quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Guiné 63/74 - P12257: Filhos do vento (22): Criada a Associação de Solidariedade dos Filhos e Amigos dos Ex-Combatentes Portugueses na Guiné


Título de notícia  do "Público", 1/11/2013, assinada pela jornalista Catarina Gomes. A Catarina foi responsável, juntamente com Manuel Roberto e Ricardo Rezende, por uma notável  peça de jornalismo de investigação sobre o tema, politicamente incorreto, dos "filhos do vento", disponível no portal Público Mais.

Recorde de imprensa reproduzido aqui com a devida vénia.

1. Sinopse da notícia

(i) São filhos de ex-combatentes portugueses da guerra colonial e de mulheres guineenses, andando hoje na casa dos 40/50 anos;

(ii) O seu desejo é ainda poderem conhecer o pai "tuga";

(iii) Criaram, um grupo deles (cerca de 50, vivendo em Bissau), a Associação de Solidariedade dos Filhos e Amigos dos Ex-Combatentes Portugueses na Guiné, sendo o seu presidente Fernando Edgar da Silva;

(iv) O objetivo principal  da associação é  "obter a cidadania portuguesa" e "conhecer o pai";

(v) Estão já a fazer diligências  para serem  recebidos pelo embaixador de Portugal na Guiné-Bissau;

(vi) Na sexta-feira (, dia em que em Portugal se vai aos cemitérios visitar as campas dos entes queridos que já partiram) , e num gesto simbólico, este grupo de "filhos do vento" guineenses foi depositar uma coroa de flores “ao pai desconhecido” (sic),  no cemitério de Bissau; 

(vii) A Associação foi criada na sequência do trabalho de investigação, corajoso e sério,  da Catarina Gomes (vd  reportagem do Público, Em busca do pai tuga);

(viii ) O presidente da associação fala da existência de  "centenas de pessoas espalhadas pelo país", a maioria das quais nunca conheceu o pai.

 Eis a história resumida de 3 dos dirigentes da associação:

(i) O presidente Fernando Edgar da Silva, camionista de profissão, nasceu em 1968; a mãe vivia em Teixeira Pinto (ou Canchungo), junto ao quartel:  o pai seria furriel, com comissão feita em 1966/67;

(ii)  O secretário José Maria Indéqui, técnico agrário, nasceu em 1971; o nome que lhe terá sido atribuído pelo pai era José Carlos dos Santos;  o progenitor terá regressado a Portugal por volta de 1973/74; esteva colocado no quartel de Pelundo, região de Cacheu;  vivia maritalmente com a mãe e tiveram mais duas raparigas;

(iii) A tesoureira Fátima Cruz, comerciante de roupa em Bissau, nasceu já em 1975;  o pai esteve no quartel de Empada e de Cutia (1973/74); a mãe era lavadeira do pai.

2. Ser solidário

Mandei à Catarina (e partilho agora com os nossos leitores) a seguinte mensagem da sequência desta notícia:

(...) Disponha sempre, mande notícias dos nossos 'filhos do vento'. Gostava de saber como poder ajudar a associação... Podemos fazer um poste... Quer escrever um pequeno texto ?...Aqueles homens e mulheres merecem muito mais!.. 

Sabemos, por outro lado, que  na sequência da sua reportagem também há, aqui em Portugal, irmãos e irmãs dos "filhos do vento",  que estão interessados em conhecer os irmãos e as irmãs que vivem na Guiné-Bissau. Naturalmente que tudo isto é feito com discrição, fora dos holofotes da comunicação social. Mas seria bom que a embaixada portuguesa assumisse um papel mais proactivo e dialogante na tentativa de resolução deste problema que está longe de ser um problema simples. A maior parte dos guineenses, filhos de portugueses do tempo da guerra colonial, não tem uma simples foto do pai, nem sabe o nome do pai...

(...) Eu sei que vocês, jornalistas, não gostam de misturar as coisas, a investigação e ação... Mas o blogue pode ajudar, temos associações também de solidariedade... Para já é preciso pôr o problema na nossa 'agenda'... Você, por seu turno, deu um excelente contributo com a sua magnífica reportagem... O Público é, continua a ser, para mim,  um jornal de referência. (...)

_________________

Nota do editor:

Último poste da série > 1 de novembro 2013 > Guiné 63/74 - P12235: Filhos do vento (21): Apelo da jornalista do Público, Catarina Gomes, para a ajudar a descobrir uma "história de reencontro" (de um pai ex-combatente que tenha encontrado ou ido à procura de um destes filhos da guerra, ou de um destes filhos que tenha encontrado o seu pai)

10 comentários:

Henrique Cerqueira disse...

Já à dias atrás li esta reportagem em outro Jornal assim como no blogue do Aly (Ditadura do Consenso)e uma coisa me chamou à atenção,foi que nos Estados Unidos com os "Filhos do pó" ou seja em situação idêntica aos nossos irmãos Guineenses,era suficiente pelo tão de pele e traços fisionómicos reconhecer esses "Filhos de militares Americanos que combateram no Vietname e por lá deixaram filhos.
Eu sei que não estamos na América ,mas a verdade é que a Guiné também não era o Vietname tanto em território como até em "Abusos dos direitos humanos".Pois é que eu estive na Guiné e bem vi que não era assim tão fácil os militares fugirem ás suas responsabilidades.Tenha sido bom ou mau pelo menos nessa altura o regime militar era bem "até de mais" exigente quanto ao comportamento dos militares.Agora quando estes passavam a civis e por lá ficavam , a estória era outra e se calhar a maior parte destes "Filhos do Vento"são resultantes desses civis.
Eu na verdade tenho algumas reticências em relação a algum deste trabalho de pesquisa jornalística em relação a estes assuntos,porque vejo sempre que o principal objectivo desse trabalho é mesmo isso "TRABALHO".
É esta a minha opinião.Sendo que repugno totalmente todo e qualquer abandono de filhos que tenha havido na Guiné daí o meu apoio na sua resolução pretendida por esta associação existente na Guiné,mas que se unam e ajudem de algum modo os outros Portugueses que ficaram na Guiné após a Independência.
Henrique Cerqueira

Antº Rosinha disse...

"Bullying (anglicismo, bullying, pronuncia-se AFI: [ˈbʊljɪŋ]) é um termo utilizado para descrever atos de violência física ou psicológica, intencionais e repetidos"

Fui ver esta definição à wikipédia para descrever "aproximadamente" o que estas pessoas sofreram principalmente em crianças.

Tudo o que se possa fazer, nada, mas mesmo nada pode servir de compensação para o que passaram estas pessoas em jovens e crianças.

Luís Graça disse...

Rosinha: É isso mesmo. E tu, quando foste para a Guiné, deves ter apanhado estes putos, ainda pequenos, enxotados por toda a gente, na aldeia, no bairro, na rua, na escola... Foram vítimas de racismo, um das formas mais brutais de discriminação entre os seres humanos (justamente porque não eram "iguais" aos outros..), e mais especificamente de "bulltying", na escola (e, mais tarde, no local de trabalho).

Em Portugal, e de acordo com o Código do Trabalho, diz-se "assédico moral"...

Artigo 29.º - Assédio

1 – Entende-se por assédio o comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em factor de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objectivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afectar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador. (...)

É uma prática criminalizada entrer desde finais de 2003...

Fui dos primeiros em Portugal a escrever sobre o "assédio moral no local de trabalho"... Podes ver aqui:

Luís Graça: Textos sobre saúde e trabalho / Papers on health and work /

Texto 188. Graça, L. (2004) - Factores de risco psicossocial no trabalho: assédio moral e outras formas de violência [ Psycho-social factors at work: harrassement and violence ]

http://www.ensp.unl.pt/lgraca/textos188.html

Sinónimos de assédio

Por razões de economia de análise, não podemos discutir aqui as diferenças semânticas e conceptuais destes termos. Os mais frequentes são (Hirigoyen, 2002):

Mobbing (nos países escandinavos, na Alemanha, na Suíça; o termo foi popularizado pelo Prof. Heinz Leyman, um alemão que vive na Suécia)

Bullying (em Inglaterra e outros países de língua inglesa, embora originalmente mais usado no contexto escolar),

Harassment (nos EUA, por analogia com o assédio sexual),

Whistleblowering (EUA, Canada);

Organizational terrorism (EUA);

Harcèlement psychologique (Quebeque, Canadá);

Harcèlement morale (France):

Ijime (no Japão).

Antº Rosinha disse...

Só para ver um cheirinho do ambiente que estes filhos do vento viveram,
Vou re-contar uma piada velha "filha-da-puta", que os calcinhas dos muceques de Luanda lançaram no antes e depois das independências:

"Com a independência os brancos vão para a terrinha deles, e os mulatos como não têm terra vão para o mar".

Conheci pessoalmente em Bissau crianças mestiças com pais e não resistiram no liceu, a mãe teve mesmo que vir com os filhos para Portugal, ficou apenas o pai.

Deve ser terrível para quem não teve hipótese de fuga.

Torcato Mendonca disse...

Rosinha, há uma palavra que define:RACISMO e Xenofobia um pouco. Não quer dizer que cá não encontremos atitudes dessas, há em minorias de mentes sujas.

Tu eu e muitos mais não sentimos isso, aliás aqui no Blogue, nunca vi nada que com essa parvoíce se pareça.

A maioria de nós podia ter passado por determinadas situações conducentes a que uma mulher ficasse gravida. Depois teria mais do que um caminho a seguir e todos o sabiam. Aceitar um filho, mesmo hoje, podia trazer problemas familiares mas, para mim, o mais correcto seria aceitar. Nada mais digo e tinha vontade de o fazer...Malhas que o Império teceu...e fomos tão pouco colonialistas.

Abraço do T.

Henrique Cerqueira disse...

António Rosinha e Torcato Mendonça.
Eu estou em total acordo com as vossas opiniões e então o Rosinha dá o exemplo do menino que não era bem aceite no liceu por ser mestiço não é?E então aqueles meninos e meninas que nasceram no PILÃO de mães que se "deram ou venderam" a tantos e tão prováveis pais biológicos.É que eu tenho visto e ouvido nas reportagens relacionadas com este assunto e são sempre os mesmos personagens que servem de exemplo. Eu recordo-me por exemplo que tanto no Biambe como em Bissorã tinha-mos vários "miúdos" que por lá vagueavam e que era totalmente Negros e não conheciam os seus pais verdadeiros,quase sempre viviam nas tabancas mas um pouco à margem das suas "famílias " de acolhimento sendo que passavam a maior parte do tempo com as nossas tropas.
E já agora dá que pensar em como é que era possível em maior parte dos casos ter a certeza de quem era o pai de determinada criança que iria nascer em determinada altura. Todos nós sabemos que não havia qualquer tipo de controlo de Natalidade e muito menos na população.
É por estes e milhentos de outros motivos que este tipo de pesquisa jornalística para mim tem o valor que tem e até em prejuízo dos principais atingidos que são os ditos "filhos do vento" e até os prováveis pais desses "filhos". Por tal eu penso que o assunto é mal abordado e com fins menos prováveis de algum êxito .Até porque tem dado a entender que o principal interesse é a Cidadania Portuguesa e aí se houver alguma vontade política e os trabalhos forem encaminhados nesse sentido não será muito difícil atribuir essa cidadania a " Ex.Portugueses " que o foram ,deixaram de ser, não os deixaram ser,... Aí sim seria uma boa matéria a debater até à exaustão.
Já me alonguei demais e espero que pelo menos o meu raciocínio seja entendido que é para interesse dos "Filhos e Filhas do Vento " . Já agora não gosto desse termo acho depreciativo.
Henrique Cerqueira

Anónimo disse...

Olá Camarada
Faço minhas as palavras do Henrique Cerqueira. Esta assunto - excluídos os casos de violação, de que não tenho conhecimento - começa a ser suspeito. No fundo estamos perante uma situação que, nesse tempo era recorrente (e hoje é frequente) na "Metrópole". Foi assim, na Coreia, e até a Pearl Buck escreveu um livro (Filhos de Guerra) isto para não falar da ópera Madame Butterfly que retrata uma situação deste tipo. Por alguma razão estas situações ocorriam nas áreas rurais do que em Bissau. Hoje não creio que haja nada a fazer e não creio que ao 60 e tal anos haja um avô português que queira presentear os netos com mais um(a) tio(a) avô(ó). Sejamos(duramente)realistas.
Um Ab.
António J. P. Costa

Antº Rosinha disse...

Sobre aquilo que se pode fazer pelo fenómeno da mestiçagem afro-luso-verdeana-indio-indo-brasileira, podemos continuar a fazer algo de muito importante que já se tornou hábito há centenas de anos:

Pôr à disposição dessas comunidades desde a linha de Sintra e Moita, até ao Alentejo e Algarve e Novelas para a televisão, e que nunca tenhamos que inventar uma Lampedusa nas nossas costas marítimas.

Talvez seja bom que nesta altura que quem ainda tenha complexos os vá perdendo e que se deixe de misturar o 25 de Abril, que ainda foi feito em pleno Estado Novo, dentro de toda a ordem, com o que se seguiu.

Se alguem devia ter complexos sobre o que se passou com essas crianças, com os comandos, Régulos, e milicias e todos aqueles africanos que hoje se afundam ao largo de Caboverde e Lampedusa, esses nunca podemos ser nós, aqueles que lutamos 13 anos contra as (In)dependências estúpidas.

Falo como retornado, portanto uma minoria, não conto.




Ultramar Naveg disse...

(opinião, publicada em 311531OUT2013 na página do UTW no facebook):
--«quote»--
– «... o assunto não é "sensível", como adjectivado pela senhora jornalista (cujo papel é o de ajudar a vender o matutino). O assunto é de domínio privado, individual; não é de fôro público.
Quanto à comparação (?!) com "o Vietnam": já cá faltava, a atrevida ignorância e arrivismo dos jornaleiros da esquerda folclórica... Em todas as guerras, desde as púnicas aos nossos dias, existem situações como a descrita.
Se a questão, é relativa à pretensão de cada uma daquelas pessoas desejar adquirir nacionalidade portuguesa (se é que ainda a não têem), tal objectivo é, também, do interesse particular.
Não se diga, nem se escreva, ser o tema de cariz "humanitário". Não, não é. Trata-se de enquadramento demagógico, por recurso à manipulação de sentimentos; ou pior, de ressentimentos... »
--«unquote»--

Torcato Mendonca disse...


Eu estou de acordo com o Cerqueira, o Rosinha e, principalmente, o Ultramar Naveg (creio ser um ex combatente) e,esquecia-me o A.J.P. Costa.

Acabam por, em pequena parte, dizer o que eu não disse...muito mais ficou por dizer,melhor escrever.nem tudo se escreve aqui e penso ser positivo.

Os Africanos (as) têm os seus próprios métodos contraceptivos...

Assunto interessante. Fica por analisar o que o L.Graça escreveu,sempre fundamentado na sua procura de elementos.

Abraço a todos.
AB,T.