segunda-feira, 20 de julho de 2009

Guiné 63/74 - P4710: Blogoterapia (119): As Fantas, as Marias, as Natachas, ou o amor em tempo de guerra e de diáspora (Cherno Baldé)


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém > Visita dos participantes do Simpósio Internacional de Guileje > 2 de Março de 2008 > Filhas de amores de guerra... Estas duas mulheres, de olhar triste, irmãs, vieram de longe procurar-nos, uma delas com um filho às costas... Queriam saber notícias de um tal Furriel Mil Mecânico Auto, de apelido Barros, que terá estado em Cacine em 1971/72... e que seria de origem madeirense. Por essa altura, entre 20 de Maio de 1970 até 15 de Fevereiro de 1972, sabe-se que passou por Cacine a CCaç 2726... Segundo informação, de 18 de Maio de 2008, do nosso camarada Juvenal Candeias (, ex-Alf Mil da CCAÇ 3520, Cameconde, 1971/74) , "a CCaç 2726 era a companhia açoreana que eu fui render em Cacine! Pessoalmente não me lembrava do Furriel Auto, mas acabei de telefonar a um soldado auto da minha companhia, que se lembrava perfeitamente do Furriel Auto da 2726... só que o nome... já foi! Contudo, quando lhe falei em Barros, confirmou-me, com muita segurança, que esse era, efectivamente, o Furriel Auto da CCaç 2726. Espero que não se tenha enganado!"... 

 Foto e legenda: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.


  Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > BART 2917 (1970/72) > Um despojo de guerra, uma fotografia de uma bajuda, certamente de etnia mandinga, oferecida a um tal Soncó, tendo no verso a data de 2 de Fevereiro de 1971. Foi apanhada, a foto, pelo Jorge Cabral, comandante do Pel Caç Nat 63, no acampamento temporário, do PAIGC, em Belel, a norte do Enxalé, a sul do Oio, no limite do Cuor, e do Sector L1. (*)

 Foto : © Jorge Cabral (2007). Direitos reservados. 1.

 Mensagem do Cherno Baldé, membro da nossa Tabanca Grande, autor da série Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (aqui na foto, à esquerda, enquanto estudante e Kiev, na Ucrânia, onde se formou em Planificação e Gestão Económica; vive em Bissau e é casado desde 1992 com a linda Geralda Santos Rocha, natural de Bissau (foto à direita). (**) 



 Prezado amigo, Luís, 

Antes de mais quero fazer uma pequena correção sobre mim. A minha formação de base não é engenharia como erradamente transcreveu e tacitamente eu corroborei, mas planificação e gestão económica. Na verdade, mesmo aqui entre nós, esta confusão é muito frequente e é tanta que já não me preocupo muito em desmentir pois, no fundo, depois de 18 anos a trabalhar no Ministério das Infraestruturas e Transportes (projectos de obras públicas) e com engenheiros, quase que tomei o gosto. 

 Depois, quero dizer que gosto da forma como o Jorge Cabral (Cabral há muitos e ...cabrões ainda mais!...) conta suas experiências (estórias) de vida na Guiné (**) A mim, pessoalmente, não me incomoda, aliás eu o felicito pela coragem que tem em fazê-lo com honestidade e sem pudor. O apelido da sua Fanta (Baldé) diz claramente que é da etnia fula e não mandinga como ele pensa, embora a área de Binta seja de maioria mandinga como de resto o é toda a zona de Farim. (***). 

 Todavia, e voltando ao assunto, em alguma parte faltou a coragem da assumpção das responsabilidades quando os filhos, depois de muitos anos, foram bater às portas aos seus pretensos pais (não me refiro aqui, particularmente, a ninguém em especial). 

  Para aqueles que não sabem (o que é pouco provável) quero informar que, também, nós, Africanos (Pretos, se quiserem), tivemos a oportunidade de viver em terras da Europa, esta velha Europa, orgulhosa e racista mas que também sabe ser, às vezes, acolhedora e bondosa. E também nós tivemos, temos e teremos as nossas experiências não menos dramaticas com as Marias e as Natachas. 

Diz um ditado popular que "o mundo é como o rabo de uma pomba" que faz viragens permanentes. Eu nunca utilizarei o termo puta porque penso que o não foram e aí o Jorge é bem explícito. Se todos os Homens fossem tão humanos como o são as mulheres (todas as mulheres), o mundo seria mais justo e a vida mais fácil de viver. Hoje, envio mais uma parte das minhas crónicas (memórias) que, curiosamente também aborda esta questão da sexualidade escondida nas casernas (****).

 Na minha opinião, na nossa Tabanca Grande, as pessoas devem ser mais abertas ao diálogo, à troca de ideias sem preconceitos e/ou ideias fixas. Um abraço deste irmãozinho de Fajonquito, Cherno A. Baldé, Chico [Revisão / fixação de texto / bold a cores: L.G.]

2. Comentário de L.G.: 

 Não páras de nos surpreender, Cherno Baldé... Fica feita a correcção: não és engenheiro, és um especialista da área da planificação e gestão económica, não és pior nem melhor por não seres engenheiro. O que importa é que te sintas bem na tua pele e possas ser útil, com as tuas competências e experiência, à tua Pátria e ao teu povo...

 De resto, os títulos (académicos, profissionais, sociais ou outros) aqui não são relevantes: como sabes, na nossa Tabanca Grande, tratamo-nos por tu, à boa maneira romana... Os camaradas da Guiné tratam-se por tu, e os seus amigos são convidados a seguir o seu exemplo... Eu trato o Chico por tu e o Chico deve responde no mesmo registo... Não é preciso estar a lembrar-to, meu irmãozinho. 

 Quantos aos textos que me mandaste, vão de certo fazer as delícias dos teus (e das tuas) fãs... Obrigado por teres retomado, aqui, um tema que é delicado... mas que não é virgem nem tabu, no nosso blogue: o tema das nossas Fantas, mas também das nossas Marias, das nossas Natashas... Falamos do(s) amor(es) em tempo de guerra, de diáspora, de imigração... (Para sermos politicamente correctos, que é uma coisa pior que a sarna, também teríamos que dizer: dos nossos Chernos, dos nossos Manéis, dos Vladimiros...).

 Obrigado, por fim, pelo teu apelo, que nada tem de surpeendente vindo de um homem como tu, cidadão do mundo, no sentido da abertura de espírito, da tolerância, do diálogo, da liberdade... Não imaginas como essas palavras caiem tão bem, no nosso blogue, e na nossa Tabanca Grande, em início ou em véspera de férias, numa altura em que andamos já todos tão cansados e irritados... 

Cuida de ti. Luís Graça 

 ___________ 

 Notas de L.G.: 




 (**) Vd. último poste da série Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé):13 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4679: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (6): Uma gesta familiar, de Canhámina a Sinchã Samagaia, aliás, Luanda

(***) O Cherno Baldé terá trocado o nome dos autores: a história da Fanta Baldé não é do Jorge Cabral mas do Victor Junqueira > Vd. poste de 31 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1475: Histórias de Vitor Junqueira (7): A chacun, sa putain... Ou Fanta Baldé, a minha puta de estimação 

  (...) Comentário (prévio) de L.G.: (i) Amigos e camaradas: o que vão ler, é um dos mais belos textos que um homem pode escrever sobre uma mulher em tempo de guerra. O estilo é puro e duro, o título enganador... Há uma tremenda ternura subliminar que me emocionou, e que só pode honrar o homem, o médico e o português que é o Vitor Junqueiro. É um texto que nos honra a todos. É uma homenagem a todas as Fantas Baldés da Guiné que climatizaram os nossos pesadelos, e que dormiram connosco na cama... (ii) É um texto corajoso, escrito na primeira pessoa do singular, sem máscaras, sem defesas, que muitos de nós gostariam de ter escrito. É um escrito da maturidade, um escrito que revela uma grande nobreza de alma, sensibilidade e humanidade... (iii) É um poste que definitivamente vai figurar na antologia dos melhores postes do nosso blogue... (...) 


 (****) A publicar em próxima oportunidade

3 comentários:

Anónimo disse...

Serei curto Cherno Baldé pata te dizer do quanto gosto dos teus textos.
Particularmente este último, síntese estupenda sobre as relações homem/mulher, sobre a Europa, sobre as contradições do mundo e dos homens.
um abraço
José Brás

MANUEL MAIA disse...

CARO CHERNO,

UMA BELA HISTÓRIA EM QUE NOS DÁS UM EXEMPLO DE GRANDEZA ENORME.

A FALTA DE ASSUNÇÃO DAS RESPONSABILIDADES FOI,INFELIZMENTE,
UMA NÓDOA MUITO GRANDE DEIXADA EM ÁFRICA.
TODOS SABEMOS DOS INUMEROS CASOS DE FILHOS LÁ DEIXADOS, POR JOVENS DE VINTE ANOS, ENVOLVIDOS NUMA TERRÍVEL GUERRA QUE NÃO PRETENDERAM...

AS EXPERIÊNCIAS DE JUVENTUDE NALGUNS CASOS DEIXARAM MARCAS.

A ESTA DISTÂNCIA QUE PODERÁ DIZER-SE PARA ALÉM DAS TUAS PALAVRAS SERENAS?

UM ABRAÇO.

MANUEL MAIA

MANUEL MAIA disse...

CARO CHERNO,

UMA BELA HISTÓRIA EM QUE NOS DÁS UM EXEMPLO DE GRANDEZA ENORME.

A FALTA DE ASSUNÇÃO DAS RESPONSABILIDADES FOI,INFELIZMENTE,
UMA NÓDOA MUITO GRANDE DEIXADA EM ÁFRICA.
TODOS SABEMOS DOS INUMEROS CASOS DE FILHOS LÁ DEIXADOS, POR JOVENS DE VINTE ANOS, ENVOLVIDOS NUMA TERRÍVEL GUERRA QUE NÃO PRETENDERAM...

AS EXPERIÊNCIAS DE JUVENTUDE NALGUNS CASOS DEIXARAM MARCAS.

A ESTA DISTÂNCIA QUE PODERÁ DIZER-SE PARA ALÉM DAS TUAS PALAVRAS SERENAS?

UM ABRAÇO.

MANUEL MAIA