sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Guiné 63/74 - P3354: Documentos (6): PAIGC - Docs (1): Comunicado de 27 de Abril de 1964 sobre a vitória na batalha do Como (Amílcar Cabral)

PAIGC > Documentos > "Amílcar Cabral e outros companheiros, a bordo de uma canoa, a caminho do I Congresso do PAIGC, Cassacá, 1964. Fotografia de Luís Cabral. [05359.000.020] · Documentos Amílcar Cabral (12/23)"

Foto (e legenda): © Fundação Mário Soares > Dossiers > Guiledje · Simpósio Internacional · Bissau, Guiné-Bissau · 1 a 7 de Março de 2008 > Fotografias (com a devida vénia...) (*)



Comunicado do PAIGC, datado de 27 de Abril de 1964, e assinado por Amílcar Cabral, regozijando-se com a "vitória" dos seus combatentes sobre as forças coloniais portuguesas na Ilha do Como (Janeiro a Março de 1964).

Fonte: Fundação Mário Soares > Dossiers > Guiledje · Simpósio Internacional · Bissau, Guiné-Bissau · 1 a 7 de Março de 2008 > Documentos

Pasta: 04602.110 Assunto: Comunicado do PAIGC sobre a vitória de Como

Termos de referência: Comunicado assinado por Amílcar Cabral, Secretário Geral do PAIGC, sobre a vitória na ilha de Como, com o relatório das acções militares ofensivas levadas a cabo pelos combatentes do PAIGC em Bula, S. Domingos e Catió.

Data: 27.ABR.1964

Nível 2:
04.PAI/PAIGC Nível 3: Comunicados/Mensagens Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral - Iva Cabral formato .pdf

Tradução do francês. L.G.

PAIGC – Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde

Secretariado Geral

Caixa Postal 298

Conacri – República da Guiné


Comunicado:

Em toda região sul do país, assim como noutras regiões onde chegou a notícia da expulsão das forças portuguesas da heróica Ilha do Como, o nosso povo manifesta a sua alegria perante esta vitória importante das nossas forças armadas. Através de mensagens entusiásticas, o nosso povo faz prova da sua consciência: a vitória do Como reforçou nele a certeza de que, com o heroísmo e o espírito de sacrifício dos nossos combatentes e das nossas populações, nós podemos, sob a direcção do nosso Partido, vencer a superioridade, numérica e em material, das forças portuguesas, e expulsá-las definitivamente do nosso país.

Se, por um lado, a vitória obtida pelas nossas forças na batalha do Como galvanizou a determinação do povo na luta, por outro lado ela contriuiu para aumentar a desmoralização tanto das tropas portuguesas destacadas no nosso pai como os próprios meios dirigentes portugueses.

Com efeito, notícias provenientes de Lisboa assinalam que uma onde de pessimismo e descontentamento invadiu os meios oficiais portugueses, sobretudo os militares, na sequência da derrota das forças portuguesas, aliás previsível desde há algum tempo. A censura não conseguiu esconder a irrupção de conflitos escaldantes à volta de Salazar, que começou a mandar regressar a Portugal certos elementos de confiança que se encontravam em missão no exterior.

Face à situação no nosso país, a pesada lembrança do caso de Goa pesa cada dia mais na memória dos chefes militares e políticos portugueses. E isto de uma maneira mais vergonhosa, por que são as nossas próprias forças armadas que estão em vias de bater as tropas coloniais portuguesas.

Por outro lado, enquanto centenas de famílias portuguesas procuram em vão conhecer a sorte dos seus filhos que fazem parte do contingentes enviados para o nosso país, dezenas de oficiais e sargentos – sem contar os soldados – acabam de ser presos nos quartéis, tanto em Portugal como na Guiné, por se terem recusado fazer a guerra colonial.

Reforçados pelas vitórias obtidas contra o inimigo, os nossos combatentes intensificam as suas acções, inspirados doravante pelo heroísmo e audácia dos combatentes do Como.

É assim que:

- No decurso de diversas emboscadas montadas nos últimos dias na região de Bula, 3 veículos foram destruídos, rendo sido mortos 12 soldados;

- Grupos de combatentes, depois de obrigar o inimigo a retirar, progridem em direcção à pequena cidade de São Domingos, situada no noroeste do país, perto da fronteira do Senegal;

- Em plena cidade de Catió, principal centro do sul do país, onde se encontra ainda uma guarnição portuguesa, um grupo móvel conseguiu fazer saltar um veículo blindado, cujos ocupantes foram todos mortos.

Redigido em 27 de Abril de 1964.

a) Amílcar Cabral, Secretário Geral.


____________ 

 Nota de L.G.:

(*) A Fundação Mário Soares participou e apoiou o Simpósio Internacional "Guiledje: Na rota da Independência da Guiné-Bissau", que se realizou em Bissau, de 1 a 7 de Março de 2008.

Neste âmbito, o Arquivo & Biblioteca da Fundação Mário Soares preparou um conjunto de documentos e fotografias relacionadas com Guiledje, com recurso, designadamente, ao Arquivo Amílcar Cabral. Contou igualmente com o apoio do nosso blogue, que disponibilizou alguns documentos e imagens.

2 comentários:

Luís Graça disse...

"Quando me deixou só,[o Dr. Mário Pádua,] comecei a ler aquela folha e fiquei muito desanimado. À medida que a ia lendo, ia perdendo a vontade de continuar. Não entendia nada de política, mas qualquer um perceberia que aquela carta era uma condenação. Eu ia dizer à minha mulher para não se preocupar comigo. Que estava muitíssimo bem e não me faltava nada. Que tivesse confiança, pois mais tarde ou mais cedo iria ter comigo, onde quer que eu estivesse. E pelo meio destas mensagens cheias de esperança dizia-se que quem tinha a culpa de tudo era Salazar…Que Salazar e Tomás eram doidos e o Cardeal Cerejeira também. Mesmo ignorante, logo percebi que jamais voltaria a Portugal sem problemas gravíssimos"...

Ainda não li o livro do David Gomes, não conheço a sua génese, nem sequer sei se ele foi ajudado, por alguém, jornalista ou outro, na conceção, redacção e publicação do seu livro... É um livro de maturidade, publicado em 2004, quando o autor está prestes a entrar nos 60... Não é um livro escrito, quando as memórias ainda estavam frescas, por exemplo, a seguir ao seu regresso a Portugal...

Choca-me,em todo o caso, o excerto que transcrevo logo à cabeça deste comentário. O PAIGC tem obviamente todo o interesse em instrumentalizar, politizar, aproveitar, para efeitos de propaganda, a "infeliz" deserção do David Gomes...

Em abono da verdade, o nosso camarada não desertou, foi apanhado pelo PAIGC fora do seu aquartelamento, por estar desorientado e ter feito uma besteira... Não se entregou ao PAIGC, fez o número que lhe convinha quando foi feito prisioneiro... E manteve esse número por uns tempos. Passou a ser considerado, lisongeado, ganhou inclusive a liberdade...

A carta à mulher é que é dura de roer... Será possível que um homem, com a craveira intelectual, humana e profissional, do Dr. Mário Pádua, lhe tenha feito "essa maldade" ? Um guineense ou um caboverdiano do PAIGC podia fazê-lo... Mas um português sabia que o David tão cedo não poderia juntar-se livremente à mulher e aos filhos... O David não era um intelectual, um antifascista, um homem politizado, informado, consciente... Era apenas, na época, um pobre diabo de um soldado raso...

É possíbel que esta história esteja mal contada, ou que a versão dos acontecimentod possa estar um pouco enviesada pela distância temporal...

Eu sei que, do nosso lado, também se obtinham, com relativa facilidade, dos prisioneiros do PAIGC, "confissões e declarações" que nos eram politicamente favoráveis... A PIDE/DGS (e alguns militares) tinha os seus argumentos assaz convincentes...

Aqui, ou melhor, em Ziguinchor, no Senegal, utilizaram a ingenuidade do pobre David... O PAIGC não precisava disso para nada... A ser verdade o que se passou (refiro-me ao conteúdo da carat), é decepcionante... Não sei se há mais versões desta história, a começar pelo testemunho do dr. Mário Pádua, hoje um homem de paz... Talvez que ele nos possa (e queira) esclarecer este ponto, que me incomoda...

L.G.

Anónimo disse...

Em toda a região sul do país assim como noutras regiões onde chegou a noticia da expulsão das forças portuguesas da heróica ilha do como,
Redigido em 27 de Abril de 1964
O secretário geral Amílcar Cabral
COMENTÁRIO
É difícil responder a este parágrafo
sem ser com um desmentido.
Neste espaço de tempo de Janeiro a Dezembro de 1964 não houve nenhuma expulsão das forças portuguesas da Ilha do Como.
O batalhão de Cav. 490 saiu sem qualquer problema, a 23 ou 24/03/1964 quando foi dado como terminada a operação tridente.
A C.C.557 saiu do cachil em 27/11/64 deixando lá a C.C.728.
Como é que os historiadores das gerações vindouras, poderão fazer fazer uma análise da história, com um documento destes com esta carga politica.
Hoje é possível dizer e afirmar o que na realidade se passou, porque ainda há muitos que viveram esses dias,inclusive o autor do comentário, mas amanhã é o que está escrito que será discutido.
20/10/2008
Colaço