sábado, 25 de fevereiro de 2006

Guiné 63/74 - P566: Sobre a procura do Fernando do rasto da memória do camarada Horácio (João Tunes)

1. Texto do João Tunes (entre muitas outras coisas, foi ex-alf mil transmissões da CCS do BCAÇ 2884, Pelundo, 1969/70; mas acabou, com uma porrada, em Catió, noutra CCS, noutro Batalhão, mas no final saiu pela porta grande, com louvor com distinção...). Aproveito para lhe mandar um alfa bravo.

João: recebi o teu abraço (um); mandei-te dois, de volta, pela tua simpática esposa que tive o privilégio de conhecer esta manhã, na minha tabanca...

Quanto à almoçarada, terá que ser quanto antes... Pelo menos, antes que o futuro novo inquilino do palácio cor de rosa decrete o estado de sítio ou de emergência (os juristas não se entendem sobre a figura jurídica adequada) por causa da gripe pandémica que aí vem... Daqui a seis meses, ou daqui a seis anos, garante(m) a(s) autoridade(s) de saúde: o prazo já não conta... Ou melhor: o problema não é a incerteza sobre quando e como ela, a dita, a pandemia, há-de chegar, terrível e vingadira... Mas talvez sobre o tabu... do estado de sítio ou de emergência... O tabu é que vai atrair as atenções do Zé Povinho. Ele está-se mas tintas para o resto. Ele quer é saber se o novo comandante-chefe das forças armadas, a ser empossado dentro em breve, nos vai pôr a todos de quarentena... Tu, abafa-te, abifa-te... L.G.

Aqui vai, por fim, a prosa do João (inconfundível, incorrigível, inigualável):

Num Batalhão já tão avantajado que o Major General Luís para aqui mobilizou, eu não acredito que ele seja capaz, apesar dos seus inegáveis méritos de comando, de meter compostura na formatura. Duvido até que no toque a reunir ele consiga formar o maralhal na parada devidamente ataviado, barbeado e com os cinturões, armas e demais atavios prontos a dispararar, segundo os regulamentos e a ordem estabelecida, a pensar que, mais uma vez, se vai purgar o patriotismo que nos levou às bolanhas no levantar e arrear da nossa querida bandeira.

Para mais, agora quando findou o Euro 2004 lá se foi o fanatismo com as bandeiras e, nessa guerra, fomos vice-campeões, disso não passando. E talvez aí é que a porca torça o rabo, esta nossa vocação de nos esfalfarmos, esfolarmos, deixando juízo e tripas, darmos o litro, para, afinal, acabarmos vice-campeões. Bolas, cada um de nós, os que estivemos nas três frentes da guerra colonial, somos todos "vices" - na Guiné, só perdemos na final contra o PAIGC; em Moçambique idem com a Frelimo; em Angola, perdemos aos penalties com o MPLA. É sina, será? E esta dúvida, sistémica ou sismada, é um elogio (ao Luís e ao blogue), nada que se pareça a uma proposta de qualquer insurreição, indisciplina e, muito menos, levantamento de rancho (isso seria um absurdo porque rancho ainda não vi que acontecesse, e quem é que levanta o que ainda não tem ou já teve e vai falecendo pela lei da vida?).

Eu digo isto a inventar paródia, se calhar de mau gosto, para com coisas sérias porque estou para aqui, velho tonto e feito merda, a disfarçar uma espécie de intróito a fingir enxugar muita água salgada vinda de dentro dos olhos ao ler o mais sentido e pungente texto jamais publicado neste blogue.

Falo da mensagem do Fernando Martinho à procura do Batalhão, referências e camaradas do seu Pai e nosso camarada Horácio Martinho Ramos, infelizmente já desaparecido no combate contra a vida. Dando-nos esses enigmas para decifrar - período 1968/70, Bissorã, Bafatá, Tite, lema Somos como Somos e os números 2483 e 2484, falando depois em memórias transmitidas de amor à Guiné e uma vontade grande de lá voltar e as pistas encontradas num pai doente entre as tatuagens no braço.

Eu não te vou ajudar, Fernando. Andei por outras bandas e outras Companhias, não as do meu camarada e teu Pai Horácio. Mas, descansa, há-de aparecer por aí, tarda nada, quem com ele tenha feito escaramuças, dando e levando no coco, e com ele se tenha entretido (todos os guerreiros têm o seu repouso) com bajudas lindas de espevitar e chorar por mais.

Mas, nada te ajudando, sempre te digo: se não ajudo à localização da camaradagem e das raízes que, na Guiné, o teu Pai deixou, pelos meros desencontros do acaso (vê lá que fui no mesmo cruzeiro no Niassa para a Guiné com o camarada Luís e ainda não lhe (re)conheço a fronha respeitável e generalíssima no alto da sua vetusta e veneranda figura de Major General e Comandante em Chefe das batalhas deste blogue), digo-te isto e assim termino para não chatear mais: tomara eu que os meus filhos, e um que fosse me bastava, um dia que não muito deve tardar, me fizesse a honra de pós-memória para com o meu penar e amor pela Guiné da mesma ou aproximada forma, tão sentida e tão bonita, como tu procuras as raízes da memória de perda do teu pai, meu, nosso camarada. Não desistas.

E leva daqui um abraço.

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