sexta-feira, 9 de fevereiro de 2007

Guiné 63/74 - P1510: Os heróis do Chão Manjaco e o Alferes Giesteira (Paulo Raposo)


Guiné > Bissau > 1970 > Uma fotografia dos três majores que foram assassinados, no chão manjaco, em 20 de Abril de 1970: da esquerda para a direita, Pereira da Silva (1º), Passos Ramos (2º) e Magalhães Osório (4º). Há um quarto oficial, um alferes (o 3º, na fotografia, assinalado com um círculo a vermelho), que o Paulo Raposo identifica como sendo um dos seus antigos camaradas de Mafra, do Curso de Oficiais Milicianos, de apelido Giesteira (o Paulo não tem a certeza). [, Fernando Giesteira].

Em contrapartida, não há nenhum apelido destes na lista dos nossos camaradas que tombaram na Guiné. O Alf Mil que morreu, juntamente com os três majores naquela data fatídica, foi o Joaquim João Palmeira Mosca, natural do Redondo (1)

Foto: Maria da Graça Passos Ramos / Círculo de Leitores. In: ANTUNES, J.F. - A Guerra de África: 1976-1974. Vol. I. Lisboa: Círculo de Leitores. 1995. p. 373. (Com a devida vénia...).



Mafra > Escola Prática de Infantaria (EPI) > 1968 > Cerimónia do Juramento de Bandeira > Desfile dos novos militares onde se integrava o Paulo Raposo, frente ao Convento de Mafra (2). E muito provavelmente o futuro Alferes Giesteira (será que o apelido está correcto ?), que aparece na foto anterior, juntamente com os majores Pereira da Silva, Passos Ramos e Magalhães Osório.

Foto: © Paulo Raposo (2006). Direitos reservados.


Mensagem do Paulo Raposo, um dos baixinhos de Dulombi (CCAÇ 2405, 1968/70):

Caro Luís,

O Alferes que está na foto (3) era do meu pelotão de instrução em Mafra. Julgo que o nome dele era Giesteira, mas não estou certo. O baixinho do Beja Santos também é capaz de se lembar bem dele.

Quem deu ordem de os liquidar (4), sabia o que estava a fazer. Pois bloqueando a solução da Guiné, levava à revolta do pessoal que levou ao 25 de Abril.

Diga-se de passagem, eu não gostava do regime, nem um bocadinho. Isto que temos é que não é nada, e havia forçosamente alguma coisa de melhor entre os dois. Saímos da merda para entrar na caca.

Um abraço

Raposo

______

Notas de L.G.:


(1) Vd. lista disponível, em formato pdf, no sítio do António Pires > Moçambique - Guerra Colonial > José da Silva Marcelino Martins > Militares que Tombaram em Campanha (1961-1974) > Guiné

(2) Vd. post de 12 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCXCVI: O meu testemunho (Paulo Raposo, CCAÇ 2405, 1968/70) (1): Mafra

(3) Vd. post de 8 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1503: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M.F. Sousa) (6): Fotografia dos três majores (Sousa de Castro)

(4) Vd. dossiê organizado pelo nosso camarada Afonso M.F. Sousa:

17 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1436: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M.F.Sousa) (1): Perguntas e respostas

18 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1445: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M.F.Sousa) (2): O papel da CCAÇ 2586 (Júlio Rocha)

19 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1446: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M. F. Sousa) (3): O depoimento do 1º sargento da CCAÇ 2586, João Godinho

27 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1465: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M.F. Sousa) (4): Os majores foram temerários e corajosos (João Tunes)

6 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1500: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M.F. Sousa) (5): Homenagem ao Ten-Cor J. Pereira da Silva (Galegos, Penafiel)

2 comentários:

augustoM disse...

Caros camaradas

É a primeira vez que visito o vosso blog. Tenho 67 anos, conheci a Guiné, não como militar mas como civil, mas durante o tempo que lá andei, especialmente pelo mato, fiquei com uma ideia de como se fazia a guerra. Sobre isso não me vou pronunciar, mas gostaria de apresentar o registo da minha memória histórica. Fiz o serviço militar entre 63 e 66, como enfermeiro militar, sempre no Hospital Militar Principal em Lisboa. Não fui para o Ultramar por haver uma crónica falta de pessoal no hospital.

Vejo em todos uma vontade de contar o que aconteceu, a sua versão dos acontecimentos, empolar este ou aquele acontecimento, conforme o julgam mais ou menos importante. Mas a guerra é isso mesmo, uma sucessão de factos cruéis, sobre os quais não temos controle e, que temos de admitir a sua existência como uma coisa normal. Não há guerras decentes nem boas guerras, só guerras onde a crueldade é o seu paradigma.

A nossa guerra africana, foi uma guerra como todas as outras, com as suas particularidades, mas foi uma guerra como qualquer outra. A mim o que me choca, não é tanto o que acontece na guerra, na sua rotina de insegurança, medo, desespero e morte.

Os rambos são do cinema, a guerra é feita por pessoas normais com todas as suas fragilidades, que têm de ser aceites tal como o são, pois é com elas que contamos para combater.

Mas o que vejo de mais injusto e cruel, não é bem a zona de combate, onde as memórias são mais profusas e abundantes, como se a guerra ficasse circunscrita ao terreno do combate.

Sem combater, vivi as três frentes de guerra ao mesmo tempo, onde durante três anos como enfermeiro, convivi com esses despojos da juventude, para quem a guerra nunca acabou e que o abandono os ignorou. Absolutamente horrível, não é morrer, diziam alguns deles, é viver como um morto. São estes “mortos” que não constam da vossa lista e, são muitos, a quem vou dedicar um livro em breve.

Se me permitirem gostaria de vos continuar a visitar e comentar.

Furriel miliciano enfermeiro Augusto Dias

augustoM disse...

A vã glória de se ter sido grande

Há dias vi um programa na TV sobre a guerra “colonial”, que procurava perceber a causa da actual proliferação de tanta literatura sobre o assunto.
A guerra “colonial” com todas as outras guerras maiores ou menores, mundiais ou regionais, não passam do único processo que o homem tem de resolver os seus diferendos. Selvagem, aquém a evolução ainda não consegui sublimar os instintos predatórios primários, o homem encara e sempre encarou, a guerra como uma das suas principais atribuições, no seu mundo dito “civilizado”. Tal acontece, por desprezar a existência do seu semelhante, que elimina, sem pestanejar, sempre que acha necessário. Este acto de eliminação não é incriminado por nenhum código penal, pois o fazer a guerra, é ter autorização para matar impunemente e, não me venham com essa treta das regras da guerra, nela vale tudo de acordo com as necessidades. Protegida pelo “código de honra da guerra”, a barbárie indiscriminada é de todas as bandeiras e, a perversidade aceite como táctica. Numa guerra nunca há um lado bom ou um lado mau, só há um lado sem qualquer qualificação, onde sem nó nem piedade se soltam os cavaleiros do Apocalipse. Maldita condição humana; A GUERRA.
De tudo o que ouvi, das causas da presente literatura dedicada ao conflito africano, chamemos as coisas pelo seu nome, nada de alcunhas de circunstância, não me ficaram mais do que subjectivas interpretações, produto da factualidade da vivência, por isso limitada, destes novos salvadores da honra nacional. A literatura não abundou anteriormente, por que nós por cá, interpretámos a guerra africana, não como um conflito para onde as forças das circunstâncias nos tinham atirado, mas de como, algumas “mentes brilhantes”, complexadas e comprometidas, defendiam, um acto criminoso, efectuado por criminosos, a mando de criminosos.
Como é que uma pessoa, cuja acção é considerada criminosa, pode falar dela? Como é que uma pessoa, por contar uma história de sangue, suor e lágrimas, a sua própria história, é considerada criminosa?
Hoje, com o declínio dos opiner maker da desgraça, que só viam na guerra africana, nada mais do que um chorrilho de massacres praticados pelos intervenientes portugueses, as pessoas começam a contar as suas vivências e com elas formar a história dessa guerra, não abjecta como muitos nos querem fazer crer, mas de uma inevitabilidade factual, que levou milhares e milhares de jovens, abnegadamente, a defender a Pátria. Relembrar os que voltaram e nunca esquecer os que lá ficaram, é mais que uma obrigação, é um dever.
Falar mal da nossa gesta africana é pôr toda a nossa história em causa. O D. Afonso Henriques, que recusou ser vassalo e foi matador de mouros, os nossos grandes navegadores, desde o Bojador até à Índia dos marajás, os que aportaram à Taprobana, Calecut e a malta do Malabar, os intrépidos da China dos mandarins e do Japão dos samurais, os almirantes do Índico, os mercadores das especiarias, os que nos apresentaram ao Mundo, os que se afogaram, os que foram mortos pela espada, os que apodreceram com escorbuto, os que mirraram nas prisões, os que ninguém conheceu e não fala deles, os que naqueles tempos, defenderam os de hoje, quem sabe até, se na fúria doentia de tudo querer deitar borda fora, queiram considerar o Condestável um general criminoso, por ter feito o castelhano cair na armadilha e depois foi um matar que fartou. Eu, só choro Alcácer Quibir e agradeço a Camões, por mim e pela Pátria.
Nós não passamos daquilo que somos, uns mesquinhos que, para ganhar notoriedade, passamos a vida a dizer mal de nós próprios.

Furriel miliciano enfermeiro Augusto Dias