terça-feira, 28 de março de 2006

Guiné 63/74 - P638: O grande comandante-em-chefe que foi o Amílcar Cabral (Luís Graça)

1. Comentário do L.G. ao comentário (pertinentíssimo) do João Tunes, blogador-mor do Água Lisa (6), benfiquista de alma e coração, tertuliano indefectível, amigo & camarada dos idos tempos da Guiné, e muitos outros atributos que eu me dispenso de enumerar aqui:

João: Acabo de levar no toutiço (e bem!) por uma frase (infeliz!) que pode revelar (revela, de facto!) alguma ligeireza, e que eu escrevi há dias, ao correr da pena. Uma primeira conclusão (provisória) que posso tirar é que não se deve escrever ao correr da pena, qaudno se é corredor de fundo...

Dizes-me em elegantíssimo comentário (que eu já publiquei previamente, como mandam as boas regras da convivialidade em vigor cá na nossa caserna):

"Não concordo nada, nadinha mesmo, com essa de meteres Amílcar Cabral na redoma do líder político-intelectual, dizendo [que] Cabral não foi um operacional, um verdadeiro guerrilheiro como o Nino... Como assim? Dizes isto, com tamanha ligeireza, e logo a propósito de um exemplo acabado de praxis feito gente como foi Amílcar?"...

O que eu escrevi foi o seguinte:

Quanto ao PAIGC, gostava de saber mais... Por exemplo, como é que um homem como Nino chegou aonde chegou... Há muitos mitos à volta da sua actuação como comandante... Mitos alimentados por nós mas também pelos seus homens... Eis um excelente tema para uma próxima discussão... Alguém o conheceu, a ele, Nino, na frente de combate? De kalash na mão? E chapéu à cowboy? O PAIGC (e a Guiné-Bissau) teria sido diferente com Amílcar Cabral, se este ainda hoje fosse vivo?

O pomo da discórdia está na frase seguinte (fatal): "Mas Cabral não foi um operacional, um verdadeiro guerrilheiro como o Nino"...

Reconheço que deveria ter usado o verbo no futuro do conjuntivo: "Mas Cabral não terá sido um operacional, um verdadeiro guerrilheiro como Nino"... O que eu queria dizer (e que, de facto, não consegui transmitir) é que o Amílcar foi um grande líder revolucionário, o que não é sinónimo de comandante militar...

Isto é apenas um exemplo do risco que corremos de não sermos, muitas vezes, "claros, concisos e precisos" (sic)... Pessoalmente dou muitíssima mais (que horror de construção frásica!) importância à figura (ímpar) do líder revolucionário do que à do comandante... Ou foi o contrário ? Se me enganei, peço desculpa ao nosso herói - ao meu herói dos verdes vinte anos - que lá estará algures no panteão dos heróis revolucionários, que a história rapidamente esqueceu... Infelizmente, Amílcar Cabral e o seu exemplo nobre, lúcido e generoso já foram há muito esquecidos pela sua pátria (quiçá menor, que a maior era a da língua portuguesa!).

João: tens, pois, toda razão!... Fui duplamente injusto: (i) para com o Amílcar Cabal (descendo-o do pedestal, pondo-o ao nível do Nino); (ii) para com o Nino, agigantando-o, elevando-o à categoria de lider revolucionário (que ele nunca foi, nem estava preparado para sê-lo)...

Confesso que tinha (e tenho) uma certa admiração (intelectual) pelo Amílcar, desde o meu tempo de menino e moço, o que era normal num gajo de esquerda do nosso tempo, mesmo desalinhado como eu... Hoje tenho muito mais informação e conhecimento do que tinha na época, o que me obriga a ser, no mínimo, mais crítico, mais prudente, mais racional...

Mesmo assim reconheço que sei pouco (muito pouco, afinal!) do homem e da obra...

Quanto ao Correia Jesuíno: não creio que ele tenha estado em Angola... Não estarás a confundi-lo com o Almirante Rosa Coutinho?


2. O João volta hoje à carga, com o seu apuradíssimo gosto pela polémica, ou melhor, pelo franco e aberto debate de ideias, o que só pode prestigiar e animar este pedaço da blogosfera lusófona:

Caro Luís,

Sobre Amílcar, pois há muito a discutir e a desvendar. Embora seja sempre complicado lidar com mitos. Agora, o que me parece indiscutível é que, enquanto vivo, Amilcar nunca perdeu um fio do controlo total sobre a estratégia militar da guerrilha e assegurando o seu controlo político. Foi, pois, um autêntico comandante-em-chefe (embora entrecortada por muitas ausências pelo mundo, em acções diplomáticas e de obtenção de apoios), ou seja, um equivalente à altura de Spínola (este, na contra-guerrilha).

Sobre Correia Jesuíno em Angola - não, não o confundi com o Rosa Coutinho. Não há livro de militar reaccionário, ou de colono branco ressabiado, que não o refira como figura central do MFA na transição angolana pré-independência. E o que dizem dele!!! (o que tomo como elogios, é claro).

Andas mesmo a baldar-te ao almoço a três, incluindo o Briote?

Grande abraço,
João Tunes

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