos, as coisas não acontecem com a facilidade e velocidade do interruptor.

Meu caro Vasco, as minhas memórias (depois da Guiné fui trabalhar em Angola) incidem na experiência pessoal, na alegria e na realização no trabalho, na segurança e harmonia familiar, mas também na observação atenta (li vários relatórios do Banco de Angola), enquanto cotejava com a propaganda local, nacional, e nacionalista (lia o Comércio do Funchal, esquerdista, e o Expresso desde o n.º 1, para além de alguns ensaios escritos que encontrava), as primeiras eram dinâmicas, a última era muito pobre de ideias e soluções dogmáticas. Também integrei uma reduzida mas interessante tertúlia com interesses no bem comum. E sonhávamos. Deve haver, porém, gente com opinião diferente, sobretudo se vinculada a dogmas ideológicos.

Finalmente, é minha convicção, que aquelas sociedades pujantes caminhavam inexoravelmente para a auto-determinação, talvez com independência soberana.

Abraços fraternos
JD
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Notas do editor

(*) Vd. poste de 12 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14351: Blogoterapia (266): O Senhor M. Proust escreveu milhares de páginas "À la recherche du temps perdu"... Será que nós estamos escrevendo milhares de postes, à procura da juventude "perdida" na guerra? (Vasco Pires, ex-alf mil art. cmdt do 23º Pel Art. Gadamael, 1970/72)

Último poste da série de 17 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14379: (Ex)citações (266): Considero, e para ser objectivo, que todos se estão borrifando para a Guiné-Bissau (Mário Vitorino Gaspar)

7 comentários:

Anónimo disse...



J.D, meu grande camarada e amigo:

Aprecio-te muito pela amizade que demonstra ter com todos os camaradas.
No campo das convicções e dos ideais já há muitos anos que o teu cerebro os defeniu para tu teres uma vida mais confortável de acordo com a tua personalidade. José Dinis, tu que és um homem inteligente, não devias querer distorcer o pensamento do Vasco, que é outro daquele que tu intrepretas. Tu que sabes muito bem isso, não entendo porque é que tu queres roubar a água do moinho dos outros, para o teu o moinho que está distante. Gosto de ti, entre outras razões, porque tu não foges ao confronto, nem à luta, mas deixa que por vezes, gostas de passares rasteiras aos velhos camaradas. J. D., minha raposa matreira, gosto muito de ti e gosto muito do Vasco, ainda um dia, oxalá, havemos de beber os três, um champanhe da Bairrada.
O Vasco é um intelectual que percorreu mundo e absorveu muitos conhecimentos nessa viagem, tu és um provinciano da linha do Estoril e eu sou um provinciano de Trás-Os-Montes.
Meu amigo, a nivel mundial a diferença entre uma coisa e outra não é muito diferente.
José Manuel Matos Dinis, acredita que é sempre um prazer falar contigo, mas por hoje é tudo. Hoje fui almoçar à Tabanca de Matosinhos, o vinho da casa até nem é bom , nem mau, mas veio um camarada de Vila Flor (enfim Trás-Os-Montes a fazer diferença), que trouxe um aguardente velha muito boa. Para ti, para o Vasco bairradino e para todos os camaradas que nos quiserem ler, um grande abraço.

Francisco Baptista

Francisco Baptista

JD disse...

Olá Francisco, boa noite!
Antes do mais quero agradecer todos os elogios que me fazes, quiçá injustos e sem estribo.
Por outro lado, acredita que não pretendo distorcer o pensamento do Vasco, como o de outro camarada, apenas apresento um contraponto, e antevejo com facilidade que não serás um unânimista, do que resulta alguma confusão para mim sobre a crítica que fazes, no sentido de que eu seja um manipulador. Acredita que não. Aliás, acho que ressalvo essa intenção de contrapor, que no meu entender é legítima, e talvez saudável, se não nos conformarmos todos a uma só voz. Lembras-te da voz do dono? Pois eu não quero ter dono, embora esteja disposto a aderir a um ou mais grupos que debatam situações com interesse. Foi nessa perspectiva que classifiquei a iniciativa do Vasco, a quem não pretendo passar rasteiras, que considero um elemento valioso que tem animado, e desejo que continue a animar, e a elevar o nível do debate interno sobre os diferentes considerandos que possamos tirar daquela circunstância.
Aceito que me digas que este espaço não deva ir além das memórias da guerra, mas essa premissa não está consignada. Agora, porém, lanço-te um repto: o de me apresentares tim-tim por tim-tim as minhas aleivosias, se elas são ou não merecedoras de crítica esclarecedora. Obviamente, não ficas obrigado a nada, ou, se preferires, podemos trocar ideias por mail, privadamente.
Sabes do que gostei? Foi do provinciano, e acertaste em cheio, porque eu adoro a provincia, e como calcorreei o país a butes, tenho de todos os azimutes fortes motivos de atracção e deleite.
Sobre a crítica ostensiva à qualidade da pinga em Matosinhos, quero alertar-te de que o palato varia de individuo para individuo, do que pode resultar o subjectivismo da tua apreciação. Espero que possas apanhar o Alfa para te encontrares comigo, com o Senhor Comandante, e com a demais tropa, para um repasto que já está ao nível do bem acompanhado, donde regressarias a casa bem amarrotado pelos abraços sinceros desta malta. Também aguardo a oportunidade para bebermos (e petiscarmos) juntos, e com o Vasco, quando se proporcione a oportunidade, para celebrarmos à amizade.
Agacha-te para te dar um abraço
JD

Vasco Pires disse...

Caríssimos Camaradas JD/FB,
Cordiais saudações,
Muito obrigado, por darem atenção às minhas mal alinhavadas considerações.
Lá nos idos de 50/60,os indivíduos que vieram de onde vim (a Bairrada profunda), eram apelidados de matarruanos da terra da batata,e,por ter sido alfabetizado, não deixei de sê-lo.
Forte abraço
VP

JD disse...

Caríssimo Vasco,
Como referi também tenho costela bairradina, do Luso, onde se criaram os "burriqueiros", outro sêlo de origem e orgulho. Até à geração do meu pai havia o costume de nos reunirmos em almoços ou jantares de confraternização.
Agora que já tenho aqui um camarada, interrompo, pois temos que ir aos aperitivos para o encontro da Magnífica.
Um grande abraço
JD

Hélder Valério disse...

Caros camaradas

O meu relacionamento com o José Dinis (Zé Dinis, JD) começa aqui no Blogue.
Fomos identificando alguns 'pontos comuns', designadamente a passagem por Piche, na Guiné, e depois e principalmente, a colaboração mútua que tivemos a partir duma viagem a Peniche para, com outros camaradas e amigos, dar-mos corpo à produção do livro do Manuel Maia.

Em termos práticos a 'coisa' processa-se de modo simples: ele massacra-me com algumas coisas interessantes e outras de provocar vómitos e eu muitas vezes ignoro-o, algumas vezes comento apoiando, outras vezes reajo em modo 'quase insultuoso'. Como retaliação ele usa a 'pedagogia do pontapé', sempre que tem oportunidade para tal, daí que eu evite o mais possível aparecer na "Tabanca da Linha".

Neste texto, sobre o desafio que o Vasco Pires deixou de se saber se andamos à procura da 'juventude perdida' durante a guerra e que me parece um desafio interessante e que decorre do inquérito que recentemente foi feito, o JD discorre sobre vários aspectos.
Gosto bastante daquela parte em que ele escreve "O Vasco lança o repto..." e depois daquela outra parte onde escreve "Abraços fraternos. JD".
Pelo meio, entre uma e outra frase, tem a sua visão do que aconteceu, ou pode ter acontecido, e contém, sem dúvidas, aspectos interessantes e que também não desdenho subscrever.
Mas há alguns outros em que parece ter sido contagiado pela prática de outras figuras que gostam, sem se perceber bem porquê, nem para quê,de 'colocar rótulos' em pessoas e coisas, por exemplo relembrando para os "vigilantes" distraídos e caceteiros frustrados mas na 'reserva', que o "Comércio do Funchal" era 'esquerdista'....vejam lá bem!

Na parte do que parece ser agora a nova moda dos saudosistas e que é a diabolização do 25A74, lá está a recorrência à questão dos "3 Dês", discorrendo sobre as suas 'malfeitorias'. Compreendo mas não subscrevo.

Sobre a 'descolonização' já muito se teorizou e apesar de se estar a falar apreciando situações de há 40 anos à luz das 'sensibilidades' de hoje, raramente se faz o esforço para situar as coisas no seu tempo e espaço. Não digo para "desculpar" mas principalmente para "compreender". Claro que isso implica algum 'distanciamento emocional', coisa impossível quando se abordam as coisas com a carga ideológica pessoal.

Sobre o Desenvolvimento basta querer ver que os 'agentes fautores' dos caminhos que têm de facto conduzido a este estado de desgraça são os que mais próximo estão (por ideologia e prática) dos tempos que alguns gostam de invocar como os 'bons tempos'.

No conjunto está um texto com 'sumo' que pode ser melhor apreciado.

E com tudo isto o desafio do Vasco 'passou-me' ao lado, mas ainda conto lá voltar.

Hélder S.

Luís Graça disse...

... Zé Dinis, e a propósito de confraternizações, deixa-me dizer-te quanto lamento não ter podido, mais uma vez, aparecer no encontro da Magnífica Tabanca da Linha...

Estive com aulas e estou de malas aviadas para umas curtas férias, de uma semana, em Berlim... Volto lá pela 2ª vez... Espero retemperar forças e perceber um pouco melhor o que se passa no coração desta velha Europa, aparentemente sem alma e sem estratégia...

Espero que o encontro tenha sido, mais uma vez, de cinco estrelas, ou no mínimo, de 4 estrelas e meia... Que o comandante Rosales e o seu estado maior não faz a coisa por menos...

Antº Rosinha disse...

Temos que ter calma ( Diniz e Luís)e não entrar em stress. (Os septuagenários)

Já somos antigos e pouco contamos e o mundo não acaba, mesmo sem nós.

O que se passa agora à nossa volta (Portugal e Europa) não deve afectar demais as nossas cabeças, agora.

A coisa está preta.

Todos sabem que os zorbas jamais pagarãp seja o que fôr.

Mesmo que pudessem não o faziam.

Dinheiro nas mãos dos gregos é manteiga em focinho de cão.

A Europa, toda rota há dezenas de anos, perdeu-se de vez.

A Inglaterra ficou, desta vez, no lugar certo, infelizmente, e fazia falta dentro do barco.

O Euro e a Alemanha atraem muitos inimigos e adversários e muitas alergias.

Se tivermos o(s) governante(s) certos no lugar certo...!

Luís traz uma boa reportagem da germania.