quarta-feira, 4 de abril de 2012

Guiné 63/74 - P9702: Efemérides (87): Homenagem aos 3 majores do CAOP, mortos a 20 de abril de 1970, no chão manjaco (António Graça de Abreu / Manuel Bento / MACOUPA)


Guiné > Teixeira Pinto (?) > CAOP / CTIG 1 > c. 1970 > Os  três majores, com população local. Da direita para a esquerda: Pereira da Silva, Passos Ramos e Magalhães Osório, ou Magalhães Osório e Passos Ramos (não sabemos se a ordem está correta).

Foto: Maria da Graça Passos Ramos / Círculo de Leitores. In: ANTUNES, J.F. - A Guerra de África: 1976-1974. Vol. II. Lisboa: Círculo de Leitores. 1995. (Com a devida vénia...).


1. Mensagem do nosso amigo e camarada António Graça de Abreu, com data de 12 de fevereiro último:

Junto envio cópia da  foto dos três majores  que está no II vol., pag. 716, de A Guerra de África, de José Freire Antunes, no depoimento do general Almeida Bruno, "Libertar Guidage". A fonte da foto é a esposa de um dos majores, Maria da Graça Passos Ramos.

Dei recentemente uma vista de olhos pelo livro da jornalista Felícia Cabrita intitulado Massacres em África, (Lisboa, Esfera dos Livros, 2008) que dedica trinta páginas (da 180 à 210) ao massacre dos três majores Passos Ramos, Magalhães Osório, Pereira da Silva, do alferes Mosca e dos dois intérpretes manjacos Aliu Sissé e Patrão, todos do CAOP 1, -  a que também pertenci -, na estrada Pelundo/Jolmete a 20 de Abril de 1970. O texto é muito interessante, bem elaborado e documentado e conclui com um sentido poema do general Roberto Durão, (irmão do meu coronel pára-quedista Rafael Durão, comandante do CAOP 1, 1971-1973) dedicado aos três majores.
           
Há uns meses atrás, o coronel Mário Machado Malaquias, meu superior, meu companheiro e meu amigo no CAOP 1 (Comando de Agrupamento Operacional 1) em Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 72/74, enviou-me também um poema, este de homenagem aos três majores. Tinha-o guardado consigo, ignorava quem era o autor do poema, apenas aparecia assinado MACOUPA e perguntou-me se o anónimo poeta não seria eu.

Não escrevi este poema, e tal como o coronel Mário Malaquias não sei quem é o autor (alguém no blogue pode ajudar a descobrir que é o MACOUPA?) mas, com uma ou duas alterações de pormenor, não me importava de o ter escrito. Aí vai:
           
            Brilharam sonhos e certezas,
            Flâmulas brancas esfacelando medos
            No erguer feliz do amanhã sem data.
            E a noite vomitou
            Ecos podres vomitando anseios,
            Ódios amassados na embriaguês de cinza e sangue
            A escarnecer o abraço impossível.
            Agora,
            Que valem escolas e bolanhas fartas
            Se os chacais uivam hálitos vermelhos.
            Que importa o ouro do suor de tantos
            Na promoção das gentes deste chão.
            Quem bebe o sangue vertido nestas matas
            Se o ódio enjeita as vidas ceifadas na rotina.
            Quem ousa meditar a crueza da verdade
            Sem se vergar ao peso da descrença.
            Ah, como eu amo o riso das crianças,
            Para ver de dentro o meu olhar parado
            E vestir ainda a minha alma nua
            Na sordidez de ideias da morte…
            Desenraizado guerrilheiro terrorista
            Vem medir o fundo deste olhar despido
            Que já luziu de esperança e de gestos.
            Vem beber o fel desta chacina
            E diz-me se ainda há sedes por matar.
            Vem.
            Aqui nas matas do Jolmete
            A luta de ideais enraizou na morte,
            Os homens bons que tu sacrificaste
            Acenam ainda o braço que rejeitas.
            Aqui,
            Desenraizado guerrilheiro terrorista
            Se lutas pela Verdade
            Ergue um santuário-mesquita-catedral
            E endeusa os mártires que tombaram de pé
            Pela Verdade,
            Pela Justiça,
            Pela Paz.


2. Comentário de L.G.:

Este poema já aqui tinha sido publicado,em 8 de março de 2011,  na sequência de uma mensagem do 1º cabo telegrafista Manuel Alberto Cunha Bento, membro da nossa Tabanca Grande. De qualquer modo, parece-nos justo e oportuno voltar a publicá-lo, neste mês de abril de 2012, em que se comemora o 42º aniversário deste trágico aontecimento. Tudo indica que o pseudónimo MACOUPA diga respeito a alguém do próprio CAOP/CTIG da época (mais tarde CAOP1), CAOP a que pertenciam os três malogrados majores:

(...) "Vi as várias noticias do massacre no Chão Manjaco,  onde os 3 Majores e o Alferes foram assassinados. Eu pertencia ao CAOP, era Cabo Telegrafista e estava sempre em contacto com os referidos oficiais.

"Alguém do Agrupamento [leia-se, do CAOP] lhes prestou uma homenagem por escrito e deu-me uma fotocópia que eu guardei nos meus arquivos, e que junto para ser inserida no blogue se acharem conveniente (...).
Manuel Alberto Cunha Bento [manuelben@gmail.com / Telem 969 609 701]" (...)

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Fonte: Manuel Bento (2011).

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Nota do editor:

6 comentários:

Luís Graça disse...

Eam três dos melhores filhos de Portugal!... Deverão ser lembrados como grandes portugueses de todos os tempos, capazes de arriscarem (e sacrificarem a sua vida) no cumprimento do seu dever e na realização de um projeto em que acreditavam.

Não os conheci pessoalmente, mas eram militares do meu tempo: e sei que amavam aquela terra e aquele povo, como poucos!

A sua morte, gratuita, continua a ser um brutal murro no estômago de todos os antigos combatentes da Guiné. Mesmo os seus assassinos não têm coragem, ainda hoje, de darem a cara perante o seu próprio povo e a história. Quem matou à catanada, a sangue, aqueles três majores portugueses e os seus acompanhantes, todos desarmados ?

Eu sei que a guerra, todas as guerras, não são um torneio de gentis cavaleiros, com regras fortemente codificadas... Que todas as guerras são "sujas", e que, no fim, vencidos e vencedores, se sentem miseravelmente mal... (Sentirão ? Temos pudor, de um lado e de outro, em falar das nossas mútuas "safadezas"... Não as contabilizo. Mas esta pesa na balança do PAIGC, e nas consciência de alguns dos seus históricos dirigentes...).

O PAIGC viveu (e ainda hoje vive, ao que parece) mal com este trágico episódio da guerra colonial...Que estupidez!, é a natural reação de qualquer tuga: estes "meninos bonitos" de Spínola valeriam mil vezes mais vivos do que mortos nas mãos de Amílcar Cabral.

Tal como em Alcácer Quibir, onde ficou a nata da elite portuguesa, a grande maioria dos filhos primogenitos das grandes familias portugueses...

Quarenta e dois anos depois, continuamos, sem palavra, a contornar este e outros trágicos episódios da nossa guerra...

No dia em que o nosso blogue regista 3,5 milhões de visitas, saúdo o AGA pela oportunidade desta dolorosa revisitação do nossa calvário da Guiné! E que melhor que a poesia para anos ajudar a fazer o luto!?

Luís Graça, Candoz, 4ª feira da semana santa (para os cristãos).

Luís Graça disse...

Desde muito cedo, ainda na I Série do nosso blogue, temos dedicado periodicamente a nossa atenção à memória destes valorosos portugueses... Recorde-se aqui dois textos pioneiros, que remontam a 2005:

11 de Agosto de 2005> Guiné 63/74 - CXLIX: Antologia (15): Lembranças do chão manjaco (Do Pelundo ao Canchungo) [Texto de João Tunes]

http://blogueforanada.blogspot.pt/2005_08_07_blogueforanada_archive.html


26 Novembro 2005
Guiné 63/74 - CCCXIII: A morte de três majores e de um alferes no chão manjaco

http://blogueforanada.blogspot.pt/2005/11/guin-6374-cccxiii-morte-de-trs-majores.html

Recorde-se, por outro lado, o nome dos quatro oficiais portugueses mortos nessa trágica cilada, bem como as localidades onde os seus restos mortais foram inumados:

(i) Major de Infantaria nº. 50972511, do CAOP - Comando de Agrupamento Operacional / CTIG, Alberto Fernão Magalhães Osório: Cemitério Paroquial do Baraçal, Celorico da Beira;

(ii) Major de Artilharia nº. 50692711, do CAOP / CTIG, Joaquim Pereira da Silva: Cemitério Paroquial de Galegos, Penafiel;

(iii) Major de Artilharia com o CEM Nº. 50275711, do CAOP / CTIG, Raul Ernesto Mesquita da Costa Passos Ramos: Cemitério Paroquial de Paranhos, Porto;

(iv) Alferes Miliciano de Infantaria nº. 19516168, do Pelotão de Caçadores Nativos Nº. 59 / CTIG, Joaquim João Palmeiro Mosca , Cemitério Municipal de Redondo, Redondo.

Antº Rosinha disse...

Talvez em 20 de Abril de 1970 esta guerra já tivesse um ano e meio a mais fora da "validade", da parte de Lisboa.

Torcato Mendonca disse...

Copy/paste

Meu Caro Luís

Morreram quatro oficiais e outros militares das Forças Armadas de Portugal. Assassinados de forma cobarde, segundo parece, a mando de "oficiais" do exército do PAIGC.

Abraço.

Boa Páscoa
Ab T.

Votos de Boa Páscoa ou Santa Páscoa aos Camarigos do Blogue

António Rodrigues disse...

Caro António Graça de Abreu, também li o livro Massacres Em África e achei que está muito bem descrito e muito bem documentado este trágico e lamentável episódio do assassinato a sangue frio por parte do PAIGC destes nossos Heróis, covarde-mente mortos. Como vivo aqui perto do cemitério de Paranhos no Porto, já tive oportunidade de visitar algumas vezes a sepultura do malogrado Major Passos Ramos, nomeadamente quando lá vou acompanhar algum funeral.Votos de Páscoa Feliz a todos os camarigos e Parabéns a quem hoje está de aniversário. Um Abraço.

Unknown disse...

Concordo em absoluto com o primeiro parágrafo do camarada Luís Graça.Servi sob as ordens destes oficiais, especialmente do major CEM Passos Ramos, que sabendo dos riscos de vida que corria me afirmou, se lhe acontecesse algo, deixava todo o trabalho pronto a ser continuado no dia a seguir. O trabalho foi continuado por Ramalho Eanes(coronel na altura?). Fur.Mil.16CCMDS