terça-feira, 31 de outubro de 2006

Guiné 63/74 - P1230: Onde se fala do Henriques da CCAÇ 12, do ranger Eusébio e da tragédia do Quirafo (Mário Miguéis)

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Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 > Finais de 1969 ou princípios de 1970 > O ex-furriel Henriques, que na altura usava um pera, à revelia do RDM, e óculos esfumados (na época, estavam na moda)... Esses óculos irão desaparecer, para sempre, sob o efeito de cone de fogo de um bazuca, no decurso da Op Boga Destemida, em 9 de Fevereiro de 1970 ... Em homenagem às cangalhas, que lhe terão possivelmente salvo a vista, e que ficaram para sempre enterrados no capim e na terra vermelha de Gundagué Beafada, aquele tuga nunca mais usou óculos na vida... O Furriel Mil de Informações Mário Migueis, que diz tê-lo conhecido em Bambadinca, entre Novembro de 1970 e Janeiro de 1971l, tem razão quanto aos óculos: nessa altura, o Henriques de facto já não usava óculos...

Foto: Luís Graça (2005). Direitos reservados. Foto alojada no álbum de Luís Graça > Guinea-Bissau: Colonial War. Copyright © 2003-2006 Photobucket Inc. All rights reserved.


1. Mensagem do Mário Migueis que me chegou via Paulo Santiago, com data de 6 de Outubro de 2006 (1):

Caro Santiago:

Só agora tive oportunidade de ir ao blogue que me indicaste. Confesso que foi uma surpresa agradabilíssima poder rever, através de fotos da época, e não só, figuras e locais tão familiares, cujo registo os trinta e cinco anos entretanto decorridos não conseguiram apagar. Só por isso, o meu jarama (2) ao editor do blogue e a todos os restantes tertulianos, independentemente dos respectivos credos e patentes.

Penso que conheci o Henriques (Luís Graça) em Bambadinca, durante a minha passagem pelo sítio (Novembro de 1970 a Janeiro de 1971). No entanto, as fotografias dele disponíveis no blogue (uns óculos de que me não recordo) deixam-me algumas dúvidas (3).

Tenho, no entanto, uma fotografia com o T. Roda (CCAÇ 12), na qual, ao fundo, aparece a figura daquele que eu admito ser o agora nosso Luís Graça. A personagem que eu recordo usava, na altura, pêra pouco farta e, quando não estava em serviço, apresentava-se invariavelmente fardado com camisa de meia manga, calção, bota de lona e meia bem esticada até ao joelho (tudo como mandava a sapatilha e... o Anjos de Carvalho) (4).

Olha, nunca me deu para ir à Internet em busca da Guiné...e agora!... Agora, despertaste-me a curiosidade e o apetite e, qualquer dia, dou comigo a blogar também por vielas e calçadas, que é como quem diz por bolanhas e picadas...

Passando, agora, à questão que me colocaste, via telemóvel, quando, na paz do Senhor, passeava eu, desarmado e inocente, na Rua de Santa Catarina da Invicta Cidade, confirmo que, na Companhia do Lourenço (andas a chamar nomes feios ao homem!...), havia realmente um Furriel Miliciano Eusébio. Não me constou nunca, porém, que fosse Ranger (embora admita que pudesse sê-lo) e, até final de Outubro de 1972 (altura em que regressei à Metrópole), não pertenceu a GE [Grupo Especial] nenhum, nem nunca pôs os pés para além da linha de fronteira (5).

Mas, atenção!... embora o nome, o tempo e o local da acção sejam coincidentes, podemos (nunca se sabe!...) estar a falar de Eusébios diferentes. De qualquer modo, já tenho gente a tratar de tentar confirmar (ou até a localizar o Eusébio, quem sabe?!...).

(...) Por outro lado, quem diz que iam fardados e equipados com armamento russo para beneficiarem do factor surpresa e lançarem a confusão, está completamente fora do esquema, pois, como sabemos, para as acções além fronteiras, eram privilegiadas pelo Com-Chefe as tropas de cor (grupo do Marcelino da Mata, comandos africanos, milícias) e o equipamento capturado ao IN, para que não ficassem eventualmente no terreno provas da nossa participação nas mesmas, retirando, assim, sustentação às queixas (constantes, após a invasão de Conacry) das Repúblicas da Guiné e do Senegal na ONU.

No que se refere à emboscada do Quirafo e ao Desaparecido em Combate (estavas de férias, mas eu estava no Saltinho)(6), detecto algumas incorrecçõs no relato das quais, oportunamente, te darei conta (antes disso, vou tentar falar com alguém da desgraçada CCAÇ 3490 e, se possível, contactar o Batista - o famoso Morto-Vivo (sabes que este foi o título que dei a um conto com que concorri, uns anos atrás, a um concurso literário do JN? Claro que foi inspirado na nossa história ...).

Bem, bem,... com estas e com outras, estou a entrar pela madrugada dentro!... Deixa-me mas é desligar o aparelho, que se faz tarde!...

Um grande abraço e até breve!


PS - Juro-te que chorei durante meia-hora de tanto me rir com o teu relato do episódio das abelhas e do nosso Lourenço. Quem, como eu, conheceu os actores, tem que chorar certamente! Assisti à chegada ao quartel das G-3 abandonadas pelos pobres periquitos, algumas das quais com as coronhas derretidas, outras calcinadas... Foi, realmente, uma grandecíssima palhaçada e, contada por ti, a história tem realmente um sabor...

2. Resposta do Paulo Santigao:

Caro Migueis:

Agradeço a tua mensagem. O Eusébio que esteve no Saltinho, trabalha na NEA no Porto. Deve ser o tipo que pensavas trabalhar na Regisconta, que parece agora ter aquela designação. Há um tertuliano, Fur Mil Ranger, que esteve em Mansoa, em 1974 [, o Eduadro Magalhães Ribeiro] , já me deu o número de telefone de casa do tal Eusébio e me disse que o tipo ía gostar de falar comigo, etc. Respondi-lhe que espero justificações na Net, local onde descobri a história. Estou a aguardar.

Agradeço que corrijas algumas imprecisões da emboscada do Quirafo. Em 17 de Abril de 1972, tu estavas presente e eu de férias, como digo nos Posts onde relato o que me transmitiram os meus homens. Penso, contudo, o mais importante foi demonstrar a incompetência criminosa do Lourenço e do C. Lemos (7).

Há dias o Cosme, um dos meus ex-cabos, disse que o cabo apanhado à mão no Quirafo se chamava Ferreira, e não Batista, nome que utilizei no relato, pois era o que tinhas indicado quando almoçámos em Aveiro e falámos no caso.

Era bom que entrasses para a Tertúlia. Reenviei a tua mensagem para o Luís Graça. Vamos ter um encontro dia 14 em Montemor o Novo, onde vou com o Julião [Martins] e o [Carlos] Santos, [ambos da CCAÇ 2701) que andam a arranjar inspiração para escrever no blogue. Deves lembrar-te do Vacas de Carvalho, do Pelotão de Cavalaria [, o Pel Rec Daimler 2406, ]em Bambadinca. Há tempos contei no blogue o dia em que despertei o Anjos de Carvalho ao som dos tambores, com autorização do Polidoro, claro (3).

Não falei nas coronhas derretidas, porque a certa altura arranquei para Cansamange, deixando o Proveta na recolha de armas e na discussão com os pilotos dos heli. Podia ter sido um dia desastroso.

Espero continuar a encontrar-te na Net e também na Blogosfera.
Um abraço

Paulo Santiago
________________

Notas de L.G.:

(1) Segundo informação posterior do Paulo Santiago, o Mário Migueis, natural de Esposende, e também conhecido por Silva, foi furriel miliciano de informações, passou por Bambadinca, no tempo do BART 2917, entre Novembro de 1970 e Janeiro de 1971, e esteve com o Paulo Santiago no Saltinho até meados de 1972. Não pertencia ao Pel Caç Nat 53: não confundir com o Fur Mil Mário Rui...


(2) Lê-se djarama e quer dizer obrigado, no dialecto fula da Guiné-Bissau.

(3) Vd. post de 16 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1180: Paraquedistas, anjos da morte nos céus do Corubal (Luís Graça)

(4) Major Anjios de Carvalho, 2º Comandante do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), já aqui várias vezes evocado, a última das quais pelo próprio Paulo Santiago: vd post de 11 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1062: Uma cena em Bambadinca: quando o Major caiu da cama (Paulo Santiago)

(5) Vd. posts de:

27 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1119: Um periquito no Saltinho, o ranger Eusébio (CCAÇ 3490, 1972/74)

27 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1120: O Ranger Eusébio no Saltinho: erros e omissões (Paulo Santiago)

27 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1121: Carta Aberta ao Ranger Eusébio (Paulo Santiago)

(6) Vd. posts de:

23 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P980: A tragédia do Quirafo (Parte I): o capitão-proveta Lourenço (Paulo Santiago)

25 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P986: A tragédia do Quirafo (Parte II): a ida premonitória à foz do Rio Cantoro (Paulo Santiago)

26 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P990: A tragédia do Quirafo (parte III): a fatídica segunda-feira, 17 de Abril de 1972 (Paulo Santiago)

(7) Capitão Miliciano Lourenço, cmdt da CCCAÇ 3490 (Saltinho, 1972/74); tenente-coronel Castro Lemos, cmdt do BCAÇ 3872, sedeado em Galomaro: vd. post de 28 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1000: A tragédia do Quirafo (Parte IV): Spínola no Saltinho (Paulo Santiago)

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