quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Guiné 63/74 - P12740: In Memoriam (179): Carlos Schwarz da Silva (1949-2014)... Pepito ca mori! (José Teixeira): A AD está de luto. Caminho silenciosamente ao lado de tantos amigos que fui ganhando nesta família – a verdadeira família do Pepito e da Isabel e sofro com eles esta tremenda perda.



Lisboa > Campus da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Liosbnoa > 6 de setembro de 2007 >  Engº Agrº Carlos Schwarz da Silva, 'Pepito', (Bissau, 1969-Lisboa, 2014). "Tive a felicidade de caminhar várias vezes a seu lado pelo interior da Guiné. Impressionava-me vivamente a forma como era acolhido em festa. Como os mais velhos e os mais novos se acercavam dele, em grupo ou isoladamente, para lhe darem conta dos resultados dos projetos em desenvolvimento", escreve o José Teixeira,dirigente da Tabanca Pequena ONGD, e seu grande amigo e admirador. "Havia sempre razão para um sorriso de esperança. Havia sempre uma mão estendida num cumprimento afetuoso. Havia sempre uma palavra amiga e de estímulo. O Pepito acreditava naquela gente, mais que ninguém porque conhecia pessoa a pessoa e chamava-a pelo nome."

Foto e legenda: © Luís Graça (2007). Todos os direitos reservados.



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Medjo > 2 de maio de 2013 > O nosso querido Zé Teixeira com o régulo de Medjo, na sua última  viagem à Guiné-Bissau.









Guiné-Bissau > 2012 > Imagens do Pepito e dos filhos do Zé Teixeira, Joana e Tiago. O Tiago, que é médico, esteve em missão humnitária a trabalhar no Hospital de Cumura.

Fotos: © José Teixeira  (2014). Todos os direitos reservados


1. Mensagem do Zé Teixeira, da Tabanca Pequena ONGD, publicada ontem na página do Facebook da AD - Acção para o Desenvolvimento

A Guiné-Bissau acaba de perder um filho e eu acabo de perder um amigo que,  sendo dos mais recentes, era dos mais queridos que eu tinha e o último a querer perder.

Marcou-me pela positiva logo no primeiro encontro em 2008 no Simpósio de Guiledge, onde nos conhecemos. A sua presença com uma alegria esfuziante, uma esperança profunda no povo da Guiné e nas suas capacidades para concretizar os sonhos de bem-estar. A sua forma de ser e estar no meio daquele povo que o idolatra porque sente o Pepito a caminhar a seu lado, a viver os seus problemas, a procurar de mãos dadas com esse povo as soluções ideais e possíveis num país continuamente adiado. 

Em suma cativou-me pela sua forma de pensar, ser e estar com os povos da Guiné-Bissau e eu deixei-me cativar.
Obrigado, Pepito,  pelas grandes e inesquecíveis lições de amor e dedicação à causa de um povo, que recebi de ti.

Entregou toda a sua vida num projeto para ajudar os mais frágeis da Guiné-Bissau, nas tabancas mais afastadas dos grandes centros, no sul e no norte, sem olhar a etnias, raças ou credos.  Entrava pelas Tabancas dentro. Dialogava com as pessoas sobre as suas carências. Estudava com os habitantes os seus problemas e formas de os solucionar. Envolvia-os nos projetos de mudança ou valorização. Empenhava-se em arranjar as verbas necessárias. Organizava as populações em associações locais, para gerir os seus próprios projetos e com elas avançava apoiado na sua equipa técnica.

Ainda há dias me dizia já com uma voz cansada pela doença que o minava velozmente que precisava de vir a Lisboa para festejar os 99 anos da sua mãe a D. Clara e ser internado para os médicos se debruçarem sobre a sua doença, mas antes ainda tinha de ir ao Sul ao Cantanhez levar máquinas costura e dinamizar o projeto de Associação de bajudas em várias tabancas para promover a aprendizagem de costurar roupa. Um dos objetivos da AD com o apoio da Tabanca Pequena para ajudar as populações do interior. Ainda tentou, mas teve de regressar no mesmo dia. Creio que foi o último esforço e que enorme esforço !

Tive a felicidade de caminhar várias vezes a seu lado pelo interior da Guiné. Impressionava-me vivamente a forma como era acolhido em festa. Como os mais velhos e os mais novos se acercavam dele, em grupo ou isoladamente, para lhe darem conta dos resultados dos projetos em desenvolvimento: 

(i) eram as rádios locais; (ii) as Tvs locais; (iii) as Escolas de Valorização Ambiental [EVA]; (iv) as escolinhas de pré-primário; (v) as mulheres das salinas; (vi) os homens e mulheres dos projetos agrícolas; (vii) as comissões de mulheres que geriam os Centros Materno-infantis; /viii) era a dinamização de projetos de desenvolvimento local para melhorar a produção; (ix) a promoção de feiras e intercâmbios com os povos vizinhos; (x) era os acampamentos das crianças das escolas, (xi) era a assistência á população nas mais variadas vertentes.

Havia sempre razão para um sorriso de esperança. Havia sempre uma mão estendida num cumprimento afetuoso. Havia sempre uma palavra amiga e de estímulo. O Pepito acreditava naquela gente, mais que ninguém porque conhecia pessoa a pessoa e chamava-a pelo nome.

Para todos levava uma palavra de estímulo, um gesto de carinho, um sorriso. O Pepito acreditava nas pessoas, nas suas capacidades e potencialidades, mas mais que acreditar, desafiava-as e estimulava-as a caminharem a seu lado. Muito conversamos sobre este tema- pôr as pessoas a agir, a dinamizar os seus projetos e ajudá-las, mas não as substituir nunca.

Em Abril de 2013, estávamos eu, a minha esposa, o Dr. Francisco Silva e esposa em Iemberém a jantar com o Pepito, quando um grupo de mulheres da Etnia Tanda, silenciosamente nos rodearam e quando acabamos de jantar uma responsável do grupo pediu a palavra. Era só para agradecer as quatro máquinas de costura que tinham recebido e para dizer que se tinham organizado em Associação para dinamizar a escola de costura para as bajudas da tabanca e já tinham 36 associadas. Depois fizeram 
festa, houve ronco, como só o povo da Guiné sabe fazer.
Foi esta uma das últimas e maios belas imagens que me ficou do Pepito na sua ligação ao povo da Guiné. Povo que com ele aprendi a amar.

Hoje sinto-me perdido. Mal souberam em Bissau do infausto acontecimento, ligaram-me para chorarem comigo a perda deste grande amigo. A Guiné-Bissau ficou mais pobre.

A AD está de luto. Eu caminho silenciosamente ao lado de tantos amigos que fui ganhando nesta família – a verdadeira família do Pepito e da Isabel e sofro com eles esta tremenda perda.

À Isabel.  sua esposa e suas filhas, à sua mãe D. Clara que fez há dias noventa e nove primaveras, quero expressar os meus mais profundos sentimentos de pesar. 

José Teixeira
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