sábado, 18 de janeiro de 2014

Guiné 63/74 - P12601: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (27): Operações Vacas


1. Mensagem do nosso camarada Rui Silva (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 15 de Janeiro de 2014:

Caros amigos Luís, Vinhal e M. Ribeiro:
Aí vai, com um abração, mais um conto extraído do meu caderno de memórias.
Rui Silva



Como sempre as minhas primeiras palavras são de saudação para todos os camaradas ex-Combatentes da Guiné, mais ainda para aqueles que de algum modo ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.

Do meu livro de memórias “Páginas Negras com Salpicos cor-de-rosa” 

27 - OPERAÇÕES - VACA

Na minha Companhia era assim e provavelmente na tua também.
O que se apanhava, e refiro-me aqui e agora à recolha (desvio, mudança de dono, etc.) de gado no mato, era compartilhado irmãmente pela população do Olossato: vaca para nós; vaca para eles.

- Não serei o primeiro a dar-lhe este nome (operação-vaca) aqui no Blogue, pois o Veríssimo Ferreira assim lhe chama no Post 12413.
(Não sabia que no célebre K3 - bifurcação das estradas para o Olossato e para Mansabá, para quem vinha de Farim - já lá havia tropa em 1966). Andámos lá perto em operações de golpes-de-mão e emboscadas -.

O nosso Capitão, e honra lhe seja feita, tinha uma filosofia da guerra muito ortodoxa (para mim e por certo para toda agente da 816). Grande comandante operacional no terreno e também no desenvolvimento dos valores morais, da ética e sobretudo humanos e culturais das povoações por onde assentávamos arraiais.
O tratamento com os seus militares era insuperável, era como se diz, “terra-a-terra” mas sem a mínima quebra do respeito hierárquico. Respeitava e fazia-se respeitar.
Uma das suas primeiras preocupações, não militares, era pôr as crianças numa “escola” com um Furriel a ensinar.
A simbiose população-tropa ou tropa-população, era um dos seus propósitos prioritários.
Não me esqueço mais, e isto já no campo militar, ele tirar a MG 42 do tripé e pô-la no parapeito da autometralhadora improvisada numa GMC (o “Águia Negra” Rogério Cardoso sabe do que estou a falar) expondo-se assim, muito a jeito, à trajetória das balas e dos estilhaços (destes não se livrou, ainda que não gravemente) das granadas inimigas (não foram poucas) numa das emboscadas mais problemáticas que a Companhia sofreu durante a refrega africana. Outra atitude de rara coragem e aqui vou citar o meu grande amigo Rui Alexandrino no seu extraordinário e singular livro “Rumo a Fulacunda”:

...acorri ao local onde deparei com uma cena terrivelmente chocante e verdadeiramente trágica.
Numa viatura GMC da Companhia que estava parada junto à arrecadação, anexa à caserna dos Soldados que se aprontava para escoltar aquela coluna, envoltos em chamas, atingido que fora o depósito da gasolina, ardiam 2 militares do 3.º pelotão.
Rebentavam ininterruptamente granadas de mão e de morteiro que já tinham sido colocadas na caixa da viatura.
O pandemónio e a desorientação eram gerais.
Imóveis os sinistrados, já mortos, ardiam.
Incrédulos, protegiam-se os restantes encobertos pelos cantos e pelas paredes dos edifícios anexos sem saber muito bem qual a atitude a tomar, qual a acção a desenvolver.
Tomou então a iniciativa o Capitão Riquito, comandante da 816 que, protegido por uma auto-metralhadora DAIMLER se aventurou até junto da viatura em chamas, a destravou, lhe engatou um cabo de reboque para que fosse arrastada para o meio da parada, longe da arrecadação onde existiam mais granadas e munições.
Esgotado o combustível e arrefecida a viatura, foi então possível fazer o rescaldo do incêndio e resgatar os corpos que estavam completamente carbonizados.
Uma verdadeira desgraça! Um inacreditável horror!

Recordo bem das primeiras advertências do Capitão (particularmente, e ainda hoje, chamamos-lhe Grande Capitão) dele, logo nos primeiros dias de campanha: Quem fizesse engravidar assumia a paternidade. Balizava o procedimento do pessoal de uma forma humana e muito altruísta. Aquele foi um dos mandamentos a cumprir. Terá sido cumprido?... Julgo que sim.

O povo do Olossato e a tropa da 816 puxavam para o mesmo lado.
Olossato era uma povoação guineense das mais pequenas certamente.
Fomos ali substituir a 566 (um abraço Zé Ribeiro) uma Companhia que tinha feito um belíssimo trabalho quer no campo da luta, quer na construção e na defesa do aquartelamento, quer ainda na ajuda aos sacrificados nativos. Fomos “apresentados” numa ida à base de Iracunda e que foi o batismo de fogo para 2 Grupos de Combate da 816, um batizado que demorou aproximadamente 25 minutos de fogachada (chamei pela minha mãe ali a primeira vez - será que ela ouviu? Até pareceu…-).

Para começar… nada mau…. e eu que me gabava de não me meter com ninguém.
Julgo que a 566 foi a primeira Companhia a sediar e a reconstruir o Olossato.
Nós da 816, fomos render aquela Companhia em outubro de 1965.
Ficamos por ali praticamente 1 ano.

O Olossato foi por assim dizer a nossa terra na Guiné. Fomos encontrar meia dúzia de casas em alvenaria, supostamente outrora de colonos, e o resto era a pequena tabanca das gentes nativas do Olossato.

Havia um chefe de posto com casa própria. Do lado para Farim a loja de panos do Sr. Fodé, a casa do padeiro do outro lado e pouco mais. Isto logo a seguir ao cavalo de frisa que fechava o aquartelamento desse lado. Do lado de Bissorã, já havia mais casas. Logo imediatamente antes da “Porta d’armas”, 2 a 3 casas a vender miudezas, panos garridos e diversidade de coisas muito simples e corriqueiras, regionais e artesanais - a necessidade aguça o engenho - ouvi já isto em qualquer lado. Por ali também inevitavelmente o grande barracão, outrora serração onde se acomodava a guarnição dos Obuses do meu querido amigo Alferes miliciano Brandão.

Libaneses, nem um, ao contrário de Bissorã onde lembro os bailes em casa do Sr. Rui. (eu? Não, o Libanês). Saudades? Talvez! Até então onde tínhamos estado.
No Olossato, bem dentro do aquartelamento, este bem fortificado com troncos de palmeira e chapa de bidão a guarnecer, e de planta quadrada, apenas um civil: um velhote cabo-verdiano que cultivava ananases não sei onde e para o lado de Maqué. Saía de bicicleta e usava um chapéu típico de expedicionário africano. Para ele não havia guerra.
Tinha uma casa também em alvenaria e esta ficava escondida num matagal de plantas e árvores, com algum toque de ajardinado, diga-se. Figura um pouco enigmática.

Dentro do quartel só havia casas em alvenaria e também mais um barracão (sempre as serrações) que servia de caserna aos soldados.
A tabanca da população flanqueava todo o lado Norte do aquartelamento e do lado de fora deste.
Olossato, bem dentro do Oio, e relativamente perto de Morés sempre foi uma povoação da Guiné mas terá sido completamente abandonada aquando de Morés se tornar uma das principais bases inimigas na Guiné. Aqui e julgo que foi a 566 que recolheu gente no mato e trouxe para o Olossato e aí renasceu aquela terra.

Um momento de festa e alegria do humilde povo do Olossato. Senti o pulsar da franca alegria daquela gente. Arrepiava, o chão, vermelho, até tremia. O riso das bajudas e até das mais velhas (estas mais traquejadas nos movimentos da dança) era largo. De face a face, e a mostrar toda uma dentadura muita branca e alinhada. Dentes tinham, nozes? Nem tanto…

Passado este introito (talvez longo. Desculpem!) vamos então às célebres e denominadas “Operações-vaca”.
As “Operações-vaca” tinham por fim, e daí a afinidade com o seu nome, o apanhar, para não usar outro termo mais apropriado, de gado ao inimigo ou pró-inimigo. A maioria do gado em poder daqueles, sabia-se, que era “roubado” aqui e acolá em pequenas povoações indefesas ou aquelas que não queriam colaborar com eles, e que na maioria dos casos não tinha qualquer proteção da tropa. Acresce dizer, que nestas povoações, sem qualquer proteção da tropa, o pessoal aí habitante era sempre suspeito, claro, de colaborarem com os “turras”, ou, no melhor das hipóteses, jogarem com um pau de 2 bicos - coitados pelo dilema -, isto é, eram por eles quando estes apareciam e eram por nós quando aparecíamos nós. Claro que esta situação nunca era de nos convir e, portanto, sempre que eles se negavam ao nosso convite de virem fazer a sua vida e o seu trabalho na povoação de Olossato, onde estariam a coberto das investidas e da política inimiga, ficavam então rotulados de "meio-turras” senão de “turras” mesmo, e daí as consequências. Estas no entanto não eram bem dentro da maneira de atuar da 816 mas, outras Companhias, para quem não acompanhasse a tropa ia-se lá ao outro dia…
Não estou, seguramente, a fazer juízos de valor.
O inimigo também fazia as suas retaliações, para com aquele pessoal, oh(!) se fazia!

Bom, mas para não me desviar das “Operações-vaca”, então sempre que nos inteirávamos de que o inimigo tinha algures grande quantidade de vacas que justificasse a nossa ida (e a nossa necessidade) lá nos púnhamos a caminho. O gado normalmente era guardado por um ou outro indígena, quase sempre armado, e que logo tratava de se por ao fresco, fazendo no entanto antes uma rajada ao pressentir a aproximação da tropa. A rajada era mais para avisar as “casa-de-mato” próximas do que alvejar alguém, mas se pudesse acontecer as duas coisas…

Como estas operações se faziam com alguma frequência nunca faltava carne à tropa e à ávida população, pois o Capitão compartilhava o “apuro” com os nossos fieis amigos e nativos do Olossato.

Era uma operação típica e grotesca; o risco a correr pela malta, salvo um encontro fortuito, embora sempre de admitir logo fora do arame farpado, não era muito previsível, pois, como atrás disse, as vacas nunca estavam, obviamente, perto dos refúgios dos “turras”, e, uma vez as vacas na nossa posse, toda a cena decorrente fazia lembrar o “Far-West”. Aquela grande quantidade de reses, só de uma vez foram à volta de 100, em fila indiana, acompanhada da malta de arma nas mãos, também a fazer lembrar os pistoleiros daquelas paragens do Oeste americano. Havia soldados que chegavam a montar nas vacas, ao bom estilo do rodeo americano, o que elas, aos pulos, tentavam sacudir. Alguns bem queriam mas não havia hipótese, e tudo aquilo tinha feições de um filme de “cow-boys”. Um rodeo (!), isso mesmo! Como víamos nos filmes.

Raramente os terroristas apareciam emboscados, pois como o sequestro era feito de surpresa e em jeito, só tarde eles se apercebiam do golpe, e quando eles apareciam, o azar que havia, era ficar uma ou outra vaca com uma rajada no lombo, pasto para os abutres que andavam sempre por perto. Homem armado, abutre por perto, parecia.

Junto da nossa cozinha, refiro-me à cozinha dos Furriéis, havia uma enorme árvore e por lá estavam sempre meia dúzia de abutres. Apetecia fazer tiro ao alvo, mas constava-se que era proibido (?) matar abutres. E por falar em abutres também lembro-me bem de encontrarmos um burro morto ali para os lados da célebre serração na estrada para o K3 inteirinho na carcaça exterior e com todo o interior comido.
Parecia que estava a dormir. Curioso. Os abutres tiveram o cuidado de preservar a total fisionomia exterior do burro. Literalmente. Prontinho a encher para embalsamar. Impressionante o trabalho cirúrgico dos sinistros abutres.

Carne (aqui já estou a falar das vacas não da do burro), portanto não faltava mesmo com semanas a comer com arroz (mal) pilado, por falta de reabastecimento. O pontão de Maqué (entre Bissorã e Olossato, mais ou menos a meio caminho) onde obrigatoriamente passavam as colunas motorizadas e de reabastecimento era destruído com alguma regularidade pelo inimigo. Mais tarde teve ali lugar um destacamento.
Na nossa companhia havia um magarefe de profissão (civil), o que ajudava e muito a seleção criteriosa de toda a carne do animal Os miolos fritos bem regados a cerveja era um pitéu logo ao meio da manhã.

As operações-vaca rendiam uma boa petiscada ao meio da manhã: miolos fritos muito bem regados a cerveja. Como se pode ver, nos Furriéis também havia bons corneteiros. Eu estou a dizer para a objetiva “ai que rico pitéu”.


Vistas aéreas (de ângulos diferentes - quase opostos -) de Olossato . A primeira foto, propriedade do meu amigo José Ribeiro (CART 566) foi tirada em 1965 e a segunda em 1966, com a diferença sensivelmente de um ano, portanto. Como ponto de referência das duas fotos a caserna dos soldados (A).
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Nota do editor

Último poste da série de 22 DE OUTUBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12188: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (26): Como se faz acabar o vício de cravar cigarros aos outros

Guiné 63/74 - P12600: Convívios (558): Notas de reportagem do XI Encontro da Tabanca da Linha, que teve lugar no dia 16 de Janeiro de 2014 (José Manuel Matos Dinis)

1. Em mensagem do dia 16 de Janeiro de 2014, o nosso camarada José Manuel Matos Dinis (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), mandou-nos a habitual crónica referente ao último convívio da Magnífica Tabanca da Linha, levada a efeito no passado dia 16 de Janeiro.
Reza assim:


16JAN2014, 5ª. feira

O céu alternava entre nublado com chuviscos, e aberto.
Da serra provinha uma ligeira brisa propiciadora do bom encontro entre camaradas da Guiné. Entre estes, avultava uma ausência, a do Sr. Comandante Rosales. De facto, a contas com uma prolongada complicação na zona ilíaca (deve ser lá prós confins ribatejanos), tem cedido às dores que isso lhe provoca, apesar das tréguas passageiras que as drogas lhe permitem, e só sai de casa, muito a custo, quando vai ao médico.

Ainda recentemente, convocou-me para o transportar, e foi um horror. A certa altura, eu já não via o caminho, nem onde punha os pés, e passou a faltar-me a respiração, quando S.Ex.ª fez um movimento que me comprimiu as narinas e a boca, contra umas adiposidades que o estado não remove, enquanto lá de cima da confusão me encorajava mais ou menos nos seguintes termos:
- "Zé! tás a ver a tua sorte, já perdi dez quilos!"

Arriei a carga, quando desfaleci, por acaso junto da viatura transportadora. O país e a tertúlia não sabem o que me devem. Nem eu imagino do que me possam acusar.

Mal tínhamos tomado lugar à mesa em atitudes de domínio territorial para não irmos almoçar para sítios menos dignos, e tocou o telefone. Era S. Exª. que, baixinho, me transmitia umas instruções que antes já delineara. Atento, como só os grandes repórteres são capazes, o grande Pires mandou-me dizer-lhe que já o contactávamos, sacou de um aparelho à profissional da rádio e informação, pôs aquilo a falar em alta voz, e S.Exª. teve ocasião de dirigir uma bonita mensagem aos presentes, entre os quais se registam cinco novidades. Cinco, que aproveitaram a campanha de inverno para se transferirem dos indistintos, para o grupo de Magníficos Tabanquistas da Linha.

Mas o telefonema acabou por transmitir uma preocupação disciplinar de S.Exª., no sentido de que nesta Magnífica Tabanca, ninguém deve ser maior do que S. Exª. o Comandante. É óbvio e eticamente merece toda a legitimidade. Por isso, o camarada Pires, com os seus palmos aferidos, foi encarregado de medir a barriguinha do confrade Miguel, iniciativa que veio revelar que aquele importante elo da formação está nos limites do aceitável, pelo que não deve exagerar. E não exagerou.

Com a chegada dos chouriços convenientemente resfriados, bocadinho quase invisível de paté, e uns queijinhos aceitáveis, o pessoal começou a aquecer as máquinas e a conversa a fluir com agrado. Cá o escrevente, antes que se esqueçam de o referir, tinha preparado umas fichas de presença, que o Canhão levou para tratar em "excel", deu a explicação sobre o preenchimento, e passaram sem sobressalto de mão em mão. Mais uma iniciativa de grande alcance exclusivamente da minha lavra, de cujo sucesso que antecipo, espero que S.Exª. me dê o merecido louvor. Alguém tem que o informar, e eu farei para que não se esqueça.

Nota de razoável interesse sobre a estratégia seguida, antes da primeira parte ter terminado, já se reclamava das instâncias locais a reposição de outros tantos jarros com vinho.

Era uma casa portuguesa, concerteza!

Os excepcionais homens do retrato regalavam-se a praticar no tiro daquela espécie de percutor que às vezes alumia o ambiente, e aproveitavam as poses mais extraordinárias para as fixar em registo para o futuro, não vá alguém dizer que não estivemos na Guiné. No seu canto de retiro, o Sr. Mata trinchava peixes e carnes com visível satisfação. E foi ele que deu o alerta, o inimigo (tempo) passava inexoravelmente, e ele tinha necessidade de recolher a casa. A pedido de alguns tertulianos, enquanto cedia mais alguns momentos, atestou para a viagem com mais um bocado do "buffet" de doces. Espero que tenham reparado e aprovado o magnífico estilo da expressão "o inimigo passava inexoravelmente". Ainda hei-de compreendê-la, e nessa ocasião vou transmitir-vos o significado.

Nesse interim, vou fazer a necessária paragem na reportagem para jantar e deixar-vos em paz de espírito.
Seguem-se alguns retratos do Manuel Resende.
Para amanhã, o Jorge Canhão promete mais artilharia.

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José Colaço e Pardal

Manuel Joaquim e José Rodrigues

Graça de Abreu e José Dinis

Veríssimo Ferreira, Armando Pires e Graça de Abreu

Enf.ª Pára Giselda Pessoa e Maria Helena

Casal Fitas, Maria Helena e Mário Fitas

António Marques e esposa Gina

Miguel Pessoa, à direita, e seu primo (?)

Jorge Canhão

Graça de Abreu e Manuel Joaquim à volta dos livros

Graça de Abreu, José Dinis, Jorge Canhão e Manuel Resende
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Nota do editor

Último poste da série de 7 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12553: Convívios (557): Próximo encontro da Magnífica Tabanca da Linha, dia 16 de Janeiro de 2014, no sítio do costume. Abertas as hostilidades (José Manuel Matos Dinis)

Guiné 63/74 - P12599: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (3): Tavira, uma terra com história... (António Manuel Conceição Santos, ex-fur mil op esp, CCAÇ 4540, Bigene, Cadique, Nhacra, 1972/74)



Tavira >  Foto nº 13 >  Álbum  fotográfico do nosso camarada António Manuel Conceição Santos [Tomanel]  > Quartel da Atalaia, RI1, CISMI (1)...




Tavira >  Foto nº 13 >  Álbum  fotográfico do nosso camarada António  Manuel Conceição Santos [Tomanel]  > Quartel da Atalaia, RI1, CISMI (2)...


Tavira >  Foto nº 15 >  Álbum  fotográfico do nosso camarada António  Manuel Conceição Santos [Tomanel]  > Quartel da Atalaia, RI1, CISMI (3)...


Tavira >  Foto nº 17 >  Álbum  fotográfico do nosso camarada António  Manuel Conceição Santos [Tomanel]  >  Quartel da Atalaia, RI1, CISMI (4)...


Tavira >  Foto nº 18 >  Álbum  fotográfico do nosso camarada António  Manuel Conceição Santos [Tomanel]  > Quartel da Atalaia, RI1, CISMI (5)...



Tavira >  Foto nº 4 >  Álbum  fotográfico do nosso camarada António  Manuel Conceição Santos [Tomanel]  >  > Centro histórico


Tavira > Foto nº 6 > Álbum fotográfico do nosso camarada António  Manuel Conceição Santos [Tomanel] > Rio Gilão


Tavira > Foto nº 21 > Álbum fotográfico do nosso camarada António  Manuel Conceição Santos [Tomanel] > Ponte (romana) sobre o Rio Gilão


Tavira > Foto nº 23 > Álbum fotográfico do nosso camarada António  nosso Antóinio Manuel Conceição Santos [Tomanel] > Um das 30 igrejas e ermidas...


Tavira > Foto nº 25 > Álbum fotográfico do nosso camarada António  Manuel Conceição Santos [Tomanel] > Ponte (romana) sobre o rio Gilão


Tavira > Foto nº 32 > Álbum fotográfico do nosso camarada António  Manuel Conceição Santos [Tomanel] > Vista parcial da cidade, e a ria de Tavira e as famosas salinas...


Tavira > Foto nº 27 > Álbum fotográfico do nosso camarada António  Manuel Conceição Santos [Tomanel] > Estação da CP  e conjunto escutório (o militar e a mulher tavirense), da autoria do belga  Francis Tondeur (1)


Tavira >  Foto nº 27 >  Álbum  fotográfico do nosso camarada António  Manuel Conceição Santos [Tomanel]  >  Estação da CP  e conjunto escutório (o militar e a mulher tavirense), da autoria do belga  Francis Tondeur (2)



Tavira > Foto nº 29 > Álbum fotográfico do nosso camarada António  Manuel Conceição Santos [Tomanel] >  Estação da CP  e conjunto escutório (o militar e a mulher tavirense), da autoria do belga  Francis Tondeur (3)






Tavira > Foto nº 33 > Álbum fotográfico do nosso camarada António  Manuel Conceição Santos [Tomanel] > > O autor, na ponte sobre o Rio Girão.

Fotos: © António Manuel Conceição Santos (2014). Direitos reservados.


1. O nosso camarada (e membro da nossa Tabanca Grande, desde 21/4/2008)  António Manuel da Conceição Santos (Tomanel, para os amigos) foi  Fur Mil Op Esp,.  CCAÇ 4540 (Bigene, Cadique, Nhacra, 1972/74)... Vive em Faro, mas nasceu em Tavira. O que poucos sabem é que um apaixonado pelas coisas e gentes da sua terra, o Algarve, tendo criado, entre outras páginas na Net, o blogue Um Raio de Luz e Fez-se Luz -. Algarve.. Sigo esse blogue (que não é muito amigável...por excesso de informação)  e há muito que tinha guardado um precioso ficheiro, em power point, com texto e fotos sobre Tavira. Trata-se um "slideshow", com 33 slides, que vale a pena ver e ouvir. Aqui.[Tavira - Tu que já passaste em Tavira].

Eu, que passei por Tavira, no 4º trimestre de 1968,  e que fiquei apaixonada por aquela terra (uma das mais belas do nosso país), não resiti a aproveitar algumas das imagens e do texto do Tomanel... para que pudessem chegar mais longe, através do nosso blogue. De algum modo, estou a antecipar a "romagem de saudade" quevou  lá fazer no último fim de semana deste mês, prenda de anos da patroa... (LG)


Com a devida vénia e um alfabravo para o autor. (LG).


2. TAVIRA – uma terra com história
Brasão de  Tavira. Fonte:  Wikipedia



por António Manuel C. Santos [Tomanel]
[Texto recuperados do "slide show" de visita obrigatória, disponível aqui]


Tu!!!!, que por aqui já passaste … por favor, não te emociones. Sei que vais deitar uma lágrima…

Vamos recuar no tempo em que os fenícios em pleno século VIII a.C. construíram uma fortaleza na colina,  hoje designada de Santa Maria.

Depois vieram os Romanos e é no século I a.C. que Tavira começou a ter um enorme valor,  quer estratégico, quer a nível económico,  devido à arte da pesca, à indústria da salga do peixe e aos produtos agrícolas. Deixaram em Tavira marcas que se encontram ainda bem visíveis e outras que estão a ser postas a descoberto.

Mais tarde, durante o domínio islâmico que ocorreu entre os séculos VIII e XIII, Tavira torna-se uma localidade muito importante, devido ao seu castelo e ao movimento do seu porto.

Tavira é então conquistada aos mouros, em 1242, sendo ocupada pelos cavaleiros da Ordem Militar de Sant´Iago, seguindo-se a tomada de Cacela (vide UM RAIO DE LUZ E FEZ-SE LUZ e procure COISAS DO NOSSO ALGARVE: Cacela Velha – Um cheirinho a Árabe)

Tavira é elevada a cidade em 1520 por D. Manuel I. 

Os anos foram passando e, com o abandono das Praças do Norte de África, com a deslocação dos grandes morgados para o Sul de Espanha à procura de melhor sorte de vida no comércio com as Índias, aliadas ao declínio das pescas e ao assoreamento do rio Gilão, Tavira deixou de ter aquele tão grande interesse e passou a ser uma cidade pacata e, em termos económicos, apenas restava a pesca do atum.

Mas Tavira continuava a ser um ponto estratégico-militar. O que nos interessa aqui é destacar que em 1640 esta pacata cidade passou a ser guarnecida por um Destacamento de um dos dois Regimento do Algarve provindo da Organização do Terço Novo da Guarnição da Corte.

Em 1795, a Rainha D. Maria I manda construir o Quartel da Atalaia, assim era conhecido e assim hoje continua a ser conhecido. Por aqui passaram várias Unidades, mudou de nome algumas vezes, mas, foi em 1948 que aqui começou a funcionar o CISMI (Centro de Instrução de Sargentos Milicianos).

Hoje, este Quartel da Atalaia recebe Companhias de várias especialidades com vista a aprofundar conhecimentos geoestratégicos, como o Centro de Instrução de Quadros (CIQ), bem como o Centro Militar de Férias de Tavira (CMFT).

Foi aqui que,  nas décadas de 60/70 [do Século passado],  milhares de instruendos foram chamados a obter especialização nas várias vertentes para Sargentos Milicianos.

Após a especialização, partiam para serem integrados em Companhias, que depois de receberem instrução, o destino era as guerras de África. Na verdade, eu próprio, natural desta Terra e que aqui fui instruendo, afirmo que este Quartel tornou-se pequeno para a imperiosa necessidade de “fabricar” furriéis milicianos, tendo sido mais tarde, acrescentado um 1º andar.

A falta de camas para todos os instruendos era uma realidade e,  por isso, quem quisesse ou pudesse, poderia pernoitar na cidade em quartos alugados. Nessa altura, Tavira tinha muito movimento devido aos militares que por aqui passavam e aos familiares que aqui vinham.

Ao anoitecer enchiam-se os bares junto ao Rio Gilão e muitos passeavam pelas ruas estreitas à procura de amizades passageiras ou não com as moças da nossa Terra. Morenas, de olhares esguios, passeavam pelo jardim do coreto,  tentando captar a simpatia dos rapazes. Muitas arranjaram namorados e muitas ficaram como madrinhas de guerra.

Sendo certo que Tavira é a Cidade das Igrejas, são cerca de 30 ao todo com ermidas, muitos de nós, instruendos, deambulávamos pelas ruas, por vezes fazendo apostas, na tentativa de descobrir quantas eram.

As margens do Rio Gilão, que divide a cidade ao meio, enchiam-se de casais de namorados. AH!!!! QUE SAUDADES… A ponte Romana era palco de passagem de uma margem para a outra. Naquela altura ainda por aqui circulavam os carros, hoje está vedado ao trânsito automóvel.

Aos fins-de-semana, os que podiam, deslocavam-se à sua Terra, outros ficavam por cá. Os primeiros iam de comboio e levavam o namorico até à estação. Os segundos iam ao cinema ou passeavam por estas bandas. 

Em memória a esta fase da vida local, o belga Francis Tondeur foi convidado a fazer duas esculturas que perpetuassem esta envolvente taviresca.  Essas duas esculturas estão junto à Estação da CP, uma está junta à porta da Estação e representa um soldado. A outra está à beira da rotunda junto à Estação e representa uma rapariga da terra. Ambos fazem adeus, esse mesmo gesto simboliza emoções ambíguas que foram vividas neste local, não se sabe se é de felicidade do regresso ou da aflição do adeus da partida para a guerra.  É uma incógnita que fica e que ninguém deve ousar perguntar ao seu autor.

Hoje, Tavira é uma cidade em franco desenvolvimento, pode-se dizer que é uma cidade limpa.  Vive do comércio local, do turismo, pois tem duas bonitas praias, e sem embargo, é uma localidade do Algarve que obrigatoriamente deve ser visitada.

Aqui vos deixo mais um recanto de COISAS DO NOSSO ALGARVE. Fim 

Por favor: Se acabaste de visitar este blog, faz o teu comentário. Há lá um cantinho que diz “comentários”. O autor agradece.

Imagens: Da responsabilidade do autor.

Textos: Pesquisas locais e Roteiro de Tavira “passear e conhecer”

 Uma produção de:



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Nota do editor:

Último poste da série > 18 de janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12597: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (2): Caldas da Rainha, a cidade onde estava sediado o Regimento de Infantaria 5, onde era ministrado o Curso de Sargentos Milicianos (Carlos Vinhal)

Sobre Tavira, o Quartel da Atyalaia, o CISMI... vd também (enter outros):

16 de outubro de  2012 > Guiné 63/74 - P10538: Os melhores 40 meses da minha vida (Veríssimo Ferreira) (2): 3.º episódio: O 2.º Turno, no CISMI, na bela terra de Tavira

2 de setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P6919: Memória dos lugares (95): Tavira, CISMI, 1968: Foto de família depois das salinas (Carlos Cordeiro)


Guiné 63/74 - P12598: Os nossos seres, saberes e lazeres (64): Passagens da sua vida - 7000 milhas através dos Estados Unidos da América (8) (Tony Borié)

1. Em mensagem do dia 29 de Dezembro de 2013, o nosso camarada Tony Borié (ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66), enviou-nos o 8.º episódio da narrativa da sua viagem/aventura de férias, num percurso de 7000 milhas (sensivelmente 11.265 quilómetros) através dos Estados Unidos da América, na companhia de sua esposa.



7000 MILHAS ATRAVÉS DOS USA - 8

Ainda se lembram? No último dia dormimos no estado de Ilinois, na cidade de Rockford, a umas tantas milhas da cidade de Chicago.

Abandonámos o hotel depois do pequeno almoço, tomámos a normal medicina de prevenção, vendo o tempo que parecia agradável, deixámos o hotel, enchemos o tanque com gasolina, o GPS em direcção algures para leste e eis-nos de novo na estrada número 90, em direcção a Chicago, pois era essa a nosso rota. "Chi...cáaa...go, Illinois”, como dizem na rádio.

Havia tráfico, a estrada estava em reparação, em algumas zonas pagava-se portagem, mais construção e por fim avista-se a cidade ao longe. Começa o tráfico a abrandar, cada vez mais devagar, lá fomos andando com algum progresso, até chegarmos a uma zona onde dizia: “Downtown”.


Aí saímos da estrada número 90, por entre um trânsito onde havia táxis, carros grandes e pequenos, alguns camiões fazendo descargas, pessoas atarefadas, querendo passar com a luz do semáforo ainda encarnada, mas lá fomos progredindo até chegar mesmo ao “Downtown” da cidade de Chicago. 

Estávamos no “Downtown” de Chicago, aquele Chicago cuja cultura popular é encontrada em romances, peças teatrais, filmes, músicas, vários tipos de revistas e meios de comunicação, que lhe chamam a todo o momento de “Chi-town”, “Windy City” e “Second City” e alguns até lhe chamam “a mais americana das grandes cidades”.


Esta cidade foi fundada em 1833, num lugar onde naquela altura se guardavam e reparavam as embarcações que navegavam entre os Grandes Lagos e a bacia do rio Mississipi. Dizem que hoje tem perto de 2,7 milhões de habitantes e é a terceira mais populosa dos Estados Unidos, claro, depois de Nova Iorque e Los Angeles.

Andámos por umas ruas ou avenidas, sempre alguém a buzinar ao nosso lado, ou atrás do jeep, não sabíamos se buzinavam por fazermos alguma manobra menos correcta ou se pelo estado em que se encontrava o jeep, sujo, mesmo muito sujo, com algumas sacas de lona e dois tanques extras de gasolina amarrados na parte de trás, entre outras coisas próprias de quem viaja por lugares quase desertos e anda muitos dias fora de casa, o que lhe dava um aspecto um pouco parecido com aquelas caravanas dos “ciganos amigos”, que me lembra quando jovem, passavam na estrada nacional, próximo da minha aldeia do vale do Ninho d’Águia, em Portugal.
Na nossa opinião, só faltava mesmo aquele “cão rafeiro”, que seguia sempre amarrado com uma corda debaixo do carro, puxado quase sempre por um “burro manhoso e faminto”. Enfim, esta barafunda toda, fazia-nos ter saudades das estradas desertas do estado de Wyoming, onde o pessoal das motos levantava a mão, saudando-nos, quando por nós passava, talvez querendo dizer, “tem calma e desfruta a paisagem”. Estes aqui, empurravam- nos, buzinando, por certo queriam dizer: “anda, que não há tempo a perder”.
Decidimos estacionar, procurámos e por fim vimos o letreiro, “parking”, entrámos, tirámos o bilhete, rodámos por um labirinto de carros, subimos alguns andares e finalmente encontrámos um espaço livre. Parámos e estacionámos.
Fechamos o jeep, levando connosco o telefone, documentos e alguns valores, pois estávamos em Chicago. Saímos à rua, que sorte, estávamos mesmo no “Downtown”.


O comboio passava nuns carris instalados numa grande estrutura, mesmo por cima da rua, portanto por cima de nós, fazendo aquele barulho característico dos comboios de cidade em fraco estado de conservação, como se vê nos filmes, as pessoas andavam depressa na rua, parece que alguém os chamava, nós olhámos e decidimos andar para norte, pois era para onde as pessoas iam, e em boa hora o fizemos, pois para esse lado era a zona mais bonita, o canal, as pontes, um passeio na beira do canal, edifícios altos e com bonita arquitectura, muitos monumentos, nas ruas e na beira do canal, barcos passando com pessoas tirando fotos, enfim era um Chicago lindo, mais lindo que Nova Iorque, dizia um casal ao nosso lado, que parecia oriundo do Japão.


Havia autocarros com dois andares, sem cobertura para fazer o “tour” na cidade, perguntámos o preço, o bilhete podia ser usado por um período de três dias, estava um pouco fora do nosso alcance, decidimos pedir o roteiro, fomos buscar o jeep ao parque de estacionamento, que nos levou uma “fortuna”, por duas horas e meia de estacionamento, e seguimos um dos autocarros sem cobertura, percorrendo a cidade e os seus mais importantes lugares, tirando fotos, (por curiosidade, muitas pessoas também nos tiravam fotos a nós, quando parávamos nos sinais de trânsito), vendo monumentos, canais, edifícios, alguns com uma arquitectura deslumbrante, as docas, parques, alguns limpos e bem cuidados, onde algumas pessoas praticavam exercícios ou simplesmente caminhavam.

Foi bonito e recomendo.

Voltámos à estrada número 90, passámos a fronteira para o estado de Indiana, que é um estado com um terreno pouco acidentado, portanto com grandes planícies, um solo bastante fértil, que fazem deste estado um grande produtor de trigo, o que podemos comprovar pelas enormes áreas cultivadas, próximo da estrada onde seguíamos, na rota em direcção ao Atlantico, passando por South Bend, Elkhart, entrando no estado de Ohio.


O estado do Ohio, que na língua “iroquesa” significa “Algo Grande”, “Grandes Águas”, “Belo Rio”, “Grande Rio” ou “Bom Rio”, pois eram estes os nomes utilizados pelos nativos americanos, para descrever o rio Ohio, antes da chegada dos primeiros exploradores europeus, os franceses.
Também chamam a este estado “Mother of Modern Presidents”, ou seja a Mãe dos Presidentes Modernos, pelo facto de sete dos Presidentes dos Estados Unidos nasceram e cresceram no Ohio, estando em segundo lugar, pois o estado de Virgínia, tem um total de oito presidentes.


Continuando na rota do Atlântico, passámos próximo de Toledo, Elyria e Cleveland, que fazia parte do nosso roteiro, embora já tivéssemos por outra altura estado na cidade, havia alguns lugares a visitar, mas já era ao pôr-do-sol e não havia muito tempo com luz do dia para admirar esses lugares, portanto seguimos e fomos dormir e comer na povoação de Austinburg, no estado de Ohio, onde não havia vagas nos hotéis, mas por especial favor, dormimos num, onde pelo menos nós não vimos computadores. A recepcionista pediu-nos para preenchermos uma folha com o nosso nome e direcção, e uma cópia dessa mesma folha foi a nossa factura. Este hotel tinha o sugestivo nome de “American B.... V.... Inn”, com uma “maravilhosa” vista para a estação de serviço na área e com um som característico dos camiões rolando fora de horas a toda a velocidade, na auto-estrada número 90.

Este foi o resumo do dia 8, e ainda estamos muito longe da nossa casa, na Florida.

Tony Borie
Agosto de 2013
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Nota do editor

Último poste da série de 4 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12541: Os nossos seres, saberes e lazeres (63): Passagens da sua vida - 7000 milhas através dos Estados Unidos da América (7) (Tony Borié)

Guiné 63/74 - P12597: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (2): Caldas da Rainha, a cidade onde estava sediado o Regimento de Infantaria 5, onde era ministrado o Curso de Sargentos Milicianos (Carlos Vinhal)

1. Dando cumprimento ao desafio do Editor Luís Graça, vou falar, não da cidade que mais amei ou odiei, mas de todas cidades (vilas e/ou lugares) onde estacionei no meu tempo de tropa, antes de embarcar para a Guiné.
Gostei de todas elas porque nenhuma tinha culpa da minha situação, temporária, de militar em trânsito. De todas me ficaram boas e más memórias.



Começarei pela cidade das Caldas da Rainha, onde assentei praça no RI5 como Soldado Instruendo do CSM.

Acho não ficar mal confessar que antes de ir para a tropa, o mais a sul que tinha ido, tendo como referência a minha residência no concelho de Matosinhos, fora Fátima com os meus pais, aos 10 anos de idade, no ido ano de 1958.

Ir para as Caldas, no dia 21 de Abril de 1969, tornou-se portanto uma aventura, minimizada pelo facto de a viagem ser partilhada por largas dezenas, ou centenas, de mancebos que de todo o norte do país convergiram para a Estação de S. Bento a fim de apanharem o comboio-correio da meia-noite. Um grupo bem numeroso, onde eu me incluía, saiu de Leça da Palmeira no autocarro das 22 horas a caminho da cidade Invicta. Assim se iniciou uma longa viagem de quase 12 horas.

Não me perguntem como, mas sabíamos de antemão que tínhamos de fazer dois transbordos, um em Alfarelos para apanhar outra composição de um ramal que nos levaria até à estação de Lares, na Linha do Oeste, onde aguardaríamos por outro comboio que nos levaria finalmente às Caldas.

Tenho em memória que chegámos aos portões do RI5 por volta das 9h30 da manhã de 22, dia que me estava destinado para comparecer no quartel, tendo grande parte do grupo entrado de pronto porque nos disseram que se esperássemos pela tarde, a confusão seria mais que muita.

Vamos saltar as peripécias militares, para aqui não chamadas, e vamos falar da terra propriamente dita.

Ao tempo a cidade era relativamente pacata, destacando-se o velho Hospital Rainha D. Leonor, localizado no frondoso Parque D. Carlos I, o Parque propriamente dito e as várias lojas de artesanato, mais ou menos atrevido, que explorámos nos tempos livres.

Hospital - Foto: http://images.fineartamerica.com/, com a devida vénia

Famoso era também o Café Zaira(*), situado na Praça da República, onde não passávamos muito de perto já que junto ao vidro, do lado de dentro, costumavam sentar-se os oficiais, o que nos obrigava a constantes e arreliadoras paladas.
Diga-se em abono da verdade que no belíssimo Parque acontecia o mesmo, já que era vulgar encontrar muitos oficiais a passear, acompanhados de suas famílias. Como bons recrutas que éramos, o melhor era bater continência a tudo o que tivesse divisas, fosse bombeiro ou porteiro de hotel.
Nesta mesma Praça realizava-se, e julgo que ainda se realiza, o afamado mercado da fruta das Caldas da Rainha, mais um ex-libris desta cidade.

Mercado da Fruta - Praça da República - Foto: EU GOZEI A MINHA ADOLESCÊNCIA NAS CALDAS DA RAINHA NOS ANOS 70 E 80, com a devida vénia

Como bom militar tem de ser bom garfo, lembro o restaurante que frequentávamos quando o rancho não era a contento. Não me lembro do seu nome, também já não existirá, mas da empregada, a Tininha(?), uma jovem que nos atendia com especial carinho, talvez por saber que no quartel se comia muito mal. Que belos bifes com ovo a cavalo, guarnecidos generosamente com batatinhas fritas, arroz e salada. Era o nosso prato favorito. Ainda lhe sinto o cheirinho.

A cidade das Caldas da Rainha tinha já, então, uma actividade cultural e desportiva interessante. Nunca mais esqueci o Museu José Malhoa que revisitei mais recentemente, assim como os torneios de ténis de mesa, uma modalidade ali muito acarinhada, praticada num pavilhão existente dentro do Parque.

Museu de José Malhoa - Foto Wikipédia, com a devida vénia

Já aflorei o artesanato local, que não se limitava só às malandrices que mais aguçava a nossa curiosidade. Eram muitos os estabelecimentos de venda de olaria, verdadeiras montras de obras de arte confeccionadas por gente anónima nas inúmeras fábricas e ateliês que transformavam o barro em peças únicas.

Uma das mais belas recordações que guardo desta magnífica cidade foi o desfile que fizemos no Dia de Juramento de Bandeira(?), ao longo das suas ruas, com as varandas das casas engalanadas com colchas multicolores e as pessoas acenando à nossa passagem. Foi um adeus sentido de parte a parte.

Na tarde do dia 5 de Julho, em que apanhámos o comboio com destino a Lisboa, a caminho de Vendas Novas, já sentia saudades daquela terra e daquela gente.

Do RI5 não guardo boas recordações, pela má comida e porque alguns oficiais e sargentos não distinguiam a disciplina militar da prepotência e do abuso da autoridade que, julgavam, os galões e as divisas lhes conferiam.
Eram um verdadeiro vexame aquelas formaturas de revista, de hora a hora, após o toque de ordem, para podermos sair e ir dar uma volta pela cidade e comer alguma coisa de jeito. Por tudo e por nada nos mandavam para trás, o que acarretava nova tentativa uma hora depois. Estávamos assim à mercê do bom ou mau humor do Oficial de Dia.

Fica desde já aqui registado que em Vendas Novas, na Escola Prática de Artilharia, a disciplina era mais severa e a instrução militar, de longe, muito mais dura, mas éramos tratados com respeito.

Carlos Vinhal
Ex-Fur Mil
CART 2732
Mansabá
1970/72

OBS: - As interrogações são fruto de alguma incerteza, volvidos que são quase 45 anos. Aceitam-se as devidas correcções.

(*) - Nome do café rectificado por indicação do camarada António Ribeiro
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Nota do editor

Último poste da série de 17 de Janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12594: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (1): Espinho, Porto, Tavira e Torres Novas (José Martins)