terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Guiné 63/74 - P3555: Navio "Carvalho Araújo". (António Matos)

imagem extraída de navios porugueses. Com a vénia devida.

"Carvalho Araújo" – verdadeiro símbolo nacional da altura Nestas curtas linhas limito-me a uma referência ao velhinho "Carvalho Araújo". Para mim era uma referência incontornável pois o comandante e herói José Botelho de Carvalho Araújo era meu conterrâneo e este barco perpetuava-lhe o nome! Ambos Vila-realenses, sabiam? Pois bem, a minha viagem para a Guiné foi genericamente agradável uma vez que, à excepção da aproximação a Cabo Verde, o mar era chão e a novidade do "cruzeiro" fazia disfarçar a missão que nos impingiram. As primeiras horas, porém, após a partida de Ponta Delgada, não auguravam nada de simpático uma vez que logo se seguiu o jantar e esse, foi digno de registo. Não pelas vitualhas que não recordo, de todo, mas duma operação logística com a qual se tentava compensar o balanceamento da embarcação. Serviram a sopa e levá-la à boca tornou-se uma prova de perícia na arte de bem manejar a colher! Aquilo parecia uma camioneta a curvar nas voltinhas do Marão! Ora agora adornava a bombordo ora agora a estibordo. Em cada uma destas oscilações, a sopa teimava em sair do prato e então era necessário pôr a colher do lado de fora para a "apanhar" quando se derramava pela mesa. Uma vez levada à boca, era urgente fazer a mesma operação para o outro lado, e assim sucessivamente. Devo confessar que cheguei a temer pelo enjoo de 10 dias consecutivos tão agoniado fiquei no fim da 1ª refeição. Felizmente que umas boas inspirações de ar puro no deck aliviaram as tonturas e tudo se normalizou. Se a memória não me atraiçoa, o paquete, após largar a carga no cais do Pijiguiti, regressou a Lisboa e nessa viagem, recordo, houve indicação de incêndio a bordo. Posteriormente arranjado, ainda rumou novamente à Guiné com grandes complicações que o seu fundo em cimento provocava. Finalmente em Lisboa, acostou ao cais da Rocha de Conde d'Óbidos e por lá deve ter apodrecido. Cheguei a vê-lo, abandonado à triste sina dos tempos, com um misto de nostalgia e pena por ver aquele símbolo nacional a agonizar.... Paz à sua alma! António Matos ex-Alf Mil da CCaç 2790 Bula 1970/72

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  Notas de vb: 1. Navio "Carvalho Araújo", misto de 2 hélices. Construído em 1929, em Monfalcone, Itália, por Cantiere Navale Trestino, foi registado na Capitania do porto de Lisboa em 21 Abril de 1930. Pertencia à Insulana, Cª de Navegação, e fez durante dezenas de anos a carreira para os Açores. Com cerca de 113 m de comprimento era movido por duas máquinas construídas em 1929, em Greenock - Escócia. Com uma velocidade normal a rondar os 12 nós, tinha capacidade para 354 passageiros com alojamentos para 10 passageiros em classe de luxo, 68 em primeira classe, 78 em segunda, 98 em terceira e 100 em cobertas. Serviam no navio 98 tripulantes. O "Carvalho Araújo" foi abatido ao efectivo em 1973. 2. Artigos de António Matos em 1 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3547: Um telefonema de Bula para a Metrópole...(António Matos)

2 comentários:

Anónimo disse...

Este vapor Carvalho Araújo, nos anos da minha juventude, escalava uma vez por mês a ilha (Velas de S. Jorge). Como quase toda a gente ia para o cais ver quem chegava e quem partia e era quase uma festa, passou a designar-se “dia de são vapor”.
Henrique Matos

joaquim costa disse...

Antônio Matos é um verdadeiro artista