quarta-feira, 1 de junho de 2011

Guiné 63/74 - P8353: Notas de leitura (243): Província da Guiné, 1972, publicado por Agência-Geral do Ultramar (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 24 de Maio de 2011:

Queridos amigos,
Isto de difundir informação fingindo que os territórios só estão a ser perturbados por meras acções de policiamento, acarreta dislates e informações cómicas ou completamente desfasadas da realidade.
O que gosto mais neste documento monográfico da Agência-Geral do Ultramar são as ilustrações a preto e branco: o Pidjiquiti, os vestígios da derradeira sumptuosidade de Bolama, o dispensário do Mal de Hansen, a Sacor, as pontes sobre o Mansoa e o Geba.
Verdadeira preciosidade é o centro telegráfico de Bissau, bem como o Grande Hotel, hoje reduzido a escombros.

Um abraço do
Mário


Província da Guiné, 1972: entre a realidade e a ficção

Beja Santos

Com regularidade, a Agência-Geral do Ultramar difundia sínteses monográficas das províncias ultramarinas ou documentos mais elaborados. Há distância de cerca de 40 anos, poderá ter utilidade apreciar o conteúdo do que se entendia ser mais pertinente para difundir juntos dos leigos: a história, a geografia, a administração, a educação, o ensino e a cultura, saúde e assistência, actividades económicas, nomeadamente.

O resumo histórico referia haver pouco conhecimento da Guiné antes da chegada dos portugueses, o que era inteiramente verdade, mesmo sabendo-se da ligação do território aos antigos impérios sudaneses, mais tarde ao império do Gana e depois o do Mali. A resenha histórica alude às etnias, populações localizadas mais ou menos como na actualidade de há 40 anos atrás: Balantas, Felupes e Baiotes, Banhuns e Cassangas, Cobianas, Manjacos, Brames e Papéis, Bijagós, Beafadas, Nalús, Bagas e Landumãs e Mandingas. A grande novidade que irá ocorrer com a chegada dos europeus é a presenças dos Fulas, que irão ter uma presença predominante no Leste.

A exposição sobre os elementos físicos e humanos é irrepreensível, dá o devido destaque à especificidade hidrográfica e a natureza do clima, descreve as vulnerabilidades do solo e subsolo (as couraças inertes de Boé, a erosão mecânica, a pobreza de grande parte dos solos, o endurecimento da camada superficial, a lateritização e cimentação ferruginosa; nada a dizer sobre a fauna e flora. Passando para a demografia, silêncio total sobre tudo quanto se passava com a chegada da guerra. A desigual concentração populacional é atribuída a factores geográficos, humanos e económicos e as migrações devem-se ao tipo de culturas itinerantes, à cultura da mancarra no Senegal e na República da Guiné.

Enuncia-se o enquadramento administrativo, omitindo como a administração estava profundamente cruzada pela presença militar e como esta invadia as esferas do ensino, da investigação, da saúde e da difusão cultural. Os dados sobre os planos de fomento e rendimentos não afloram nem ao de leve, tudo quanto estava a acontecer nomeadamente a partir de 1963. Uma curiosidade no tocante à caça. Escreve-se o seguinte: “A caça grossa é rara, como sucede com o elefante e o leão. Abundam as onças e os pequenos antílopes. No Sul encontram-se, em pequenas manadas, os búfalos. De entre os animais cuja caça é proibida contam-se: abutres, corvos, serpentários, mochos, corujas, cegonhas, garças, noitibós, andorinhas, etc. São ainda protegidos: chimpanzé, elefante, alguns macacos, jabiru”.

No mapa das estradas, Beli e Madina do Boé (abandonadas depois da chegada de Spínola) aparecem ligadas a Nova Lamego. Na rede de navegação fluvial, diz-se que o maior movimento se verifica no troço Bissau-Bafatá, era por ele que passava grande parte da mancarra de Geba e Bafatá (como é de todos sabido, o Geba estreito só era navegável até Bambadinca, daqui até Bafatá estava completamente interdito por razões elementares de falta de segurança). A única nota dissonante aparece em torno do turismo: “A província tem magníficas condições para certo tipo de turismo, sobretudo o que se processa a partir da caça e das praias e das manifestações folclórico-etnográficas. No entanto, o interesse que ultimamente as potencialidades turísticas estavam a despertar depara-se agora com a perturbação provocada pelo terrorismo desencadeado a partir dos territórios vizinhos”.

Para que conste, para que os estudiosos tomem em consideração esta difusão de informações na Guiné de 1972.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 27 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8335: Notas de leitura (242): O Meu Testemunho, uma luta, um partido, dois países, por Aristides Pereira (6) (Mário Beja Santos)

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