terça-feira, 19 de dezembro de 2006

Guiné 63/74 - P1381: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu regresso (6): comandos de Brá em 1965, crime e castigo (João S. Parreira)







Guiné > Brá > Insígnias dos grupos de comandos constituídos em Brá (1963/66).

Fotos: © Virgínio Briote (2006). Direitos reservados. (Reproduzido do blogue Tantas Vidas, com a devida vénia...).

Mensagem do João S. Parreira, ex-furriel miliciano comando (Brá, 1964/65)

Natal/Ano Novo dos 4 Grupos Comandos em Brá - 1965
por João Parreira

Na véspera de Natal daquele ano o Comandante do Batalhão que se encontrava aquartelado em Brá, decidiu dar uma festa, mas apenas para os militares do seu Batalhão.

Assim, para a festa de Natal foi colocado na estrada alcatroada que virava para a direita do interior do aquartelamento um estrado de madeira (palco) rodeado por um palanque.

Com a festa a decorrer naquele fim da tarde, pois o barulho ouvia-se no meu quarto, saí com intenção de pedir boleia a algum jipe que nessa altura saísse para Bissau, pelo que tive necessariamente que passar por detrás do palanque. ´

De passagem parei por detrás dos convidados e ainda ouvi o final de uma anedota contada pelo militar que naquela altura estava em cena.

Logo a seguir fizeram um intervalo e muitos dos assistentes sairam dos seus lugares e foram dar uma volta. Nesta altura um soldado de um dos grupos de comandos que ia a passar, vendo que o estrado estava vazio, decidiu subir e começou a cantarolar.

De imediato o Comandante do Batalhão mandou prendê-lo. Presenciei a cena e fiquei revoltado e indignado. Ouviram-se depois muitas vozes em uníssimo gritar:
- É Natal, soltem o rapaz...soltem o rapaz...soltem o rapaz!

Mas o rapaz não foi solto. Não muito tempo depois, no local da festa, explodiu uma granada ofensiva, que provocou uma cratera no asfalto e fez com que várias lascas de madeira saltassem em várias direcções, ferindo ligeiramente alguns dos presentes.

O rebentamento da granada coincidiu com a entrada em Brá de uma viatura transportando o Comandante-Chefe, General Arnaldo Schultz, que por sinal se cruzou à saída com um jipe que me estava a dar boleia, e que a meu pedido me deixou ficar na estrada, perto da morança da Alda Mendonça, filha do Régulo de Bula. No dia seguinte vim a saber que alguém comentou que tinha sido algum comando, e que o General tinha dado ordem para não permitir a saída de nenhum comando, e mandar recolher os que se encontrassem em Bissau.

Foi mandado realizar um inquérito para averiguar responsabilidades, e subsequentes punições. Se as mesmas não dessem resultado, os 4 grupos seriam enviados para vários aquartelamentos no interior do país, por um período de 3 semanas.

Como o resultado foi infrutífero, o meu Grupo - que já não eram os Fantasmas, mas os Apaches, liderados pelo Mário Dias - foi reforçar o quartel de Bigene, onde a passagem de Ano foi passada em abrigos pois estava-se à espera de um ataque. Os Vampiros foram para Guileje. Os Diabólicos já não sei para onde, tal como os Centuriões (2)...

Com um abraço.
João Parreira

PS - O João acaba de mandar Vê se consegues corrigir ou fazer um P.S. pois no Natal 1965, Naquela altura o meu Grupo era os Apaches ,liderado pelo Mário Dias.

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Nota de L.G.:

(1) Vd. post de 3 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74- CCCXXX: Velhos comandos de Brá: Parreira, o últimos dos três mosqueteiros (Luís Graça / Virgínio Briote / Mário Dias / João Parreira)

(...) "É um privilégio reunir nesta tertúlia três veteranos da guerra da Guiné. E mais do que isso, três mosqueteiros dos velhos comandos dos primeiros anos de guerra (1963/66). Estou referir-ne, por ordem cronológica de chegada a esta tertúlia, aos milicianos Virgínio Briote (alferes), Mário Dias (2º sargento) e, agora, João Parreira (furriel). Este é o mais recente membro da nossa tertúlia. Pedi aos dois primeiros para o apresentarem. Aqui ficam as palavras destes três sábios guerreiros que, contrariamente a muitos de nós, foram voluntários e conheceram a Guiné, de lés a lés. O Mário, inclusive, participou na mítica batalha da Ilha do Como (1964).

(...) "Mensagem do Virgínio Briote:

(...) "E agora pede para entrar o João Parreira, uma das lendas vivas dos velhos comandos de Brá. Andou pela Guiné toda, viu camaradas a morrer mesmo ao lado dele, foi evacuado no mesmo heli que transportou para Bissau o corpo do Furriel Morais. E tanta coisa que o João pode contar, se quiser!

"Luís, parabéns pela obra que estás a erguer. Ninguém ainda a tinha feito desta forma, sem recriminações, sem bons e maus. Apenas combatentes, de um lado e doutro. Com mais ou menos vontade, uns e outros cumpriram a missão de que os encarregaram" (...).

(2) Segundo informação do João, no Natal de 1965, já não existiam os Grupos Fantasmas, Panteras e Camaleões.

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