terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Guiné 63/74 - P3933: Os meus 53 dias de brasa em Bissau (Cristina Allen) (4): Cenas, pouco edificantes, de caserna, que não contarei...

Guiné-Bissau > Bissau, capital do país. Planta da cidade, pós-independência.

Foto: © A. Marques Lopes (2005). Direitos reservados.

1. Mensagem de Cristina Allen, através da sua filha Joana Santos:

Caro Luís Graça,

Junto mais um texto da minha mãe para o Blogue.
Em breve, ela sairá de Bissau, mas eu ainda não acredito.

Um abraço,

Joana


2. Um agradecimento e ... um poema a Bissau (*)

por Cristina Allen

A Vasco da Gama, Luís Graça, Jorge Cabral, Torcato Mendonça, Mário Fitas e Alberto Branquinho,


Vocês são demasiado elogiosos.

Tinha preparado, para este Blogue, um texto hilariante sobre a perseguição nocturna a um coronel, que punha gravata para o jantar, me piscava um olho velhaco e, numa noite em que o Mário se ausentara, entrou, no meu quarto, em cuecas. Tantos anos volvidos sobre o caso, não acho que seja assim tão engraçado.

É que, a esse tempo, o homem teria a idade do meu pai e, nos dias de hoje, já sou mais velha do que ele então seria. Também entrava nessa história o Carlos D’Orey, um amigo que morreu de abandono.

Portanto, nada de graças. Em vez desse texto, mais uma visão de Bissau, da qual não consigo ainda partir.


Bissau, a menos bela,
te cantarei bela
em cada esquina.
Bissau, como te vi,
luzeiro e sombra densa,
Bissau da paz
e luta ardente,
Bissau benvinda,
oculta para sempre.

E se, em sonhos,
farrapos de mim
por ti e só por ti ainda gritam,
são coisas da lembrança,
cidade adormecida,
entre a morte e a vida
bem cumprida,
delgado fio pendente…

E, da suprema traição,
que tão bem viste,
o espanto e a ira,
na tua cor esbatidos,
mais brandos tos retorno,
em meus olvidos,
Bissau, a menos bela,
que cantarei mais bela
em cada esquina.


Cristina Allen
Fevereiro de 2009

__________

Nota de L.G.:

(*) Vd. postes anteriores da série:

9 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3713: Os meus 53 dias de brasa em Bissau (Cristina Allen) (1): Just married...

8 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3850: Os meus 53 dias de brasa em Bissau (Cristina Allen) (2): Quarto, precisa-se, por favor!

19 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3913: Os meus 53 dias de brasa em Bissau (Cristina Allen) (3): Quanta chuva, Mário ?

2 comentários:

Anónimo disse...

Dª. Cristina,

Depois deste poema, não tenho palavras.
A única coisa que me resta é voltar a socorrer-me da minha minha querida Florbela, com este lindo Soneto:

EXALTAÇÃO

Viver!... Beber o vento e o sol!...Erguer/
Ao Céu os corações a palpitar!/
Deus fez os nossos braços para prender,/
E a boca fez-se sangue pra beijar!

A chama, sempre rubra, ao alto, a arder!.../
Asas sempre perdidas a pairar,/
Mais alto para as estrelas desprender!/
A glória!... A fama!... O orgulho de criar!...

Da vida tenho o mel e tenho os travos/
No lago dos meus olhos de violetas,/
Nos meus beijos extáticos, pagãos!...

Trago na boca o coração dos cravos!/
Boémios, vagabundos, e poetas:
_Como eu sou vossa Irmã, ó meus Irmãos!...

(Florbela Espanca)

Recordação grata da Planície,

Mário Fitas

Anónimo disse...

Este site, sítio, blogue... é um espanto. O fundador, o iniciador (não digo o nome pode ele se aborrecer e dizer: lisonja não), lançou uma mão cheia de sementes e que aconteceu? Estórias, contributos para a História, lugar de afectos, de indignações, de encontro de gentes há muito separadas, de prosas várias e de poesia de emoção. Vejam o Vasco da Gama a terminar um poste com parte de um poema de Sophia, a Cristina Allen a escrever um poema seu e o Mário Fitas a regressar á planície, ao Alentejo, á terra dos seus sonhos (da Cristina, meus e de tantos)e a responder com Florbela. É multifacetado este "lugar", sitio de encantos de alegrias e tristezas, mas com uma certeza - lugar de afectos, nas divergências ou convergências.
Se me permite Cristina, não saia de Bissau. Nem consegue. "Aquilo" pega-se e não esquece.
Eu pensei ter "saído" de lá;puro engano. Continue a escrever.
Um abraço para sua filha e para si,Torcato