domingo, 12 de outubro de 2008

Guiné 63/74 - P3301: História da CCAÇ 2402: Em Mansabá não se passava nada...(João Bonifácio)

Ataque a Mansabá em 03 Abril de 1969


1. Mensagem do João Bonifácio, membro da nossa Tabanca Grande, que vive no Canadá:

Olá Luís.


Desculpa o incómodo. Achei que devia enviar uma nota acerca da narrativa do Raul Albino (*), e enviei um e-mail para o nosso camarada Carlos Vinhal, mas veio devolvido. Foi por isso que decidi enviar o mesmo à tua atenção para revisão e publicação se achares que a minha nota tem algum interesse.

O Raul mencionou que o Cap Vargas Cardoso não gostava do modo "abandalhado" como a guerra era vivida em Mansabá. Também eu tive a prova disso, lamentavelmente.


Um grande abraço e "Have a good weekend".

João G. Bonifácio
Ex-Fur Mil do SAM
CCaç 2402/BCaç 2851
Guiné 1968/70

_______

Histórias da CCaç 2402

por João Bonifácio
Ex-Fur Mil do S.A.M.
CCaç 2402/BCaç 2851
Có - Mansabá - Olossato
1968/70



Caro Amigo.

Os meus melhores cumprimentos. De vez em quando visito esta Tabanca para ver o que há de novo e para aprender sobre tudo o que passou há tantos anos e quando éramos ainda uns jovens.

A narrativa do meu amigo e ex-alf mil Raul Albino, pelo que me lembro, corresponde à verdade do que se passou nessa noite (*).

Apenas um pormenor escapa, mas não é de admirar, pois viver em Mansabá era tarefa simples para um militar, que como eu, ficou sem fazer nada. Contudo, desejo dizer-lhes que na noite do ataque a Mansabá, relatado pelo Raul Albino, para minha infelicidade, eu estava de sargento de dia à CCAÇ 2402.

Como sempre fui um militar que se preocupava com os detalhes de tudo, decidi numa das rondas aos postos de Mansabá, fiscalizar e verificar o estado das armas e munições que ali se encontravam. Esta ronda era feita com uma viatura de transporte pequena pois a área a cobrir era imensa, para ser feita pelo lado de fora dos postos.

Nesse dia verifiquei que nenhuma das armas estava limpa, bem pelo contrário, podiam ver-se mostras de alguma corrosão, e as munições para além de não estarem devidamente colocadas nas caixas (havia munições pelo chão que até nos deixou sem fala), mas as que estavam nas armas estavam já cheias de verdete.
Enfim, como era minha norma dei conhecimento e até falei com o Sargento de Material de Guerra da minha companhia acerca do assunto, e compreensivelmente, nada foi feito, pois a nossa posição era, para além da protecção das obras da estrada mencionada pelo Raul, a de esperar que nos mandassem para outro lado.
Foi um tempo difícil de passar pois os especialistas da formação ficaram sem nada para fazer.

Voltando à ronda que fiz em Mansabá e esta já por volta da 10 da noite, tudo correu normalmente até que eu e o condutor percorríamos o trajecto do lado da pista. Foi nessa altura que senti um arrepio de frio, pois pareceu-me ouvir barulho não muito longe. Ordenei ao condutor para desligar os faróis e regressar ao interior do quartel. Lembro-me de ter falado com alguns militares, mas fiquei apenas frustrado porque nada se fazia.

Uns diziam que nada se passava em Mansabá. Ouvi que eu estava a ver coisas a mais, etc. Mas o que mais me feriu foi o facto de me dizerem "Oh João, afinal o que é que percebes destas coisas, se o teu papel é dentro do arame farpado?"



Mansabá . Alguns dos feridos esperando evacuação para Bissau. Foto de Raul Albino (?).

Pois é. O resto já o Raul mencionou. Sei dos muitos feridos na minha companhia, muitos porque na sua fuga para os locais estabelecidos, e como estavam deitados e descalços, acabaram por se cortar com os vidros das garrafas de cerveja, que eu notei logo que cheguei a Mansabá.

Este quartel até não era mau, mas estava "abandalhado" , pois ninguém passava cartão a nada.
Deste dia que não esqueço, apenas lamento, que as minhas suspeitas não tivessem sido consideradas.

Se fosse a CCaç 2402 a operar e conhecendo o Cap. Vargas Cardoso, tenho a certeza de que as armas e munições estariam em perfeita condição, assim como a situação que mencionei durante uma ronda à noite, tinha sido investigada. Assim não foi, e agora apenas podemos contar a história.

Obrigado por me terem permitido este anexo para a história de Mansabá e da CC2402, e também ao Raul Albino pela sua magnifica narrativa.

Um abraço amigo.

João G. Bonifácio
___________

2. Nota de vb:

- Gratos pelo teu apontamento à História da CCaç 2402. Recebe um abraço dos teus Camaradas.

Sem comentários: