quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Guiné 63/74 - P8931: Antologia (72): Tarrafo, crónica de guerra, de Armor Pires Mota, 1ª ed, 1965 (5): Ilha do Como, 8 e 12 de Fevereiro de 1964



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Foto: © Mário Dias (2005-2011) / Blogue Luís Graça & camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados


















Fonte: © Armor Pires Mota (1965-2011) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados.





1. Continuação da publicação de Tarrafo; crónica de guerra, de Armor Pires Mota, 1ª ed., Aveiro, 1965. Parte 2 (Ilha do Como, Jan / Mar 1964), pp. 65-67. (*)


Começámos, a partir de 14 do corrente, a publicar as crónicas do Tarrafo, relativas à Op Tridente, na Ilha do Como (15 de Janeiro a 15 de Março de 1994), recorrendo para o efeito a um exemplar, fotocopiado, da primeira edição do livro (pp. 47 a 85).  

Publicamos hoje mais duas crónicas, relativas aos dias 8 e a 12 de Fevereiro de 1964.  Estas duas situações passam-se quase  um mês depois do Alf Mil Cav Mota ter desembarcado no Como, juntamente com o resto da sua subunidade, a CCAV 488, integrado na Agrupamento B.

 2. Paralelamente estamos a seguir a crónica de outro combatente do Como, o nosso querido amigo e camarada Mário Dias, hoje sargento comando reformado. Em relação a este período (1ª quinzena de Fevereiro de 1964), selecionámos o seguinte excerto (o resto pode ser lido na I Série do nosso blogue, aqui):


(...) Em 4 de Fevereiro [de 1964], em mais uma incursão na mata de Cauane, o grupo de comandos [,comandado pelo Alf Mil Saraiva,] ficou emboscado após a retirada das outras forças (CCAV 489). Surpreendemos elementos avançados do IN a quem provocámos 3 feridos. (Não sei se terão morrido mais tarde.)


Boas notícias. Vamos passar a ter uma refeição quente por dia: o almoço. Já não era sem tempo. Como estávamos instalados junto ao 8º Dest de Fuzileiros [, comandado pelo 1º ten Alpoim Calvão, ] com quem nos dávamos extraordinariamente bem, tanto no aspecto operacional como no convívio diário, resolvemos também “juntar os trapinhos” na confecção da comida.

À vez, à volta dos caldeiros de campanha, armados em cozinheiros, lá íamos mostrando os nossos dotes. E, acreditem, tudo correu maravilhosamente. E nem sequer faltava marisco para petiscarmos. Quando a maré vazava e não estavamos em operações, era só ir até à linha de baixa-mar onde colhíamos grandes quantidades de combé que por lá abundava. Para quem não conhecer, combé é um bivalve parecido com o berbigão mas muito maior e de casca bastante grossa. Uma delícia. Atendendo à situação, claro.

No dia 6 de Fevereiro, o grupo de comandos com o pelotão de paraquedistas, embarcou na LDM  ao fim da tarde com destino a Curcô para, a partir desse local, atingir Cachida tentando surpreender o IN pela retaguarda. Chegamos a Curcô onde estava instalada a CCAV 489 [, comandada pelo Cap Cav Pato Anselmo]. Aí pernoitámos, aguardando a madrugada para iniciar a progressão.

(...) Partimos, em silêncio como convinha, e embrenhámo-nos na mata. Olhos e ouvidos atentos, mão firme nas armas, prontos a reagir. Tudo vimos com cuidado, explorando indícios e tentando descobrir onde se acoitavam. Trilhos bem pisados pelo uso, mas as poucas palhotas que fomos encontrando estavam abandonadas, algumas recentemente, outras há semanas. Contacto, nenhum. Nem vê-los. De vez em quando soava um tiro isolado, talvez de aviso, e nada mais. Ao fim da manhã atingimos Cachida, que se encontrava abandonada, e derivámos em direcção à picada que liga Cassaca a Cachil.



Infografia: © Mário Dias (2005-2011) / Blogue Luís Graça & camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados



(...) Desde a manhã que nessa zona da mata de Cachil o 7º Dest de Fuz [, comandado pelo  1º ten R Pacheco,] estava fixado por um grupo de cerca de 50 guerrilheiros, bem armados e municiados, que os flagelava a partir da orla da mata de Cassaca. Uma secção dos fuzileiros  chegou a estar isolada e cercada cerca de 45 minutos.

Conseguimos chegar ao local e detectamos a retaguarda do IN que atacámos causando-lhes baixas. Como a reacção não foi grande, deduzimos - ingenuamente como em breve viríamos a verificar - que se tinham posto em fuga e iniciámos a travessia de uma zona descampada, lisa como um campo de futebol e de capim muito rasteiro, com o intuito de nos juntarmos aos fuzileiros que nos aguardavam do outro lado. Ainda não íamos a meio quando estalou a fuzilaria vinda de um ponto mais a oeste da orla da mata que acabávamos de deixar.

Chão… rebolar…responder ao fogo… procurar alguma abrigo… não há nada, tudo liso como a careca de um careca. Eles não paravam o fogo, nós também não. Mas estávamos a descoberto, alvos fáceis.

O alferes Godinho gritando para o Saraiva:
- Porra, que estamos aqui a fazer? Vamos embora. - E fomos. Em lanços, uma equipa correndo em zigue-zague, as outras cobrindo, a equipa instala-se, outra se levanta e a ultrapassa, instala-se, outra faz o mesmo e assim conseguimos percorrer os 200 metros daquela maldita clareira, debaixo de cerrado fogo, sem qualquer arranhão, juntando-nos aos fuzileiros.

Quando recordo este episódio, lembro-me sempre do logro em que fiz cair um guerrilheiro e que me salvou a vida. Faltando-me alguns metros para atingir a orla da mata onde teria abrigo seguro, vi no chão os impactos de uma rajada mesmo junto aos meus pés. Bom, esta não é à toa, é mesmo apontada para mim. De imediato, nem sei mesmo como me ocorreu tal estratagema, armei-me em artista de cinema quando atingido por disparos e, abrindo os braços, mandei um salto deixando-me cair de costas desamparado. Remédio santo. A rajada que me era dirigida parou. Fiquei no chão alguns instantes, quietinho, e de repente, ala que se faz tarde. Alcancei a segurança da mata onde já estavam quase todos os elementos do grupo. Os restantes não tardaram a juntar-se a nós.

Os paraquedistas [, 1 pelotão,] tiveram menos sorte. Como vinham atrás de nós, ao ouvir o tiroteio que nos atingia na clareira, resolveram atravessá-la um pouco mais a leste. O resultado foi terem demorado mais tempo permitindo a reorganização do IN que lhes dificultou seriamente a travessia da clareira. Tiveram um morto e um ferido grave.

Juntas todas as tropas, caminhámos até Cachil, onde estava em construção uma espécie de quartel para uma companhia que lá ficaria instalada, ocupando e patrulhando a ilha, uma vez terminada a Op Tridente. Era uma construção sui generis pois não passava de uma enorme paliçada feita com troncos de palmeira a pique para servir de abrigo. Parecia um cenário de filme de índios contra a cavalaria americana.

No rio esperava-nos uma LDM que nos trouxe de volta à base. Oh praia, lá vamos nós. (...)

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Nota do editor:


Postes anteriores:

14 de Outubro de 2011 > Guiné 63/74 - P8905: Antologia (68): Tarrafo, crónica de guerra, de Armor Pires Mota, 1ª ed, 1965 (1): Ilha do Como, 15 de Janeiro de 1964



1 comentário:

Luís Graça disse...

Alguém tem mais pormenores sobre este T6 abatido na Ilha do Como, no decurso da Op Tridente, em Janeiro de 1964 ? Quem era o piloto ? Em que circunstâncias foi abatido ?, etc,