quinta-feira, 18 de março de 2010

Guiné 63/74 - P6015: Em bom português nos entendemos (7): O kapuxinho vermelho, contado aos nosso netos, de Lisboa a Dili, de Bissau a S. Paulo (Nelson Herbert / Luís Graça)

1. O nosso Nelson Herbert, jornalista na Voz da América, nascido em Bissau, há cerca de 50 anos, mandou-nos um peça de antologia que tanto poderia ser publicada na série Humor de Caserna, como na série Em Bom Português Nos Entendemos... Optámos por esta, que tem estado inactiva (*).

Trata-se de uma paródia da história do Capuchinho Vermelho e do Lobo Mau  (Le Petit Chaperon Rouge) que, como se sabe, é da autoria do francês  Charles Perrault (1628-1703), considerado o pai da literatura infantil...

Não sei quem mais gosta deste conto tradicional, se as crianças se os adultos...  Estes últimos são mais dados à paródia do texto e às suas interpretações simbólicas e psicanalíticas (A adolescente, o vermelho, a avózinha, o lobo mau que come a jovem e a velha deram origem a múltiplas e delirantes leituras, que vão deste o comportamento sexual predador dos machos até aos fantasmas da violação e ao tabu do canibalismo...).

Na realidade, esta  versão (Capuchinho Vermelho pós-Acordo Ortográfico) é mais facilmente lida e compreendida pelos nossos jovens lusófonos (do Rio de Janeiro a Luanda, de Bissau a Dili, de Lisboa a New Jersey) do que os clássicos da lusofonia, do Camões ao Craveirinha, do Eugénio Tavares ao Machado de Assis...

De tanto circular pela Net, como Spam, já ninguém sabe quem é o seu autor. Em princípio, pretende ser apenas uma paródia ao último Acordo Ortográfico... Na pior das hipóteses, lá teremos que falar assim,  chungas e chonés!, dentro de alguns anos, para os queridos netinhos nos entenderem, aos fins-de-semana, antes de irem para a cama, quando lhes contarmos as inocentes histórias do nosso tempo de meninos e moços... Tázaver, meu ? Mikas a cena, kamarada ?

Quem quer que seja (ou tenha sido) o autor desta versão yah, yah, bué bakanaprontes, man!,  merece uma chapelada... Ainda há gente com talento e disposição para o humor (que é uma forma sublimada de amor...), e que é de resto um coisa que andamos a precisar à brava (muito),  nesta recta final do inverno e neste 1º trimestre do ano de 2010  marcado por muitas nuvens negras no horizonte do nosso futuro...

Há um toque,  meu, neste texto, em dilalecto chunga ou basofe ou portuguex,  que, se bem interpreto o gesto do Nelson, pode também ser visto - e porque não ? - como uma homenagem à lusofonia e ao universo de mais de 250  milhões de falantes nossa língua (que todos juntos ocupam quase 11 milhões de quilómetros quadrados do  planeta azul)... (LG)

KAPUXINHO VERMELHO... (em dialekto xunga)  


Tás a ver uma dama kom um gorro vermelho? Yah, essa cena! A pita foi obrigada pela kota dela a ir à toka da velha levar umas cenas, purke a velha tava a bater mal, tázaver?

E atão disse-lhe:
- Ouve, nem te passes! Népia dessa cena de ires pelo refundido das árvores, ke salta-te um meko marado dos kornos para a frente e depois tenho a bófia à kola!

Pá, a pita enfia a  karapuça e vai na deskontra pela estrada, mas a toka da velha era bué longe, e a pita kagou na cena da kota dela e enfiou-se pelo boske. Népia de mitra, na boa e tal, kurtindo o som do iPod...

É atão ke, ouve lá, salta um baita dog marado, todo xinado e bué ugly mêmo, ke vira-se pa ela e grita:
- Yoo, tá td? Dd tc?
- Tásse... do gueto alí! E tu... tásse? - disse a pita
- Yah! E atão, ke se faz?
- Seka, man! Vou levar o pakote à velha ke mora ao fundo da track, ke tá kuma moka do kamâno!
- Marado, marado!... Bute ripar uma até lá?
- Epá, má onda, tázaver? A minha kota não kurte dessas cenas e põe-me de pildra se me kata...
- Dâsse, a kota não tá aki, dama! Bute ripar até à kasa da tua velha, até te dou avanço, só nakela da kurtição. Sem guita ao barulho nem nada.
- Yah,  prontes, na boa. Vais levar um baile katéte passas!!!

E lá riparam. Só ke o dog enfiou-se por um short no meio do mato e chegou à toka da velha na maior, com bué avanço, tázaver? Manda um toke na porta, a velha 'kem é e o kamâno' e ele 'ah e tal, e não sei kê, ke eu sou a pita do gorro vermelho, e na na na...'.

A velha abre a porta e PIMBA!!!, o dog papa-a toda... Mas mêmo, abre a bokarra e o kamâno e até xuxou os dedos...

O mano xêga, vai ao móvel da velha, saka uma shirt assim mêmo à velha ke a meka tinha lá, mete uns glasses na tromba e enfia-se no VL... o gajo tava bué abixanado mêmo, mas a larika era muita e a pita era à maneira, tázaver?
A pita  xêga, e tal, e malha na porta da velha.
- Basa aí ká pa dentro! - grita o dog.
- Yo velhita, tásse?
- Tásse e tal, kuma moka do kamâno... mas na boa...
- Toma esta cena, pa mamares-te toda aí...
- Bakano, pa ver se trato esta cena.
- Pá, mika uma cena: pa ké esses baita olhos, man?
- Pá, pa mikar melhor a cena, tázaver?
- Yah, yah... E os abanos, bué da bigs, pa ke é?
- Pá, pa poder kontrolar melhor a cena à volta, tázaver?
- Yah, bakano... e essa kremalheira toda janada e bué big? Pa ké a cena?
- É PA XINAR ESSE KORPO TODO!!! GRRRRRRRR!!!!

E o dog manda-se à pita, nakela mêmo de a engolir, né? Só ka pita dá-lhe à brava na kapoeira e saka um back-kick mesmo direkto aos tomates do man e basa porta fora! Vai pela rua aos berros e tal, o dog vem atrás e dá-lhe um ganda baite, pimba, mêmo nas nalgas, e kando vai pa engolir a gaja aparece um meko dakêles ke korta as cenas kum serrote, saka de maxado e afinfa-lhe mêmo nos kornos. O dog kinou logo alí, o mano xina a belly do dog e saka de lá a velha toda xeia da nhanha. Ina, man, e a malta a gregoriar-se toda!!!

E prontes, já tá...

 [Autor: Anónimo. Fonte: WWW  / Fixação de texto / revisão: L.G.. Ilustração: Gustave Doré, 1832-1883. Imagem do domínio público. Cortesia: Wikipédia]

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Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 13 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3447: Em bom português nos entendemos (6): Histórias... ou estórias de guerra ? Venham elas... (J. Mexia Alves)

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