domingo, 10 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4314: Nino: Vídeos (5): 'A guerra é uma das coisas mais horríveis da vida' (Nino Vieira)

Guiné-Bissau > Bissau > Palácio Presidencial > 6 de Março de 2008 > Último excerto, em vídeo, da audiência que o Presidente João Bernardo 'Nino' Vieira (1939-2009) deu, por volta das 12h, a cerca de duas dezenas de participantes estrangeiros do Simpósio Internacional de Guiledje (Bissau, 1-7 de Março de 2008) (*). 

 Sinopse: 

Referência às difíceis negociações de Argel, em 1974, entre Portugal (representado por Mário Soares e Almeida Santos) e o PAIGC, com vista ao acordo de paz. Posição de Spínola que acaba por dar o seu OK, facilitando assim o desfecho das negociações. Grande apreço de 'Nino' pelo velho marechal. Quando estava já em coma, fez questão de o visitar no hospital. Encontro, nessa ocasião, com o Gen Almeida Bruno, que estava emocionado. Bruno e 'Nino' falam de Guileje e Gadamael. Bruno pergunta a 'Nino' a razão por que é que o PAIGC não quis tomar Gadamael, quando tinha todas as condições para o fazer. A resposta de 'Nino' foi que, para o PAIGC, Gadamael seria uma cilada das NT. Depois de entrar em Gadamael, as tropas do PAIGC seriam facilmente dizimadas. Mantendo o seu tom de confidências, 'Nino' diz taxativamente que "a guerra é uma das coisas mais horríveis da vida".... 

Volta a fazer um apelo à cooperação. A antiga colónia portuguesa precisa hoje, não de ser novamente colonizada, mas atacar os seus problemas de desenvolvimento. Remata, por fim, com um apelo a Cuba e Portugal "para que ajudem a escrever a história"... A Guiné-Bissau precisa de preservar a sua memória. "Os senhores têm filmes, documentos, fotografias"... Visivelmente feliz e bem disposto, 'Nino' faz um agradecimento final aos presentes por terem vindo à Guiné-Bissau participar no Simpósio de Guileje... 

 Vídeo (7' 00''): © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados. 

Alojado em You Tube > Nhabijoes

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 Notas de L.G.: 

 Vd. postes anteriores da série:

8 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3996: Nino: Vídeos (1): Ouvindo a versão do Coutinho e Lima sobre a retirada de Guileje (Luís Graça) 

 9 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4002: Nino: Vídeos (2): O amigo de Cuba... e de Portugal, que em Março de 2008 pedia mais professores de português (Luís Graça) 

 17 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4045: Nino: Vídeos (3): Em Portugal, um vizinho meu, antigo combatente, reconheceu-me e tratou-me por 'comandante Nino'... 

 14 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4185: Nino: Vídeos (4): Guidaje, Guileje, Gadamael: A Op Amílcar Cabral

6 comentários:

Anónimo disse...

REESCREVER a história, disse Nino Vieira.

A África inteira devia reescrever aquele período da suas independencias, embora já nao seja mais possível virar os "VENTOS DA HISTÓRIA". Embora houvesse alguns a lutar contra AQUELES VENTOS.

Mas a História ainda há-de ser reescrita e talvez várias vezes.

Antº Rosinha

António Matos disse...

Nos tempos de hoje não me movem sentimentos de ódio nem de vingança sobre o que se passou, sobre O QUE EU PASSEI nem sobre as consequências daquela guerra na minha vida pessoal.
Assumo aqueles tempos como uma fatalidade que me coube suportar e hoje é tarde para chorar baba e ranho.
Porém, a História vai-se construindo com o aparecimento deste indício ou daquele outro, desta informação, daquela fotografia, deste ou daquele documento.
Uma das artes dos tempos é precisamente o branqueamento de situações dúbias, pecaminosas mesmo, e transmitirem-se noções e conceitos que possam estar eivados de demagogia e de falsas boas vontades.
Não será este pequeno filme que me lava a alma e me faz ver no Nino Vieira aquele bom samaritano e humanista a que o seu discurso apela.
Nino Vieira já por cá não anda e, ironia das ironias, ele que se queixava da falta de documentos escritos e/ou fotográficos que contassem a história da Guiné, aí estão, e com requintes de selvajaria, as fotos do seu final exibidas à saciedade como que em hino ao extermínio daquele que, para muitos, representou o que de pior um ser humano consubstanciou.
Ponhamos de parte falsos puritanismos e interroguemos as mães, os pais, as esposas, os filhos, as noivas dos nossos mortos naquela guerra e vejamos quantos se emocionam com as palavras daquele guerrilheiro.
Quantos assumem a perca do seu familiar de modo pacífico ?
Quantos deles estão dispostos a guardar a imagem bonacheirona do Nino transmitida neste filme ?
Estarei errado ou não estamos, definitivamente, na presença dum Luther King ou dum Gandhi ?
Paz para a Guiné-Bissau !
António Matos

Luís Graça disse...

Maquiavélico ? Cínico ? Ingénuo ? Provocador ?... Bestial ? Besta ?... Herói ? Monstro ? ...

Um dia alguém há-de estudar a personalidade, a vida, a história deste homem... Ou talvez não. Muitos dos que o conheceram de perto, que com ele lutaram e viveram, já não podem ser ouvidos como testemunhas... porque foram mortos ou estão mortos. E nda deixaram escrito (ou gravado) sobre os momentos que partilharam.

António Matos, caro camarada: tive a mesma dúvida que tu... quando em 6 de Março de 2008 os organizadores do Simpósio Internacional de Guileje nos disseram, a nós, estrangeiros, que o Presidente João Bernardo Vieira fazia questão de receber uma delegação de participantes até um número máximo de 20...

Também tive o mesmo problema de consciência: vou, não vou ? cumprimento ou não aquele homem ? vou estar com o presidente da República da Guiné-Bissau, ou com o Nino, com o antigo guerrilheiro do PAIGC ou o homem que tem as mãos sujeitas de sangue, do assassínio de antigos camaradas e opositores políticos ?

Esse é o dilema com que se confrontam também os legítimos representantes do povo português, em toda a parte do mundo (da Europa à América, da África à Ásia)... Onde acaba o assassino e começa o estadista ?

Tudo isto para te dizer que, não tendo cumprimentado, de mão estendida, o nosso homem (por que ele passou ao aldo, quando estava a falar com o vizinho...), fui o autor deste regísto de vídeo... Não tenho, bem, pelo contrário, qualquer intenção de branquear ou falsificar a história... Nunca tive sequer simpatia pelo personagem, antes e depois da guerra... Mas, até por deformação profissional (sou sociólogo), gosto de (e devo) ouvir as partes envolvidos nos processos sociais.

Mau seria que, agora que o homem morreu (de resto, miseravelmente, sem dignidade, como tu acentuas...) aparecessemos todos nós, em coro, a diabolizá-lo ou a santificá-lo...

Em suma: este e outros documentos que aqui pomos, têm todas as leituras possíveis. Não temos (os editores do blogue) nenhuma cartilha ideológica, como sabes e reconheces. Obrigado por manifestares publicamente a tua leitura. É esse exercício que se pretende suscitar.

António Matos disse...

Caríssimo Luís, não é o filme que pretende branquear seja o que fôr ! São as palavras do homem !
Peço-te imensa desculpa se dei a entender alguma crítica ao realizador ( desconhecia que fosses tu, meu caro ) quando me referi ao discurso.
Fica a minha palavra.
Um abraço
António Matos

Anónimo disse...

Camaradas
Subscrevo o texto do António. Porque se vrefere à personalidade política do Nino, homem desapiedado, arrogante, prepotente.
Enquanto guerrilheiro, relativamente aos portugueses, ele fazia o que devia, atacar-nos, causar-nos danos e baixas. Nessa condição, não tenho conhecimento de actos reprováveis sobre portugueses capturados. Até aí, merece-me, se não respeito, pelo mesnos a consideração de um adversário. O pior viria a revelar nos anos de governação, em que traíu os objectivos independentistas de uma Guiné-Melhor. E como qualquer ditador, gostava de ser adulado, como foi intenção na reunião promovida.
Abraços
J.Dinis

Luís Graça disse...

Caros camaradas:

Ainda hoje me interrogo sobre a verdadeira motivação do 'Nino'... Por que é que ele fez questão de nos receber, a nós, estrangeiros, à margem do programa (oficial) do Simpósio ? Foi uma decisão de última hora...

Sabemos que ele era politicamente inimigo dos homens e mulheres que fundaram e dirigem hoje a AD - Acção para o Desenvolvimento: o Carlos Schwarz, a Isabel Levy Ribeiro, a Isabel Nosolini Miranda,, o Roberto Quessangue, o Nelson Dias...

Ora a AD foi o cérebro e o motor desta iniciativa, que teve um considerável impacto (mediático e não só) em Bissau e no sul do país...

Repare-se que no programa do Simpósio uma das alocuções no dia da inauguração, a fazer pelo Presidente da República da Guiné-Bissau, aparecia por confirmar... E não tenho a certeza que ele tenha aparecido, na sessão inaugural... Por razões de segurança ou outras, não apareceu mesmo (se a memória me não falha)... Apareceu, sim, inesperadamente, no último dia, e assistiu, visivelmente bem disposto, à projecção do filme "As Duas Faces da Guerra"...

Ele era o último dos moicanos e deu conta, durante essa semana (1 a 7 de Março de 2008) do seu estatuto de "mito", de "figura histórica", de "último combatente"... Ele deu conta, premonitoriamente, que um ciclo da história da Guiné-Bissau se estava definitivamente a encerrar... Ele sabia (e temia) que no ciclo seguinte já não haveria espaço para ele...

Se querem saber a minha opimião, ele recebeu-nos, não como Chefe de Estado ou ditador poderoso (muito menos para ser temido, adulado, bajulado; nenhum de nós, tugas, estaria ali disposto a fazê-lo...) mas com a cumplicidade que é própria dos antigos combatentes...

Ele estava alí para não ser esquecido... pelos seus inimigos de ontem... Patético!

É a minha interpretação.