segunda-feira, 17 de março de 2008

Guiné 63/74 - P2653: O regresso dos mortos (A. Marques Lopes)

2.º Sargento Justino Teixeira da Mota, pai do António Teixeira Mota

1.
Vem a propósito do P2651 "História de Vida (11): A luta incessante de António Teixeira Mota", recuperar um texto que o nosso camarada António Marques Lopes nos enviou em fins do ano passado.

Com as devidas desculpas ao nosso camarada, algumas partes foram retiradas uma vez que foram afloradas no post já publicado.
Fica a certeza que o mais importante está aqui, assim como os seus comentários sentidos e oportunos.
C.V.

2. Dizia Marques Lopes em mensagem de 21 de Novembro de 2007

Estive hoje (20 de Novembro) com o António Teixeira da Mota no restaurante Bajú, em Leça do Balio.

As lágrimas soltaram-se-me, não tenho vergonha, ao ouvir a narração de um filho que fez todos os esforços para devolver o corpo do seu pai, morto na guerra colonial, à família e à sua terra.

Teve a circunstância de um amigo em posição privilegiada para o ajudar, o então Coronel João Afonso Bento Soares (agora Brigadeiro reformado). Gastou do seu bolso várias centenas de dólares, mas conseguiu-o com o seu esforço.

Um exemplo de dedicação pessoal de um filho, uma chapada na falta de esforço e dedicação das entidades oficiais que nada fazem para trazer os nossos mortos (nem os de antes nem os de agora).

Como diz a contra-capa do livro: "Luta Incessante" é a história da determinação de um filho na busca da memória do pai. Uma história em torno das facetas menos conhecidas da vida dos militares portugueses nas ex-colónias.

É a luta de quem recuperou os restos mortais de um Sargento falecido e sepultado em Angola no ano de 1962, e que encontrou pelo caminho inúmeras contrariedades, mas também a solidariedade de novos amigos, de antigos combatentes do Ultramar e de muitos que desinteressadamente apenas o quizeram ajudar.

Um relato forte, como só o pode ser as palavras de um filho que, finalmente, reencontrou seu pai.

É um caso em Angola, mas podia ser o caso dos quase trezentos que ficaram sepultados na Guiné, ou perdidos nas suas matas e nos seus rios, alguns até no Senegal (em Cumbamori) ou na República da Guiné (em Conakry). Toca-nos a todos, a nós ex-combatentes, mas não aos governantes.

(...) 10 contos em 1962 era para brincar com a pobreza do povo e para evitar as trasladações que agitariam as mentalidades em relação à guerra. Mas agora? Porquê? Talvez a espectativa que o esquecimento lance uma poeira sobre ao passado.(...)

Quantos filhos e esposas de mortos na Guiné não desejariam ter os seus pais e esposos sepultados onde os pudessem afagar com flores... e lágrimas também? Mas há muitos que não têm esse benesse. Porque alguém não se esforça, ou não se interessa, porque é passado e não valerá a pena...


Segue-se um poema do António Teixeira Mota

Procurei...

Nos caminhos onde andaste
Nas paradas onde formaste
Nas avenidas onde desfilaste
Também andei, formei e desfilei...

Nas casernas onde moraste
Nas camas onde deitaste
Nos objectos onde tocaste
Também morei, deitei e toquei...

Nos sítios onde pisaste
Nos bancos onde sentaste
Nas árvores onde descansaste
Também pisei, sentei e descansei...

Naquelas paragens eu fui...
Andei, formei, desfilei
Morei, deitei, toquei
Pisei, sentei, descansei
Procurei... procurei... procurei...

Naquelas paragens eu fui
Atrás de ti, para te buscar...
Sinais de ti, eu descobri
Mas a ti, já não consegui encontrar...


Vou ler o livro

O António Mota conhece uma senhora que lhe pediu para saber da sepultura de um irmão que lá ficou na Guiné.

Eu dei-lha, do livro da CECA:

José Maria Fernandes Carvalho, Soldado da CCAÇ 1566, morreu a 25 de Agosto de 1966 em S. João por doença, natural de Aião, Felgueiras. Sepultado no Cemitério de Bolama, Campa 25, Guiné

A. Marques Lopes

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