quinta-feira, 25 de abril de 2013

Guiné 63/74 - P11470: No 25 de abril de 1974 eu estava em... (17): Bissorã, a ouvir as notícias da BBC, depois de regressar, de manhã, de um patrulhamento noturno (Henrique Cerqueira, Bissorã)

1. Mensagem do Henrique Cerqueira (ex- fur mll, 3.ª CCAÇ / BCAÇ 4610/72, e CCAÇ 13, Biambe e Bissorã, 1972/74)

Data: 25 de Abril de 2013 à12 12:49
Assunto: O meu 25 de Abril de 1974


Luís Graça:

Hoje,  25 de Abril de 2013, resolvi narrar um pouco do meu 25 de Abril de 74 . Pretendo assim homenagear deste modo essa data já com 39 anos mas que ainda está bem presente nas minhas memórias.

O texto não tem grande novidade mas mesmo assim resolvi mandar para apreciação dos meus camaradas editores que se acharem por bem o publiquem no nosso blogue que ainda respira festividade pelo seu aniversário.
Um abraço

Henrique Cerqueira


2. O meu 25 de Abril em 1974

Pois é,  hoje dia 25 de Abril de 2013, trinta e nove anos depois trouxe-me á memória o meu 25 de Abril de 1974 passado na Guiné.

Tinha ido eu com o nosso grupo de combate no dia 24 de abril de 1974 fazer mais um patrulhamento para a zona situada entre Bissorã e Biambe,  o qual se porlongou por toda a noite e felizmente sem 
qualquer acontecimento a assinalar. 

Pese embora a nossa guerra noturna com os mosquitos tudo correu com normalidade. Pela manhãzinha foi a hora de regressar ao aquartelamento e como era normal a malta quando chegava a Bissorã dava uma passagem pelo bar dos Sargentos tanto para saciar a sede como para depositar o armamento mais pesado,  pois que era nas traseiras do bar que havia a arrecadação de armamento.

Então nós nos deparamos com toda a malta junto de um pequeno rádio a ouvir notícias da BBC sobre os acontecimentos na Metrópole. Lembro-me que na altura se encontrava lá um elemento da PIDE/DGS e não se cansava de ameaçar o pessoal por estar a ouvir as ditas notícias (mal ele sabia o que o esperava).

Toda a gente ainda incrédula com a possibilidade do fim da guerra mas mesmo assim foi como se nada mais importasse e, a partir daí,  começou logo a rolar cerveja a festejar. Eu até esqueci as ferradelas dos mosquitos da noite passada no mato.

Bom,  depois de já convencido das mudanças na nossa política e com o fim á vista,  lá me dirigi a casa onde me esperava a minha mulher e filho (pois que ambos viviam comigo em Bissorã) e dei a novidade,  o que foi recebida com alguma incredulidade. É que dias antes tinha sido avisado que devido ao agravar da guerra na Guiné teria que mandar embora a família para a Metrópole que até já estaria um navio em Bissau de prevenção para a evacuação dos civis .

A verdade é que,  como todos sabem,  nada disso aconteceu embora até meados de Maio tenha havido alguma atividade do PAIGC flagelando ainda a nossa posição com um ataque de misseis terra/ar sem que tenha havido qualquer estrago tanto humano como material, pois que os misseis caíram na periferia de Bissorã,  de certeza que intencionalmente.

A partir daí foi o que toda a gente sabe. Algumas convulsões populares contra as nossas tropas, possivelmente para mostrar um revolucionarismo de última hora. O que mais tarde se veio a revelar é  que a população temia era o futuro,  o que infelizmente se veio a confirmar pois que hoje a Guiné é "Independente" mas continua pobre e massacrada por interesses que nada tem a ver com o desenvolvimento daquele povo.

Bom,  e foi assim o meu 25 de Abril de 1974.

Henrique Cerqueira
Ex-fur mil CCAÇ 13,  Bissorã
Batalhão 4610 /72

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Nota do editor:

7 comentários:

Carlos Costa disse...

Nesse dia estava eu em Canquelifá, a notícia foi recebida com natural surpresa e curiosidade de saber o que na verdade se estaria a passar. Escutava-mos a rádio avidos de saber notícias. No dia seguinte o capitão chamou a uma reunião, sargentos e oficiais, comunicando-nos que tinha 2 mensagens para nos comunicar, 1 seria dada a conhecer naquele momento e a outra passadas 24 horas. Assim a mensagem lida de imediato anunciava que estaria iminente mais um ataque do PAIGC. Passadas as 24 horas de com uma espera debaixo de uma enorme tensão à espera do primeiro "bum" que não chegou a acontecer. Foi então lida a 2ª mensagem que revelava ter havido os primeiros contactos do MFA com os movimentos de libertação das colónias, tendo sido acordado que as escaramuças seriam evitadas, não haveria mai ataques e se encontros houvesse no mato, haveria apenas alguns tiros para o ar, sinalizando a presença, seguindo cada força em sentidos opostos. Nos dias que se seguiram foram calmos com uma excepção com os paraquedistas em segurança de uma coluna, um deles pisou uma mina,perdeu a vida. Como era do batalhão de intervenção da Guiné 4516, passado algum tempo regressamos a Bissau e até Setembro, mês do regresso à metrópole fizemos segurança à cidade.
Carlos Costa, Fur.mil. Bat.inf.4516

Anónimo disse...

Um dia inesquecível, para mim. Estava em Pirada, em uniforme nº. 2. para embarcar numa aeronave, com destino a Bissau, via Lisboa, para gozar as minhas férias disciplinares. Nesse interim, fomos atacados pelo IN, com um potencial de fogo, muito superior ao do ataque, que tivémos em Março. Saltei para a vala mais próxima e aguardei que acabasse a flagelação. Não houve vítimas militares, mas pereceram. creio que 8 senegaleses, que se encontravm ao balcão, de uma loja, de um comerciante locar.
Carlos Ferreira, ex - fur mil atir cav. 3ª.CCav/BCav8323.

Mario Tito disse...

Preados camaradas:
Primeiro, refiro-me á menagem do camarada cerqueira, por mencionar Bissorã onde, se não estou em erro de nome, um amigo meu - de apelidos Lavinas tinha um café-cervejaria restaurante. Lá dormi num fim-de-semana bem passado, já depois da independência.

No dia 24 de Abril, crria o "ram-ram" do dia-a-dia, comigo na cidade de Bissau ás compras para o meu restaurante "O NINHO DE SANTA LUZIA", localizado na estrada do QG.

No dia 31 de Março tinha feito as escrituras por trespasse (400 contos) na aquisição daquilo que foi incialmente "A META" mas que, na ocasão se chamava "A TABANCA", junto ao campo de futebol.

O local andava em remodelação, na intenção de abrir no 1º de Maio.

Assim, eu ali na cidade...tendo deixado a minha "R-4L" estacionada junto ao café Bento - em frente da casa "Gouveia"...oiço um "alarido" emnorme vindo do lado do Grande Hotel - estrada que segue para o QG. Olhei e vejo uma enorme multidão de "africanos" expressando toda a espécie de contentamento e fazendo alguns desacatos, com gestos e algazarra diversa. ESpecialmente nalguns carros por ali estacionados.

Ora, estando a minha famila para além da multidão, eu não sabia o que se tinha passado até ali, uma vez que o NINHO ficava na rectaguarda da multidão, na direcção do QG.

Agarrei, meto-me no carro, entro na avenida e sigo direito ao Pálácio. Faço uma direita, lgo uma esquerda em direcção ao NINHO.

Chego, dei ordens para não se abrir...(seriam umas 11:30). Ali fui confrontado com uma situação de uma familia ainda parentêsco em 3º grau, cujo marido era RádioTelegrafista da DGS. A mulher ali a choramingar, porque o marido (meu 3º primo) tinha saído para ir á DGS, passando antes pelo Dr. de crianças. Creio que foi o que lhe valeu porque, horas mais tarde a tropa ou ocupou aquilo, dando ordens a que todos os agentes se entergassem na Amura.

Já contei antes noutra mensagem que, dali fui ao consultório do Dr. á procura de pai e filho, para acalmar a mulher e mãe. Encontrei-os e torcamos de carro porque o dele era conhecido como sendo da DGS e o meu não. A ideia seria...se atacassem o carro pensando que ia lá dentro um da DGS, eu mostrava a cabeça...dizendo que era eu.

Porquê? Não era porque não tivesse medo mas sim porque eu tinha "boa reputação" entre o pessoal local.

Ao mesmo tempo, com o meu primo na minha carrinha, confiei - e saiu certo - que não iriam atacar uma "coisa" minha, pela reputação do dono.

Entretanto, eu tinha as chaves de um armazem que antes tinha sido a "fábrica das malas" na Estrada de Antula, junto ao NINHO, sainda da estrada de Sta Luzia, junto ao QG.

Ali escondi o carro do meu primo aquem dei guarida até o convermos a entregar-se na Amura. Ele não queria mas lá foi. Depois foi com todos os outros para o Cimuré.

Entrentanto, vou á Tabanca e digo ao pessoal que "nem mais um prego" espetam até se ver como vão ficar "as coisas".

Dali em diante..."turbulência" enorme e decisões nem sempre as mais acertadas. Por ali fiquei até 1981. Só abri a TABANCA creio que em NOvembro de 1974, tal com tonha ficado a 25 de Abril. O 1º jantar foi u calote do Governo que demorou a pagar tanto como um bebé a nascer - não prenmatura, mas com dias de atraso. recordo que foram ter comigo ao NINHO para que abrisse "aquilo" para receber a 1ª delagação estrangeira á Guiné depois da Independência. Era da Argélia. Na ocasião, era o único local com ar condicionado, porque o resto ainda não estava nada a funcionar com deve ser. Só eu é que tinha algo operacional, excepto o Grande Hotel. O Pelicano não tinha ar condicionado que eu saiba. Ventoinhas sim. Enfim...longa história já contada em parte.

Hei-de tentar arranjar as memórias para publicar no bloge "http://pidjiguiti.blogspot.com

Abraço a todos e VIVA o 25 de Abril


Anónimo disse...

Onde é que você estava no 25 de Abril..."seu...seu..fascista"(em pensamento) do B.B...isto dito com voz gutural...

Bem,eu estava em Gadamael,e após fazer a minha ronda higiénica..liguei o rádio em onda curta e percorri as ondas do "éter"..."rádio habana--cuba..território libre in ámerica"..nada.."rádio moscovo"..nada.."deutchsvella"..nada..."rádio globo"..nada.."bbc..golpe militar em Portugal..géneral Spinóla..coiso e tal"..o quê..porra..finalmente..
Contactei o Sr. comandante H.Patrício,dizendo-lhe que estava a decorrer um golpe militar,e este pergunta se era o nosso General Spínola que estava à frente..e eu..claro que é.. (eram 7 da manhã e eu não fazia a mais pequena ideia)..ah..sendo assim eu alinho..BOA.

Não houve a flagelação da ordem..já não saiu uma companhia para o mato..e o resto continuou tudo como dantes..apenas troca intensa de mensagens com Bissau,que pouco ou nada sabiam,ou não queriam dizer..

Foi assim o meu 25A.

C.Martins

Henrique Cerqueira disse...

Mário Oliveira
Que bem me lembro do saudoso LAVINAS.Era o local ideal e "único"para se comer umas patuscadas e como restaurante também se remediava bem . Foi lá que festejei o aniversário da minha mulher em Março de 1974.
Quantos aos PIDES/DGS.Nessa altura tudo aconteceu...houve exageros por parte de muitos "antigos visados",mas também houve humanismo e em especial por parte das nossas tropas.Eu tive que um certo dia de Maio levar a Bissau (para o Cumeré)dois agentes da DGS que estavam citiados em Bissorã. E um especialmente que era ainda muito jovem,tinha acabado uma comissão e sido recrutado para a PIDE/DGS e naqueles momentos não sabiam o que ia ser o seu futuro.Também teve o seu "Dramatismo" até porque a maioria tinha familia formada na Guiné. Mas este assunto dará provávelmente para uns artigos deste blogue.
Um abraço
Henrique Cerqueira

Vasco Gama disse...

Meu amigo Henrique desculpa mas após o 25 de Abril Bissorã só foi atacada uma vez. Com misseis sim mas no dia 2 de Maio e de dia. Não cairam fora de Bissor
ã mas bem dentro de Bissorâ. Eu estava junto
a Caixa de Correio da CCS quando veio o primeiro. Cortou uma arvore pelo meio só com o sopro. Eu estava dentro de uma vala. Houve feridos, não sei se mortos no meio da pop. Um abraço para todos os camaradas que por lá passaram Vasco Gama

Henrique Cerqueira disse...

Olá Camarada Vasco
Tens toda a razão quanto ao ataque de misseis.A memória já não é o que era e já não me recordava que realmente um dos misseis caíu dentro da povoação.Mas eu penso que não houve feridos em ninguem , pois me lembro de ter ido ver a cratera de um dos impactos mas fora da povoação e relativamente próximo de uma das tabancas onde vivia o Branquinho que era soldado do meu grupo.Qualquer dos modos é bom saber que o meu amigo e camarada Vasco estava atento e me corrigiu.
Vasco vê lá se escreves algumas estórias da "nossa guerra".
Um abraço
Henrique Cerqueira