sábado, 6 de março de 2010

Guiné 63/74 – P5941: Estórias do Mário Pinto (Mário Gualter Rodrigues Pinto) (35): A dança das bazucas (Mário G R Pinto)

1. O nosso Camarada Mário Gualter Rodrigues Pinto, ex-Fur Mil At Art da CART 2519 - "Os Morcegos de Mampatá" (Buba, Aldeia Formosa e Mampatá - 1969/71), enviou-nos a sua 35ª mensagem, em 5 de Março de 2010:

Camaradas,

Ao dar aqui umas voltas aos meus velhos manuscritos, dos tempos já distantes do serviço militar onde a minha memória se vai perdendo, encontrei mais este texto que achei interessante pela sua morbidez, enviar para vossa leitura.

A DANÇA DAS BAZUCAS

Estávamos no fim de Maio de 1969, acabadinhos de chegar á Guiné, éramos ainda uns imberbes periquitos.

Apesar disso, fomos enviados para o teatro de guerra, tocando-nos Buba (COP 4), comandado pelo Major Carlos Fabião, que nessa altura tinha a seu cargo a fatídica construção da estrada Buba-Aldeia Formosa (já por diversas vezes referenciada, em outros postes, aqui no blogue).

A minha CART 2519 foi mandada para Mampatá, numa coluna em que seguia um conjunto de máquinas da Engenharia do Exército, que a partir de Sare Usso, iriam desbravar a floresta em direcção a Buba.

Aqui começa a nossa história:

Todos os dias por volta das seis horas um conjunto de militares das NT, com picadores à frente, saía de Mampatá, pela estrada velha até Sare Usso, procurando na estrada minas que eram, entre outros, um dos maiores perigos à sua progressão no terreno.

Chegados ao local onde decorriam os trabalhos de abertura da estrada, flectiam para a mata, e, depois da segurança montada pelas forças presentes, avançavam as máquinas da Engenharia desbravando a floresta na direcção já referida.

O IN que, com certeza, vigiava todos os nossos passos, esperava habitualmente por nós emboscado, e, certa manhã, quando flanqueávamos uma coluna que seguia para as obras, para meu total espanto, um dos soldados que seguia à frente chamou-me a atenção, para um cartaz preso no tronco de uma árvore.

Montada a segurança em volta do perímetro, demos com os seguintes dizeres escritos no cartaz: "VAI COMEÇAR A DANÇA DAS BAZUCAS PREPARA-TE PARA DANÇARES". Coisa no mínimo mórbida. O IN ainda se dava ao “luxo” de nos gozar e convidar para um “bailinho” de morte.

Normalmente as hostilidades despoletavam então com um “baile de bazucadas”, que era para nós um “show” completamente desconhecido, “orquestrado” sob uma música brutal e arritmada, constituída por sons acutilantes e terríveis de fortes explosões, para uma fatídica e dantesca dança mortal.

Eram shows” de curta mas eficaz duração, que obrigava os “piras” da Companhia recém-chegados ao teatro de operações a “bailarem” num palco desconhecido, um tanto desnorteados como baratas tontas, a disparar as suas armas para tudo o que mexia na paisagística, misteriosa e insondável mata em redor.

Lembrava-me um género de opereta com final trágico, que nos arrasava psicologicamente e que rapidamente nos afectou, até porque foi neste período que tivemos, infelizmente, um morto e alguns feridos.

O IN não nos dava tréguas trazendo-nos sempre ocupados, ou através de emboscadas, ou colocando minas na estrada, ou flagelando a zona de trabalhos, e, à noite, quando pretendíamos alguns momentos de descanso, no quartel de Mampatá, lá vinha o maldito “baile das bazucadas”, acompanhado, muitas vezes, de várias morteiradas.

Esta nova estrada foi assim um “salão de baile”, onde o PAIGC sempre orquestrou a música que quis para nos pôr a “bailar”.

Quando pela primeira vez por ela nos movimentámos, em coluna motorizada, levámos mais um ensaio de todo o tamanho, com um festival de bazucada, morteirada e outra musical metralha, dividida em três sessões dignas de um filme de Spielberg, saldando-se as contas finais em três mortos e vários feridos para as NT, que ficaram nas nossas memórias para todo o sempre.

Por ordem do “mestre de sala”, este tipo de dança foi devidamente estudado, e, ao longo do tempo alterado, passando os seus protagonistas (os desgraçados piras), a preparar os seus instrumentos e a retribuir ao IN, com um novo ritmo musical que eu designei como a "DANÇA DOS DILAGRAMAS".

Assim, por aquelas bandas de Mampatá, o maquiavélico espectáculo foi-se manifestando, meses a fio, numa sinfonia mais justa e equilibrada, cujos sons passaram a ser mais “democráticos”, mais próprios de um "Agora danças tu, depois danço eu e… vice-versa".

Um abraço,
Mário Pinto
Fur Mil At Art

Emblema de colecção: © Carlos Coutinho (2009). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

19 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 – P5678: Estórias do Mário Pinto (Mário Gualter Rodrigues Pinto) (34): O turra branco "Capitão G3" (Mário G R Pinto) 

Guiné 63/74 - P5940: Notas de leitura (74): Além do Bojador, romance de estreia de Manuel Fialho (II) (Beja Santos)


1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 1 de Março de 2010:

Queridos amigos,
Temos aqui um livro simpático, carregado de pormenores, haverá certamente gente que sentirá satisfação em regressar a Farim no início dos anos 70.

Um abraço do
Mário



Além do Bojador* (II): triunfo do feitiço africano

Beja Santos

“Além do Bojador” o primeiro romance de Manuel Fialho (Edição 100 Luz – www.100luz.pt) narra as vicissitudes da história de amor de um capelão militar, um franciscano que viera de Itália, de nome Miguel, e a quase adolescente Binta ou Fátima, uma Mandinga de Farim. Assistimos à viagem de um batalhão que tem a sua sede em Farim e cujas companhias se derramam por Cuntima, Jumbembem e Nema, fora os destacamentos. Miguel Lúcio adapta-se à sua missão, percorre estes itinerários em coluna militar, celebra missas, faz uma grande amizade com o alferes do pelotão auto, visita a tabanca de Farim e aos poucos deixa-se enlear pela beleza de Binta, uma neta de um português, uma jovem de beleza espectacular, cheia de predicados.

A descrição do Norte da Guiné, no início do romance, é de que era uma região relativamente controlada. Mas a acção dos guerrilheiros irá começar a intensificar-se, a missão do batalhão é refeita e as unidades envolvidas em ocupações e múltiplas operações. O PAIGC revelava um espírito ofensivo, multiplicando as emboscadas e as minas. O comandante-chefe determinara o reordenamento das tabancas. O padre Miguel escrevia a história do batalhão e procedia ao registo dos relatos dos antepassados Mandingas (recorde-se que o subtítulo deste romance é “Na guerra colonial da Guiné, a história pré-colonial da África Ocidental”). Miguel usa um gravador para onde fala Malan, ali ficam depositadas as suas memórias dos ancestrais. Miguel descobre que é poeta, sente inspiração e passa para uma folha de papel, primeiro as suas orações, mais tarde o seu amor ardente. Aos poucos, os dois amantes exprimem a sua paixão. A vida em Farim ganha novo alento com a chegada das mulheres de dois alferes, uma delas será professora, far-se-á apoiar por Binta.

Tudo isto se passa, recorde-se, num contexto de recrudescimento das acções inimigas, começam a registar-se tensões entre Spínola e o comando, dá-se o afastamento compulsivo do comandante, a unidade em peso reage com o baixo assinado ao Spínola, tudo tivera origem num dirigente local que morrera na prisão. Quem escreve o documento a pedir o regresso do comandante é o capelão, as consequências serão altamente positivas para a unidade de Farim. A povoação vai sofrer um ataque de foguetões, será uma experiência que irá aproximar ainda mais Miguel e Binta. Miguel descobre que não tem necessidade de se penitenciar por amar Binta. O comandante regressa, tem uma longuíssima conversa com Miguel, conta-lhe detalhadamente tudo o que se passara acerca da morte de um régulo na prisão. Miguel confessa a Malan que ama a filha. O feitiço africano está consumado. Ao som do concerto para piano nº 21, de Wolfgang Amadeus Mozart, Miguel poeta: “O teu corpo é a nave que no espaço / me governa para além da morte, / nesse transpor em que me deixo à sorte / de Quem de arremessou no teu abraço. / Ah, meu amor, eu já nada mais faço / senão imaginar esse teu lindo porte / a guiar o meu desejo, que de tão forte / em êxtase anseia pelo teu regaço...”. Miguel prossegue as viagens aos aquartelamentos como Cuntima, Canjambari, Jumbembem. Continuam a ser detectadas minas anti-carro, prosseguem as flagelações ao K3. De novo Farim sofre um ataque de foguetões. Aos poucos, Miguel vai transcrevendo os feitos dos Mandingas, a história da África Ocidental ganha compreensão. No regresso da tabanca, depois de uma visita a Malan e a Binta, Miguel é barbaramente espancado na calada da noite e transportado para Bissau. É aqui que se reencontra com Spínola, Miguel dá-lhe uma lição de história na enfermaria do hospital militar.

Encurtando razões, já que Manuel Fialho escreve cerca de 500 páginas, Miguel conclui a história dos povos da África Ocidental que manda para Spínola, a guerrilha assanha-se, Miguel e Binta experimentam o amor tórrido na povoação de Binta, exactamente em casa do sogro português de Malan. Miguel lê a propaganda do PAIGC e fica a saber que os aviões Fiat e os T6 matam e ferem crianças no mato. De vez em quando morrem militares, Miguel reza por eles. Chegou o momento de tomar decisões, Miguel aconselha-se com um padre em Bissau, este, compreensivo, recomenda-lhe que prossiga este amor verdadeiro por Binta. Eles casam, Miguel confia que possa vir a ser investigador, escreveu ao pai a contar o sucedido, a unidade militar oferece uma lua-de-mel ao casal na ilha do Sal.

Vale a pena insistir que se trata de uma obra generosa, didáctica com propósitos de reconciliação, é uma escrita amena de um ex-combatente que seguramente se afeiçoou por Farim e toda essa região, que conservou memórias do funcionamento daquela quadricula e que estudou a história dos Mandingas, forjando uma amena e até plausível história de amor. Talvez não fique como livro de referência mas cumpriu a função didáctica: os mais novos poderão ficar a saber o que eram dois anos de comissão militar; os mais velhos revêem o funcionamento da vida de um batalhão que pôde ficar com as suas companhias relativamente próximas; os investigadores terão elementos para percepcionar a evolução da guerrilha, no início dos anos 70; e o diálogo inter-étnico aparece aprofundado nesta tocante história de amor. Para que conste.

“Além Bojador” ficará propriedade do blogue.
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 26 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5888: Notas de leitura (71): Além do Bojador, romance de estreia de Manuel Fialho (I) (Beja Santos)

Vd. último poste da série de 4 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5930: Notas de leitura (73): Gadamael, de Carmo Vicente (Beja Santos)

Guiné 63/74 - P5939: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (9): A minha primeira vez (na guerra)

1. Mensagem de Rui Silva (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 24 de Fevereiro de 2010:

Caros Luís, Vinhal, Briote e M. Ribeiro:
Recebam um grande abraço mais votos de muita saúde, extensivos a todos os ex-Combatentes da Guiné, mais ainda para aqueles que, de algum modo, ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.


Em 21 De Maio de 1965 pelas 12h (meio-dia) entrava no Niassa de forma descontraída e com ares de turista para cruzeiro, para embarcar para a Guiné; Volvidos 20 dias entrava às 12h (meia-noite) no mato, algures numa zona de África, armado de G3 e de cartucheiras cheias de carregadores, à caça do inimigo, meu semelhante, mas “pintado” doutra cor.

- Das minhas memórias: “Páginas Negras com Salpicos cor-de-rosa”-

A minha primeira vez (na Guerra).


…Entretanto fez-se a minha primeira saída para o mato, que não se fez esperar muito, pois deu-se na segunda noite que passávamos em Bissorã. O meu Grupo de combate, que era o 3.º Pelotão da Companhia, seria portanto o primeiro a sair para o mato para um “golpe-de-mão”. (2 Secções de outro Pelotão já tinham feito uma escolta a uma coluna de reabastecimento até Maqué - estrada Bissorã-Olossato-).



Em conjunto com o Grupo de Comandos - os chamados “Lordes”- da Companhia 643 (os Águias Negras) íamos actuar de assalto o refúgio inimigo de Queré.



Embora não esperasse uma saída tão cedo, não fiquei surpreendido, pois até não estava ali para outra coisa. Foi depois de jantar e quando já nos encontrávamos nos quartos, que ouvi uma voz lá fora, uma voz e uma frase que se iriam repetir muitas vezes futuramente, para mal dos nossos pecados. O “Braga” mais para diante até dava o recado a uma razoável distância e com alguma precaução, pois havia quem, mais na brincadeira, lhe atirasse uma bota ou outra coisa que tivesse à mão. Não podíamos ver o “Braga” quando ele se aproximava. Então a voz e o recado do Braga: “Os sargentos do 3.º Pelotão - na circunstância era este - ao nosso Capitão”. Ficou para valer esta macabra mensagem. Como era a primeira vez que aquele recado acontecia, desconhecíamos a razão de tal convite, mas, passados breves minutos logo ficámos ao corrente. O nosso Capitão – o Capitão Riquito – acompanhado do Comandante do meu Grupo de Combate - o Alferes Esteves - e com o Hipólito e o Graça (estes dois, Sargentos dos “Lordes”), deu conhecimento da Operação a efectuar.

Antecedidas de breves horas, as saídas para o mato iriam ter sempre aquela necessária e imprescindível reunião, para aí ouvirmos da missão, progressão no terreno, táctica, dispositivo a adoptar, hora de saída, e dados referentes ao inimigo, nomeadamente do seu efectivo, do seu armamento, se haviam sentinelas, e se haviam qual a sua localização, etc.

Toda esta informação era para transmitirmos depois às respectivas Secções, ficando assim todo o efectivo operacional ao corrente da Operação.

Não encarei com muita preocupação esta minha primeira saída para o mato, como até seria de supor, pois para mim tudo seria novidade, desconhecendo e ignorando como era aquilo de andar aos tiros, uma espécie de brancos contra os pretos.

Vesti então o camuflado, apertei bem o cinto com as cartucheiras, coloquei a G3 em bandoleira, fiz a minha oração e segui então para o lugar de partida para o mato com um cigarro apertado nos lábios.
Assim, parti com um relativo à-vontade e uma certa confiança, não conseguindo porém, disfarçar um nervoso miudinho.

Lá estavam os soldados já agrupados para tomarem o tonificante café, ritual que se repetiria sempre antes de formarmos a fila indiana para sair do quartel.

Aproximei-me do local – cozinha dos soldados - para fazer o mesmo. Sabia sempre bem aquela tigela de café antes de sairmos. Servia-nos de lenitivo e aquecia-nos o corpo. Como de costume a noite já ia bem dentro. Com o Sargento Tavares, sentados no degrau do passeio, troquei algumas palavras com ele e as nossas expressões denotavam relativa preocupação, mais a minha que a dele, pois ele já tinha uma certa prática nestas andanças, uma vez que já tinha feito uma comissão em Angola.

Entretanto os “Comandos” da 643, já muito habituados àquilo, demonstravam uma nítida descontracção e ligeireza de movimentos que me causaram impressão. Barbudos, queimados, camuflados coçados e desbotados pareciam que iam para uma festa. Eu já não via a coisa tão bem assim.

Em breves segundos puseram-se ordenadamente em fila indiana prontos para saírem. Depois de agruparmos as nossas Secções nas posições definidas pelo Comandante do Grupo de Combate, começámos então a caminhar, abandonando o quartel e rumo ao objectivo. À frente os “Comandos” (os Lordes) e atrás os “periquitos” do 3.º Grupo de Combate da 816. Ou seja à frente os que tinham os camuflados coçados, desbotados rotos e rostos queimados e atrás os ainda branquinhos periquitos de camuflado novo e passado a ferro (passe o exagero).

Eram cerca das 11 horas da noite quando deixámos o aquartelamento de Bissorã rumo à casa-de-mato de Queré, algures nesta zona, aonde um grupo de terroristas se acoitava. A estrada tomada era a que ia para a “outra banda” mas não chegámos a cruzar o rio Armada, pois cortámos num carreiro à esquerda.

Segundo as informações dadas na reunião que antecedeu a Operação, o refúgio tratava-se mais de um Posto Administrativo (?), apenas com as armas e efectivo suficientes para a segurança deste. Portanto contava-se com relativa fragilidade por parte do inimigo. Caso insólito: nesta Operação o guia era uma “bajuda”! (rapariga nova, indígena).

Para as Operações de “golpes-de-mão”, necessitávamos, naturalmente, de um guia indígena, conhecedor da zona e do caminho. Muitas das vezes os nativos do nosso lado (milícias) também conheciam mais ou menos as paragens, salvaguardando as alturas em que entravam em contradição (uns diziam que era para a esquerda outros para a direita) e baralhavam mais as contas. As deslocações para este tipo de Operações eram feitas normalmente de noite, através do sinuoso mato (muitas das vezes evitávamos trilhos e caminhos para fugir às minas e a não darmos azo a sermos mais facilmente detectados), atravessando, não raras vezes, alagadas bolanhas e outros obstáculos. Assim era indispensável alguém da região que nos conduzisse e se para além de conhecedor do percurso, soubesse-nos informar do local exacto do refúgio, quantidade de terroristas, seu armamento, da existência e posição de eventuais sentinelas, etc., ainda bem melhor.

Muitas das vezes sabíamos de antemão todos estes pormenores pois o nosso guia tratava-se de alguém que tinha já pertencido ao refúgio e que o abandonou, por fome, por maus tratos ou outro motivo qualquer, ou então fora apanhado inadvertidamente no mato pelas tropas e instigado a colaborar.

A maioria dos guias no entanto, não queria colaborar, (outra situação a reflectir) nem à força, chegando muitas das vezes a pagar caro a sua recusa. Saíam sempre com a tropa, mas, uma vez no mato, e na maior parte das vezes, faziam-nos andar às voltas e mais voltas até sermos detectados, o que se julgava ser de forma propositada e gorando assim o objectivo da Operação. Eram castigados duramente ou liquidados mesmo ali.

Voltando à Operação Queré, a rapariguinha negra, envolta numa grande túnica(?) que lhe cobria a cabeça e grande parte do rosto e até a terminar nos pés – para não ser reconhecida - lá nos foi conduzindo pelo mato fora e com grande determinação. O motivo que levou a “bajuda” a querer ajudar a tropa é que ela tinha sido vítima de tentativas de violação, e não só, por parte dos componentes de tal acampamento, daí o desejo de se vingar e para nós uma boa oportunidade, uma vez que tínhamos um guia que conhecia completa e detalhadamente o refúgio e muito decidida à retaliação.

À medida que nos afastávamos de Bissorã as luzes desta povoação iam-se tornando, naturalmente, menos visíveis, sempre que as olhava, virando-me para trás, para certificar-me da distância, até que a coluna mergulhou na completa escuridão do mato, entregues ao destino e, vejam lá (!), aquela frágil mas corajosa e decidida rapariguinha. Logo à entrada do mato, o que mais tarde acharia ridículo, comecei a olhar para todos os lados como prevendo, num possível esconderijo – uma árvore, um “baga-baga” (montículo de terra endurecida que chegava a atingir 2 metros e mais de altura e que era construído por uma formiga - leia-se milhares e milhares - com uma disciplina militar e guerreira na defesa do seu laborioso habitat - o tal montículo de terra - e a que se dava o mesmo nome também de formiga “baga-baga”. Não sei se foi o nome do montículo que deu nome à formiga se foi o contrário), um arbusto, o capim, etc. - uma possível posição inimiga pronta a atacar, o que me provocava alguma tensão. A minha arma ia terrivelmente apertada nas mãos e, com o corpo hirto, a respiração entrecortada e de olhar extasiado, ia galgando assim o acidentado e desconhecido terreno do mato.
Ainda deu para apanhar um cagaço mal tínhamos entrado no mato:

Próximo de mim caiu com algum barulho (presumi, mas só depois, que algum fruto ou coisa parecida tenha caído ao chão) qualquer coisa que quase e instintivamente me fez deitar no chão (uma granada queres ver!). O que vinha atrás ainda riu-se do que eu ia fazendo, mas se calhar só parou de tremer muito depois de mim. Refeito, coração em batida normal, toca a seguir. Este meu estado de espírito foi-se desanuviando à medida que ia ganhando experiência nestas andanças, pois mais tarde, só quando estávamos próximo do inimigo é que tomava cuidado e o coração batia mais vezes. Nessa altura é que a G3 mudava de posição já com o indicador próximo do gatilho e a mão esquerda a segurar a arma junto ao cano. Até essa altura, e com a arma segura na mão como um saco, pensava em tudo menos na guerra. Assim o tempo parecia passar mais depressa e o sistema nervoso era mais controlado. Mas naquela minha primeira saída para o mato o meu estado de espírito era de facto como atrás conto.

A missão do meu Grupo de combate era a de segurança ao grupo de assalto, grupo este que era o dos “Lordes”. Devíamos formar um semi-anel em torno do refúgio e à retaguarda dos “Lordes”. Este nosso dispositivo permitiria assim uma segurança pelas costas aqueles, ao mesmo tempo que evitaríamos, por esse lado qualquer fuga inimiga.

As horas, que pareciam longas, foram passando até que chegamos perto do refúgio e, tal como estava previsto, alguns minutos antes da hora prevista para o ataque. Estes minutos de espera serviam para nos refazermos do esforço e da tensão acumulados ao longo da caminhada e para ultimarmos pormenores ou desfazer qualquer dúvida sobre o assalto a perpetrar. Sentamo-nos então, procurando a todo o transe não fazer qualquer espécie de ruído. Ouvia-se eventualmente o barulho provocado pelo movimento de um ou outro animal furtivo e como já estávamos perto do alvorecer do dia ouviu-se também o chilrear incessante e ensurdecedor da imensa e variada passarada que infesta aquelas paragens. Nunca tinha imaginado e muito menos ouvido tão variada e estridente sinfonia. O chilrear de uns dava a sensação de uma serra mecânica a cortar madeira; o de outros parecia o de autênticas gargalhadas de pessoas; outros ainda pareciam crianças a berrar, etc., etc…. Espectáculo!!

Enfim uma complexa orquestra espalhada e oculta naquela emaranhada floresta, utilizando os mais diversos instrumentos. Todas as notas musicais e mais algumas eram ali ouvidas.

Seria sempre esta a música de fundo quando fazíamos Operações do género: ataques a “casas-de-mato” e, como normalmente se fazia, era ao amanhecer.

Como na altura desconhecia tão diversidade de cantares e chilreares, confundia por vezes com a presença próxima de crianças ou até de adultos que, afinal ali perto deviam estar e que eu, “periquito”, os adivinhava em todo o lado naquela tenebrosa mata.

E então ecoa um batuque!!..., todos (os da 816) tomámos uma expressão de alerta. O rufar enervante daqueles tambores parecia avançar para nós para logo voltarem ao seu ponto de origem num frenético vai-e-vem. Lembrei-me dos filmes de índios só não via era sinais de fumo. Claro que o nosso estado de espírito na altura redobrava as sensações também. Que sensação! Que pesadelo! O que é isto? O que será? É um sinal? Ordem para atacar? Interrogavam-se uns aos outros. Confesso que senti um pouco de medo naquela altura. Logo, porém, o meu coração começou a compassar normalmente quando os “velhinhos” dos “Lordes” nos fizeram sossegar dizendo que se tratava de um “choro”.
Choro, mais um termo a descodificar.
Não muito longe dali, em alguma tabanca, um grupo de indígenas e de uma certa raça ou etnia, manifestavam-se no tradicional “choro” em honra de um defunto. Eles batiam os tambores fortemente e a um ritmo estonteante, que no silêncio e quietude da madrugada pareciam estar ali mesmo à beira dos nossos ouvidos. Acompanhando o ritmo dos bombos eles pulavam e dançavam também. “Uivavam”, atiravam-se para o chão, dando cambalhotas, etc., como mais tarde tive ocasião de assistir a um em Bissorã, e na outra Banda.
Não cheguei a saber se eles riam ou choravam, se lamentavam a perda de uma vida ou se davam graças e rejubilavam arreigados a alguma crença ou fiéis ao Deus deles. Nunca os chegaria a compreender. Também foi coisa que não me interessou muito. Mas que o faziam com grande fervor e devoção, lá isso era verdade. Meditei muito sobre os ideais daquela gente e como eles religiosamente os seguiam embora tão humildes e com grande deficit de civilização. Uma coisa a respeitar, tive sempre cá comigo.

E ali estávamos, prostrados no chão, dissimulando os nossos vultos com a vegetação, aguardando tensamente a chegada da hora conveniente para o ataque. O barulho infernal dos tambores não cessava… nunca mais cessaria. Os nervos pareciam ser agora comandados pelas pancadas dos tambores. Pancada mais forte acelera coração.

A hora aproxima-se! Não era uma hora fixada pelo relógio, antes uma altura cruciante do dia, que era logo que a claridade começasse a despontar, isto é, ao “lusco-fusco”.
E pronto, é o momento, decidiram os “Lordes”. As sucessivas interrogações não paravam no meu cérebro e os nervos, esses, eram difíceis de dominar. E os bombos sempre a rufar.

Começámos então a actuar. Fomos dando terreno ao grupo de assalto que, felinamente, se foi introduzindo de forma estratégica no mato. Impressionou-me a rapidez e a destreza nos movimentos daqueles calejados homens. Nós, os da 816, começámos também a formar o semi-círculo, como fora previamente planeado e…, para surpresa minha, quando ainda dispunha os homens da minha Secção, vi o Graça dos “Lordes” juntar-se a nós e para minha perplexidade dizer que já tinham feito o assalto! “Devem estar no choro”, acrescentou ele. Ouve-se um agitar de arbustos e eis que surge o Hipólito que traz na mão uma espingarda “Mauser” (!) e duas rudimentares granadas de mão, armas que o inimigo, inadvertidamente ou não, deixara na casa-de-mato. Pedi ao Furriel Graça que me levasse ao dito refúgio para satisfazer a minha curiosidade ao que ele logo acedeu. Ainda se notavam vestígios de uma recente presença, atendendo a uma pequena fogueira que se dissipava lentamente. O refúgio, apesar de chão de terra, mostrava-se, como sempre verifiquei noutros, bem varrido, asseado, bem ordenado com todos ao apetrechos naturalmente usando arbustos, folhagem de palmeiras, troncos destas e de outras árvores, etc. com boa ordenação. Seria sempre assim e então aquela escola em Iracunda!! Muita disciplina ali.
Pendurado num pau estava um “ronco” – um cordel com um cornicho de um animal qualquer-.
Dentro do cornicho encontravam-se vários papeis cuidadosamente dobrados, e escritos em hieróglifos, (árabe, ou escrita muçulmana, talvez), que se trataria de qualquer oração, prece ou algo relacionado com uma religião, talvez muçulmana, pois algumas etnias na Guiné seguem esta doutrina. Aquilo era de trazer pendurado ao pescoço, como supus. Peguei naquilo e trouxe comigo pois parecia-me tratar-se de um amuleto para quem o usasse.
Embora trouxesse aquilo no bolso do camuflado não vinha muito tranquilo. Sou dos que não acreditam em bruxas, mas…

Voltando à Operação, esta tinha-se saldado por um pequeno fracasso mas, achei que para começar foi melhor assim para os “periquitos” da 816 já que os “Lordes” denunciavam uma grande frustração por o inimigo não aparecer. Estes pareciam que dias sem refrega nem era dia.

Irreflectidamente, nós, os “periquitos” fomo-nos amontoando e em ares de quem foi só ali para assistir a qualquer coisa. Ainda me lembro então do Radiotelegrafista dos “Lordes” que ao ver-nos em grupo vociferou, gritando: “Tomem as vossas posições que vamos ter aqui manga de “chocolate”. Viria mais tarde a saber que ele, com “chocolate” queria dizer tiroteio e que “manga” queria dizer muito. Estes e outros termos em crioulo ou não, foram também por nós adaptados futuramente fazendo parte do nosso vocabulário corriqueiro.

Mas porque é que ia haver muita porrada se não estava ali ninguém, interroguei-me eu?
Tal interrogação ainda não tinha saído da minha mente quando uma rajada inimiga fez-me rebolar pelo chão. Era a resposta de um sentinela. Sim, porque se a nós, “periquitos” nos desse a impressão de total deserção, eles não iam deixar a “casa-de-mato” completamente abandonada assim de barato, como se fez entender um dos “Lordes” que contava sempre com alguma retaliação inimiga. Eis uma outra rajada, outra ainda, até que uma nossa “bazookada” bem apontada, fez calar o matraquear da arma inimiga e se calhar também o seu utilizador. Pus-me de pé e respirei fundo. Sorri um pouco como que para demonstrar alguma descontracção, que era o que tinha menos naquele momento. Mal refeito, o pânico instala-se de novo: Ouve-se “cuidado está um a subir à árvore!”. Deitei-me de imediato atrás de um arbusto, pois foi pró que o meu instinto me deu. Que valeria um simples e pequeno arbusto ante a ameaça de pistolas-metralhadoras? Bom, pelo menos podia servir de abrigo às vistas inimigas.
O alerta tinha sido dado pelo Sargento Tavares da 816, mas, afinal, não se tratava de um terrorista…, era o fumo provocado pelas chamas que envolviam o refúgio ao qual momentos antes os “Lordes” tinham posto fogo. O fumo ao emergir para o espaço infiltrava-se por entre a folhagem da árvore, agitando-a e dando realmente a sensação de que alguém estava a trepá-la. Mais uma exclamação de alívio, e então dirigimo-nos para a tabanca que estava ali próxima e onde acontecia o referido “choro”. Presumivelmente os “turras” do refúgio estavam lá também. Também estavam alertados, por certo, da nossa presença, pois concerteza ouviram o tiroteio instantes antes e junto à sua “casa-de-mato”.
Avançando cautelosamente, como a situação aconselhava, e em fila indiana fomo-nos aproximando da tabanca.
O terreno era agora descampado e por isso dificultávamo-nos a possibilidade de surpresa, pois íamos todos ali vem à vista. A cada metro que avançávamos esperava-se por fogo inimigo, pois este podia muito bem estar já emboscado - pelo menos tiveram tempo para isso - e nós ali a peito descoberto e a formarmos um bom alvo. Não, não houve um único tiro. Encontramos a tabanca também abandonada, recentemente abandonada.

Animais domésticos, como porcos, galinhas, cabritos, etc., deambulavam de um lado para o outro, alvoraçados. E então começava sempre aqui o jogo do gato e do rato. Principalmente os nativos, que nos acompanhavam fazendo parte da nossa tropa, e já se vê por mais necessitados, alheavam-se completamente da guerra, para também, e numa corrida desenfreada, tentarem apanhar este ou aquele animal, que bem jeito lhes fazia. Era uma cena grotesca que dava para rir à farta pois, logo atrás de um animal em fuga surgia o seu perseguidor que era fintado pelos ziguezagues da presa. Ora da esquerda para a direita, ora da direita para a esquerda a coisa ainda demorava o seu tempo e muitas das vezes o animal é que se ficava a rir. Muitas das vezes nem era o perseguidor “oficial” que apanhava o animal, pois bastava este esbarrar nas pernas de um, que este aproveitava logo para, sem qualquer trabalho, ficar com ele. Para tudo se queria sorte…
No regresso, todos os “caçadores” exibiam os seus troféus garbosamente.

E pronto, foi o regressar à base. Estava assim cumprido o programa, que não a jornada. Programa que pouco resultou: refúgio e tabanca próxima e cúmplice arrasadas pelo fogo e o inimigo posto em debandada, e o saldo bélico de uma espingarda “Mauser” e duas granadas de mão.

Foi um caso sério para que a malta se agrupasse e se dispusesse em fila indiana, pois era sempre este o dispositivo de progressão pelo desconhecido mato, já que a malta da 816 estava aos magotes e em jeito de arraial, como aquilo fosse uma festa ou uma feira, mas, com mais grito ou menos grito, as posições foram tomadas, a ordem restabelecida, e a coluna pôs-se então em marcha de regresso a Bissorã. ”Ainda lá ficou um cabrito”!... “e aquele frango que quase o apanhava”!. Frases como estas ou parecidas ouviam-se sempre naquelas circunstâncias, aquando do regresso de uma “visita” ao inimigo.

E pronto, com a arma sobre o ombro, numa posição que expressava alguma fadiga, lá foi andando. Os comentários sobre as diversas peripécias não cessavam: este diz que foi assim; aquele diz que não, foi antes “assado”, etc., etc..

Entretanto os “Lordes” foram-nos avisando que no regresso era de contar com emboscadas ou, no mínimo, flagelações, pois uma vez sendo nós detectados, o inimigo vinha no nosso encalço, exercendo para além do mais, uma represália por aquilo que lhes fizemos ou lhes queríamos fazer. Sempre que tentávamos atacá-los, isto salvo um possível, mas pouco provável, encontro que o acaso poderia proporcionar, teríamo-los sempre à pega, muitas das vezes até às portas do quartel. Portanto, a parte final duma Operação, ou seja o regresso ao aquartelamento, e depois de termos sido detectados no mato, era sempre temerosa. No entanto, e agora que já fiz diversas Operações a “casas-de-mato”, posso dizer que esta a Queré foi uma das raras em que não tivemos qualquer emboscada ou simples flagelação durante o regresso.

Naquele clima de suspense e expectativa, fomos encurtando a distância que nos separava da estrada aonde se encontrariam as viaturas que nos levariam depois até ao quartel, poupando-nos assim o esforço de uma caminhada total. Sempre que possível, as viaturas, devidamente escoltadas, ia-nos buscar até onde o trajecto fosse possível ou conveniente.

Acontecia porém, e o que era normal, e por razões de segurança também, que nós chegávamos primeiro ao local de encontro e com bastante antecedência muitas das vezes, e então aproveitávamos essa altura para repousarmos um pouco de fadiga, quer física quer psicológica. Lia-se bem nos nossos rostos, transtornados e desfigurados, as consequências de uma noite perdida em caminhada através do sinuoso mato, através das por vezes alagadas e cheias de lama, bolanhas. Chegávamos às vezes a atravessar zonas de água que nos cobria quase completamente. O efeito causado por este tipo de Operações era bastante desgastante e isso então era bem visível nos nossos rostos.

Enfim, quase rendidos ao esforço, para ali jazíamos, sempre com o ouvido alerta no roncar das bem-vindas viaturas, que a todo o momento se aguardavam e que muito se ansiavam. E o rufar dos tambores ainda parecia estar nos ouvidos. Nesse tempo de espera tomávamos, no entanto, as devidas cautelas quanto a segurança e assim distribuíamo-nos em leque, pois o inimigo não enjeitaria uma distracção nossa. Mas valha a verdade que nesta altura de ressaca o que queríamos era deitarmo-nos ao comprido e que a guerra fosse pró… outro lado.

E elas aí estavam!!. Primeiro o ruído dos motores, depois as viaturas mesmo aparecendo ao fundo da curva. Subimos para as viaturas e fiquei sentado junto ao Alferes Costa. Ao lado deste a bajuda que nos tinha servido de guia e, logo a seguir, quem havia de estar? O Baião, claro. Havendo mulheres, não era difícil encontrar o Baião. Lá estava ele com o braço por cima do ombro da rapariga com todo o seu ar paternal. A moça continuava com a manta a envolver-lhe o rosto, pois ela adivinhava o que lhe acontecia se os homens de Queré a apanhassem, sabendo do seu cometimento. Pessoalmente e em face das circunstâncias que rodearam e levaram à execução daquela Operação, não dava nada por a vida daquela rapariga, para mais Bissorã estava cheia de bufos e informadores que colaboravam com o inimigo. Sabia-se e sentia-se isso, como com o tempo se foi constatando.

E pronto, eis-nos finalmente a caminho de Bissorã.

Risos de alegria e alívio, comentários piadéticos, chacota com este ou aquele, etc, foi este o quadro durante aquele curto trajecto, pois ao fim e ao cabo tudo tinha corrido mais ou menos bem, não houve qualquer ferido ou acidentado, pois também, verdadeiramente, não chegou a haver um recontro com o inimigo. Isto estaria reservado para mais tarde, e de que maneira, mas, para começar, para nós “periquitos” da 816, talvez fosse melhor assim, o que não deixaria de contrastar com a frustração dos “comandos” dos “Águias Negras”, que, por certo, queriam que aquilo tivesse corrido de maneira bem diferente.

Chegados a Bissorã, tinha-se assim consumado o baptismo da 816, mais propriamente o do meu Grupo de Combate, que, na circunstância, foi o primeiro a “procurar” o inimigo.

Grande parte da população, (o que me causou alguma surpresa) e como sempre acontecia, aguardava-nos à entrada da povoação e, formando alas, partilhavam, pelo menos aparentemente, da nossa alegria e satisfação, mas, muitos daqueles olhares eram olhares que mal disfarçavam o ódio e a decepção por chegarmos em euforia. Viríamos mais tarde a constatar, e, como anteriormente disse, que a maior parte da gente de Bissorã tomava acção, de forma velada, na actividade terrorista. Portanto, convivíamos com uma população indígena, que se nos pudesse fazer mal….

Completamente esgotado, tomei um apetecido duche, recostei-me na cama e deixei-me adormecer. A cerveja fresca, essa, já cá cantava. Quando acordei, a Operação Queré tinha tomado lugar no passado e não era para recordar.
Vamos jogar a bola, que está a chover…
__________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 8 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5610: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (8): O périplo da 816 em dois anos de Guiné - Mansoa

Guiné 63/74 - P5938: A tragédia de Fajonquito ou as amêndoas, vermelhas de sangue, do domingo de Páscoa de 2 de Abril de 1972 (José Cortes / Luís Graça)


1. Mensagem do nosso camarada José Cortes [, foto actual, à esquerda,] ex-Fur Mil At Inf da CCAÇ 3549/BCAÇ 3884, Fajonquito, 1972/74 (*), com data de ontem, enviado ao seu camarada José Bebiano (**), com conhecimento ao editor do blogue, Luís Graça

Caro amigo

Ao ler, na Tabanca Grande, o teu comentário à história do Cherno Baldé, tive a alegria de ver o teu nome no fim do mesmo.

Pois por teres um nome um pouco fora do vulgar, é mais dificil de esquecer, mas a tua fisionomia de careca, ou com pouco cabelo, nunca mais esqueci.

Bem, eu sou José Cortes, ex-Furriel da CCAÇ 3549, e tinha na companhia a função de sargento de material.. Estava no gabinete junto com o Furriel Vague Mestre Pina e o Furriel de Transmissões Farraia.

Ainda hoje falei com o Luis Graça sobre o que aconteceu ao Cap Carlos Figueiredo da companhia de Artilharia que nós fomos render, mas como é obvio não sei as razões que levaram o soldado a fazer o que fez. Talvez hoje consigas tu contar o que se passou.

Não sei se te lembras de mim. Mas, caso estejas interessado, gostaria de te contar o que foi a vida da Companhia depois de saires e de te dizer o que aconteceu ao teu substituto.

Para já fico por aqui, conto mais tarde podermos falar sobre tudo.

Um abraço, Jose Cortes.

2. Comentário de L.G.:

Foi-me contada ontem, de viva voz, ao telefone, uma das versões sobre a tragédia de Fajonquito. Liguei ao José Cortes, que vive em Coimbra, e falámos durante mais de meia hora. O pretexto foi o convívio do pessoal da sua companhia, a realizar no próximo dia 27. Mas também Fajonquito e a história do Cherno Baldé.

O José Cortes falou-me com emoção desses tempos. Ele próprio tem um filho que foi pára-quedista e esteve em missões de paz (por ex.,Timor, Bósnia). Mas, como muitos outros camaradas, queixa-se de que nem sempre a família tem pachorra para ouvir as suas recordações da Guiné. Uma das que está bem presente na sua memória é a da morte do capitão e mais três ou quatro militares da companhia (a CCAÇ 2742, Fajonquito, 1970/72) que eles  foram render. Ele tinha prometido contar essa história mas ainda não o fez porque acha que tem fraco talento para a escrita. Eis, pois, a sua versão oral:

(i) Havia um, soldado da CART 2742 que, uma vez terminada a comissão, queria ficar na Guiné como civil;

(ii) Ao que parece o Cap Mil Art Carlos Borges Figueiredo manifestou, desde logo, a sua oposição à ideia, c contrária a todo o bom senso e sobretudo ao RDM;

(iii) Ter-se-á aberto um contencioso entre o soldado e o seu comandante, e envolvendo também o primeiro sargento;

(iv) A mulher do capitão havia  mandado, da Metrópole, "dez quilos de amêndoas" para distribuir pelo pessoal da companhia; a distribuição foi feita pelo próprio comandante, no refeitório, no domingo de Páscoa, 2 de Abril de 1972;

(v) Quando chegou a vez do soldado em questão, o capitão terá passado à frente, num acto que aquele interpretou como de intolerável discriminação;

(vi) O soldado levantou-se, sem pedir a licença a ninguém, e saiu do refeitório. Foi ao abrigo (ou à sua caserna) e veio para a parada com "duas granadas já descavilhadas", em cada mão. Dirigiu-se à secretaria. O primeiro sargento ter-se-á apercebido, a tempo, das intenções do soldado, e não se aproximou da secretaria (ou fugiu, não sei);

(vii) Dentro da secretaria, estava o Capitão, um alferes e um furriel. Ninguém sabe o que se passou lá dentro. O soldado deixou cair as duas granadas. O tecto da secretaria foi pelos ares. Lá dentro ficaram 4 cadáveres

Mortos, em 2/4/1972, todos do Exército, por acidente (sic), constam os seguintes nomes, na lista dos Mortos do Ultramar da Liga dos Combatentes:

- Alcino Franco Jorge da Silva, Fur
- Carlos Borges de Figueiredo, Cap
- José Fernando Rodrigues Félix, Alf
- Pedro José Aleixo de Almeida, Sold

Sabemos que o Sold Básico Pedro José Aleixo de Almeida era natural de Portel, em cujo cemitério local repousam os seus restos mortais. Presumimos que se trate do protagonista desta trágica história.  O Alf Mil Art Op Esp José Fernando Rodrigues Félix era de Moimenta da Beira.  O Cap Mil Art Carlos Borges de Figueiredo era natural de Vila Pouca de Aguiar. A sua última morada é Meadela, Viana do Castelo, possivelmente a terra da sua esposa. Por sua vez, o Fur Mil Alcino Franco Jorge da Silva também era de Op Esp, mas desconhecemos a terra da sua naturalidade. Não sabemos o que faziam os dois rangers na secretaria, possivelmente terão vindo em auxílio do capitão com a intenção de desarmar o militar que trazia as duas granadas descavilhadas. O José Cortes fala em cinco mortos, mas tudo indica que sejam apenas os quatro que constam da lista da Liga dos Combatentes. 

Julgo que o caso foi também utilizado pelo serviço de propaganda do PAIGC (nomeadamente a Rádio Libertação) para desmoralizar as tropas portuguesas: Há um documento do PAIGC, no Arquivo Amílcar Cabral, na Fundação Mário Soares (FMS), que faz referência ao sucedido; de momento, não consigo ter acesso a ele, uma vez que a página da FMS foi reestruturada.  

O facto de o insólito caso ter ocorrido em Fajonquito, na fronteira com o Senegal, significa que foi de imediato conhecido da população local, das autoridades do Senegal e do PAIGC. O nosso Cherno Baldé, na altura com  12 ou 13 anos,  faz referência, num dos seus postes a este trágico "acidente", que ocorreu a 100 metros, quando ele estava a brincar com outros putos na parada  (***). 

Gostaríamos de ter outras versões deste acontecimento. Espero que o José Bebiano  aceite o repto do José Cortes. Infelizmente não temos ninguém, na nossa Tabanca Grande, da CART 2742. Temos apenas duas referências a esta subunidade do BART 2920.  Julgo que seja difícil, ainda hoje, aos camaradas da CART 2742 abordar esta história, tão trágica quanto absurda...  Infelizmente, este caso não foi único no TO da Guiné. O acesso fácil a armas de guerra e a usura física e mental da guerra ajudam também a explicar estes surtos de violência patológica que, de tempos a tempos, ocorriam nas nossas fileiras. Quantos suicídios terão havido ? Quantos homícídios terão ocorrido, dentro das NT ? Na lógica da hierarquia militar, eram tratados como "acidentes".... E assim ficarão - como acidentes, inexplicáveis - para a história, se não houver parte dos contemporâneas e das testemunhas presenciais destes casos a vontade de contribuir, com depoimentos em primeira mão, para o seu esclarecimento...

Intrigam-nos casos como este. O que podia levar um militar português a querer ficar na Guiné, na vida civil ? Podia não ter ninguém à sua espera, na sua terra, não ter família, não ter amigos... Podia, por qualquer razão, querer esquecer a sua origem ou condição. Podia estar perdido de amores por alguma bajuda... Podia estar pura e simplesmente deprimido... Um indivíduo deprimido pode facilmente perder a noção do perigo, ficar indiferente a uma situação de perigo imediato e iminente,  e até desejar a sua própria morte. Não nos parece ter sido uma acção premeditada, pensada e amadurecida a frio... Em princípio, foi uma acção precipitada, irreflectida, impulsiva. O tal "acto de loucura" da "vox populi"... A ser verdade que o capitão deliberadamente ou não discriminou o soldado, aquando da distribuição das amêndoas, isso poderá ser sido "a gota de água" que transformou um conflito disciplinar num massacre... No final da comissão de uma companhia, na festa do e,m que se celebravo o dever cumprido, no domingo de Páscoa de 2 de Abril de 1972...

______________

(..) Desembarcámos no aeroporto de Bissalanca no dia 26 de Março de 1972, fomos fazer o IAO, ao Cumeré, de onde seguimos em LDG, para o Xime e daí em viaturas cívis e militares, para Fajonquito.

Rendemos a CART 2742, que no dia de Páscoa desse ano, 2 de Abril de 1972, perdeu o Capitão Borges Figueiredo, e mais quatro militares (...) (**)

Foi uma comissão que correu com alguns sobressaltos, desde termos 3 Comandantes de Companhia, 3 Primeiros Sargentos, 2 camaradas mortos e dois feridos graves. (...)

(...) Na Guiné não exerci a minha especialidade (, Atirador de Infantaria, ] por contingência de serviço da Companhia, que não tinha Sargento que fosse reponsável, pelo Material de Guerra. Eu, como Furriel Atirador com melhor nota, fiquei responsável pelo mesmo.

Mesmo assim não deixei de estar ligado a dois acontecimentos graves da Companhia, um acidente com um lança-granadas de 6,5 no qual perdeu a vida o nosso soldado António Manuel, mais 4 soldados da Milícia, numa acção de Reordenamento no Sumbundo. Outro, uma mina que provocou a morte do soldado José Jubilado dos Santos. Estas histórias são para contar mais tarde.

(...) Sou José Augusto Cortes, ex-Furriel Miliciano da Companhia de Caçadores 3549, cumpri missão em Fajonquito, Leste da Guiné e pertencemos ao BCAÇ 3884, sediado em Bafatá. Sou nascido e criado em Coimbra, onde resido na Freguesia de Santa Clara, lugar de Bordalo. Ainda trabalho, sou funcionário do SUCH (Serviço de Utilização Comum dos HospitaIs), faço serviço no Hospital da Universidade de Coimbra como Técnico de Manutenção. (...)


 (...) Estive presente como Furriel Rec Info (Rendição Individual), entre Nov/70 a Out/72. Conheci bem de perto os 2 Capitães (Borges Figueiredo e J. Eduardo Patrocínio). (***)

Guardo bem presente o tempo que por lá passei. Hoje, professor de Educação Física, em Moura, estou à espera da aposentação, e por acaso passei por este blog. Bom trabalho para vós. Vou procurar fotos e depois de digitalizadas, vou inseri-las. Contar-vos-ei a história da morte trágica do Cap Figueiredo e 1 Alf, 1 Fur e do Soldado que fez deflagrar a granada. José Bebiano - email:  jbebiano@gmail.com  


(...) Conheci muita tropa que passou por Fajonquito entre 1968/74, em especial das companhias 3549 e 4514/72.  O rebentamento da(s) granada(s) que vitimara o saudoso Cap Figueiredo e seus companheiros de armas [da CART 2742] (*), apanhou-me a menos de 100 metros do local, quando estávamos a brincar perto da casa dos oficiais. (...) 

(...) Companhia de Artilharia n.º 2742, comandada pelo Capitão de Artilharia Carlos Borges de Figueiredo e, posteriormente, pelo Alferes Miliciano de Artilharia Baltazar Gomes da Silva, unidade orgânica do Batalhão de Artilharia n.º 2920, mobilizada em Penafiel no Regimento de Artilharia Ligeira n.º 5, assumiu a responsabilidade do subsector, rendendo a CCaç 2436, em 13 de Agosto de 1970, vindo a ser substituída pela CCaç 3549 em 21 de Maio de 1972.

Companhia de Caçadores n.º 3549, comandada pelo Capitão Quadro especial de Oficiais José Eduardo Marques Patrocínio e, posteriormente, pelo Capitão Miliciano Graduado de Infantaria Manuel Mendes São Pedro, unidade orgânica do Batalhão de Caçadores n.º 3884, mobilizada em Chaves no Batalhão de Caçadores n.º 10, assumiu a responsabilidade do subsector, rendendo a CArt 2742, em 27 de Maio de 1972, vindo a ser substituída pela 2.ª Companhia do BCaç 4514/72 em 15 de Junho de 1974. (...)

Guiné 63/74 - P5937: Convívios (198): Convívio Anual da CCAÇ 3549 “DEIXÓS POISAR”, no próximo dia 27 de Março de 2010 em VISEU (José Cortes)




1. O nosso Camarada José Cortes (ex-Fur Mil At Inf da CCAÇ 3549/BCAÇ 3884), Fajonquito - 1972/74 -, enviou-nos uma mensagem com um pedido de publicação do programa da próxima festa da sua unidade:


CCAÇ 3549 “DEIXÓS POISAR” - 1972/74
FAJONQUITO - CAMBAJÚ - SARE-UALE

Camaradas,

O João Vasconcelos, vai organizar no próximo dia 27 de Março de 2010, o nosso Convívio Anual, com o seguinte programa:

Concentração:
10h00 - Na Avenida Europa, enfrente ao Tribunal,
11h30 - Missa.
13h00 - Almoço no Restaurante Sol da Muna, na Estrada Nacional 2, Muna em Lordosa - VISEU.

O Vasconcelos agradece que façam a vossa inscrição o mais depressa possível.

Contactos:

Vasconcelos - Telef. 232 459 656
Telem.966 261 000
E-mail. deixospoisar3549@gmail.com

José Cortes - Telef. 239442204
Telem. 914516384
E-mal. cortjose@gmail.com

Não se esqueçam que o Vasconcelos espera por nós na sua terra.

Um grande abraço,
José Cortes
Fur Mil At Inf da CCAÇ 3549/BCAÇ 3884
____________
Nota de M.R.:

Há pelo menos 3 referências (marcadores) em relação a esta companhia, a CCAÇ 3549, um deles é:

http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/search/label/CCAÇ%203549

Vd. último poste da série em:

4 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5934: Convívios (110): Pessoal do BCAÇ 2885, dia 6 de Março na Batalha (César Dias)

sexta-feira, 5 de março de 2010

Guiné 63/74 - P5936: Blogues da Nossa Blogosfera (32): Blogue sobre os COMANDOS da Guiné (Luis Manuel Nobreza D'Almeida Rainha)


1. O nosso Camarada Luís Rainha (ex-Alf Mil de Operações Especiais/RANGER, Comandante do Grupo de Comandos "CENTURIÕES", Grupos de Comandos, Brá - 1964 e 1966, enviou-nos a seguinte mensagem, solicitando o envio de documentos, emblemas, etc. que estejam relacionados com os COMANDOS, especialmente os da Guiné, para colocar no blogue que está a construir:


COMANDOS
NOVO BLOGUE

Camaradas,

Antes de mais, quero dizer quem sou: fui Comandante do Grupo de Comandos "CENTURIÕES" na Guiné, e, como tal, gostava de deixar aos vindouros algo que os informasse daquilo por que lá passámos e vivemos.

Ao pensarmos este Blogue "Comandos-Guine-1964a1966", pois não sou só eu que participo e que tive a ideia, já que fomos três (3): o Júlio Abreu (a viver na Holanda), o João Severo Parreira e Eu, tendo sido também convidado o V. Briote que, até ao momento, ainda não se manifestou. Gostaríamos imenso de o ter junto de nós, pois além de ter sido nosso Camarada-de-Armas é um Elemento de alto gabarito entre afamíla COMANDO e sou muitíssimo Amigo dele e da Família.

Portanto, somos um grupo de ex-COMANDOS, daquele tempo, que queremos deixar aos presentes e aos vindouros, um relato tão quanto possível verídico (quando não o fôr, faremos referência a tal), e, o mais importante, este blogue que agora nasce de certeza que não está complecto, poderá conter algumas incertezas, e, quem sabe, algo que não seja totalmente verdadeiro. Mas de uma coisa podem estar certos, todos aqueles que lerem e aderirem a este blogue, o que ali fôr colocado é feito com muito amor, carinho e respeito por todos nós (vivos e mortos).

Fizemo-lo, também, em virtude de a seguir ao 25 de Abril, ou durante o mesmo, o Rosa Coutinho ter dado ordens ao Otelo Saraiva de Carvalho, para destruir tudo o que dissesse respeito aos Comandos da Guiné.

Ora, este último, começou então a destruição, no período de 1964 a 1967, e parou (não sei porque motivo só o fez).

Mas que aconteceu… aconteceu.

Assim, querendo deixar aos nossos Filhos, Netos e para o Futuro o que se passou, resolvemos tentar reunir num blogue, tudo aquilo que ainda existe e anda disperso nas mãos daqueles, que viveram os factos e acontecimentos.

Pedia a todos aqueles que nos queiram ajudar nesta tarefa o façam, o que desde já agradecemos, e, ao fazê-lo, se identifiquem para que possamos agradecer devidamente.
Os meus contactos são:

Telef. 233040495, telemóveis 966726336 ou 931157102.

E-mails:
regisreginae@gmail.com
regisreginae@hotmail.com

O blogue poderá ter alguns erros, que serão reparados e recompletados à medida que formos recolhendo mais informação credível.

O seu endereço é:
http://comandos-guine-1964a1966.blogspot.com/

Recebam um BEM HAJA
Luis Rainha
Alf Mil Op Esp/RANGER, CMDT dos "CENTURIÕES"

Mini-guião de colecção: © Carlos Coutinho (2009). Direitos reservados._
__________
Nota de M.R.:

Vd. último poste da série em:

12 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5634: Blogues da Nossa Blogosfera (31): Tabanca dos Melros - Ex-Combatentes do Ultramar Português de Gondomar (Jorge Teixeira/Portojo)

quinta-feira, 4 de março de 2010

Guiné 63/74 - P5935: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (20): O Honório e o 2º Sarg que dizia que se aguentava (Vítor Oliveira)

1. O nosso Camarada Vitor Oliveira (ex-1.º Cabo Melec da FAP - BA 12, 1967/69), enviou-nos em 2 de Março de 2010, a seguinte mensagem:

O Honório e o 2º Sarg que dizia que se aguentava

Havia um 2º Sarg. do exército, em Nova Lamego, que quando nós íamos para lá se nos juntava depois do jantar, connosco a beber os nossos whiskies no café Mar Verde, ou no outro que também lá existia de que não me lembro do nome.

Então, uma noite em conversa, este nosso amigo diz que já tinha andado muito de avião e que não gritava ao “Gregório” (termo usado na gíria para vomitar).

O Honório vira-se para ele e diz-lhe:
- Amanhã apareces lá na pista que eu trato de ti!

Na altura, ele Honório, estava a voar nos T6G.

Assim, logo de manhã, apareceu o nosso amigo com a sua farda verde todo bonito. Colocamos-lhe o pára-quedas e aí vai ele para dentro do T6.

Dizia-lhe eu:
- Nem sabes onde te meteste ele.

Respondeu-me:
- Não há problema.

Claro que o Honório quando o apanhou dentro do T6, deu o seu festival do costume.

Quando aterrou, o nosso amigo parecia que vinha da piscina, com a farda toda encharcada, de tal modo que tivemos que o tirar de dentro do avião, pois o nosso 2º Sargento, neste passeio aéreo, tinha-se esquecido de como era andar a pé.

Um grande abraço,
Vítor Oliveira
1º Cabo Melec 1ª66 (Pichas)

Emblema de colecção: © Carlos Coutinho (2009). Direitos reservados.
___________
Nota de M.R.:

Vd. último poste da série em:

28 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5912: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (19): O Honório e o major que lhe chamou maluco (Vítor Oliveira)

Guiné 63/74 - P5934: Convívios (197): Pessoal do BCAÇ 2885, dia 6 de Março na Batalha (César Dias)

1. Mensagem de César Dias (ex-Fur Mil Sapador da CCS/BCAÇ 2885, Mansoa, 1969/71), com data de 4 de Março de 2010:

Amigo Carlos
Embora já um pouco tarde venho pedir-te que divulgues o nosso 15.º Encontro / Convivio, que assinala as 39 primaveras do nosso regresso.

Este almoço de confraternização será no dia 6 de Março na Batalha, e terá lugar no "A Aldeia de Santo Antão - Restaurante" .

Para os mais distraídos, ainda podem telefonar para o José Carlos Ventura da CCAÇ 2588 para o n.º de telemóvel 967 964 368.

Grato pela atenção
César Dias

__________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 3 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5922: Convívios (109): Tabanca do Centro, Monte Real, 26/2/2010: uma jornada de camaradagem e de solidariedade (Luís Graça / Joaquim Mexia Alves)

Guiné 63/74 - P5933: Agenda Cultural (63): Seminário Lusófono Que Fazer com Estas Memórias? - Lisboa, 5 e 6 de Março de 2010 (Diana Andringa)

1. Mensagem da nossa tertuliana Diana Andringa* com data de 3 de Março de 2010:

Que fazer com estas memórias?

Entre os países da CPLP, para lá da Língua e da História comuns, há um traço de união que, embora muito próximo de nós em anos, é normalmente esquecido: a tortura sofrida pelos seus povos sob regimes de ditadura, fossem estes nacionais, como nos casos de Portugal e do Brasil, colonizadores, como nos casos dos países que atingiram a independência em 1974/75, ou invasores, como no caso de Timor-Leste.
E, no entanto, essa é uma memória traumática que urge enfrentar, não apenas pelo que representa para os que a sofreram, quer pelo que dela se prolonga, muitas vezes, numa desatenção aos Direitos Humanos indigna de povos que por eles se bateram em condições de extrema dificuldade.

É no sentido de pensar essa memória, não apenas enquanto passado, mas enquanto sombra pesando sobre o presente, que a Associação Movimento Cívico Não Apaguem a Memória (NAM) e o Centro de Estudos Sociais (CES-Lisboa) entenderam levar a cabo, em Lisboa, um Seminário subordinado ao tema “Que fazer com estas memórias?”, a ter lugar nos próximos dias 5 e 6 de Março de 2010, no CES-Lisboa (Picoas Plaza, R. Viriato, perto a Maternidade Alfredo da Costa, do jornal Público e do hotel Sheraton; no 1º andar, sobre o pátio com restaurantes, pintado de vermelho e com grandes letras a dizer CES.).

Queremos ouvir testemunhos de quem sofreu a tortura, comentários de médicos que trataram os torturados e de cineastas que recolheram a sua memória.
Queremos que a memória não se perca, para que o futuro seja melhor.

Diana Andringa



Seminário Lusófono

QUE FAZER COM ESTAS MEMÓRIAS?


Local: Centro de Estudos Sociais-Lisboa (Picoas Plaza, R. Viriato)

Data: 5 e 6 de Março de 2010


Programa

Sexta-feira, 5 de Março
9:30 – 10:30 Abertura – Porquê um Seminário Lusófono sobre Tortura e Memória

José Manuel Pureza, Representante do Centro de Estudos Sociais – Lisboa,
Raimundo Narciso, Presidente da Associação Movimento Cívico Não Apaguem a Memória,
Cecilia Coimbra, Representante do Movimento Tortura Nunca Mais (Brasil),
Simonetta Luz Afonso, Presidente da Assembleia Municipal de Lisboa, CES-Lx

10:30 - 12:00 Projecção do filme “48”, de Susana Sousa Dias

12:00 – 12:30 Comentário pelo Dr. Afonso Albuquerque (Médico psiquiatra, autor de um livro sobre o impacto da tortura sobre presos políticos portugueses)

12:30 – 13:30 Debate sobre o filme, com a presença da realizadora Susana Sousa Dias

13:30 – 15:00 Pausa para almoço

15:00 – 16:30 Projecção do filme “Memória para uso diário”, de Beth Formaggini

16:30 – 17:30 Comentário pelo Dr. Carlos Martin Beristain (Médico especialista em Saúde Mental, Universidade de Deusto, Bilbao) e por Alípio de Freitas (português, preso e torturado no Brasil.)

17:30 – 18:30 Debate sobre o filme, com a presença da realizadora

Sábado, 6 de Março

10:00 – 11:30 Projecção do filme “ Tarrafal: Memórias do Campo da Morte Lenta”, de Diana Andringa

11:30 – 12:00 – Comentário por Miguel Cardina, historiador, investigador do CES e Víctor Barros, investigador do Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX (CEIS20).

12:00 – 13:00 Debate sobre o filme, com a presença da realizadora

13:00 – 13:30 Sessão de encerramento: Como fazer da memória partilhada da tortura uma alavanca pela defesa da Cooperação e dos Direitos Humanos?, Secretário Executivo da CPLP, Eng. Domingos Simões Pereira.

Sobre os filmes:

48, Susana de Sousa Dias

São rostos. E vozes. Apenas isso. Minimalista. Susana Sousa Dias leva-nos a olhar para as fotografias de presos dos arquivos da Pide e a ouvir as memórias que essas fotografias despertam neles tantos anos depois.

São 16 imagens para contar 48 anos de fascismo - tudo fala da sociedade, os rostos, as roupas, a forma de estar. Não estão identificados por nomes nem idades porque valem por todos os presos políticos da ditadura. "Todas as fotografias têm uma história por detrás. O que me interessava era perceber o que a foto nos está a mostrar e o que nos está a esconder". Um rosto de mulher com um sorriso aberto em pleno arquivo da Pide, por exemplo, o que é que nos diz? É a própria que, em voz off, nos explica como aquela imagem, aquele riso inconsciente no meio de um lugar de sofrimento, a perseguiu toda a vida.

E o rosto daquele homem de cabelo claro? Por detrás dessa imagem estão já dias da tortura do sono - mas isso só ele próprio nos pode dizer. E aquela mulher que nos olha fixamente até a imagem se tornar quase abstracta, como uma pintura, e depois desaparecer no negro, apesar de os olhos parecerem continuar lá? "Há momentos em que olhamos para eles, outros em que eles olham para nós e outros em que olhamos para eles através do olhar deles".

"O filme procura estender aquele momento, uma fracção de segundo, em que eles enfrentam o opositor, olhos nos olhos", diz a realizadora. A expressão que têm, esse olhar de desafio, é o último espaço de liberdade que têm. "Nunca lhes daria o gosto de me verem com cara de sofrimento", diz uma das vozes.
Susana achou que para contar toda a história das vítimas da Pide tinha que incluir também os africanos presos pela política política, mas como os arquivos de África desapareceram não há imagens. Por isso são planos negros, apenas com vozes, e os espectadores presos a essas vozes que falam de tortura e de sofrimento.

Memória Para Uso Diário, de Beth Formaggini (Brasil, 2007)
por Rodrigo de Oliveira


Arquivos, como antes eram porões

Memória Para Uso Diário, e o nome não podia ser melhor. Mais que um filme para forçar o acesso emotivo a um passado coletivo submerso e dar voz a vítimas que se tornaram heróis, este é um projeto lindamente pragmático em sua militância: entre as diversas calhordices cometidas contra os revolucionários antiditadura militar e suas famílias, a mais grave foi certamente o apagamento da dimensão visível de sua história, e se há reparação possível, ela só pode se dar pelo “uso diário” do que sobrou desta gente – sua imagem, seus nomes, os signos associados a eles.

Em algum momento do filme, vemos uma parente de um dos militantes assassinados pelo regime falar sobre a perversidade embutida na invenção da expressão “desaparecido político”. É contra esse apagamento que Beth Formaggini investe, e o faz pelo desmascaramento, antes de tudo. A ditadura, como o cidadão brasileiro médio a conheceu, era a das imagens icônicas e da propaganda nacionalista institucional, largamente apresentada no prólogo do filme: não apenas os diversos cartazes e slogans repetidos à exaustão pelo regime, mas também a ostentação da caça e prisão dos vários “terroristas”, alardeadas nos jornais e na tevê como se aquele fosse um ambiente de faroeste, um “procura-se vivo ou morto” onde o rosto de um perseguido só tinha serventia até que ele fosse capturado – depois disso, o limbo, a morte secreta e o desaparecimento.

Uso diário é a experiência cotidiana desta memória, a ação corriqueira que nem por isso deixa de carregar todos os sentidos emocionais e políticos de que está preenchida. Numa das seqüências mais impressionantes do filme (e impressionante justamente por mostrar o caráter habitual da lembrança, e não o grande alarde profundo e pomposo que projetos dessa natureza costumam ter) acompanhamos a visita de Romildo a um cemitério no subúrbio carioca onde se suspeita que seu irmão tenha sido enterrado. Com a ajuda de uma amiga e também ex-militante, o homem começa a listar, de cor e com nome completo, dezenas de pessoas que faziam parte do mesmo aparelho de guerrilha do morto, montando um quebra-cabeça de identidades perdidas que surgem com a naturalidade de quem fala de amigos de infância. Romildo e a amiga não conheceram a maior parte daquelas pessoas em vida, e a única ligação que mantém com elas é a coincidência de terem participado junto com o irmão da luta armada. A memória é superficial e posterior, como a nossa, espectatorial, mas diferente de nós (e do filme), um nome dito é mais que a estampa de uma época, ele é o próprio reaparecimento, a alcunha perversa se desfazendo em nome do presente destas pessoas, mesmo que apenas oral e corriqueiro.

É assim, no limite de sua própria inviabilidade, que Memória Para Uso Diário vai se equilibrando. Porque há algo na sobrevivência dessa lembrança que está marcado por um irremediável senso de história íntima que nem todo o caráter coletivo da luta revolucionária pôde superar. Quando Tânia Roque visita a escola que leva o nome de seu marido morto pela polícia da ditadura, vemos uma celebração da figura de Lincoln Bicalho Roque que é marcada pelo reconhecimento emocionado para a família, enquanto nunca perde a sensação de valorização de uma ausência e de um vazio para os pequenos alunos e suas professoras. As crianças carregam faixas com o nome do militante, cantam enfileiradas o hino da escola, que exalta sua luta, fazem perguntas no microfone sobre quem foi e o que fazia aquele homem, mas, no fundo, nunca assumem estes discursos e essa celebração como sua propriamente.

Ponto de não-retorno definitivo é quando o filme leva um grupo de familiares dos desaparecidos pelas ruas de um bairro carioca para buscar endereços e placas que homenageiem ex-guerrilheiros (encontram no caminho, por exemplo, uma Praça Lamarca, ironicamente abandonada ao capim pelo poder público). É quando a mãe de Marcos Nonato da Fonseca encontra a rua com o nome do filho, mas, com uma placa enferrujada que impede o reconhecimento do nome, recorre a alguns dos moradores curiosos do lugar para que lhe dêem uma conta de luz que comprove a homenagem. Com a conta na mão, a mulher se dirige à câmera e mostra orgulhosa o nome do filho, enquanto um abismo se cria com o fundo do quadro, onde os moradores ainda não sabem direito do que se trata aquele fuzuê todo, e talvez nunca venham a saber ou se interessar. Não há chamado à memória e ao exercício da reparação que Beth Formaggini e o Grupo Tortura Nunca Mais (financiadores institucionais do filme) possam fazer sem que se esbarre neste abismo. A clandestinidade é a única marca da luta antiditadura que resistiu ao tempo, porque essa memória também é clandestina e, independente dos esforços de ambas as partes, ainda inviável.

Em Memória Para Uso Diário utiliza-se a estratégia do nome completo e do retrato 3x4 das vítimas, reforçados pelos letreiros finais que listam todos os ditos “desaparecidos políticos” do país, e ainda assim esta é apenas uma personificação de segunda ordem. É uma fissura da própria sociedade brasileira e sua incapacidade de lidar efetivamente com o período militar que acaba se espalhando para o cinema, do qual o filme de Formaggini acaba não deixando de ser um louvável retorno à regra. Não houve julgamento dos torturadores, não se prenderam os responsáveis pelas mortes, e as vítimas vão sendo indenizadas na surdina, em processos lentos e financeiramente desproporcionais. Do mesmo modo, este cinema brasileiro que fala da ditadura nunca conseguiu nem sequer levar a cabo a máxima godardiana de que as vítimas são sempre filmadas de frente, enquanto os carrascos aparecem sempre de costas.

Este acordo tácito pelo esquecimento torna mesmo a filmagem das vítimas um problema – e não só porque, como neste caso, o que resta delas é um retrato ou uma placa de rua. Mais do que a forçosa relação entre os desaparecidos dos 60 e os desaparecidos dos 2000, que o filme faz ao propagandear as ações do Grupo Tortura Nunca Mais contra o abuso policial sobre jovens da periferia e das favelas cariocas, o que Memória Para Uso Diário faz de realmente novo e instigante sobre esta relação do país com seu passado é filmar não os personagens da tragédia, mas seu depositário. Em poucos planos dos arquivos públicos nacionais onde uma viúva tenta buscar provas de que seu marido foi morto pelo Estado e, portanto, merece uma pensão do governo, vemos finalmente materializado todo o horror da desimportância que tanto a ONG como o filme tentam combater. Confusos, sujos, improvisados, escuros, os arquivos são o retrato mais fiel da falta de retrato: pastas e mais pastas com nome completo e eventualmente fotos dos mortos e desaparecidos, sem que isso possa garantir que as histórias guardadas ali possam um dia ser verdadeiramente ouvidas e revisitadas.

Abril de 2009 http://www.blogger.com/editoria@revistacinetica.com.br



Tarrafal: Memórias do Campo da Morte Lenta

Diana Andringa


Chamavam-lhe “o Campo da Morte Lenta”. Os críticos, naturalmente. Que as autoridades, essas, chamaram-lhe primeiro, entre 1936 e 1954, quando os presos eram portugueses, “Colónia Penal de Cabo Verde” e, depois, quando reabriu em 1961 para nele serem internados os militantes anticolonialistas de Angola, Cabo Verde e Guiné, “Campo de Trabalho de Chão Bom”.

Trinta e dois portugueses, dois angolanos, dois guineenses perderam ali a vida. Outros morreram já depois de libertados, mas ainda em consequência do que ali tinham passado. Famílias houve que, sem nada saberem o destino dos presos, os deram como mortos e chegaram a celebrar cerimónias funebres.

“Ali é só deixar de pensar. Porque se não morre aqui de pensamentos. É só deixar, pronto. Os que têm vida ficam com vida. Nós aqui estamos já quase mortos.” A frase é do angolano Joel Pessoa, preso em 1969 e libertado, com todos os outros presos do campo, em 1 de Maio de 1974.

No 35º aniversário desse dia, a convite do presidente da República de Cabo Verde, Pedro Verona Pires, os sobreviventes reencontraram-se para um Simpósio Internacional sobre o Campo de Concentração do Tarrafal.

“Tarrafal: memórias do Campo da Morte Lenta” resultou desse reencontro. Durante os dias em que os antigos presos voltaram ao Tarrafal, gravámos entrevista após entrevista, registando as suas recordações. Trinta e dois presos, desde o português Emundo Pedro, um dos que o estreou, em 1936, aos angolanos e cabo-verdianos que foram os últimos a deixá-lo, no 1º de Maio de 1974, passando pelos guineenses que, ali cegados em Setembro de 62, saíram em 64 uns, em 69 os restantes. Um guarda, Joaquim Lopes, cabo-verdiano e convertido ao PAIGC. Uma das raras pessoas que testemunhou a vida no Tarrafal desde a sua abertura ao seu encerramento, Eulália Fernandes de Andrade, mais conhecida por D. Beba.

É um documentário feito à base de depoimentos e filmado quase sempre no interor do campo, afinal, o espaço em que os presos se moviam. Entre as raríssimas excepções, o cemitério, onde acompanhamos a homenagem dos sobreviventes aos que ali ficaram. Vozes, caras expressivas contra fundo de cela. Alguns objectos surpreendentes: as calças rasgadas pelo chicote e puída pelo chão prisional, a planta do campo desenhada num osso de vaca, a bengala que testemunha o resultado da tortura. A alegria de se verem lembrados em duas exposições nas celas que tinham ocupado.
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Nota de CV:

Vd. poste de 28 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5908: Agenda Cultural (62): Seminário Lusófono Que Fazer com Estas Memórias ?, Centro de Estudos Sociais-Lisboa, 5 e 6 de Março de 2010 (Diana Andringa)