quarta-feira, 18 de junho de 2014

Guiné 63/74 - P13302: Furriel Enfermeiro, ribatejano e fadista (Armando Pires) (15): Fadista e locutor, para cumprir o destino

1. Mensagem, de 11 do corrente, do Armando Pires
[ex-Fur Mil Enf,  CCS/BCAÇ 2861,Bula e Bissorã, 1969/70], [, foto à esquerda, Monte Real, 14/6/2014]

Meu Caro Luís Graça.
Camarada e Amigo.

Faz tempo que esta história te estava prometida. Mas o tempo não é coisa que se comande. Se eu fosse supersticioso diria que foi por ter chegado ao número 13 da série "Furriel enfermeiro, ribatejano e fadista", que a veia secou.

Mas não sendo supersticioso, porque é coisa que dá muito azar, limito-me a dizer que mais vale tarde do que nunca. Aqui tens, com o titulo de "Fadista e locutor, para cumprir o destino", o número 14 de uma série que, espero eu, passe a fluir com melhor ritmo.
Um abraço para ti, para os nossos editores, e para todos os camarigos.

2.  Furriel Enfermeiro, ribatejano e fadista (Armando Pires) (14)  Fadista e locutor, para cumprir o destino 

Portanto, o João Rebola mais o Vilas Boas foram para Binar e o fado acabou em Bissorã.

Isto foi em Junho de 70, altura em que a companhia a que eles pertenciam, a CCAÇ 2444, foi rendida por uma outra companhia de intervenção, a CCAÇ 13.

Desculpem os camaradas se os faço recuar ao P12905 para melhor compreenderem este antes e o que vem já depois, mas a vida de “escritor-amador” é muitas vezes atapetada de escolhos tais, que nem a sua muito boa vontade consegue derrubar às primeiras.

Prosseguindo.

Foram-se embora os meus violas e, oh coincidência, também partiu o capitão Luís Barros, que ali foi terminar o seu tempo de serviço no comando da CCS, grande impulsionador e animador daquelas noites sábado, com cantos ao fado e às bolas do bingo onde sempre se sorteava uma garrafa de whisky Haig, vá lá saber-se porquê, escolha pessoal do cap Barros, facto que acabou por lhe granjear, entre a sargentada, a alcunha do “capitão Haíg”, lido assim, com assento agudo e tudo, alcunha que vai certamente surpreender o hoje coronel reformado Luís Andrade Barros, fugaz leitor do nosso blog, meu recém correspondente em troca de emails, num dos quais, sobre estas noites que lhe lembrei, escreveu:

“Caríssimo Armando Pires, furriel enfermeiro, ribatejano, fadista e companheiro da guerra .
Recebi com muito agrado as suas notícias de Bissorã, nomeadamente recordando as sessões de bingo com uma afluência capaz de fazer inveja às melhores casas da especialidade. Lembro o entusiasmo que tal iniciativa despertou, a preparação - decoração da sala com pinturas alusivas e os convites para o evento, incluindo a amigos do IN, isto na certeza de então não sermos atacados.”
– P13065

O fim das sessões de bingo, e das grandes noites de fado, poderiam ter sido uma forte machadada nos relatórios da acção psico-social, não se desse o caso de nas cabeças do major Alcino e do Alferes Vinagre, ter nascido a ideia de sacar umas massas que o comandante Polidoro Monteiro tinha para a psico, para com elas comprarem uma aparelhagem sonora que o Alfredo, o libanês, mandara vir da África do Sul. A aparelhagem foi ligada a uma corneta sonora, o 1º cabo sapador Marques Catarré emprestou a sua substancial discografia, e assim nasceu a “Rádio Bissorã-70”, com emissões diárias das sete às nove da noite.

Todos estes pormenores vieram à luz do dia graças à prodigiosa memória do Furriel Sousa, uma espécie de “secretário-confidente” do comandante Polidoro. É que todos os da companhia, eu incluído, nos lembramos da “rádio”, mas de como ela nasceu é que… já lá vão 44 anos.

É preciso dizer que o major Alcino era o oficial de operações, e o João Vinagre, alferes miliciano de informações, para que se percebam os objectivos propagandísticos da coisa.

“A rádio” foi instalada no vão de escada de um edifício em
cujo rés-do-chão funcionava a secretaria do
batalhão. O 1º andar fora reservado para quartos dos oficiais. O edifício era conhecido, e ainda o é, por Casa Gardete, família guineense de grande prestigio social, na qual sobressaiu o Dr. Manuel Gardete Correia [, foto à direita], já falecido, licenciado em medicina pela Universidade de Coimbra no ano de 1959, e que se tornou numa das figuras africanas, e mesmo mundiais, mais prestigiadas na luta contra a doença do sono e a malária. (**)

A família Gardete rumou a Bissau logo nos alvores da guerra, deixando de aluguer a vários comerciantes a loja, até à chegada a Bissorã do comando do meu batalhão, que tomou de arrendamento todo o edifício.



A Casa Gardete.  Foto de 2006, cedida pelo camarada Carlos Fortunato, ex-fur mil. da  CCAÇ 13, e tirada aquando de uma das suas deslocações a Bissorã ao serviço da ONG Ajuda Amiga, de que é presidente.  Actualmente o edifício funciona como tribunal civil. A escadaria dava acesso aos quartos dos oficiais. Entre o vão de escada e a porta onde se lê “Secretaria Judicial”, funcionava “a rádio”. A corneta sonora era montada sobre aquela grande coluna que suportava um portão de ferro de entrada para o edifício. 

Foto: © Carlos Fortunato  (2006).  Todos os direitos reservados.


E à noite, aquela rua enchia-se de militares e povo, povo das tabancas, já se vê, que “a sociedade” local, o Alfredo Khalil, o senhor Rachid Aral, o velho Michel… de tão perto que moravam nem precisavam de sair de casa para ouvirem as canções do Nelson Ned, da Rita Pavoni, do Roberto Carlos, do Nico Fidenco…, em forma de discos pedidos deste para aquele, dedicados pelo soldado tal para a sua lavadeira que tinha direito a nome e tudo, e muitas vezes, num extravasar de saudade, querendo que o som da corneta chegasse lá longe, até se dedicavam canções às queridas mães e às namoradas que ficaram à espera.

E havia um concurso. Perguntas sobre história e geografia, que as fazia o furriel Sousa, professor na vida civil, sobre desporto, em que era perito o 1º cabo Santos, da messe dos oficiais, ou ainda perguntas acerca dos valores pátrios, trazidas pelo alferes Vinagre, que fora para isso que “a rádio” nascera.

Quem acertasse nas perguntinhas tinha direito a prémios de que não me lembro quais.

Lembro-me dos locutores. Sim, que “a rádio”, como não podia deixar de ser, tinha locutores. O Filipe, furriel vagomestre, o Basso, furriel cripto, e o furriel Bonito, da secretaria do batalhão.
–  Ó Pires – disse-me o Filipe – tu também podias ir para lá fazer locução.

Chamem-lhe destino, digam que era o Senhor a escrever direito por linhas tortas, ou, mesmo, que estava escrito nas estrelas, a verdade é que ser locutor era uma das possibilidades que me acompanharam até à Guiné.

Eu explico.

Quando desembarquei em Bissau levava mais recomendações do que medalhas um general tem ao peito. (Passe o exagero, se faz favor)

Desde logo para o dono do “Solar do Dez”. Um cartão, daqueles com nome ao meio, que tanto serviam para enviar boas festas como para expressar sentidos pesamos, onde o Carlos Lisboa, fadista da minha terra que em Bissau servira na policia militar, garantia que eu era apaz para repetir os êxitos que ele próprio alcançara nas grandes noites de fado que realizara naquele restaurante.

Sentados à mesa, no centro da qual estava uma coisa chamada lagosta que nunca, até ali, me passara pelo estreito, eu e o dono do “Solar do Dez”, cujo nome, esteja ele onde estiver, vai perdoar que me tenha esquecido, rapidamente começámos a falar nas hipóteses de eu ficar no Hospital Militar de Bissau, garantia de umas sessões de fado aos sábados à noite lá no Solar, com um dinheirinho extra, está claro, tudo coisas que umas pessoas que ele bem conhecia tratariam de facilitar num abrir e fechar de olhos.
– Venha cá jantar logo à noite que estará cá gente para tratarmos logo do assunto.

O pior é que por volta daquela hora encontrei o Vitor “Cascais”, rapaz que eu conhecia das noites no “Galitos”, casa de fado vadio no Estoril, junto da cosmopolita praia do Tamariz, que me quis logo apresentar a umas amigas e uns amigos, gin para um lado conversa para o outro, “está aqui um gajo que toca bem guitarra, queres ouvir?”, uns camarões para entreter a cerveja, “é pá, dá aí o tom para o mouraria”, e qual jantar no “Solar do Dez” qual quê, saí dali já era outra vez dia, e sem modo de explicar a minha ausência, só voltei ao Solar muito mais tarde, quando vim numa coluna a Bissau.

E havia o célebre “PIFAS”, o Programa das Forças Armadas.

Embora ainda não de forma profissional, antes de ser mobilizado eu já fazia locução de vários programas na rádio da minha terra. Era a Rádio Ribatejo, propriedade do capitão Jaime Varela Santos, homem que vale uma nota antes de prosseguir o relato.

O capitão Varela pertencia à arma de cavalaria. Em finais dos anos 40 inicio dos anos 50, mandaram-no comandar a força da GNR de segurança ao Forte de Peniche.
– Não aceito! Eu sou oficial de cavalaria, não sou carcereiro.

Valeu-lhe a afronta ao regime a sua passagem à reserva, por incapacidade física, que foi o melhor que se arranjou para evitar escândalo maior no meio social em que se movimentava.

Pois mal fui mobilizado, em Outubro de 68, o capitão Varela mandou que eu à chegada à Guiné, me apresentasse a um brigadeiro seu amigo que trataria de me levar para a rádio das forças armadas.

E até o meu primo Carlos Fernandes, que tal como eu iniciou a sua profissão na Rádio Ribatejo, e que estava em Madina do Boé, de furriel miliciano atirador da CCAV 1662, quando foi chamada para o “PIFAS”, ao chegar a Portugal, em Dezembro de 68, tratou de escrever uma carta que eu levaria em mão a José Vale de Figueiredo, o director do Programa das Forças Armadas, dando-lhe nota de como eu podia ser “útil à rádio”.

Pois foi. Só que com aquela cena das amigas e dos amigos do “Cascais”, mais dos copos e dos fados até de madrugada, quando dei por mim estava a marchar em direcção a Bula, com a carta do meu primo dentro do bolso, sem conhecer o tal brigadeiro amigo do capitão Varela, e sem ter ido ao tal jantar no “Solar do Dez”.

E eu, que tudo tinha para fazer a guerra de fato e gravata em Bissau, fui cantar fados para Bula e, em Bissorã, ao microfone de uma “rádio” manhosa, apresentar o Gianni Morandi a cantar o “Non son degno di te”.

Mas, porra! Também não tinha feito os amigos que fiz e que me têm dado um jeito do caraças.

(E querem saber mais? O que eu queria mesmo era andar com a minha malta.)


IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > Em primeiro plano, o Armando Pires: em segundo plano, o Rui Silva, o Jorge Rosales, o Manuel Joaquim (de perfil) e o Francisco Palma. No decorrer do almoço, tive oportunidade de apresentar o Armando Pires ao António Gracez Costa que foi locutor do PFA, em 1970/72. Ficaram os dois à conversa

Foto: © Manuel Resende  (2014).  Todos os direitos reservados.
________________

Notas do editor:

(*) Vd, postes anteriores e da série>

(...) Urge proceder à reformulação da divisa desta Tabanca Grande. De facto, onde ela proclama que “o mundo é pequeno e a nossa Tabanca … é grande”, já não é sem tempo que se aumente o grau ao adjectivo, passando então a escrever-se que, “o mundo é pequeno e a nossa tabanca… é muito grande”.

Ocorreu-me isto após as incidências que resultaram do meu post anterior (P12905*), no qual, desastradamente, troquei o nome a um capitão. A correcção chegou num comentário do nosso camarada Grantabanqueiro, coronel Hilário Peixeiro, feito nos termos que aqui recordo. (...)

(...) Tirando uns mal entendidos com a rapaziada do Morés, os dias corriam pachorrentos em Bissorã. Desde logo porque o Rodrigues, quando à chegada lhe fui oferecer os meus préstimos, ficou-me muito agradecido mas respondeu que “a malta cá se arranja”. A malta era a CCAÇ 2444, mais conhecida pelos “Coriscos”, companhia da qual o Rodrigues, Felizardo Rodrigues, era furriel miliciano enfermeiro. O felizardo neste caso era eu, melhor dito, até, era a minha equipa, porque com uma companhia operacional a prescindir do nosso apoio, passámo-nos a ocupar, a tempo inteiro, das micoses, paludismos e gonorreias entre os nossos, e da saúde de toda a população em geral, coisa que caía muito bem dentro dos relatórios da “psico-social”. (...)


(...) Queiramos ou não, a primeira imagem, a primeira impressão que causamos, acompanha-nos vida fora, cola-se-nos à pele como lapa. Podemos melhorá-la, ou piorá-la, “vê lá tu, pá, quem diria que aquele gajo se transformava no que é hoje”, mas a primeira impressão fica para sempre. À primeira, eu vi o Polidoro assim. Emproado, como um pavão. Escreva-se, por ser verdade, ele fez tudo menos querer causar uma primeira boa impressão. (...)


(...) Aquelas primeiras horas em Bissorã não foram fáceis. Desde logo, como já escrevi, o não me sentir dentro de um quartel. Era assim a modos como que um exército que tivesse ocupado uma cidade e “vamos lá instalar-nos”. Não quero com isto dizer que fossem más aquelas acomodações. Antes pelo contrário. Mas num quartel está ali tudo próximo, estamos ali todos juntos, tipo ó militar chegue aqui, e em Bissorã não, era mais ó furriel dê um salto à enfermaria e lá ia eu, no jeep, rua acima. E depois, o que também me fez confusão, abrigos "cá tem". (...)


(...) Portanto, o DO aterrou em Bissorã eram nove da manhã. Nem fanfarra nem guarda de honra à minha espera. Apenas um Unimog para me levar a mim, mais ao correio e outras mercadorias que o avião transportara. Sem esquecer, evidentemente, o Machado, o meu cabo enfermeiro, que viera receber-me, dar-me as boas vindas, e levar-me ao comando onde era devida a minha apresentação ao comandante da companhia. (...)


(...) Mais um reencontro para agasalhar a idade. Estava eu posto em sossego e chama-me o João Rebola para perguntar:
- Ó Pires, sabes quem está aqui?

A pergunta foi feita através desse prodígio da comunicação chamado Skype. Sabem os que sabem, quem não sabe fica a saber que é um software que podemos instalar no computador, e que nos permite falar com qualquer pessoa, em qualquer lugar do mundo, e, o melhor de tudo, estar a vê-la do outro lado. (...)


(...) Tal como prometera, envio um conjunto de 12 (doze) fotografias de Bula. Tenho dúvidas quanto à forma de as editar. Por essa razão permito-me enviar duas versões. Como podes ver, a que tem o titulo de Bula 2 ocupa menos espaço no blog, mas algumas das fotos perdem em qualidade. Deixo ao teu critério, ou ao critério do "Editor de Dia", escolher qual das duas versões publicar. Do mesmo modo, também fica ao vosso critério decidir em que série as inscrever. Se na série "furriel enfermeiro,ribatejano e fadista", se em "Álbum fotográfico..." do que for. (...)


 (...) A oito de agosto, deixei Bula com um nó na garganta e sem saber que não mais lá voltava. Tinha férias marcadas para Portugal e pedi ao comandante que me permitisse ir uns dias mais cedo para Bissau, de forma a poder visitar o Daniel no Hospital Militar. (...)


(...) Raios te partam, Manel Jaquim, que as tuas Cartas de Amor e Guerra incendeiam-me a memória na razão directa do respeito que me provocam. Começo pelo fim, em que sou mais breve, para dizer de quanta admiração sinto por essa cumplicidade entre ti e a Dionilde, tua mulher, nascida no tempo do amor e dos segredos, trazida pela vida fora, chegando hoje à comum aceitação da partilha dessas palavras escritas, tão intensas de paixão e raiva, que só os amantes sabem dizer. (...)


(...) A coluna estava pronta para se pôr em marcha. À frente o rebenta minas, logo atrás uma das Panhard’s do EREC 2454, depois um Unimog com munições para o Óbus 14 e as restantes viaturas. Eram seis camionetas civis que, vindas de Bissau, tinham sido cambadas, uma a uma, através do Rio Mansoa para João Landim e daí escoltadas até Bula, onde foi organizado o comboio militar que iria levar os reabastecimentos ao aquartelamento de Binar. (...)


(...) Eu tinha dois doutores. Era para ter três, mas perdi um mesmo à saída da escada de portaló. Era um oftalmologista em quem alguém descobriu, logo ali, insuspeitadas capacidades para ver fundo na raiz dos dentes, razão porque ficou em Bissau para uma especialização de três meses em medicina dentária, findos os quais percorreu todos os quadrantes dessa Guiné, em socorro de algum militar carente dos seus serviços. (...)


(...) Já era noite fechada em Bula quando o Teixeira, meu soldado maqueiro, veio ao bar dizer-me:
– Furriel, está uma mulher à porta de armas a pedir para tratarmos o filho.
– Já lá vou.
– Mas, ó furriel, olhe que o miúdo se não está morto, parece.
– Leva-a para a enfermaria que eu é só acabar o café. (...)


(...) - Então doutor, o puto safa-se?
Não me respondeu. Limitou-se a olhar-me assim como quem diz “vamos ver”, e a dizer-me com um sorriso benevolente:
- Vá lá dormir que você está com cara de quem precisa de descansar. (...)


(...) Bula, 15 de Abril de 1969, depois das oito da noite.

Ofegantes, os noventa cavalos da velha GMC galgaram a cancela do aquartelamento e estacaram às dez rodas em frente ao bar. Ao lado do condutor ergueu-se o Caeiro e gritou-me:
– Salta práqui, ó pira, que esta noite vai haver espectáculo no Esquadrão. (...)

(**) Manuel Gardete Correia (1928-19_?)



Fonte: Assembleia da República > Deputados à Assembleia Nacional (1935-1974)

10 comentários:

Luís Graça disse...

História "pequena" ("petite histoire"m como dizem os franceses), mas sempre ligada à "grande", com a tal que dizem se escreve com H...

Uma e outra ajudam-nos a conhecer melhor o passado do qual alguém disse que é "um país desconhecido".... Imagine os nossos filhos e netos, "metidos na máquina do tempo", desembarcados em Lisboa, em 1969, e depois em Bissau e Bissorã...

Desconhecia, por outro lado, a existência desta figura, o dr. Manuel Gardete Correia que faz parte da história da nossa saúde pública... Eu tinha a obrigação de o conhecer!...

Sobre ele há poucas referências na Net, tem obras pubklciadas na área da saúde pública / medicina tropical... (Vd. catálogo da Memória d'Africa e do Oriente, da Universidade de Aveiro)

Dizes que já morreu ? Se sim, onde e quando ?

Sei que esteve preso em 1975, em Bissau, ao tempo do Luís Cabral. Há um documento no arquivo histórico da Presidência da República em que as autoridades portuguesas intercedem pela sua libertação.

Se souberes algo mais sobre este guineense de Bissorã, diz.

Um abração, Luis

Luís Graça disse...

Os italianos também a sua "Casa da Mariquinhas"... Eu pessoalmente prefiro a letra e a música do nosso grande Alfredo Marceneiro...

Mas aqui a letra do tal Nico Fidenco que nos dava uma imagem estereotipda da "bela" Itália dos anos 60... Passou "ad nauseam" na rádio daquele tempo... Em suma, faz parte também das nossas memórias....


"Na casa de Irene se canta, e se ri,
tem gente que vem, tem gente que vai.

Na casa de Irene há garrafas de vinho.
à casa de Irene esta noite se vai."... Peloo menos, as noites na casa da Irene tinham mais poesia e sonho que os miseráveis buracos onde dormíamos, no mato, na Guiné... LG

__________

A Casa de Irene

Nico Fidenco

I giorni grigi sono le lunghe strade silenziose
Di un paese deserto e senza cielo

A casa d'irene si canta si ride
C'e gente che viene, c'e gente che va
A casa d'irene bottiglie di vino
A casa d'irene stasera si va

Giorni senza domani e il desiderio di te
Solo quei giorni che sembrano fatti di pietra
Niente altro che un muro
Sono montato da cocci di bottiglia

A casa d'irene si canta si ride
C'e gente che viene, c'e gente che va
A casa d'irene bottiglie di vino
A casa d'irene stasera si va

E poi, ci sei tu a casa d'irene
E quando mi vedi tu corri da me
Mi guardi negli occhi, mi prendi la mano
Ed in silenzio mi porti con te

A casa d'irene si canta si ride
C'e gente che viene, c'e gente che va
A casa d'irene bottiglie di vino
A casa d'irene stasera si va

Giorni senza domani e il desiderio di te
Nei giorni grigi io so dove trovarti
I giorni grigi mi portano da te
A casa d'irene, a casa d'irene

A casa d'irene si canta si ride
C'e gente che viene, c'e gente che va
A casa d'irene bottiglie di vino
A casa d'irene stasera si va

_______________

Fonte:

http://letras.mus.br/nico-fidenco/416761/

Luís Graça disse...

Armando, tens que trazer esse furriel Sousa-Memória-de-Elefante para o blogue!... E parabéns ao Alcino, ao Vinagre e ao Polidoro (que já lá está na terra da verdade) e a todos dos demaais colaboradores da Rádio Bissorã 70!... Como é que outros gajos, noutros sítios (Bambadinca, por ex.) não se lembraram da ideia ? No fundo, é sempre o eterno medo da liberdade que traz a novidade... LG

_______


(...) "O fim das sessões de bingo, e das grandes noites de fado, poderiam ter sido uma forte machadada nos relatórios da acção psico-social, não se desse o caso de nas cabeças do major Alcino e do Alferes Vinagre, ter nascido a ideia de sacar umas massas que o comandante Polidoro Monteiro tinha para a psico, para com elas comprarem uma aparelhagem sonora que o Alfredo, o libanês, mandara vir da África do Sul. A aparelhagem foi ligada a uma corneta sonora, o 1º cabo sapador Marques Catarré emprestou a sua substancial discografia, e assim nasceu a “Rádio Bissorã-70”, com emissões diárias das sete às nove da noite.

Todos estes pormenores vieram à luz do dia graças à prodigiosa memória do Furriel Sousa, uma espécie de “secretário-confidente” do comandante Polidoro. É que todos os da companhia, eu incluído, nos lembramos da “rádio”, mas de como ela nasceu é que… já lá vão 44 anos. " (...)

JD disse...

Uma delicia!
Fazes uma tal descrição das tuas aventuras e desventuras na Guiné, que os impreparados até vão pensar que seria muito bom serem para lá mobilizados.
Requinte de escrita, domínio dos tempos da narrativa, boas pinceladas que ilustram as acções... um cheirinho a alecrim.
Nota: a casa de fados era no Estoril, junto à estação, em frente ao hotel Cibra, onde fui uma vez acompanhar uma bifa porreira. Pergunta ao Rosales e ao Palma se eles ainda se lembram da geografia.
Um grande abraço
JD

armando pires disse...

Meu caro Luís.
1º - grande foto, essa, que me tiraste no nosso Encontro. Tens que a enviar-me por email. Quero tê-la no meu álbum.
2º - A informação de que o Dr. Gardete Correia já faleceu foi-me transmitida por quem cresceu e viveu na Guiné, que vive lá e cá, e que me acrescentou viver a viúva em Londres. Curiosamente, numa página "social", encontrei uma "jovem" de apelido Gardete Correia, a quem ainda não tive tempo, nem lata, de perguntar a origem do apelido. Mas um dia calha.
3º - Quanto ao Sousa, açoriano de gema, ex-furriel miliciano de informações e operações de infantaria, faz parte daquele glorioso grupo de rapazes que tenho tentado trazer ao nosso grupo, mas que delicadamente (é uma força de expressão...) me têm dado com os pés.
4º - Finalmente, o Vinagre, meu amigo e conterrâneo (ainda que de Coruche), infelizmente já não está entre nós. O Alcino,à época major, desconheço com que patente se reformou bem como o seu paradeiro.
Não te esqueças da foto.
armando pires

armando pires disse...

Tens toda a razão, Dinis.
O Galitos era no Estoril e não em Cascais como, no calor da narrativa, erradamente escrevi.
E vê lá tu, que à mesa do almoço em Monte Real, até falámos no assunto e, ó desgraça, nem eu nem tu nos lembrávamos do nome da casa.
Como se nós não soubéssemos...
Uma braço e obrigado pelo teu apreço ao meu texto.
armando pires

Joaquim Luís Fernandes disse...

O que eu aprendo e descubro neste Blogue... a corroborar a máxima "O Mundo é Pequeno e a Nossa Tabanca é Grande" !

Em mais um post com a qualidade a que já nos habituou, o camarada Armando Pires traz-nos informações que me ajudaram a clarificam algumas das minhas memórias já um pouco difusas.

Ao falar-nos da família Gardete avivou-me a recordação do meu senhorio em Bissau, com quem coabitei durante 6 meses, numa parte alugada da sua casa: O Casal Manuel Correia Gardete e Eugénia. Eram oriundos da zona de Bragança e tios do Dr. Manuel Gardete Correia, então Deputado na Assembleia Nacional e de quem me falavam com grande orgulho.
Tinham dois filhos, o mais velho, um rapaz de nome Manuel Gardete, também orientado para a medicina e que penso, ainda hoje a exercer essa profissão, com prestigio, na zona de Lisboa; a mais nova uma menina de pele muito clara e lourinha, que tratávamos por Nelinha.

E já lá vão 41 anos de esquecimento e sem alguma vez ter procurado por esta família, que na sequência do 25 de abril e da descolonização abandonou a Guiné. Devo-lhe o favor de me terem confiado a sua casa, terem partilhado o seu convívio e a sua companhia com absoluto respeito pela independência do jovem casal, eu e a minha mulher.

Tenho pena de não ter aproveitado melhor esse tempo para convivermos mais. Só uma vez fomos em conjunto, fazer um pique-nique para os lados de Quinhamel e foi agradável. Pudera, eramos um jovem casal em lua de mel prolongada.

Qualquer dia tenho que fazer um post sobre isto. Mas quando não sei!

Para os meus amigos e camaradas envio um grande abraço.
JLFernandes

Hélder Valério disse...

Armando, caro camarada

Nem sei que mais dizer.
Foram rápidos a comentar e a apontar o essencial.
No entanto ainda quero sublinhar algumas coisas.

Quem estiver a ler e a ver com 'os olhos de hoje' e sem 'entrar no espírito da coisa' é bem capaz de te censurar quanto ao teu 'desleixo', à 'irresponsabilidade' por não aproveitares as cunhas (as recomendações, os empenhos) que te podiam ter proporcionado umas férias permanentes em Bissau.
O que 'eles' não podem, nem querem, ou se calhar não são capazes, de entender, é essa coisa quase inexplicável que te leva a dizer no final: "Mas, porra! Também não tinha feito os amigos que fiz e que me têm dado um jeito do caraças. E querem saber mais? O que eu queria mesmo era andar com a minha malta.)"

Um outro aspecto interessante e que ressalta desta tua memória disponibilizada, é que o raio da Guiné acabou por ser um 'alfobre' de tantas coisas que também não tem explicação fácil mas que demonstra, mais uma vez, que "é a fome e o frio que metem a lebre ao caminho", ou seja, as necessidades levaram-nos a superá-las de tantas e variadas maneiras que afinal bastava um pouco de iniciativa e muita vontade.
E isso ainda é válido para os tempos e dificuldades de hoje.

Obrigado pelo relato, pelas informações e pelas lições.

Abraço
Hélder S.

armando pires disse...

Camarada Dinis.
É só para te dizer que já foi feita a devida correcção no post quanto à localização do Galitos.
Se fores ler... já lá está que é no Estoril (é não, era...)
Quem tem editores como nós, pode errar à vontade.
Um abraço
armando pires

Rogerio Cardoso disse...

Caro Armando
Só agora li sobre o sr.Gardette, onde dizes que logo que começou a guerra eles foram para Bissau. Na verdade ainda funcionou a loja em 1964 e 1965 no 1º piso, sendo o 2º piso a sua residencia. Mais á frente morava o Alfredo Kalil, o padeiro.
Abraço Rogerio Cart643-AGUIAS NEGRAS