domingo, 12 de janeiro de 2014

Guiné 63/74 - P12576: Os nossos camaradas guineenses (36): Abdulai, meu irmão!... Recordando quatro valorosos milícias de Guileje: Sátala Colubali, Camisa Conté, Abdulai Silá e Sargento Samba Coiaté (Manuel Reis, ex-Alf Mil Cav, CCAV 8350, Guileje, Gadamael, Cumeré, Quinhamel, Cumbijã, Colibuia, 25/10/72 - 27/8/1974]


1. Mensagem de Manuel Reis [, ex-Alf Mil Cav, CCAV 8350, Guileje, Gadamael, Cumeré, Quinhamel, Cumbijã, Colibuia, 25/10/72 - 27/8/1974], com data de 13 de dezembro último:


Caros amigos Carlos e Luís:

Trata-se de um pequeno texto de agradecimento a todos os africanos que, na guerra da Guiné, muitas vezes nos serviram de escudo protector. Fica ao vosso critério a publicação, ou não, deste texto.


2. Abdulai, meu irmão

por Manuel Reis


Por vezes, dou comigo a pensar no destino triste e por vezes dramático dos nossos amigos guinéus, os que partilharam connosco a tortura da guerra e a população anónima, que se acolhia sob a nossa protecção. Muitos já não estão no reino dos vivos, ou porque foram mortos após a nossa retirada, como represália, ou porque a erosão provocada pela guerra insensata causou danos irreversíveis, ou porque as deficientes condições de saúde e/ou alimentação apressaram a sua partida.

Quase todos os ex-combatentes sentem uma dívida de gratidão, por todos os que, estando do nosso lado, se expuseram de modo a salvaguardar a nossa integridade física.

Recordo aqui alguns nomes, desta gente anónima, com quem partilhei alguns momentos e que a memória se recusou a enviar para o caixote do lixo. Não passa de um gesto simbólico de agradecimento a camaradas e amigos que já partiram.

Sátala Colubali, Camisa Conté, Abdulai Silá e Sargento Samba Coiaté eram milícias em Guileje, tendo cada um destes ex-combatentes uma missão diferente a desempenhar dentro do grupo.




Guiné > Região de Tombali > Gadamael > CCAÇ 3518 (1972/74), "Os Marados de Gadamael" >  "Dois dos melhores soldados milícias que nos acompanharam em Gadamael. O da direita, Camisa Conté, viria a falecer em 1973 quando das batralhas de Guileje e Gadamael". Foto do nosso saudoso  camarada  Daniel Matos [1950-2011, ex-Fur Mil da CCaç 3518, Gadamael, 1972/74].


Comentário (postetior de Manuel Reis: "É feliz a foto do camarada Daniel Matos. Do lado esquerdo está Camisa Conté e do lado direito o Sátala Colubali, duas referências do meu texto."... E eu (LG) acrescento: "São tão raras as fotos dos nossos camaradas guineenses!"... 

Foto (e legenda): © Daniel Matos (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados


Sátala Colubali assumia o Comando de Grupo, na ausência de Samba, e distinguia-se pelo empenho e cuidado que colocava em cada missão, que lhe era destinada. A presença dele, em qualquer missão, era sinónimo de segurança e tranquilidade para todos os combatentes. Sabia o terreno que pisava, fruto da experiência dos muitos anos de guerrilha.

Camisa Conté actuava clandestinamente, entre o cair da tarde e o amanhecer do dia seguinte. A sua actuação residia na colocação de minas e armadilhas junto da fronteira ou dentro do próprio território da Guiné-Conacky. Saía só, pelo cair da tarde, com uma sacola aos ombros e a G3 a tiracolo. Estas surtidas obrigavam a um certo cuidado na desactivação das armadilhas do trilho, que ele utilizava e aos responsáveis pela vigilância do aquartelamento, quando do seu regresso ao romper do dia. Esta tarefa tinha, por vezes, algum êxito, a dar crédito nas informações que nos chegavam. Não era do meu gosto este tipo de actuação, mas o reconhecimento por todo este trabalho está fora de causa.

Estes dois amigos e camaradas vieram a falecer no mesmo dia, finais de Abril de 73, nas imediações do aquartelamento, quando Camisa Conté procedia ao levantamento de um engenho anti-carro, colocado no troço de estrada que ligava ao Mejo, recém-aberto. O Sátala que sempre se recusara a trabalhar com tal material, nesse dia fatídico, resolveu acompanhá-lo. Eram homens estimados e admirados por todos, combatentes e população. Um grito de dor, em uníssono, ecoou pela mata cálida de Abril, quando os restos mortais dos dois nos aparecem embrulhados numa camisa de um dos milícias. Permanecem na memória de todos como símbolos vivos de uma amizade, feita de convívio, luta e sofrimento .

Abdulai Silá, era um dos Homens-Grandes, tinha atravessado todo o período da guerra. Já com idade avançada, acima dos 40 anos, era o nosso guia. Detectava a presença do IN a uma distância considerável, pelo seu olfacto apurado e pela sua experiência de 10 anos de guerrilha. Muitos episódios partilhei com ele, em missões de maior risco, pois só nessas participava, dada a sua idade não se coadunar com um grande desgaste físico.

Vou citar apenas duas dessas acções:

Um dia foi-me atribuído um patrulhamento nas imediações da fronteira, onde o contacto com o PAIGC tinha um grau de probabilidade elevado, por ser um trilho de reabastecimento do PAIGC, que se dirigia a Gandembel e aí inflectia para dentro da Guiné, seguindo o mítico corredor de Guileje. A 100 metros do trilho Abdulai chama-me e comunica-me a presença de grupos de combate do PAIGC. Alerta-me para as possíveis consequências negativas de um confronto, pelo facto de as nossas tropas se mostrarem um pouco inquietas. Conjuntamente com ele e com o comandante do outro grupo de combate decidimos não arriscar. Nunca esqueci as palavras amigas e sábias de Abdulai, nesse momento: “Nós, se morremos, morremos na nossa terra, junto da nossa família, enquanto vós estais longe da família”.

Uma das missões mais complicadas que me foi atribuída, foi a montagem de uma emboscada no Corredor de Guileje. Exigia-se a presença do Abdulai para com ele e com o Alferes Lourenço, o melhor amigo [, de seu nome completo, Vitor Paulo Vasconcelos Lourenço, e  que viria a morrer, por acidente em 5/3/73],  delinearmos o trajecto, dada a densidade da mata e a dificuldade de progressão. O trajecto foi dividido em duas partes, pelo facto de ser necessário abrir um novo trilho, por questões de segurança.

No 1º dia fizemos metade do percurso e no final armadilhámo-lo com uma granada defensiva, o que desagradou a um chimpanzé que resolveu accioná-la. A conclusão do percurso fez-se passados três dias. Chegados ao local, previamente determinado, a detecção da nossa presença foi de imediato assinalada por um tiro de kalachnikov. A situação era delicada, o local era muito bem controlado pelo PAIGC. Abdulai aconselhou-me a retirar do local, dada a previsível violência do embate, fazendo fé nos embates anteriores com as nossas forças especiais, noutros momentos, e sempre ao nível de Companhia ou Batalhão. Era urgente abandonar o local. A emboscada abortou, após prévio reconhecimento do local e uma breve conferência com o Abdulai e o Lourenço. O conhecimento da actuação do inimigo, nesta zona, foi valioso para uma tomada de decisão.

De quando em vez Abdulai vinha a Bissau gozar uns dias férias e, sempre que o fazia, solicitava ao Comandante de Companhia a não atribuição de missões muito arriscadas na sua ausência.

Abdulai morreu em Gadamael, atingido por um estilhaço, no final do dia, com perfuração pulmonar. Foram imensos os apelos para que o helicóptero, que ainda se encontrava em Cacine, o transportasse para Bissau, mas tornou-se impossível, dada a proximidade da noite e o risco do voo.

Do Sargento Samba [Coiaté], lembro o seu espírito de sacrifício, quando no ar já se sentia o cheiro da guerra, que se aproximava com toda a violência. Comandava o seu grupo, já muito reduzido, no dia 18 de Maio de 1973, com a missão de detectar a existência de minas na picada, que ligava Guileje a Gadamael. De repente gerou-se entre eles uma enorme discussão, cuja razão de ser não consegui entender. Falavam em crioulo e a sua conversa até chegou a ser escutada pelo grupo do PAIGC que se encontrava emboscado a 30/40 metros.

Alertei-os para a gravidade de tal atitude e Samba, num gesto repentino de revolta, assume a dianteira dos seus homens e 30/40 metros à frente detecta um fio eléctrico, que as gotas de água, caídas durante a noite, puseram a descoberto. Atingido, com um tiro no pescoço, teve morte imediata. Este sacrifício impediu que os restantes combatentes caíssem na zona de morte, que se estendia ao longo de 100 metros, com os guerrilheiros do PAIGC bem protegidos em valas construídas para o efeito e com a picada bem armadilhada com 20 minas, electricamente comandadas.

A todos o meu Bem-haja. Aos que partiram o meus desejo que Repousem em Paz.

Com as cordiais saudações natalícias.

Um abraço. Manuel Reis

P.S. Segue uma foto mais actualizada.      

_____________

Nota do editor:

Úlotimo poste da série > 8 de outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10501: Os nossos camaradas guineenses (35): O Dandi, manjaco, natural de Jol, que eu conheci... (Manuel Resende / Augusto Silva Santos)

17 comentários:

Anónimo disse...

...e lá fomos nós: Samel, primário com um Prof. Pires, Colégio Nacional, Coimbra....Tombali!!!

Caríssimo Manuel Augusto,

Gratidão, e perplexidade pelo cruel abandono dos nossos camaradas Guineenses.É uma "NÓDOA" difícil de apagar!!!

Todo o meu pelotão, á excepção de dois Sargentos era de Tropa Africana, além da convivência com Companhia de Comandos Africanos em Gadamael, me fazem compartilhar contigo essa gratidão aos nossos Camaradas.

cordiais saudações BAIRRADINAS,

Vasco Pires

Juvenal Amado disse...

Manuel Reis
Este teu escrito é um agradecimento aos homens que por força das circunstâncias se encontraram do mesmo lado da barricada num conflito que atingiu a nossa geração.
Agradecimento mais que justo, pois foram homens que nos salvaram muitas vezes com risco das próprias vidas e tu, falas disso de forma real de sofrimento partilhado e não no abstrato.
Que país teríamos sem essa guerra, que se tornou fratricida?
Essa guerra para nós serviu para tomada de consciência do enorme atoleiro que era a nossa paz podre, em que mesmo assim os cadáveres saiam dos armários com dedos esticados e acusatórios.
Eles combateram contra os seus próprios irmãos porquê?
Tornaram-se heróis e nós devedores dessas dádivas é a grande verdade.
Verteram o seu sangue no momento e contraíram um grave conta corrente, que lhe seria sempre cobrada quando a independência chegasse num futuro mais ao menos próximo.
E esse futuro chegaria mais dia menos dia.
A pior herança que os colonizadores deixaram e não fomos só nós, foi um futuro a prazo em que a falta de cultura democrática, iliteracia, a falta de empregos, e uma economia de guerra que promove uma classe que vivia junto do poder politico/militar, única fonte de receita para milhares de guineenses.
O que a guerra lhes deu, a guerra lhes levou, só ficou o ódio e a violência dos novos senhores.
Talvez assim se explique o amor à nossa Bandeira e ao poder central da potência colonizadora do qual 10 anos antes só conheciam o chefe do posto.
Quanto mim foram duplamente enganados.
Primeiro acreditaram na sociedade que lhes ofereceram e os levou a pegar em armas. Depois foram enganados porque talvez pensassem que nunca os abandonaríamos.
Se conhecessem a história, veriam que o abandono dos seus colaboradores pelos ocupantes, foi sempre a outra face da moeda havendo perdão até para os ocupantes, mas nunca para os seus servidores.
Foram sempre abandonados à sua sorte depois das respectivas independências, os que combateram pelas potências colonizadoras.
Escreves ;
“Nunca esqueci as palavras amigas e sábias de Abdulai, nesse momento: “Nós, se morremos, morremos na nossa terra, junto da nossa família, enquanto vós estais longe da família”.
Nós sabíamos porquê porque corríamos o risco de morrer. Corríamos esse risco por amarmos a nossa Pátria, para podermos viver nela sem ser excluídos nem perseguidos e alguns para poderem imigrar, o que aconteceu a milhares após o regresso.
Saberia ele a verdadeira razão porque morria?
Um abraço

Luís Graça disse...

Canmrada Manel Reis:

Também fui "tocado" pelo sentimento de gratidão (e de mágoa) que manifestas no teu texto, relativamente aos nossos camaradas de armas guineenses, mílícias ou militares. Cito:

(...) Nunca esqueci as palavras amigas e sábias de Abdulai, nesse momento: 'Nós, se morremos, morremos na nossa terra, junto da nossa família, enquanto vós estais longe da família'. (...)

Cheguei, a Contuboel, ao centro de instrução militar de Contuboel, no dia 2 de junho de 1969, eu e mais meia centena de graduados e especialistas metropolitanos, que compunham a CCAÇ 2590....

Deram-nos então 100 homens que tinham acabado de fazer a recruta e jurado defender a bandeira portuguesa até à última gota de sangue... Não falavam português....

E depois passámos 22 meses com eles, no mato, no duro... Formámos em conjunto a futura CCAÇ 12, uma companhia de intervenção em que o pessoal africano pagou caro, em sangue, suor e lágrias, a sua kealdade aos tugas...

Sou o primeiro a testemunhar a sua lealdade e coragem, em todas as circunstâncias... Mas sobre tudo isto podemos (e devemos= falar com mais tempo e vagar...

Um abraço. Vou agora a caminho de Lisboa, e ainda a tempo de chegar a casa do fim do jogo Benfica-Porto Lisboa. Moro a um km a seguir ao estádio da luz...

Um alfabravo. Luis

Manuel Reis disse...

É feliz a foto do camarada Daniel Matos. Do lado esquerdo está Camisa Conté e do lado direito o Sátala Colubali, duas referências do meu texto.

Aproveito para retribuir as cordiais saudações BAIRRADINAS, ao meu amigo,companheiro e camarada Vasco Pires. De facto o nosso trajecto é muito idêntico.
Um grande abraço do tamanho do oceano que nos separa.
Manuel Reis

Joaquim Luís Fernandes disse...

Caros Camarigos

Este texto do camarada Manuel Reis, de justo tributo aos seus camaradas guineus (como lhes chama) e o comentário do camarada Juvenal Amado, tornam presente um facto perturbante, de uma gravidade enorme. Deveria pesar na consciência nacional. Em nós, a mágoa é latente.
E nos seus responsáveis?... O que fizeram ou fazem para minimizar os sofrimentos daqueles nossos ex-camaradas?
O mesmo será de perguntar, em relação a todos os que voltaram, mas continuam a sofrer e a morrer mais cedo, em consequência dessa guerra que aguentaram.

A História de Portugal dos últimos cinquenta anos, há-de
contar numa página negra a desonra da Pátria, e condenar os seus autores. Desde já nos envergonhamos se por fraqueza ou tibieza nos calamos perante todas as injustiças... As de lá... e as de cá.

Um abraço
JLFernandes

Luís Graça disse...

Há uma injustiça gritante, quando as nossas Forças Armadas não registaram (ou não registam) na lista oficial dos mortos os nomes de todos ou de muitos desses valorosos "milícias"...

Por exemplo, o srgt de mílicas Samba Coiaté não consta na lista dos mortos da guerra do Ultramar, disponível no sítio da Liga dos Combatentes... Pesquisei pelo seu nome e data de morte em combate (18/3/1973)... E nada,, o seu nome não consta...

E no entanto a sua morte é heróica, a avaliar pelo relato do Manuel Reis...

Fiz um outro teste, com o nome do Seco Camará, valoroso milícia e guia das NT (que muito de nós, do Setor L1, conhecemos)... Morreu, juntamente com uma secção inteira (5 camaradas do Xime, da CART 2715), numa operação em que participei, no subsetor do Xime (Op Abencerragem Candente)... Ajudei a recolher os seus restos mortais... Fez connosco muitas operações... Mas aquela foi-lhe fatal... Morreu, à roquetada, no dia 26/11/1970...

O seu nome também não consta na lista dos "nossos" mortos...

Acho que é miserável, da nossa parte... Os milícias não eram militares, mas forsm combatentes... E que combatentes, muitos deles!... Ora, a sua memória deve ser honrada por nós... Pelo menos aqui...


Luís Graça disse...

Pedido ao nosso conselhjerio permanente José Marcelino Martins:


Zè: És capaz de confirmar se os milícias estão ou não estão fora das listas dos mortos da guerra na Guiné?

Dou dois exemplos, em que sabemos os nomes e as datas da morte... Mas há mais casos, seguramente...

A ser assim, temos de rever as baixas no TO da Guiné... São muitos mais do que os c. 3 mil combatentes oficiais ou oficiosos... E já não contabilizo os "civis" das tabancas em autodefeesa, logo "militarizadas...


Um abraço. Luis

Hélder Valério disse...

Caro camarada Manuel Reis

Que mais posso dizer?

Todo o texto que fizeste, em que fazes uma mais que justa homenagem àqueles que conheceste e que queres aqui honrar, contém tudo o que é preciso para se entender o que raio é isso de 'gratidão', 'solidariedade', 'reconhecimento', 'camaradagem'.

As suas memórias ficam aqui bem registadas. A amizade e reconhecimento são coisas que nós entendemos.
Esperemos que outros também o possam fazer.

Tal como o JLFernandes escreve o comentário do Juvenal complementa muito bem o teu texto e agora o que o Luís escreve de que "Acho que é miserável, da nossa parte... Os milícias não eram militares, mas foram combatentes... E que combatentes, muitos deles!... Ora, a sua memória deve ser honrada por nós... Pelo menos aqui...", vem de facto ao encontro do que sinto quanto a isto:
O abandono a que fomos votados pelos 'Poderes', cá e lá, há alguns anos e ainda hoje, terá que ser vencido. Se não se conseguir que 'os Poderes' emendem a mão (e não o farão de vontade própria, já se percebeu) que nós façamos esses honras.

Abraço
Hélder S.

Anónimo disse...

Caro camarada M.Reis

Dói..dói muito ao ler o teu texto.

Só estou vivo porque--------

Desculpem mas não consigo continuar..estou demasiado emocionado.

Um grande alfa bravo

C.Martins

Anónimo disse...

Camarada Manuel Reis:
Li com grande concentração o teu texto repleto de sensibilidade e admiração pelos camaradas de armas africanos... A maneira como evocas a sua memória, diz tudo e por isso não tenho mais palavras senão dizer-te: Obrigado pelo teu testemunho. Um abraço.
Manuel Vaz

Anónimo disse...

Caro camarada M. Reis

Hoje mais calmo quero continuar o meu comentário.

Como é fácil de perceber ia contar uma situação que se passou comigo..mas não o farei por simples pudor e que me marcou e marcará para o resto da minha vida.

Falar em camaradagem é muito pouco e julgo que não há adjectivação que se consiga fazer quando em fracções de segundo se reage de forma instintiva e se protege o camarada ao lado de morte certa apesar de provavelmente morrer na mesma se não o fizesse.

Julgo que houve ao longo da guerra várias situações destas e não só na guiné.

Muitos foram esquecidos na própria voragem do tempo.

Tentei que no meu caso o gesto deles tão nobre fosse devidamente assinalado e recordado..apenas recebi sorrisos de desdém e até incompreensão como se pretendesse algo para mim.

Mágoa que jamais esquecerei..muitos guineenses que faziam parte das nossas forças armadas e milícias foram simplesmente esquecidos..muito poucos foram reconhecidos.

Porque seria ?

Foi só mais uma injustiça entre tantas..

Um alfa bravo

C.Martins

Anónimo disse...

Manuel Reis,

Obrigado pelo teu texto.

As guerras, todas elas estúpidas… se isso é possível, são-no mais ainda quando tratam os seus intervenientes como foi e é o caso do que aconteceu e vai acontecendo com os nossos, não sei avaliar o grau de dor, se morrer sem dignidade às mãos dos seus irmãos de “cor”, em tempo de paz, dita, se deixados a morrer lentamente pelas esquinas de um qualquer lugar.

Já aqui manifestei, por mais de uma vez, o meu sentimento sobre o que se passou com os nossos camaradas de armas africanos, aqueles que não conseguiram colocar-se a salvo a tempo e horas…

É uma das vergonhas nacionais que não deve ser escondida. Os nossos camaradas de armas devem sempre ser aqui lembrados e recordados, é para isso que serve também este espaço.

Fico-me por aqui, sem mais palavras.
BS

Antº Rosinha disse...

Aqueles Comandos, Régulos e Milícias que lutaram ao nosso lado, sabiam e tinham consciência que lutavam para evitar maiores males do que a presença do Chefe de Posto, do Soldado Colonialista e do comerciante explorador.

E pior do que o nosso "virar" costas a essa gente, foi a comunidade internacional apoiar politicamente e militarmente e religiosamente (Vaticano e Meca), fascínoras, tribalistas, e feiticeiros, a pisotear um povo inteiro.

Desde Amílcar Cabral até hoje, a Guiné-Bissau pode servir de exemplo para toda a África, em como era justa a luta desses Comandos ao lado dos quais lutámos 13 anos.

Mas agora, desde que este PALOP não vir PALOF...deixar andar, pode ser que não exista petróleo!

JD disse...

Vivam Camaradas!

Registo a unânimidade de pontos de vista em relação ao texto e aos comentários complementares.

Parece que só quem por lá andou, terá capacidade para entender o sentimento de frustração que nos invade.

Por norma, andei com o pelotão, e poucas vezes em conjunto com outros, não alinhei com milicias, mas reconheço o valor e os contributos das tropas de recrutamento local. Igualmente, acuso o MFA sem hesitação, de acções criminosas pelo abandono de populações fiéis a Portugal.

Abraços fraternos
JD

Anónimo disse...

Camaradas

Comungo do sentimo geral expresso sobre "a sorte" dos guineenses que nos foram fieis e que muito nos ajudaram.
Já agora, como dizem que os milícias e outros, como os carregadores, não constam das baixas em combate, posso acrescentar que na HU do BCaç 2885, constam os seguintes Mortos em Combate:
Pel Mil.ª n.º 250 (Ex-Pel Mil.ª n.º155)
- Soldado Mil.ª n.º 17267 Bailó Djaló, em 18MAI69
Pel Mil.ª n.º 251 (Ex-Pel Mil.ª n.º 156)
- Soldado Mil.ª n.º 21067 Alberto Silva, em 18JUL69
Pel Mil.ª n.º 252 (Ex-Gr Caç Balantas) (Ex-Pel Mil.ª n.º 186)
- Caçador Nativo José Bacar, em 04JUL69
- “ “ Clode Biete, em 18JUL69
- “ “ Toban Car, em 23SET69
- “ “ Quedim Botche, em 23SET69
- Soldado Mil.ª n.º 49069 Tuquena Iagna, em 06DEZ70
Pel Mil.ª n.º 253 (Ex-Pel Mil.ª n.º159)
- Soldado Mil.ª n.º 02868 Sambel Sabali, em 05OUT70
Colaborador das NT
- Carregador José Sambú, em 17AGO69.

Abraços
JPicado

Luís Graça disse...

Zé [Martins):

GEMIL [Grupo Especial de Milícias] = Trinta homens ? Porquê a mudança de nomenclatura (de Pelotão para GEMIL) ? Pemso que foi com o Fabião...

Sabes alguma coisa sobre isto ? O Paulo Santiago, instrutor de milícias em Bambnadinca, também deve saber...

No nosso tempo (de 1968 a 1971...) não havia ainda GEMIL. Havia Comp Mil e Pel Mil...

Anónimo disse...

Luís
Neste momento,não te sei responder.
Na 2ªCª que formei,havia um PEMIL,
destinado à zona do Saltinho,e dois
GEMIL,um destinado à Ponta Luís Dias,
e outro para o Enxalé.Tenho isto num
documento de instrução,mas terei que o procurar.Lembro-me,isso nunca esqueci,o comandante do GEMIL da P.L.
Dias,era o Fafe Nkumba,ex-chefe de
bi-grupo do PAIGC,capturado após
ferimento de que resultou a amputação da mão e antebraço direito.A instrução era igual para
todos os pelotões,não me consigo
recordar a que era devida a
diferente designação.
Abraço
P.Santiago