terça-feira, 5 de março de 2013

Guiné 63/74 - P11196: Estórias do Juvenal Amado (46): Este gajo não tem uma cunha, tem um barrote

1. Em mensagem do dia 22 de Fevereiro de 2013, o nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872,Galomaro, 1971/74), enviou-nos mais uma das suas estórias.


ESTÓRIAS DO JUVENAL AMADO

46 - ESTE GAJO NÃO TEM UMA CUNHA, TEM É UM BARROTE

O Passos e o Ferreira eram como as p….. andavam sempre aos pares. Assim quando resolveram meter férias para vir à Metrópole, fizeram de forma a virem e regressarem juntos. Cá, o Ferreira foi para Viseu e o Passos para Matosinhos.

Quando chegaram a Bissau apresentaram-se nos Adidos. Logo por sorte o Passos conhecia lá um tipo de Matosinhos que estava na secretaria e tinha um quarto no bairro do Pilão. Escusado será dizer que o Ferreira e o Passos nunca dormiram nos Adidos, apenas deixaram lá a farda num cacifo do camarada que se encarregava de evitar que fossem escalados para os serviços de linha.

Nos Adidos, quando apanhavam a malta em trânsito do ou para o mato, metiam-nos em tudo que era escala onde pontificavam os reforços, os piquetes e cabos de dia. Não havia volta a dar, era dia sim dia não.
Bom, aqueles dois ou três dias até embarcarem na TAP para os 35 dias da praxe, foram passados entre copos e paródia, isto para não falar do resto.

O Silva, o Ivo, com o Passos ao colo, e o Ferreira

Quando embarcaram, o amigo do Passos disse-lhes:
- Companheiros, calha-vos a regressar num Domingo, dia em que a secretaria dos Adidos está fechada, por isso podeis regressar só no avião de Segunda Feira e aproveitais assim mais um dia. Eu depois trato dos papéis.

Assim foi, avisaram a transportadora e passada que foi a licença, eles desembarcam em Bissau um dia depois do que deveria ter sido, com a agravante de ninguém saber do individuo da secretaria.
Tiveram que apresentar as guias de marcha a outro, que lhes disse logo que eles estavam em falta, e que o facto da secretaria estar fechada não os ilibava, pois o que contava era o registo do desembarque e eles segundo o dito, tinham desembarcado um dia depois. Lá arranjaram umas desculpas esfarrapadas e trataram de regressar ao batalhão em Galomaro.

Enganaram-se ao pensar que aquilo tinha ficado por ali. Quando chegaram a Galomaro já estavam com o tenente Raposo à perna, que tinha já recebido as informações de Bissau, e as ordens eram para levantar um auto.
O capitão já tinha ido para Bissau, não regressando mais à Companhia, tendo o tenente assumido o comando interino da CCS, tornando-se mais tarde efectivo.

O Ferreira foi o primeiro a ser chamado. Quando o tenente lhe disse que eles poderiam ser obrigados a cumprir a comissão, mais um dia, e que esse dia, depois nunca se saberia quando era, ficou tão acagaçado que a primeira coisa que lhe veio à cabeça, foi a carta de apresentação que Passos tinha e era assim como um tratamento de choque contra as adversidades de percurso que existem sempre na tropa. Vai daí, dizer que se tinha que falar com o comandante, pois o Passos tinha uma carta de apresentação de um “tipo cheio de estrelas”, foi um sopro de tempo. A lógica do Ferreira era só uma: se o Passos não se lixar, eu também não me lixo.

De pé: o tenente Raposo, o 1º Sargento do Batalhão, o Caramba e o 1º Sargento Silva da secretaria. De cócoras o Santos. Na camioneta: o Ermesinde e o Aljustrel

A famosa carta tinha o efeito nos problemas que o Imodium tem nos desarranjos intestinais. Para com eles na maior parte dos casos. Assim como uma varinha mágica.

O Passos entretanto quando vai à presença do tenente Raposo já estava de sobreaviso sobre a “trovoada” que aí vinha. Voltou à baila o nome do “padrinho estrelado”, que já tinha funcionado no caso da cantina tendo logo o condão de serenar os ânimos.

E assim foi, o caso ficou por ali, o tenente passou a chamar o Passos amiúde para lhe fazer recomendações que seriam normais um pai fazer a um filho. O Passos era pois aconselhado a andar na linha, por que sim e por que não, mas a coisa “amaciou” para não se falar mais no assunto.

Isto de não se saber com quem se estava a lidar até causava calafrios e podia facilmente tirar o sono a um homem que fazia desta vida o seu ganha pão, lá pensava para com os seus botões o bom do nosso tenente.

Passado para aí um mês, o Passos foi chamado à secretaria. Diz-lhe o tenente:
- Tens aqui um documento de amparo de pais. Temos que rever que dinheiro estás a mandar para lá, pois eles precisam de ajuda.

O 1º sargento Silva que sabia mais daquilo num pé que o resto da secretaria junta, estava de parte diz a gozar:
- Qual quê meu tenente, isso é amparo de pais sim, mas é para esse gajo ir daqui para fora.

O tenente fez um ar incrédulo e o sargento acrescentou com ar manhoso:
- É mesmo, o gajo vai mais cedo para casa, a comissão acabou para ele - e acrescentou:
- Ele não tem uma cunha... tem é um barrote.

E foi verdade, o Passos livrou-se do resto da comissão, embarcando de vez em Janeiro de 1973 num Nordatlas da Força Aérea a caminho de casa.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 27 de Outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10584: Estórias do Juvenal Amado (45): A cachaça do senhor Pereira de Lima

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