segunda-feira, 14 de julho de 2014

Guiné 63/74 - P13398: Notas de leitura (611): "Estados de Alma: cem sonetos de vida e amor", por Tomás Paquete (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 10 de Janeiro de 2014:

Queridos amigos,
Tomás Paquete tem nas veias sangue guineense, cabo-verdiano e são-tomense, nado e criado em Lisboa, assumiu depois as suas origens africanas e partiu para a Guiné-Bissau.
Como funcionário das Nações Unidas tem corrido Seca e Meca e Olivais de Santarém, ásias, américas e áfricas.
A sua poesia não é rotulável, é quase académico, oscila entre o gosto popular e o romantismo desabrido. Uma poesia cosmopolita de quem calcorreou muito mundo e descobriu as âncoras do amor e as desvela, com alegria e exaltação.

Um abraço do
Mário


Estados de Alma: Cem sonetos de vida e amor

Beja Santos

Tomás Paquete apresenta-se como produto da multiculturalidade lusófona, filho de pai guineense, mãe cabo-verdiana e avô paterno são-tomense. Nasceu em Lisboa e passou a juventude entre a Amadora e a capital. Frequentou os liceus Pedro Nunes e Passos Manuel e as Oficinas de São José. Foi funcionário do Instituto Nacional de Estatística e partiu para a Guiné-Bissau depois de assumir as suas origens africanas, foi professor e depois diretor-adjunto do Internato Domingos Ramos, no Boé. Foi seguidamente produtor e chefe do departamento de produção da Rádio Nacional da Guiné-Bissau. Participou na primeira antologia poética da Guiné-Bissau, “Mantenhas para Quem Luta”, 1977, tem vasto currículo ao serviço das Nações Unidas.

“Estados de Alma” é o seu primeiro livro de poesia. Como prefacia António Soares Lopes Jr. (Tony Tcheka), este livro marca a rotura do poeta com o passado, este conteúdo de sonetos medularmente românticos nada tem a ver com a longa luta de libertação nacional, é uma extensa e avassaladora crónica de amor, escrito por vezes num ritmo febril, por vezes mais distenso, elegíaco, temente das perdas desses amores, lançando apelos confessionais, desculpando-se, sofrendo, vitoriando as coisas do amor.

Sempre 14 versos, sonetos que cuidam da rima, métrica rigorosa. Um português castigado, depurado, saltitando entre o gosto popular e o evanescente ultrarromantismo, sem tibiezas. Assim, um poeta raro, indiferente à escola, ao estilo castigado, ao pendor académico. Poesia de consagração, de concelebração, de cântico da dor, de promessa, de registo da mulher que transformou a existência do poeta, ode à sensualidade, pranto na hora da despedida, registo da angústia nos diferentes momentos da incerteza. Fala-se do amor mulato, dos tons mate, da sensaboria do amor vertigem, curtíssimo. Trata-se de uma longa crónica de amor e de alguém que buscou e encontrou um porto de abrigo, que faz confissões ao Tejo, que tem nostalgia das ruas de Lisboa, que lança promessas e que se despede com versos feitos vida, com esta delicadeza e esta intemporalidade:

Vieste num belo formato, nada pequenina,
lembra-me o galão do mata bicho, morena.
Pele delicada em porcelana, tal loiça da china,
que até o tocar-te, não vás partires-te, me dá pena.

Vestida ou não em roupa muito ou pouco fina,
tens sempre um porte real e a voz amena.
E ao teres sido assim pensada e criada, menina,
ao teu corpo só poderiam ter dado uma alma divina.

A água de dois rios famosos fizeram-te, soberana
e quantas esperanças desfeitas, de quem queria
ocultar a beleza, que é, do Nilo e Tejo, a predileta.

Se tudo em ti, é tão sublime, apesar de humana,
espero que percebas, que és a minha única moradia,
e que um dia, transformes os versos, na vida, deste poeta.

Tomás Paquete apresenta-se assim numa toada vibrante, a pulsão é mesmo a paixão ardente. Vale a pena regressar a Tony Tcheka e ao que ele pensa destes estados de alma: “Descortina-se por entre as palavras rimadas, eivadas de estética e ternura, uma musa inspiradora à qual o autor também dedica muitos dos textos escritos num hiato de dois anos. Outros motivos vão aparecendo à medida que a esteira de sentimentos se alarga e abrange outros espaços físicos e geográficos. Ainda quando fala de lagos, rios e montanhas que foi conhecendo por esse mundo fora, é o amor sublime aos cantos”. Ingénuo nesta sua vivacidade de contar, atento à melodia dos sons, este seu livro é a exaltação pelo amor descoberto, nada mais que a vida e o amor se atravessam nesta poesia simples e calorosa.
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Nota do editor

Último poste da série de 11 de Julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13389: Notas de leitura (610): "Exploradores Portugueses e Reis Africanos, Viagens ao Coração de África no Século XIX", por Frederico Delgado Rosa e Filipe Verde (Mário Beja Santos)

1 comentário:

Anónimo disse...

Conheci o Tomás Paquete "pai".
Morava na Amadora e era corredor de velocidade. Segundo se dizia "nunca perdeu contra espanhóis". Corriam os despreocupados anos 50.
Era muito rápido e tinha um estilo inconfundível: parecia uma aranha, por ser muito magro e com as perna muito compridas. Deve haver registos dele no Sporting, no Record, no Mundo Desportivo e... na "Bíblia".
Um Ab. do
António J. P. Costa