sábado, 6 de dezembro de 2014

Guiné 63/74 - P13979: Bom ou mau tempo na bolanha (78): Da Florida ao Alaska, num Jeep, em caravana (18) (Tony Borié)

Septuagésimo sétimo episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGRU 16, Mansoa, 1964/66.




Companheiros, antes de iniciar o resumo do próximo dia, queria dizer-vos que nada mais nos move, além de retirar o vosso pensamento, por alguns minutos, das lembranças horríveis daquela maldita guerra, que nós todos vivemos, dos tiros, ataques ao aquartelamento, emboscadas, aquartelamentos com lama, pó, terra vermelha, abrigos improvisados, fome, arroz e peixe da bolanha sete dias por semana, esperas que o tempo passasse, com muita amargura e sofrimento, o catra-pum-pum-pum, da metralhadora mais próxima, companheiros feridos, camuflados rotos e sujos de sangue, isolados, sem notícias do exterior, onde um simples sorriso de uma simpática “bajuda”, nos fazia, pelo menos no nosso pensamento, o mais refinado “Don Juan” e, aquele sorriso daquela “bajuda”, não era “guerra”, era outra coisa, talvez uma “lofada de ar fresco”, talvez uma pequenina esperança em continuar a viver, tal como eu quero dar aos meus companheiros, quando me lêm e viajam comigo.

Cá vai o resumo do vigésimo dia

Depois de arrumar toda a “tralha”, que eram os nossos utensílios de casa, próprios para viver com alguma facilidade na nossa caravana, eis-nos de novo na estrada número 287, com um cenário de mais montanhas que planícies, rumo ao sul, parando no cruzamento com a estrada número 90, que vem do oceano Pacífico e nos leva ao Atlântico, aqui existe uma pequenina povoação de cruzamentos de estrada, com estação de serviço, loja de conveniência e, uma famosa padaria com produtos de trigo, milho ou centeio, toda a qualidade de pão e seus variados, também lá tinha pão tipo “português”, onde comprámos muito pão, que armazenámos para os próximos dias. Neste cruzamento, vêem-se muitas pessoas, mesmo casais, alguns com crianças, “à boleia”, são simpáticos. Quando comprávamos gasolina, falámos com um casal, que nos pediu boleia, todavia, não tínhamos espaço, disseram-nos que andam na estrada há cerca de um ano e, não tinham nenhuma pressa em chegar de novo ao estado do Alabama, de onde eram oriundos.




Seguimos rumo ao sul, parando por algum tempo na pequena, mas acolhedora povoação de Ennis, onde dizem que por volta do ano de 1863, um tal William Ennis se estabeleceu ao longo do rio Madison, quando se descobriu ouro na região e, talvez sem saber, deu o nome ao que hoje é uma pequena povoação. Aqui, fizemos algumas compras, continuando rumo à aventura do “Yellowstone National Park”, onde passado umas horas chegámos à povoação de “West Entrance”, pois era assim que era assinalada nos diversos anúncios de estrada que constantemente apareciam.


Aqui, antes de entrar no Parque, visitámos o Centro de Turismo e algumas lojas de recordações, onde se vende quase de tudo e, em algumas lojas, até se pode “regatear”, ou seja oferecer diferente preço do que está marcado na mercadoria. Entrámos num restaurante onde nos serviram sandes de churrasco de carne de búfalo, era diferente, gostámos.

Toda esta povoação ainda está no estado de Montana. Pouco depois de entrarmos no parque, atravessamos para o estado Wyoming e, foi surgindo pela frente o parque nacional mais antigo do mundo, pois foi inaugurado no ano de 1872, cobrindo uma área de mais de 9000 quilómetros quadrados, que se divide pelos estados de Wyoming, Montana e Idaho. Este parque é famoso por, entre outras atrações, ter os seus “Geysers”, que são umas fontes termais, que entram em erupção periodicamente, lançando uma coluna de água quente e vapor para o ar, que nós podemos observar, caminhando por umas “passadeiras”, em madeira que nos dão acesso, mesmo em frente às colunas de água quente e vapor, que se perdem na atmosfera.



O centro do grande ecossistema de Yellowstone, é um dos maiores ecossistemas de clima temperado ainda restantes no planeta. O “Geyser” mais famoso do mundo, denominado “Old Faithful”, do qual nos aproximámos, encontra-se neste parque.

Muito antes de haver presença humana em Yellowstone, pois dizem que essa presença remonta mais ou menos a 11.000 anos, uma grande erupção vulcânica ejectou um volume imenso de cinza vulcânica que cobriu todo o oeste dos USA, a maioria do centro-oeste, o norte do México e, algumas áreas da costa leste do Oceano Pacífico, deixando uma enorme caldeira vulcânica, (70 por 30 km) assentada sobre uma câmara magmática.

Felizmente não, durante a nossa visita, mas Yellowstone já registou três grandes eventos eruptivos nos últimos 2,2 milhões de anos, o último dos quais ocorreu há 640.000 anos. Estas erupções são as de maiores proporções ocorridas no planeta a que chamamos Terra, durante esse período de tempo, provocando alterações no clima em períodos posteriores à sua ocorrência. Percorremos o parque em quase todo o lugar em podíamos ter acesso, vimos os “Geysers”, com as suas diferentes cores, que correspondem aos diferentes minerais que brotam do seu interior, cascatas de água pura saindo das montanhas e rios de água quente. Atravessámos o “Continental Divide”, que é o nome dado ao conjunto de linhas formado por uma série de cumes, (vulgarmente diz-se, cumeada), na América do Norte, que separam as bacias hidrográficas que drenam para o oceano Pacífico, oceano Atlântico, incluindo o Golfo do México e mesmo até o oceano Ártico, onde uma das suas linhas divisórias passa aqui no Parque de Yellowstone, também vimos alguns animais, dos quais dizem haver no parque uma grande variedade de vida selvagem, na qual se incluem ursos castanhos, lobos, búfalos, alces e outros animais.



Ainda era dia quando tentávamos sair do parque, cumprindo o nosso programa, mesmo a poucas milhas da “South Entrance”, ou seja, da saída sul, pois estava no nosso programa seguir para outras paragens, quando surge um aparatoso acidente envolvendo um autocarro, onde segundo nos disseram seguiam crianças, ficando a estrada intransitável, mesmo fechada por um período que se prolongou por mais de 6 horas.

Esperámos mais ou menos uma hora, continuando a estrada fechada, tentámos voltar ao ponto da “West Entrance”, no caminho de regresso os veículos passavam por nós, em direcção ao sul, perguntámos, diziam que a estrada já estava aberta, voltámos ao sul, ao local do acidente, onde havia uma enorme fila de viaturas paradas, pois a estrada continuava fechada, desviámonos para um local entre árvores, embora já fosse quase noite, estando no meio da montanha, se ouvissem alguns sons de animais uivando. Estávamos decididos a passar ali a noite, quando a estrada abre, começando o tráfico a andar, voltámos à estrada, conseguimos sair do parque, mas com todo este atraso, o adiantado da noite, todos os parques de campismo lotados, pois todos procuravam lugar onde dormir, não tivemos outra alternativa, senão ocupar um lugar numa cabana, com o Jeep e a caravana estacionados numa “ribanceira”, parecendo um precipício, onde um luar divino nos iluminava.

Neste dia percorremos 339 milhas, com o preço da gasolina a variar entre $3.67 e $3.68 o galão, que são aproximadamente 4 litros.

Tony Borie, Agosto de 2014.
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Nota do editor

Último poste da série de 29 de Novembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13957: Bom ou mau tempo na bolanha (76): Da Florida ao Alaska, num Jeep, em caravana (17) (Tony Borié)

1 comentário:

Anónimo disse...

Tony Borié

Quase conterrâneo, já que a distância entre as nossas terras é pequena.

Aproveito a ocasião para te dizer que, no meu entender, apesar deste cantinho ser de "camaradas da guerra", neste caso de uma das antigas Colónias, nem só de guerra "se deve viver", para não dizer "escrever".

Continua pois que estou certo, muitos mais do que os que te fazem comentários, gostam de ler estas tuas e, quiçá de outros, aventuras, pois é também uma forma de conhecer outras "paisagens". No fundo, um pouco mais de cultura.

Leio-te sempre e raramente comento.

Abraços de Ílhavo até Miami.

JPicado