quinta-feira, 23 de novembro de 2006

Guiné 63/74 - P1309: Verdi a régulo do Cuor, já! (Torcato Mendonça)

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Guiné-Bissau > Região Leste > Bambadinca > Missirá > 1970 > Pelotão de Caçadores Nativos 54... "Antecipo o que naquela noite, lá pelas duas horas, aconteceu. Um deslumbramento. Ouve-se forte barulho de vozes, de cânticos. Levantam-se os militares. Com olhares extasiados (...)" (TM)


Foto: © Mário Armas de Sousa (2005). Direitos reservados


Escreve-me, o fim da tarde de ontem, o Torcato Mendonça esta nota, com bonomia, sabedoria e humor:

Luís Graça:

Leio certos textos e, apesar de gostar, sinto que... não foi aquela a minha guerra.

Comento com o C. M. dos Santos, por telemóvel ou escrito. Há dias ele pedia-me para eu falar de certos assuntos. Curiosamente respondi-lhe:
- Só falado...

E o Beja Santos escreve aquele e-mail. De facto nem tudo se diz (1). Mas a História tem que ser feita: Em verdade. Os cronistas do reino finaram-se.

Li a visita do Ten-Cor Pimentel Bastos ao Cuor (2). Em Mansambo foi recebido como as imagens documentam. Dissemos-lhe:
- Viver assim é muito duro! - As imagens atestam-o.

Dedilhando a tecla, sem interesse nem intenção de enviar, acabei por escrever esse texto em anexo... Não é crítica a nada nem a ninguém. A vida da [CART ] 2339 foi dura para todos nós...

(i) Foi a intervenção – conhecíamos bem o Mato Cão e Enxalé e a última operação foi a poucos dias do embarque;

(ii) Foi a construção do quartel...

(iii) Foram as autodefesas...Foi... E ponto final.

Leio textos de gente que passou bem pior. Era a guerra!

Depois escrevo.

Um abraço,
Torcato Mendonça

Verdi a Régulo do Cuor

Antecipo o que naquela noite, lá pelas duas horas, aconteceu. Um deslumbramento.
Ouve-se forte barulho de vozes, de cânticos. Levantam-se os militares. Com olhares extasiados, a que assistem?

Vestidos de deslumbrantes fatos, seis escravos - Fulas claro - com os corpos reluzentes pelos finos óleos neles passados. Seguram, apoiando nos fortes ombros, um doirado andor. Escravas fulas, belas nos seus trajes, ladeiam-no, seis de cada lado. Seguram varas de rico pálio, em damasco e debruado a oiro. Verdi, sentado naquele andor, sorri deslumbrado.

O Régulo do Cuor segue á frente de enorme séquito. A ladeá-lo virgens empunhando archotes. Jovens cantores entoam cânticos em honra de Verdi.

A tudo, de cuecas, a maioria, assistiam atónitos os militares.

Pára o séquito. Rebentam cascatas de luz – género S. João do Porto (visto do lado de Gaia).

Acordo e grito:
- Que raio de guerra é esta? Eu nunca lá estive.

Os Deuses devem estar loucos. Nunca! Eles nunca estão loucos. Eu é que estou. O que li não está escrito. Sonhei ou, na minha loucura, não leio lendo. Melhor, junto letras e fantasio textos.

Calmamente sinto que vou adormecer. Lá muito ao fundo, ouço acordes de La Traviatta. À volta do leito, duas de cada lado, quatro escravas empunham enormes leques de plumas de Aves do Paraíso. Uma suave brisa envolve-me.

Eunucos… Paro…

- EU NÃO ESTIVE LÁ !!!

Grito:

- VERDI A RÉGULO DO CUOR JÁ!

___________

Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 23 Novembro 2006 > Guiné 63/74 - P1308: Doces mentiras, amargas verdades (2): as nossas (in)comunicações (Beja Santos)


(2) Vd. post de 22 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1304: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (21): A viagem triunfal do Pimbas a terras do Cuor

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