quarta-feira, 16 de março de 2011

Guiné 63/74 - P7950: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (84): Na Kontra Ka Kontra: 48.º episódio




1. Quadragésimo oitavo episódio da estória Na Kontra Ka Kontra, de Fernando Gouveia (ex-Alf Mil Rec e Inf, Bafatá, 1968/70), enviado em mensagem do dia 15 de Março de 2011:


NA KONTRA
KA KONTRA


48º EPISÓDIO

Depois de tirar uma fotografia, despede-se e promete voltar para recordar os velhos tempos. Já no jeep, com ar condicionado, resolve definitivamente ir procurar a Asmau, quanto mais não fosse para a ajudar em alguma coisa que precisasse, caso ainda fosse viva. Pensa que será junto de algum africano que poderá obter informações do paradeiro duma mulher grande, de quem só sabe o nome. Lembrou-se do ourives de Bafata, de nome Tchame, que conhecera há quarenta anos na Tabanca da Ponte Nova. Ouvira dizer que na oficina, estava agora um filho. Para lá se dirigiu. Disse ao actual ourives que tinha conhecido o seu pai e que nesse tempo lhe tinha comprado umas peças. Achou a oficina igual à que conhecera quarenta anos atrás. Finalmente perguntou:

- Conhece uma mulher grande chamada Asmau?

Em dois segundos obtém a resposta.

– Conheço, mora aqui perto, se quiser mando-a chamar. O marido chamava-se Ibraim.

Asmau, Ibraim, podia apenas ser uma coincidência. Ibraims haveria muitos, por Ibraim ser o nome de um dos filhos do Profeta. Magalhães Faria, por momentos, fica paralisado. Como antigo guerreiro reúne forças e reage. Tinha que fazer uma pergunta:

– Tchame, esse Ibraim foi empregado do Cinema?

– Sim, foi.

Magalhães Faria como que mudou de cor, teve tremuras, pediu para se sentar, foi-lhe oferecida água. Esteve mudo por largos momentos. Ainda sem nada dizer começou a pensar:

- A Asmau foi casada com o meu melhor amigo guineense. Asmau era com certeza a namorada que o Ibraim nunca me quis mostrar. E isso teria acontecido por o meu amigo Ibraim sempre ter estado a par do que se passou em Madina Xaquili. Incrível, pensou.

Viria a saber ainda que o Ibraim tinha morrido com um ataque de coração, o que não deixou de relacionar com o não ingresso nos Pára-quedistas.

- Tchame, por favor mande-a chamar.

O miúdo que a foi chamar, talvez lhe tenha dito que género de pessoa a procurava. Talvez a arranjar-se demorou algum tempo, o que a Magalhães Faria pareceu uma eternidade. Sentado debaixo do alpendre lateral da oficina do Tchame não a viu chegar. Só deu por ela quando já estava junto dele.

Asmau recebeu Magalhães Faria com um sorriso.

Cedeu-lhe a cadeira e ficaram a olhar um para o outro como se nunca tivesse acontecido KA KONTRA, ela sorrindo, ele admirando talvez a forma impecável como vinha vestida e o rosto sem uma ruga. Conversaram tanto que, quando deram por isso, já tinha ido embora todo o pessoal que se tinha juntado com a chegada do visitante. Ela chegou a dizer-lhe que andava com alguns problemas de saúde e que ali em Bafata não sabiam o que ela tinha. Ele foi-lhe dizendo que se sentia muito só.

Asmau impecavelmente vestida.

Asmau e Magalhães Faria.

Fim deste episódio
Até ao próximo camaradas.
(Fernando Gouveia)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 15 de Março de 2011 > Guiné 63/74 - P7944: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (83): Na Kontra Ka Kontra: 47.º episódio

3 comentários:

Cherno Baldé disse...

Caro Fernando Gouveia,

Duas notas, da minha parte, sobre o episódio de hoje:

Esta tua novela é uma ficção que surpreende pelo seu conteudo real. Pode ser uma mera coincidencia mas, na verdade, eu conheci em Bafatá nos anos 70 um Ourive de etnia Fula de nome Tcham, provávelmente de origem senegalesa(Thiam) que trabalhava na baixa da cidade mas vivia no Bairro da Rocha (Rotcha) situado mais acima (no planalto) a saída para Gabu, tendo conhecido, inclusive, alguns dos seus filhos.
- Não será o mesmo Tcham?

E a segunda nota era para dizer que Ibraim, Ibrahim ou simplesmente (I)Braima (como dizem os Fulas) vem do nome bíblico Abraao ou Abrão o patriarca que deu origem aos povos Árabe e Israelita (Hebreu), conforme diz a Bíblia, a partir dos seus filhos, Ismael e Isaac.

Um grande abraço e desejos de muita força nesta novela Guineense.

Cherno Baldé

Fernando Gouveia disse...

Caro Cherno:

É muito reconfortante ver que a minha estória vai sendo lida.

Estive em Bafata até Junho de 1970 e nessa altura o Tcham(e)era o único ourives que lá havia. Podes ver uma boa foto dele, em dia de Ramadão, no poste nº 7453, e do filho, no episódio anterior. O que dizes sobre ele está certo.

Um abraço
Fernando Gouveia

Luís Graça disse...

Espantoso, Fernando, trocas os papéis (e troca-nos as voltas), ao assumires definitivamente a identidade do personagem principal...

Caminhamos para um "happy end"... Espero que a tua história tenha um final... feliz. Tenho fotos do João, em Dezembro de 2009, em Bafatá, que vais gostar de ver...