quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Guiné 63/74 - P2186: Uma guerra, duas vitórias: entrevista de Diana Andringa à RTP África (Luís Graça)

Guiné > Zona Leste > Paunca > Pós 25 de Abril de 1974 > Confraternização entre os guerrilheiros do PAIGC e as NT (CCAÇ 11): vd. post de 30 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1636: Álbum das Glórias (10): Paunca, CCAÇ 11: Com o PAIGC, depois do 25 de Abril de 1974 (J. Casimiro Carvalho)

Fotos: © José Casimiro Carvalho (2007). Direitos reservados.

Texto de L.G.:

Em entrevista à RTP África, hoje, às 14) , a Diana Andringa falou da génese e do conteúdo do filme-documentário “As Duas Faces da Guerra”, realizado por ela e por cineasta guineense Flora Gomes (1).

Os exteriores foram filmados nos três países envolvidos na guerra (Portugal, Guiné-Bissau e Cabo-Verde, sendo os dois últimos antigas colónias portuguesas), se bem que tenha havido combatentes de outros países que também participaram, do lado do PAIGC, na luta de libertação. Foi o caso de Cuba, por exemplo (Oficialmente, Cuba perdeu 9 combatentes durante a guerra de libertação da Guiné, entre 1966 e 1974; em Janeiro de 1966, Amílcar Cabral visitou Cuba, no âmbito da I Conferência Tricontinental, de que foi co-fundador)(2).

Na Giné-Bissau, as filmagens de "As Duas Faces da Guerra" foram feitas em Bissau, Mansoa,Geba, Bafatá, Gabu, Guileje... Na primeira visita que tinha feito à Guiné-Bissau, a Diana Andringa ficou fortemente impressionada com o sentimento geral, recolhido das conversas com os antigos combatentes do PAIGC, de que “nós nunca lutámos contra os portugueses, vocês eram igualmente vítimas do mesmo sistema político que nos oprimia”… Em suma, foi uma guerra que não deixou sentimentos de ódio entre os dois contendores.

Diana Andringa conheceu Flora Gomes, nascido em 1949, em Cadique, quando este estava a realizar “Morte Negra” (o seu primeiro filme, "Motu Nega", 1987). O desejo de fazer um filme sobre a duplicidade daquela guerra, terá nascido quando um dia, em 1995, em Geba, perto de Bafatá, no antigo aquartelamento das tropas portuguesas, descobriu uma pedra, que fazia parte de um monumento funerário, e onde constava o nome de dois soldados, mortos precisamente no dia em que a jornalista e realizadora portuguesa fazia 20 anos, ou seja, em 21 de Agosto de 1967 (3)…

Percebeu depois que as memórias podiam apagar-se nas pedras (ainda para mais na Guiné, em que a natureza rapidamente destrói a obra dos homens), mas que é mais difícil destruí-las na cabeça das pessoas…

Referiu depois alguns pontos fortes do filme, além da fotografia e do som, e do trabalho em equipa: dois soldados portugueses, cujo grupo cai numa emboscada, e que assistem a camaradas feridos, voltam a rever hoje, com lágrimas, a cena de há trinta e tal anos … Pode não haver (nem há) stresse pós-traumático em todos os combatentes, nomeadamente entre os portugueses, mas todos ficaram marcados…

No filme, ouvem-se depoimentos de gente que combateu nos dois lados, portugueses, caboverdianos e guineenses… Os primeiros mais comedidos, os guineenses muito mais espontâneos e soltos, dotados de grande oralidade (“São mesmo grandes contadores de histórias”). E mais uma vez, não há ódio no rosto e no coração dos guineenses entrevistados, mesmo naqueles que foram presos e torturados pelos portugueses…

Diana fala então da duplicidade, das duas faces desta guerra. Aliás, como em todas as guerras. Mas esta termina com 2 vitórias: por um lado, a independência da Guiné-Bissau (já declarada em 24 de Setembro de 1973 em Madina do Boé, e rapidamente reconhecida pela comunidade internacional); por outro, a solução política, que foi o 25 de Abril de 1974.

Hoje os antigos militares portugueses regressam à Guiné-Bissau em roteiro de saudade, também sem ódio, e utilizam os recursos da Internet para reorganizar, escrever e divulgar as suas memórias. Diana deu, como exemplo, “o conhecido blogue de Luís Graça & Camaradas da Guiné”.

Um dos entrevistados no filme é o antigo comandante do COP5, que deu a ordem para abandonar Guileje (4). No filme aparece a esposa de Coutinho e Lima a defender esta difícil e corajosa decisão do marido que permitiu salvar 600 vidas (os homens do PAIGC que cercavam o aquartelamento e a tabanca de Guileje, não tinham outra alternativa senão chacinar toda a gente). Pergunta a esposa de Coutinho e Lima:
- O que vale a Pátria ao lado de 600 vidas que se salvam ?

A música do filme foi criteriosamente escolhida, tendo a selecção incidido em canções que marcaram a época (do lado português, Adriano Correia de Oliveira e Zeca Afonso); do lado guineense, temas que inspiravam a guerrilha mas também músicas compostas hoje pelo Flora e o grupo com quem trabalha (O Grupo de Teatro Os Fidalgos, de Bissau) (5).

Diana e Flora quiseram pôr os protagonistas daquela guerra a contar as suas histórias. Diana voltou desta experiência, não com uma mudança de perspectiva (política) da guerra colonial / guerra de libertação – ela que, nascida em Angola, desde sempre se opôs à guerra colonial e admirava Amílcar Cabral – mas com outra noção, outro conceito dos soldados portugueses que rapidamente eram confrontados com a realidade do quotidiano dos povos da Guiné, e compreendiam que aquela terra não podia fazer parte de nenhum glorioso Império Português, do Minho a Timor…

O filme foi “arrancado a ferros” (leia-se: feito com um escasso orçamento), sendo financiado pela RTP e pelo INCAM. Depois da sua estreia em Bissau e em Lisboa (no doclisboa2007, na próxima 6ª feira, dia 19), irá ser exibido na RTP em duas partes (esta inevitável mas lamentável partição é imposta pelos compromissos da programação e publicidade da estação televisão pública).

Diana tem, por fim, uma palavra de grande admiração pelo fundador e líder do PAIGC, de quem diz Manecas dos Santos:
- Amílcar Cabral era insubstituível…

Quem o assassinou (ou mandou assassinar) bem sabia que há homens que são insubstituíveis em certos lugares e tempos da história. Nelson Mandela, Amílcar Cabral…Todos teriam ganho, a Guiné e a própria África hoje seriam seguramente diferentes se ele fosse ainda fosse vivo e tivesse assistido à vitória da luta de libertação (6)…

________

Notas de L.G..

(1) Vd. post de 8 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2165: As Duas Faces da Guerra, filme-documentário de Diana Andringa e Flora Gomes, no DocLisboa2007 (18-28 Outubro 2007)

(2) Vd. post de 12 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P956: Antologia (48): Félix Laporta, o primeiro cubano a morrer, num ataque a Beli, em Julho de 1967

(3) Vd. post de 22 de Junho de 2005 > Guiné 69/71 - LXXIII: Antologia (4): 'Homenagem aos mortos que tombaram pela pátria': Geba, 1995 (Diana Andringa)

(4) Vd. post de 27 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2137: Antologia (62): Guileje, 22 de Maio de 1973: Coutinho e Lima, herói ou traidor ? (Eduardo Dâmaso / Luís Graça)

(5) Vd. post de 10 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1831: Macbeth em África ou Namanha Makbunhe no Teatro da Trindade, com os Fidalgos, grupo de teatro de Bissau (Beja Santos)

(6) Vd. post de 12 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1066: Homenagem a Amílcar Cabral, o Inimigo Libertador (João Tunes)

4 comentários:

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