domingo, 10 de junho de 2012

Guiné 63/74 - P10019: Lições de artilharia para os infantes (6): O obus 14 de Bedanda em tiro direto... (C. Martins / Rui Santos)






Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > Agosto de 1972 > Espetacular foto noturna do obus 14 em ação... Segundo o nosso camarada Nuno Rubim, e um dos maiores especialistas portugueses de história da artilharia portuguesa, "de acordo com um relatório oficial português que encontrei no AHM [Arquivo Histórico Militar],
no dia 16 de Maio [de 1973], isto é, dois dias antes do ataque, as três peças de 11, 4cm foram substituídas por 2 obuses de 14 cm (3). Agora se compreende a polémica sobre o assunto. Um deles veio sem aparelho de pontaria e não foi recebida nenhuma tábua de tiro ! Sem comentários... Esses 2 obuses foram pois abandonados, mas sem possibilidades de entrarem em acção e capturados pelo PAIGCTenho uma fotografia desse facto." (Vd. poste P1672).
Foto: © Vasco Santos (2011). Todos os direitos reservados.

1. Resposta, com data de 28 de maio último, de C. Martins,  a um comentário do Rui Santos (*):


(i) Comentário do Rui Santos:

João Martins:


Quem conhece Bedanda, aliás Amedalai, pois Bedanda é lá em baixo a 700 metros do Ungauriol, fica de facto num pequena colina (23 metros de cota de nível) e se o inimigo atacasse vinha de baixo...Assim,  como é possivel um aparelho que faz tiro tenso (suponho) dispare por cima das moranças e vá cair a cerca de 1.000 metros à cota de 2/3 metros ???  (...)

Rui Santos
Ex-alferes miliciano
Bedanda 1963/1964

(ii) Resposta de C. Martins:

Caro camarada Rui Santos

Não conheço Bedanda nem Amedelai.

O obus 14 tinha uma elevação de - 5º a + 45º, por isso podia fazer tiro de uma cota superior para uma inferior e tiro directo.


Tinha um grande inconveniente, que era se se fizessem muitos tiros com graduação negativa ou tiro directo,  normalmente rebentava com os hidráulicos e ainda para armar a espoleta esta necessitava de percorrer cerca de 500 m. 

Esta armava pela força centrífuga devido ao seu movimento de rotação. A granada saía sempre a uma velocidade superior à do som. A maior ou menor velocidade dependia da carga. Com carga 4 e a + 45º saía a 640 m/s.

Mesmo que não rebentasse, convenhamos que uma "ameixa" com 14 cm de diâmetro e com 45 cm de comprimento e ainda com 45 kg,fazia "ronco" de certeza.

Fiz uma vez uma experiência em Gadamael com tiro a -2º para o outro lado do rio a uma distância de 600m, onde nos dias da "brasa"estava um posto avançado de observação do IN. A granada explodiu só que alguns estilhaços caíram no perímetro do quartel. Não voltei a fazer a experiência, e felizmente nunca foi necessário fazê-lo em nenhuma flagelação.

A artilharia é a arma dos fogos largos e profundos e de tiro tenso, mas como a necessidade aguça o engenho, também em circunstâncias especiais podia ser de fogos curtos e pequenos,  só que podíamos levar com estilhaços na "mona" ou em outro sítio, fica à vontade do freguês.

Ah, o raio de acção da explosão da granada podia atingir os 400m, tudo dependia da dureza do terreno no impacto.

Julgo que esclareci os infantes (**) e o camarada Rui Santos.
Um alfa bravo

C.Martins

(iii) Comentário de Rui Santos, com data de 29 de maio último:

Amigo C. Martins>


Obrigado pelos esclarecimentos, mas quem conheceu Bedanda/Amedalai, sabe que a cota de Amedalai onde estavam estacciondos os obuses é de cerca de 22, e que as bolanhas circundantes estão a uma cota 4, bem como se houver um ataque jamais será executado a menos de 200 metros do aquartelamento, pois lá de baixo para cima só com morteiro, e não estou a ver o IN a atravessar qualquer linha de água com o morteiro ás costas. 

Diga-me então como é possivel fazer fogo 3/4 metros acima das moranças e as granadas cairem a 200 metros??? quase no topo da colina?? 

Nunca fomos flagelados em Amedalai como o fui em Bedanda, pois a aproximação do IN mais segura seria directamente pela mata do Cantanhez que ficaria a cerca de 100 metros da sebe de arame farpado.

Falarei com este amigo João Martins pessoalmente no dia 9 (***), se Deus quiser  (...)
 ______________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 26 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9947: Memórias da minha comissão (João Martins, ex-alf mil art, BAC 1, Bissum, Piche, Bedanda e Guileje, 1967/69): Parte VI: Bedanda, com o obus 14: um dos locais que me deixou mais saudades...

(**) Último poste da série > 17 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9915: Lições de artilharia para os infantes (5): Quando o oficial de dia fez um levantamento de rancho... (C. Martins, Cmdt do Pel Art, Gadamael, 1973/74)


(***) Data do 2º encontro, na Mealhada,  dos bedandenses, organizado pelo António (Tony) Teixeira e que, segundo conversa telefónica que tive ontem com o Pinto de Carvalho, reuniu umas boas dezenas de camaradas (Tenho ideia de ele me ter falado em 50)...

8 comentários:

Anónimo disse...

C. Martins
Se tiveres paciência diz-me quem foram os alferes e furriéis de artilharia com quem privaste nos diferentes pelotões que integraste.
António Ribeiro
ex-furriel mil. artª

Anónimo disse...

No tempo da CCAÇ 2617, Magriços do Guileje, Março de 1970 / Fevereiro de 1971, não havia em Guileje o obus 14, mas sim a peça de artilharia 11.4. Na véspera do abandono de Guileje, em 22 de maio de 1973, sabemos que as peças 11.4 foram substituídas por obuses 14, por falta de munições...

Luis Graça

Anónimo disse...

Caro camarada António Ribeiro

Não estive em diferentes pelarts,infelizmente.
Só estive em Gadamael, cujo o pelart tinha o n.º 23,que passou a designar-se 15.º, que era o de Guilege.
Contrariamente ao que era norma na artilharia nunca saí de Gadamael, e soube posteriormente que iria lá fazer toda a comissão.
Sobre os nomes , confesso que passados estes anos,já esqueci o nome de alguns,também nunca mais tive contacto com outros, e há um que já fez comentários aqui no blog, mas não está interessado em fazer mais comentários, por isso só com a autorização dele é que direi o nome.
Como é compreensível lembro-me muito bem de factos que nunca mais esquecerei, agora nomes, propriamente dito...

Um alfa bravo

C.Martins

Anónimo disse...

Caro Luís Graça

A bem da verdade,quando se abandonou Guilege,existiam apenas obuses 14,que obviamente foram abandonados,tendo-se destruído as culatras.
Anteriormente parece que foram para lá duas peças 11,4, tendo uma delas chegado com o aparelho de pontaria inop.
Não existiam muitas granadas de 11,4 era em Beirolas.
Esta minha informação carece de confirmação, porque estou apenas a relatar aquilo que me foi transmitido na altura.
As granadas do 14 eram importadas dos U.S.A.

C.Martins

Vasco Pires disse...

Caro C. Martins,
Como disseste, "a necessidade faz o engenho", uma vez, também tive que fazer tiro direto;houve uma tentativa de invasão do quartel,e um grupo foi detetado no começo da pista, que bem conheces, se não fez muitos estragos, pelo menos assustou.Vasco Pires, Ex-Comandante do 23° Pel. Art.

JC Abreu dos Santos disse...

... ainda um dia haveríamos (todos?) de gostar de saber - aqui, que ninguém nos lê nem ouve -, em qual EP o veterano C.Martins fez o seu COM e em que turno de que ano.
Cordialmente,
João Carlos Abreu dos Santos

jorge figueira disse...

Conheci Mejo-Guileje de Jan68 a fim de Ag68. Retirámos os 8.8 dos PelArt.7 e 8 (cito de memória posso falhar o número dos pelotões). Os 8.8 foram Catió. Li o livro do Sr Cor. Coutinho e Lima, onde julgo, está explicada a situação que se levantou com as peças 11.4 e obus 14. Até fim de 1969 tenho ideia, aquela que possível face ao lapso de tempo decorrido, daquilo que foi vida da Bac1, mais tarde Gac1.

Anónimo disse...

Começo por pedir desculpa a todos os comentadores pela minha intervenção, mas não posso de fazer uma analogia entre alguns comentários aqui produzidos e a «Guerra de 1908» do nosso querido Raul Solnado, que naquela guerra foi Infante.

Não fora estarmos a falar de coisas muito sérias eu atrevia-me a sugerir a solução do Sargento daquela história, «amarramos uma guita à…. », e pronto já não precisava-mos de substituir as armas. Falta de imaginação dos Chefes da Guerra.

E a guerra não foi perdida!.......mas estava quase.

Cumprimentos a toda a Tabanca

A. Almeida